Foi, sem dúvida, genial — absolutamente genial. Enquanto o país se entretinha com o “sim ou não” à burca, o Parlamento aprovava uma medida com impacto económico real: a descida do IRC. São menos 2.000 milhões de euros de receita pública, canalizados - como sempre - para quem já está muito acima da média. É curioso: quando o tema é a pobreza, o discurso é de contenção e sacrifício. Mas quando o tema são as grandes empresas, há sempre folga no orçamento e pressa nas decisões. Foi, como disse, um truque genial. Soltam a polémica da burca, inflamam o debate nas redes, puxam o povo para o campo da moral e da emoção e, por trás do pano, passam a lei que interessa verdadeiramente a quem manda. Um golpe limpo e silencioso. O Chega garante o espectáculo, o PSD e a IL fazem o serviço económico, e todos saem satisfeitos. Todos menos o país, claro - esse continua distraído, a discutir burcas e véus enquanto lhe puxam o tapete. A política, agora, tornou-se nisto: num teatro onde se fala de símbolos para esconder o essencial. E o essencial, como sempre, é o dinheiro - e quem o concentra. Enquanto o pobre discute o véu, alguém lhe leva o pão. Está tramado este povo!
