Primeira Cruzada: Testemunhos Históricos
Primeira Cruzada: Testemunhos Históricos
E DOCUMENTOS
130 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S
TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 131
As tomadas de Jerusalém
Jerusalém, cidade três vezes santa, para os judeus,
os cristãos e os muçulmanos, foi tomada duas vezes,
pelos cruzados em 1099 epor Saladino em 1191, mas
em condições muito diferentes.
s u a s v i t ó r i a s — r e t o m o u a c i d a d e e ali m a l h a v i a m a c a b a d o de q u e i m á - l a
fez reinar u m a justiça até e n t ã o s e m quando u m a m e n s a g e m chegou, c o m
precedentes n a história de qualquer u m p e d i d o u r g e n t e de a j u d a , p o i s a
rei d o m u n d o : n ã o h o u v e u m dirham cidade h a v i a sido t o m a d a pelo outro
q u e t i v e s s e s i d o tomado d e a l g u é m . lado: de fato, ela caiu pelo lado norte,
A s s i m , eu havia começado a esperar n a m a n h ã d e s e x t a - f e i r a , d i a 2 2 do
q u e D e u s , e m v i r t u d e de s u a j u s t i ç a e m ê s de s h a b â n , 4 9 2 [ 1 5 d e j u l h o d e
c
enquanto que a guerra santa deve conseguir obter a nações não digam: onde está o D e u s
deles?".
salvação para aqueles que a empreendem e por vezes S ã o B e r n a r d o , De laude novae
citado por Jean Richard, in
resulta, para os muçulmanos, em uma escolha entre a mílitiae,
L'Esprit de croisade, Paris, 1 9 6 9 .
conveisao ou a morte.
Bizâncio e a idéia de Cruzada
No momento em que os Templários p r ó p r i o s forem m o r t o s . Q u e r a m o r t e
A própria n o ç ã o de Cruzada é
se transformaram em ordem militar, seja sofrida, quer ela seja i m p o s t a a
incompreensível para u m bizantino:
São Bernardo tentou dissipar as outrem, será sempre u m a morte por
as lutas do império c o n t r a os persas e o
inquietações de certos monges que se C r i s t o : e l a n a d a t e m de c r i m i n o s a , e l a
Islã n u n c a se revestiram do caráter de
questionavam, sobre a legitimidade de é m u i t o gloriosa. N o primeiro caso, é
g u e r r a s a n t a . A s g u e r r a s p e r s a s de
seu engajamento militar. para servir a Cristo, no outro, permite
H e r á c l i o j a m a i s f o r a m as " C r u z a d a s "
que se g a n h e o próprio C r i s t o : este
que o Ocidente quis ver nelas a partir
p e r m i t e que, para vingá-lo, s e m a t e
São Bernardo se pronuncia contra a d a I d a d e M é d i a . N o f i n a l do s é c u l o X ,
u m i n i m i g o , e e l e p r ó p r i o s c dá a i n d a
no m o m e n t o e m que Nicéforo Focas
oDjeçao ae consciência de m a i o r boa v o n t a d e ao cavaleiro buís VII, aos pés de S ã o B e r n a r d o , e m p r e e n d i a , n a S í r i a do N o r t e ,
Para os cavaleiros de Cristo, pelo p a r a c o n s o l á - l o . D e s s e m o d o , eu •regando a C r u z a d a .
expedições que seu sucessor João
contrário, é c o m toda a segurança d i z i a , o c a v a l e i r o d e C r i s t o dá a m o r t e T z i m i s c e s estenderia até a Palestina, o
que c o m b a t e m por seu Senhor, s e m s e m nada t e m e r ; m a s m o r r e c o m patriarca se r e c u s o u a a c e d e r a o pedido
c o m que v e n h a a si o cavaleiro p a i a
precisar t e m e r pecar ao m a t a r seus ainda m a i s segurança: é ele q u e m se recompensá-lo. N o primeiro caso, o do imperador e a honrar, c o n c e d e n d o o
adversários, n e m perecer, s e eles beneficia c o m sua própria morte, e justo se regozijará ao ver o castigo; título de mártir, os soldados m o r t o s
C r i s t o da m o r t e q u e e l e e x e c u t a . no s e g u n d o , ele d i r á : " U m a v e z q u e c o m b a t e n d o os infiéis. Fiel ao
Pois n ã o é s e m motivo q u e ele o justo recebe o fruto de s u a justiça, c r i s t i a n i s m o primitivo, a Igreja
e m p u n h a a espada: é o executor da há s e m dúvida u m D e u s q u e julga os b i z a n t i n a era hostil â o e m p r e g o de
v o n t a d e divina, quer seja p a r a castigar homens na Terra." a r m a s p e l o s l e i g o s — o c â n o n e de S ã o
os m a l f e i t o r e s ou para glorificar os Contudo, não convém matar os Basílio priva da c o m u n h ã o d u r a n t e
b o n s . Q u a n d o leva à m o r t e u m pagãos s e f o r p o s s í v e l e n c o n t r a r três anos aqueles que " c o m e t e r a m u m
malfeitor, ele n ã o é u m h o m i c i d a , u m outro m e i o de impedi-los de assassinato durante a guerra" — e a
e s i m , o u s o dizer, u m m a l i c i d a . E l e p e r s e g u i r o u de o p r i m i r o s f i é i s . fortiori [por m o t i v o d e f o r ç a m a i o r ]
vinga Cristo daqueles que f a z e m o Mas, por enquanto, m a i s vale que os pelos clérigos.
m a l ; d e f e n d e o s cristãos. Se ele próprio pagãos s e j a m m o r t o s , a n t e s isso que C é c i l e M o r r i s s o n , Les Croisades,
for morto, não perece: atinge s e u permitir a ameaça que representam " Q u e sais-je?", PU.F.
objetivo. A m o r t e que ele inflige é e m os pecadores elevados a c i m a da cabeça
benefício de Cristo; a que ele recebe, dos justos, por m e d o de ver os j u s t o s
e m s e u p r ó p r i o b e n e f í c i o . D a m o r t e do se d e i x a r e m ser l e v a d o s a c o m e t e r a Conceito de Cruzada, conceito
pagão, o cristão pode o b t e r glória, u m a i n i q ü i d a d e . [...] de jihad
vez que ele age pela glória de C r i s t o ; Q u e sejam repelidos para longe N a realidade, a C r u z a d a n ã o é u m a
n a m o r t e do c r i s t ã o , a g e n e r o s i d a d e da c i d a d e d o S e n h o r a q u e l e s q u e
C a r t a circulai do m u n d o árabe ( 1 1 9 3 ) . resposta à guerra santa islâmica: no
do rei p e r m i t e livre c u r s o : e l e f a z c o m e t e m a iniqüidade, aqueles f i n a l d o s é c u l o X I , o ideal do j i h a d
148 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S
TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 149
A prática da guerra na época de c o m b a t e novo para os francos, que postos. C o n s e r v a n d o - s e u m pouco de os sobreviventes e recolher s e m
Nur ed-Din n ã o s a b i a m , p o r falta de m o b i l i d a d e , lado, e s p e r a n d o o m o m e n t o d e intervir, resistência a s bagagens do i n i m i g o .
combater ao m e s m o t e m p o e m q u e m a n t i n h a m - s e a s abtal, a s t r o p a s d e
Combate em campo A ação de defesa contra essa
seguiam e m m a r c h a perseguindo elite m a i s e s p e c i a l m e n t e encarregadas manobra consistia e m posicionar
Face ao adversário, era necessário ter o inimigo a distância, os cavaleiros ile p r o t e g e r a r e t i r a d a , e o s sug'an, o adversário de tal m a n e i r a q u e
e m campo u m a infantaria competente, tucomanos e r a m pouco vulneráveis. i ropas d e c h o q u e p r o n t a s p a r a a t a c a r ele tivesse atrás de si u m terreno
c o m u m a p r o t e ç ã o de soldados [...] ; c a m p o i n i m i g o . A h a b i l i d a d e do impraticável para executar seu
avançando a descoberto e elementos Ao longo dos séculos VI-XII, para chefe consistia e m estudar b e m as s i m u l a c r o de fuga.
de vigilância para evitar as surpresas lutar contra a tática de perseguição de condições que determinavam a ação
A m a n o b r a d e al-karr wa'1-farr,
e impedir o cerco. Era recomendado N u r ed-Din, os francos multiplicaram m combate e que iriam desencadear
apesar de ser simples e de prática
que se evitasse o c o m b a t e e m terreno as unidades constituídas de nativos, os .i m a n o b r a . U m a v e z i n i c i a d a a
corrente, era sempre bem-sucedida;
plano, onde as possibilidades do "turcópolos", elementos de cavalaria batalha, a dificuldade era conservar o
contudo, o sucesso desse m o v i m e n t o
i n i m i g o n ã o podiam ser avaliadas, ligeira a r m a d o s de arco. A d a p t a n d o c o n t r o l e das t r o p a s , d e o n d e p r o v i n h a
ficava c o n d i c i o n a d o à agilidade, à
t e r b o a s t r o p a s d e r e s e r v a e protegei- material e m é t o d o s ao adversário com muita freqüência a incerteza
ousadia e à vontade do e x e c u t a n t e .
o s flancos. N u n c a c o m b a t e r c o m o s oriental, os cruzados n ã o tiraram que planava sobre o resultado final
Q u a n d o a s tropas de N u r ed-Din
flancos ou a retaguarda descobertos, n e n h u m proveito dos esquadrões de u m combate,- o c h e f e devia s a b e r
atacavam n a planície, elas buscavam,
escolher o local do c o m b a t e , s e m p r e rápidos para m a i s tarde modificar s u a
I imitar o s riscos e conservar b e m os sobretudo, mobilidade. D e fato, as
se dispor de m a n e i r a q u e o inimigo tática no Ocidente.
h o m e n s sob controle. N o m o m e n t o disposições de c o m b a t e variavam de
tivesse o sol nos olhos e o vento s c o l h i d o , a s fileiras d e s o l d a d o s d e acordo c o m a situação geográfica e as
soprando c o n t r a ele, c o m b a t e r c o m as ifantaria do centro, depois de t e r e m forças que se apresentavam. S e o t e m a
O c o m b a t e e m linha de batalha
retaguardas protegidas por obstáculos ontido o adversário, s e a f a s t a v a m , da m a n o b r a q u e c o n s i s t i a e m d e s t r u i r
n a t u r a i s c o m o u m c u r s o d'água, u m Al-Turtusi ( u m c o n t e m p o r â n e o de • posicionavam n a s alas e deixavam a coesão entre a infantaria e a cavalaria
p â n t a n o o u falésias, para evitar u m a infância de N u r ed-Din) era partidário era sempre o m e s m o , sua execução
I I c a m i n h o livre p a r a o s c a v a l e i r o s
m a n o b r a q u e p e r m i t i s s e a f o r m a ç ã o de de u m exército ordenado e m três conhecia variantes.
e f e t u a r e m a m a n o b r a d e al-kair wa'l-
u m cerco; fortificar s e u campo, j a m a i s partes: u m a central e duas alas. Ele fiirr (carga e d e b a n d a d a d a c a v a l a r i a ] . N i k i t a Elisseeff,
se l a n ç a r n u m a perseguição d e m a s i a d o preconizava para o c o m b a t e e m linha
rápida, n e m separar i n f a n t a r i a e Nur ed-Din, Dumas, 1967
de batalha a f o r m a ç ã o e m três fileiras.
cavalaria, n ã o permitir de n e n h u m a A primeira fileira e r a c o m p o s t a de Al-karr wa'1-farr
m a n e i r a o f r a c i o n a m e n t o do exército. soldados de infantaria equipados c o m
[...] E m u m a carga r e p e n t i n a , a cavalaria
b o n s e s c u d o s : hanuwiya o u taríqa,
dc N u r e d - D i n , p o s i c i o n a d a n o centro,
U m a das manobras principais dc h o m e n s que a s s u m i a m posição
n i t r a v a e m contato c o m o adversário.
N u r ed-Din, se n ã o a mais freqüente, atrás de seus escudos, c o m o j o e l h o
I )epois, fingindo fraqueza, ela se
era separar a cavalaria da infantaria esquerdo apoiado n o chão, portando
retirava, s i m u l a v a a f u g a a r r a s t a n d o
e destruir a coesão do adversário p o r longas lanças fixadas n o solo e m u m
consigo, irresistivelmente, e m u m a
m e i o da perseguição e provocação. ângulo p r ó x i m o a 4 5 graus, e t i n h a m
ivalgada p a r a l o n g e d e s u a s b a s e s , o s
t a m b é m , a o alcance da m ã o , azagaias
N a s operações desse gênero, logosos cavaleiros f r a n c o s .
pontudas. Esses h o m e n s constituíam
os cavaleiros zângidas, armados N a m a n o b r a da debandada, inspirada
u m a primeira l i n h a de defesa. N a
e s s e n c i a l m e n t e de arcos e flechas, na e s t r a t é g i a d o s p o v o s d a s e s t e p e s , o
s e g u n d a fileira, a t r á s d e c a d a g r u p o
e x e c u t a v a m u m a verdadeira cavalgada II l o m e n t o d e l i c a d o e r a a q u e l e e m q u e
d e dois h o m e n s , f i c a v a u m a r q u e i r o
ao redor da c o l u n a e m m a r c h a . cavalaria de N u r e d - D i n fazia a
a t i r a d o r d e a r c o d e m ã o [garh] m u n i d o
Atacando pelos flancos, perseguindo e meia-volta para contra-atacar. Este
d e f l e c h a s [rúbal); o p a p e l d e s s a f i l e i r a
m o l e s t a n d o a retaguarda, eles f a z i a m m o v i m e n t o devia ser e x e c u t a d o
e r a repelir a t r a v é s do l a n ç a m e n t o d e
c a i r u m a v e r d a d e i r a saraivada de [liando a s a l a s , q u e t i n h a m
suas setas as cargas do adversário. M a s ,
flechas, depois se retiravam. Q u a n d o permanecido n o local do confronto,
se certos elementos conseguissem
as fileiras i n i m i g a s e s t a v a m desfeitas, já h a v i a m p o s t o f o r a d e c o m b a t e o s
entrar e m contato c o m a primeira
os cavalos m o r t o s o u feridos, a elementos francos que n ã o t i n h a m
fileira, o s c a v a l o s s e c h o c a v a m c o m
cavalaria t u r c o m a n a se reorganizava p a r t i c i p a d o da p e r s e g u i ç ã o . Q u a n d o
as l a n ç a s , e c a v a l e i r o s e m o n t a r i a s
e m esquadrões e atacava violenta e i cavalaria franca retrocedia, ficava
e r a m abatidos c o m golpes d e azagaia.
i m p e t u o s a m e n t e o adversário, pondo presa c o m o n a a r m a d i l h a de u m laço
N a t e r c e i r a fileira, p r o t e g i d a p e l a
fora de c o m b a t e os e l e m e n t o s isolados, mi e m u m t o r n o ; e n t ã o n ã o faltava
infantaria, m a n t i n h a - s e a cavalaria a D e s t r u i r a c o e s ã o do adversário p o r m e i o
u m após outro. Era u m m o d o de mais nada, exceto fazer prisioneiros de p r o v o c a ç ã o e p e r s e g u i ç ã o .
154 T E S T E M U N H O S E DOCUMENTOS TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 155
exemplo inspirou muitos chefes de Estado árabes Relata-se que o Profeta disse as
seguintes palavras: " D e u s a m a a
contemporâneos. Junto aos francos, pelo contrário, coragem, m e s m o quando se trata
de m a t a r u m a s e r p e n t e . " S a l a d i n o
seu prestígio foi imediato. Eis aqui o depoimento c i a u m h o m e m dos m a i s c o r a j o s o s ,
de seu secretário, Baha ad-Din Ibn Shaddad. o coração forte, o espírito valente, a
iiIma f i r m e , i n t r é p i d a d i a n t e d e t o d a s
iis p r o v a s . E u o v i c o m b a t e r c o n t r a
Alguns aspectos de sua generosidade ignoro. Ele dava de p r e s e n t e províncias u m g r a n d e n ú m e r o de f r a n c o s p a r a
inteiras. C o n q u i s t o u A m i d a [na os q u a i s i n c e s s a n t e m e n t e c h e g a v a m
O Profeta disse: " Q u a n d o o h o m e m M e s o p o t â m i a ] ; o f i l h o de Q a r a A r s l a n .i p o i o s e r e f o r ç o s , a l g o q u e a p e n a s
generoso tropeça, D e u s o t o m a pela [ M u h a m m a d Ibn Qara Arslan, e m i r o ijudava a m u l t i p l i c a r s u a f o r ç a
m ã o " , e várias tradições canónicas a r t ú q u i d a de H i s n Kaifa, 1 1 7 4 - 1 1 8 5 ] terreno; t a m b é m se aproximava
ilc a l m a e s u a r e s i s t ê n c i a t e n a z . N a
f a l a m da generosidade. A de Saladino pediu-lhe que dela lhe fizesse presente, do inimigo quando não estávamos
m e s m a tarde c h e g a r a m m a i s de
era d e m a s i a d o m a n i f e s t a para que a e S a l a d i n o o p r e s e n t e o u c o m ela. Vi, longe dele; e m p l e n o fragor da
M lenta embarcações inimigas, as
registremos aqui, f a m o s a d e m a i s para c o m m e u s próprios olhos, toda u m a i|ii.iis c o n t e i , d a h o r a d a p r e c e d o asr c
b a t a l h a , p a s s a v a e m m e i o às f i l e i r a s ,
que dela f a ç a m o s m e n ç ã o : v o u m e s é r i e de d e p u t a ç õ e s r e u n i d a s d i a n t e 11 >i i n t e i r a s h o r a s d a t a r d e ] a t é o p ô r acompanhado apenas por u m único
dele, e m J e r u s a l é m , q u a n d o h a v i a di i sol, e p o r i s s o S a l a d i n o t o r n o u - s e p a j e m que conduzia u m cavalo de
limitar a u m a visão de c o n j u n t o . C o m
d e c i d i d o ir r e s i d i r e m D a m a s c o , e ainda m a i s obstinado. N o princípio do batalha pelas rédeas; m o v i m e n t a v a - s e
t o d o s o s o b j e t o s de v a l o r q u e e s t i v e r a m
e m seu tesouro não havia nada para inverno, ele t i n h a c o n c e d i d o l i c e n ç a a da a l a d a d i r e i t a p a r a a a l a d a e s q u e r d a ,
e m sua m ã o , por ocasião de sua m o r t e
d a r a e s s a s deputações,- i n s i s t i t a n t o suas tropas e s ó havia c o n s e r v a d o u m p u n h a e m o r d e m as unidades e lhes
só f o r a m e n c o n t r a d o s e m seu tesouro
c o m ele, q u e Saladino v e n d e u u m a pi i|i.ieno d e s t a c a m e n t o p a r a e n f r e n t a r ordenava que avançassem ou que
4 7 d r a c m a s de prata n a s i r i t a e u m
aldeia, propriedade do t e s o u r o p ú b l i c o , .is g r a n d e s f o r ç a s i n i m i g a s . [...] p a r a s s e m n o s lugares oportunos.
único lingote de ouro de Tiro, cujo peso
e distribuímos o produto dessa venda l o d o s o s dias, u m a ou duas vezes, D o m i n a v a do alto e seguia de p e r t o o s
s e m conservar u m único dracma. ele i n s i s t i a i m p e r i o s a m e n t e e m s a i r m o v i m e n t o s do i n i m i g o ; ao m e s m o
S a l a d i n o q u e i m a s e u s c a n h õ e s e galeras,
e parte c o m seu e x é r c i t o . Ele distribuía dinheiro e m t e m p o s de 11.iia f a z e r o r e c o n h e c i m e n t o d o t e m p o e m q u e dirigia a b a t a l h a ,
escutava u m p a j e m ler u m f r a g m e n t o
das tradições c a n ó n i c a s . Tudo isso foi
fruto de m i n h a s observações; eu tinha
dito que as tradições já h a v i a m sido
lidas n o s lugares m a i s n o b r e s , m a s q u e
n u n c a s e o u v i r a f a l a r de a l g u é m q u e a s
tivesse lido e m m e i o às tropas
e n f i l e i r a d a s e m c a m p o d e batalha,-
portanto, "se Sua Majestade aceitasse
que relatássemos esse seu costume,
seria r e a l m e n t e m a r a v i l h o s o " . Ele
autorizou que isso fosse feito; m a n d o u
trazer u m a coletânea e m a n d o u
que alguém lhe lesse, e n q u a n t o n o s
encontrávamos todos montados a
cavalo, avançando o u parando entre os
156 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 157
II i
Os francos vistos pelo Oriente basileu, que c h a m o u u m de seus
intérpretes para a língua latina e lhe
Para os orientais, bizantinos ou árabes, não há discussão pediu que traduzisse o significado
dessas palavras. Q u a n d o t o m o u
sobre a questão: os francos são seres grosseiros, brutais e c o n h e c i m e n t o do q u e o l a t i n o t i n h a
dito, n ã o lhe fez de i m e d i a t o n e n h u m a
ignorantes. Osama, emir de Sheizar, reconhece, todavia, o b s e r v a ç ã o , m a s g u a r d o u p a r a si
m e s m o suas reflexões. Q u a n d o todos
que os cavaleiros tinham qualidades de coragem e de despediram-se dele, o basileu c h a m o u
franqueza, bem como eram fiéis à amizade por aqueles o orgulhoso e impudente latino e lhe
perguntou q u e m era, de que região
que residiam no Oriente há muito tempo. vinha, a que linhagem pertencia.
"Sou u m franco puro", respondeu
o o u t r o , " e da n o b r e z a ; e sei de u m a
Os francos vistos pelos bizantinos " T u n ã o deverias", disse-lhe,
coisa: é que, e m u m a encruzilhada na
"agir dessa maneira, tanto m a i s que
S e g u n d o o depoimento deAna terra onde nasci, existe u m santuário
a c a b a s de j u r a r v a s s a l a g e m a o b a s i l e u .
Comneno, os cruzados chamam a h á m u i t o s a n o s erigido, onde qualquer
Efetivamente, n ã o é c o s t u m e dos Godofredo de B o n i l l o n , respeitado pelos
atenção sobretudo por sua grosseria e u m q u e deseje se b a t e r e m duelo vai
b a s i l e u s dos r o m a n o s p e r m i t i r q u e s e u s m u ç u l m a n o s p o r sua s i m p l i c i d a d e e p o r
sua brutalidade se postar c o m e s s e objetivo, e ali ele
súditos sentem-se ao m e s m o t e m p o que sua piedade.
pede a D e u s s u a ajuda, e n q u a n t o
eles; a q u e l e s q u e s e t o r n a r a m v a s s a l o s
D e p o i s de t o d o s t e r e m sido reunidos, espera n o local o h o m e m que ousaria
de S u a M a j e s t a d e d e v e m o b s e r v a r
inclusive o próprio Godofredo, e depois desafiá-lo. N e s s a encruzilhada, passei
t a m b é m o s c o s t u m e s do p a í s " . características e as peculiaridades de
de o j u r a m e n t o ter sido prestado por m u i t o t e m p o s e m t e r n a d a q u e fazer,
sua mentalidade.
O h o m e m nada respondeu a esperando u m protagonista; m a s o
cada conde, u m nobre teve a audácia N o e x é r c i t o do rei F o u l q u e s , f i l h o d e
Balduíno, m a s lançou u m olhar furioso h o m e m suficientemente audacioso
de sentar-se na cadeira do basileu. O Foulques, havia u m honrado cavaleiro
p a r a o b a s i l e u e, f a l a n d o s o z i n h o para tanto jamais apareceu".
basileu tolerou isso s e m dizer u m a franco que, t e n d o v i n d o de suas terras
e m m u r m ú r i o s , dirigiu-lhe a l g u m a s D i a n t e dessas palavras, o basileu
palavra, pois c o n h e c i a h á m u i t o t e m p o para fazer a peregrinação, ia voltar p a r a
palavras e m sua própria língua. "Vede", replicou:
a natureza arrogante dos latinos. M a s lá. Ele t o r n o u - s e m e u c o n h e c i d o e
disse ele, " q u e h o m e m grosseiro; ele " S e buscaste c o m b a t e r s e m poder
o conde Balduíno interveio, puxou o a p e g o u - s e a m i m , c h a m a n d o - m e de
senta-se sozinho quando tão valorosos encontrar ocasião p a r a isso, eis que
outro pela m ã o e o fez se levantar, seu i r m ã o . T e n d o e m vista o fato de
capitães se m a n t ê m de pé a seu lado". chegou o m o m e n t o e m que serás que a amizade havia criado entre n ó s
fazendo-lhe severas censuras.
O m o v i m e n t o d o s l á b i o s do satisfeito à força de t a n t o s c o m b a t e s ; r e l a ç õ e s p r o l o n g a d a s , e ele p r ó p r i o
latino não passou despercebido ao recomendo-te, vivamente, que não estivesse decidido a viajar por m a r
A n i m a i s q u e p o s s u e m a v i r t u d e da força.
te p o s i c i o n e s n e m n a r e t a g u a r d a para retornar à s u a terra, m e disse:
n e m à frente das fileiras, m a s que "Irmão, v o u - m e embora, volto para
permaneças no centro." casa. Gostaria que deixasses que teu
A n a C o m n e n o , Mexíade, X filho partisse c o m i g o (este ú l t i m o , c o m
14 anos, m e acompanhava); e m m i n h a
terra, ele observaria os cavaleiros,
Os francos vistos pelo emir de Sheizar
seria instruído n o s c o n h e c i m e n t o s e
n a f o r m a ç ã o d a c a v a l a r i a e, q u a n d o
Osama, emir de Sheizar, é sensível, voltasse, teria aprendido o m o d o de
sobretudo, à ignorância deles, mas proceder de u m h o m e m sensato."
estabeleceu uma diferença entre os
antigos e os recém-chegados. M i n h a orelha ficou chocada ao
ouvir tais sugestões, que não poderiam
e m a n a r de u m a c a b e ç a razoável.
N o q u e diz r e s p e i t o a o s f r a n c o s , Pois se m e u filho tivesse sido feito
q u a n d o s e t r a t a d a m a n e i r a d e ser, p r i s i o n e i r o , n a d a de p i o r p o d e r i a t e r - l h e
pode-se apenas exaltar e santificar o acontecido e m seu cativeiro do que
Altíssimo, pois v e m o s neles a n i m a i s ser levado para a terra dos francos.
q u e p o s s u e m a v i r t u d e da f o r ç a e Respondi:
da r e s i s t ê n c i a p a r a c a r r e g a r g r a n d e s " Q u e curioso, isso era e x a t a m e n t e
fardos. V o u evocar a l g u m a s de s u a s o que eu tinha e m m e n t e . M a s estou
160 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 161
impedido de fazê-lo pela afeição que a o médico examinou a mulher, sobre a medicina coisas que, até " U m amigo meu, u m franco, m e
avó t e m pelo m e n i n o : ela só p e r m i t i u declarou que ela t i n h a n a c a b e ç a u m então, m e eram desconhecidas." convidou. Venha comigo, para ver
que ele v i e s s e c o m i g o depois de m e d e m ô n i o que a possuía e exigiu que Entre os francos, existem aqueles c o m o se c o m p o r t a m essas pessoas."
ter feito jurar que eu o levaria de volta. lhe rapassem a cabeça. Q u a n d o isso que se a c l i m a t a r a m e a d q u i r i r a m " E u fui c o m ele", r e l a t o u - m e m e u
— D e m o d o q u e t u a m ã e a i n d a vive? — estava feito, ela s e p ô s a comer, e n t r e o h á b i t o de c o n v i v ê n c i a c o m o s c o m p a n h e i r o , " e c h e g a m o s à casa de
m e perguntou o cavaleiro. outras coisas que se c o m e entre os m u ç u l m a n o s . Esses ú l t i m o s são u m c a v a l e i r o da v e l h a g e r a ç ã o , u m
— Sim. — Então não a contrarie." francos, alho e mostarda. A mulher m e l h o r e s que os outros, r e c e n t e m e n t e daqueles que t i n h a m partido de suas
Agora falemos das estranhezas emagreceu ainda m a i s e o médico instalados e m suas terras, m a s
terras c o m as primeiras expedições
da m e d i c i n a dos francos. O s e n h o r disse: ' O d e m ô n i o já l h e h a v i a e n t r a d o c o n s t i t u e m a exceção que não se
francas. Afastado de f u n ç õ e s especiais
de a l - M u n a y t ' i r a escreveu a m e u n a cabeça.' Ele pegou u m a navalha, fez deveria considerar c o m o regra.
e d i s p e n s a d o de s e r v i ç o , e l e p o s s u í a ,
tio pedindo que lhe enviasse u m sobre o crânio u m a incisão e m forma A propósito disso, direi q u e
e m A n t i o q u i a , u m a p r o p r i e d a d e de
medico que pudesse tratar alguns de c r u z e, n o m e i o , u m a e s f o l a d u r a t ã o havia enviado a Antioquia, onde
cujos frutos vivia. A p r e s e n t o u - n o s u m a
de seus c o m p a n h e i r o s d o e n t e s . M e u profunda que o osso apareceu. Então se e n c o n t r a v a o c h e f e T h e o d o r o s
beía m e s a e pratos tão limpos e tão
tio despachou u m m é d i c o cristão esfregou t u d o c o m sal e a m u l h e r Sophianos, que m a n t i n h a comigo laços
finos q u a n t o se podia imaginar. Ao ver
c h a m a d o T h a b i t . Ele n ã o havia se morreu imediatamente. Eu perguntei de a m i z a d e e t i n h a p l e n a a u t o r i d a d e
aos francos se eles ainda precisavam q u e e u m e a b s t i n h a de comer, ele m e
ausentado n e m sequer dez dias na c i d a d e , u m d e m e u s c o m p a n h e i r o s ,
de m i m . C o m o respondessem que disse: " C o m a , n ã o faça cerimônia! Eu
quando retornou. D i s s e m o s a ele p a r a c u i d a r de a l g u n s n e g ó c i o s . E l e
não, v i m - m e embora, tendo aprendido t a m b é m não c o m o a comida franca.
que havia curado aqueles doentes d i s s e c e r t o dia a m e u c o m p a n h e i r o : '
T e n h o cozinheiras egípcias, s ó c o m o o
m u i t o depressa. M a s pedimos que nos
que elas p r e p a r a m e a c a r n e de porco
explicasse c o m o : "Trouxeram-me
não entra e m m i n h a casa." E assim
u m cavaleiro e m cuja perna havia
eu comi, ainda que c o m cautela,
se formado u m abscesso e u m a
m u l h e r que estava sofrendo de u m m a n t e n d o - m e e m guarda, e depois
m a l de e m a g r e c i m e n t o , m i n g u a n d o , f o m o s e m b o r a . A l g u m t e m p o depois,
ressequida. Preparei, para o cavaleiro, a o passar pelo mercado, fui agarrado
u m pequeno emplastro, o abscesso por u m a m u l h e r f r a n c a que se pôs a
se abriu e c o m e ç o u a evoluir b e m . v o c i f e r a r n a l í n g u a deles,- e u n ã o s a b i a
Para a mulher, receitei u m a dieta o q u e e l a d i z i a . U m g r u p o de f r a n c o s
especial e comecei a acalmar-lhe o s e f o r m o u e s u a h o s t i l i d a d e m e fez
temperamento. Entretanto, chegou acreditar que, c o m toda certeza, iria
u m médico franco, que declarou morrer. M a s eis que chegou aquele
que eu não conhecia nada capaz de c a v a l e i r o : a d i a n t a n d o - s e , e l e m e v i u e,
curá-los. ' Q u e preferes', perguntou ele a p r o x i m a n d o - s e da mulher, disse-
ao cavaleiro, 'viver c o m u m a perna lhe: "Qual é teu problema c o m este
s o o u morrer c o m as duas?' O outro m u ç u l m a n o ? " — "Ele m a t o u m e u
respondeu que preferia viver c o m u m a i r m ã o H u r s o , " respondeu ela.
só. 'Eu quero', disse e n t ã o o médico, E s t e H u r s o era u m cavaleiro de
' u m cavaleiro robusto e u m m a c h a d o A p a m é i a , que tinha sido m o r t o
b e m cortante e afiado!' Quando ambos
p o r a l g u é m do exército de H a m a .
e s t a v a m lá, eu m e s m o a s s i s t i n d o à
O cavaleiro, gritando, respondeu à
cena, o médico colocou a perna do
mulher: "Este h o m e m é u m burguês
doente sobre u m cepo de m a d e i r a e
[ele q u e r i a d i z e r : u m m e r c a d o r ] ,
disse ao cavaleiro: 'Acerte-lhe a perna
que não combate, que j a m a i s viu
c o m u m golpe de m a c h a d o , u m ú n i c o
u m a b a t a l h a ! " E o cavaleiro, s e m p r e
q u e a c o r t e f o r a ! ' V i o c a v a l e i r o golpear,
gritando m u i t o alto, partiu para c i m a
u m a primeira vez, s e m que a perna
dos outros que h a v i a m se agrupado
fosse cortada. N o segundo golpe, a
a o n o s s o redor. E l e s s e d i s p e r s a r a m ,
m e d u l a da p e r n a f o i e s p a r g i d a e o
paciente morreu n a hora. Depois, e n q u a n t o ele m e levava consigo,
m i n h a m ã o apertada n a dele. Esses
f o r a m os b o n s resultados de t e r m o s
N o s domínios científicos, comparado compartilhado u m a refeição: eu havia
c o m o O c i d e n t e , o Islã estava m u i t o e s c a p a d o da m o r t e .
avançado.
O s a m a , Ensinamentos da vida
162 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 163
As fortalezas francas
De todas as fortalezas construídas pelos francos na
Síria e na Palestina, o Krak dos Cavaleiros, na Síria, é
a mais célebre e a mais bem conservada. Cedida aos
Hospitalarios, não pôde resistir a Baybars, a despeito
do poderio de suas defesas.
Função, origem e descendência e, s i m , i n d i v i d u a l m e n t e , p o r
dos castelos francos da Síria e da cavaleiros e m busca de terras. N e s s e
Palestina sentido, a c o n s t r u ç ã o de fortificações
francas n a Terra Santa teve c o m
O historiador francês Paul D e s c h a m p s , f r e q ü ê n c i a u m a origem, e c o n ô m i c a e
a q u e m devemos u m admirável não p u r a m e n t e militar. Era o m e i o
estudo sobre o Krak dos Cavaleiros, d e e x i g i r da p o p u l a ç ã o d o s a r r e d o r e s
havia ressaltado a e x i s t ê n c i a de u m rendas anuais e serviços para as
verdadeiro s i s t e m a de defesa da necessidades pessoais e militares
Terra Santa, organizado e m função do do s e n h o r . A l é m d i s s o , a f o r t a l e z a
traçado da fronteira, das características tornou-se rapidamente u m centro de
do relevo, das p a s s a g e n s e das c o l o n i z a ç ã o e de d e s e n v o l v i m e n t o , Fortaleza de Sidon.
estradas. Atualmente, r e e x a m i n a m o s atraindo novos habitantes pela
essas afirmações: os francos ocuparam, segurança que ela garantia. C o n t r i b u i u
por necessidade prática, as fortalezas t a m b é m para estender os l i m i t e s do A origem contestada das fortalezas a zona costeira, de capital
que balizavam a fronteira noroeste do reino ao estabelecer o controle dos importância, u m a vez que assegura
Islã e o l i m i t e sudeste dos territórios A localização das fortificações suas comunicações c o m o Ocidente.
ocidentais sobre novos territórios.
bizantinos; ora, esta l i n h a n ã o coincide responde, contudo, a u m n ú m e r o D e lá, eles p r o c u r a r a m e s t e n d e r a
D e s s e m o d o , os castelos dos cruzados
c o m a de seu m a i o r a v a n ç o . Por outro d e t e r m i n a d o de i m p e r a t i v o s fronteira continental até o deserto,
r e s p o n d e r a m a c o n s i d e r a ç õ e s de
lado, as praças fortificadas n ã o f o r a m ordem administrativa, econômica e estratégicos, eles próprios ligados às quase sempre s e m sucesso. N ã o
todas adquiridas pelo poder público, social, a n t e s de s e r e m integrados e m p r i n c i p a i s c a r a c t e r í s t i c a s do r e l e v o p u d e r a m c o n t r o l a r as p l a n í c i e s de
de a c o r d o c o m u m p l a n o s i s t e m á t i c o , u m s i s t e m a geral de defesa. da região. Esta c o m p r e e n d e u m a Alepo, de H a m a e de H o m s , do o u t r o
planície litorânea m a i s ou m e n o s lado do Oronte. Fracassaram diante
estreita, entrecortada por p o n t a s de d e D a m a s c o e s ó s e a p r o x i m a r a m da
contrafortes, u m a zona m o n t a n h o s a g r a n d e r o t a de c a r a v a n a s n o s u d e s t e
e s t e n d e n d o - s e de n o r t e a sul que do m a r M o r t o , ao s e e s t a b e l e c e r e m n o
P l a n t a do c a s t e l o de M a r k a b (Margat).
domina a profunda depressão ocupada K r a k de M o a b e n o K r a k d e M o n t r e a l .
pelo m a r M o r t o e o v a l e do r i o J o r d ã o . A l é m disso, d u a s l i n h a s de defesa
Ao n o r t e , o v a l e do rio L i t a n i e d e p o i s de n o r t e p a r a sul f o r a m n e c e s s á r i a s ,
() c u r s o s u p e r i o r do O r o n t e p r o l o n g a m u m a n a c o s t a e m que todas as cidades
a bacia do Jordão. M a i s além, e m litorâneas e r a m fortificadas, outra
MODERNA direção ao leste, depois de u m planalto sobre o flanco oriental das m o n t a n h a s
e da c a d e i a do A n t i - L í b a n o , c o m e ç a o q u e d o m i n a m a g r a n d e b a c i a da S í r i a ,
C>'
d e s e r t o . N a b o r d a do d e s e r t o , a G h u t a d o vale do O r o n t e ao m a r M o r t o .
de D a m a s c o é u m o á s i s fértil p e l o q u a l M a s a barreira m o n t a n h o s a que se
passa a rota das caravanas, fazendo e s t e n d e do A m a n u s , p r ó x i m o d e
i > p e r c u r s o da M e s o p o t â m i a p a r a a A n t i o q u i a , à s c o l i n a s da J u d e i a , p e r t o
Arábia o u para o Egito. de Jerusalém, n ã o é contínua: grandes
O s francos inicialmente passagens põem e m contato o mundo
estabeleceram sua d o m i n a ç ã o sobre do deserto c o m a planície litorânea.
164 T E S T E M U N H O S E DOCUMENTOS TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 165
D o controle dessas passagens, através grandes b l o c o s de pedra p r o v e n i e n t e s estrutura de c o n s t r u ç ã o s i m é t r i c a . torres quadradas, isolava u m pátio
de sólidas praças-fortes, d e p e n d i a a de m o n u m e n t o s da é p o c a h e l e n í s t i c a , M a s eles são t a m b é m u m i n s t r u m e n t o central, onde foi c o n s t r u í d o o grande
sobrevivência dos Estados francos. u m portão baixo, aberturas reduzidas de defesa ativa; n ã o p o d e n d o salão. N o f i m do s é c u l o X I I e n o s
F i n a l m e n t e , sendo os m u ç u l m a n o s d a v a m grande solidez a essas torres resistir a u m cerco i m p o s t o por u m primeiros anos do século XIII, u m a
a m p l a m e n t e superiores e m n ú m e r o , refúgios, que ofereciam u m a defesa exército poderoso, os defensores segunda área, m u i t o maior, cercada
era i m p o r t a n t e ser r a p i d a m e n t e passiva e de curta duração diante e r a m obrigados a fazer n u m e r o s a s de muralhas, encerra a primeira,
i n f o r m a d o sobre os m o v i m e n t o s de tropas n ã o regulares o u de surtidas para impedir a aproximação q u e foi r e m o d e l a d a . G r a n d e s
do a d v e r s á r i o e criar p o n t o s c o m saqueadores. Enquanto no Ocidente os das m á q u i n a s de guerra e m a n t e r reformas internas modificaram a
população fixa para facilitar a torreões eram, ainda no século XI, suas ligações c o m a retaguarda. O capela, o grande salão, os depósitos
m o b i l i z a ç ã o rápida n a retaguarda de m a i s f r e q ü e n t e m e n t e torres de p r o j e t o de c o n s t r u ç ã o d o castrum de s u b t e r r â n e o s e as vias de a c e s s o
u m exército de i n t e r v e n ç ã o . N e s s a s madeira, a escassez dessa matéria- Belvoir responde e x a t a m e n t e a essas n a frente oriental, enquanto u m a
c o n d i ç õ e s , os castelos da Terra S a n t a p r i m a n a Síria levou os francos a p r e o c u p a ç õ e s . [...] fortificação de sacada v i n h a proteger
ocupavam posições estratégicas, eram utilizarem pedra e a c o n s t r u í r e m a f r e n t e sul, m a i s difícil de defender.
diques de r e s i s t ê n c i a e t i n h a m valor abóbadas que s u s t e n t a v a m os dois F i n a l m e n t e , n a s e g u n d a m e t a d e do
a n d a r e s do t o r r e ã o . A o redor deste,
Um modelo para o Ocidente?
somente por sua situação e suas século XIII, quando os recursos da
relações c o m as outras praças-fortes, u m a m u r a l h a de pedra d e l i m i t a v a u m o r d e m dos Hospitalários se reduziram,
O ú l t i m o tipo era o das grandes
c o m as cidades e c o m o s e x é r c i t o s de pátio muito pequeno. u m a fortificação p e n t a g o n a l foi
fortalezas, o u castelos esporões.
c a m p o . [...] O Oriente Próximo há muito tempo Elas g e r a l m e n t e o c u p a v a m u m construída no ângulo meridional
c o n h e c i a o u t r o t i p o de f o r t i f i c a ç ã o , promontório c o m encostas muito da fortaleza. Praças desse porte
o castrum de p l a n t a quadrada, íngremes que c o n s t i t u í a m , de n e c e s s i t a v a m de u m a g u a r n i ç ã o
O torreão "normando" n u m e r o s a para resistir a u m cerco
comportando u m a torre e m cada três lados, as defesas naturais,
ângulo. O s a c a m p a m e n t o s das enquanto o quarto, no ponto e m que prolongado: e m 1 2 7 1 , o sultão Baibars
Q u a n d o v i e r a m do O c i d e n t e , os
legiões r o m a n a s , as praças-fortes o contraforte s e ligava ao planalto foi o b r i g a d o a r e c o r r e r a u m a f a l s a
cruzados trouxeram consigo suas
da fronteira b i z a n t i n a o u dos califas ou à m o n t a n h a , devia ser reforçado m e n s a g e m do c o n d e deTrípoli aos
t é c n i c a s d e f o r t i f i c a ç õ e s ; n o final do
o m í a d a s t i n h a m sido c o n s t r u í d o s de pela c o n s t r u ç ã o de u m fosso e sólidas defensores para obter sua r e n d i ç ã o .
século XI, a m a i s característica era
o torreão " n o r m a n d o " , torre isolada acordo c o m esse modelo. O s francos m u r a l h a s . Safed, M o n t f o i t , Subciba, B a i a r d , i n Les Croisades,
ou cercada por u m a p e q u e n a área adotaram-no e acrescentaram-lhe o K r a k de M o a b e, s o b r e t u d o , o Points Seu i 1
protegida por m u r a l h a s , q u e era m a i s sensíveis modificações para adequá-lo Krak dos Cavaleiros são as m a i s
adequada para a defesa de aldeias à n a t u r e z a do t e r r e n o e ao objetivo de célebres. O Krak, o u "fortaleza dos
ou pequenas povoações. Ainda s u a estratégia. A maioria dos castra ' Iospitalários", ocupou o local de u m As etapas da construção do Krak
sobrevivem, h o j e e m dia, e m t o r n o foi edificada rapidamente, e m c a m p o mitigo c a s t e l o m u ç u l m a n o . T e n d o dos Cavaleiros
de vinte n a Terra S a n t a : u m a aberto, o que implicava u m a defesa pertencido, inicialmente, ao c o n d e
A que época remonta a primeira
estrutura quadrada, c o m de todos os lados, p o r t a n t o , u m a de T r i p o l i , f o i c e d i d o , e m 1 1 4 2 , à
c a m p a n h a de c o n s t r u ç õ e s francas? O
muralhas de 10 a 15 m e t r o s i i d e m dos Hospitalários, responsável
posto, ocupado pela colónia militar
de c o m p r i m e n t o , 1 0 por t r ê s f a s e s s u c e s s i v a s d a
dos curdos, estabelecido pelos sultões
m e t r o s de altura, 3 (instrução. A n t e s de 1 1 7 0 , u m a
muçulmanos em IIosn-el-Akrad,
m e t r o » dc ON|v-»iir.i pifei',, área m u r a d a interior, balizada p o r
"o castelo dos Curdos", t e r m o que
que, c o m freqüência,
os cronistas árabes continuaram
reutilizam
a empregar durante toda a Idade
M é d i a para designar o Craque, devia
ser a p e n a s u m f o r t i m de p o u c a
importância e e n c o n t r a m o s vestígios
d i s s o . [...]
C a s t e l o dc M a r k a b ( M a r s a l ! : vista da face
sudoeste.
166 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S
TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 167
loi t o m a d o d e a s s a l t o e e s t a b e l e c i d a
1 m a p o s i ç ã o da q u a l o s u l t ã o p o d i a
itirar n o i n i m i g o c o m a r c o - e - f l e c h a .
laibars e n t ã o c o m e ç o u a d i s t r i b u i r
o r n o p r e s e n t e dinheiro e trajes de
i erimônia.
N o dia 1 6 s h a b a n [31 de m a r ç o ] ,
c
I oi a b e r t a u m a b r e c h a e m u m a d a s
lorres d a fortaleza; n o s s o s h o m e n s
i lartiram para o ataque, e s c a l a r a m
i fortaleza e se a p o d e r a r a m dela
• n q u a n t o o s f r a n c o s se r e f u g i a r a m
io torreão. O sultão então pôs e m
II h e r d a d e u m g r u p o de f r a n c o s e de
r i s t ã o s , c o m o o b r a de c a r i d a d e e m
n o m e d e a l - M a l i k S a i d [o p r i m e i r o
c Torre n o r o e s t e do Krak dos C a v a l e i r o s
170 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 171
Lawrence da Arábia
Lawrence daArábia
escreveu uma tese
consagrada às fortalezas
francas da Síria e da
Palestina, da qual foram
extraídos alguns destes
desenhos e fotografias.
O K r a k dos C a v a l e i r o s (abaixo, à
e s q u e r d a e a c i m a ) e o C a s t e l o Peregrino
(abaixo).
D e s e n h o a t i n t a e a lápis do C a s t e l o de Sayun.
172 T E S T E M U N H O S E D O C U M E N T O S
TESTEMUNHOS E DOCUMENTOS 173