83% acharam este documento útil (6 votos)
13K visualizações323 páginas

Nas Garras Da Máfia - Brenda Ripardo

Enviado por

Luiza Simões
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
83% acharam este documento útil (6 votos)
13K visualizações323 páginas

Nas Garras Da Máfia - Brenda Ripardo

Enviado por

Luiza Simões
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 323

Direitos autorais do texto original copyright © 2021, BRENDA

RIPARDO, NAS GARRAS DA MÁFIA

Capa: Magnifique Design


Diagramação: Brenda Ripardo
Preparação de texto/Editor: Graci Rocha

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desse livro pode ser
utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes — tangíveis ou
intangíveis — sem autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº 9.610/98,
punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Este livro segue a norma-padrão do novo acordo orográfico da língua


portuguesa, mas há muitas abreviações como o "tá", "tô", “pra” e "pro", de
forma que o texto fique o mais natural e verossímil possível.
“As revistas de fofoca não mentiram quando disseram que ele havia se
tornado um homem implacável. Só esqueceram de acrescentar que é um
idiota arrogante também. Um idiota arrogante e sarado.”
Por causa da morte repentina da mãe, Nicholas volta para Toronto, e
mesmo que pareça impossível, está tentando se reconectar com a irmã mais
nova, que o odeia por ter sido abandonada por ele no passado.
Ele é um homem sério, sexy e de poucas palavras. Gosta de ter seus
sentimentos sob controle e agir com cautela.
Com a máfia, aprendeu que relacionamentos podem ser o ponto fraco
de alguém, por isso não está procurando compromisso.
Lexie Rogen tem 25 anos e se formou em T.I como uma das melhores
da classe. É uma malandrinha de nível máximo, vive aprontando umas
travessuras (crimes digitais) na internet, como por exemplo esvaziar a conta
bancária do ex-namorado por ele ter lhe dado de presente um par de chifres.
Por causa de uma oportunidade de emprego nada convencional na
Corporação Farley, Lexie entra na vida de Nicholas e vai virá-la de cabeça
para baixo.
Uma garota colorida, bocuda e aventureira não é o que Nicholas está
procurando, mas talvez seja justamente o que ele precisa...
Este é um romance que tem como pano de fundo a Máfia Italiana, mas
se você espera encontrar cenas de extremo abuso, uma história dark, detalhes
sobre as negociações dentro da máfia e burocracias ou torturas, este livro
NÃO corresponderá às suas expectativas. Este livro é um romance. O foco
aqui é o nosso casal principal e o relacionamento deles.
A história narrada nas páginas seguintes, foi escrita baseada em muito
estudo sobre a Máfia Italiana, e claro, usando o bom senso da licença poética
e minha criatividade.
Este é um romance hot e pode conter gatilhos e temáticas delicadas
como álcool, drogas, abuso verbal e violência, incluindo temas de
consentimento questionável, linguagem imprópria e conteúdo sexual gráfico.
Apesar do conteúdo sensível, esse NÃO é um romance dark. Mas é
necessário reforçar que por se tratar de uma história sobre a Máfia Italiana,
certas passagens podem ser desconfortáveis ao leitor.
A autora não apoia e nem tolera as ações ilegais e comportamento de
alguns personagens retratados neste livro. A atenção do leitor é aconselhada.
Não leia se não se sente confortável.
Está é uma obra de ficção destinada a maiores de 18 anos.
Imagine Dragons – Radioactive
Arctic Monkeys – Do I Wanna Know?
Sleeping With Sirens – Shadow Preachers
Michael Andrews – Mad Word
Kaleo – Way Down We Go
Annie Lennox – Sweet Dreams
Justin Timberlake – Mirrors
Adele – Skyfall
Sia – Elastic Heart
Sia – Alive
LP – Tightrope
Bishop Briggs – River
Adele – Set Fire To The Rain
ZAYN & SIA – Dusk till dawn
Daniel Caesar – Best Part
Imagine Dragons – Natural
Hozier – Take Me To Church
Echos – Leave Your Lover
"Nós podemos compartilhar nossos segredos até engolirmos um ao
outro”
~ Echos, Leave Your Lover
Sete anos antes...
Montreal, Canadá

— Mate — Enrico ordena, me fazendo engolir o caroço na garganta.


Observo o homem sentado à minha frente. Pensei que fosse ser mais
fácil puxar o gatilho, mas não é. Ele está amarrado, indefeso, e eu, com uma
9 mm apontada no centro da sua testa, esperando a coragem para puxar a
merda do gatilho.
Eu sei que quando tirar a primeira vida, vou perder um pedaço da
minha alma e nunca mais serei o mesmo. No entanto, é exatamente isso que
eu quero, não é? Não ser o mesmo de antes.
Com a visão periférica, vejo Enrico andar de um lado para o outro,
segurando o queixo cheio de barba com a ponta dos dedos e me analisando.
Não sei o que ele está pensando. Talvez, esteja decepcionado comigo.
Mas eu posso matar um homem assim?
O que minha mãe e irmã pensariam de mim? O que o meu pai pensaria
de mim? Se ele estivesse vivo, com certeza estaria decepcionado. Eu não fui
criado para fazer coisas assim. No entanto, eu quero ser alguém novo. Preciso
saber usar minha dor, minha raiva, minha força.
Preciso saber controlar meus sentimentos e usá-los da maneira certa.
E para isso, para me tornar algo novo, eu preciso matar esse homem.
— Nicholas — ele chama e eu viro o rosto para encará-lo. — Puxe o
gatilho. Agora! — ordena de novo.
Volto a atenção para o homem à minha frente. Ele apanhou tanto de
Enrico, que os olhos estão fechados de tão inchados e escorre uma baba
sangrenta da sua boca, enquanto geme palavras inaudíveis aos meus ouvidos.
Tenho certeza que deve estar implorando pela sua vida.
Cerro os dentes e encosto o cano da arma na testa dele, estou tremendo,
mas pronto para apertar o gatilho, no entanto, infelizmente, não consigo.
Ainda não. Fecho os olhos por uma fração de segundos e levo ar até os
pulmões, respirando fundo e tentando me recompor.
— Esse homem sequestrou uma garota de doze anos e a estuprou antes
de matá-la. Você vai mesmo ter misericórdia de alguém assim, Nicholas? —
me lembra, mas a verdade é que eu não tinha esquecido disso. — Tem
certeza?
Eu sei que ele merece morrer.
Mas por que não consigo puxar o gatilho?
— Não me decepcione, Nicholas — Enrico fala, me fazendo viajar em
pensamentos. — Puxe a porra do gatilho.
Quando eu cansei de olhar para minha mãe e irmã e lembrar que por
causa de mim, o papai tinha morrido, eu fugi e acabei aqui, em Montreal.
Ainda desolado por ter perdido uma das pessoas mais importante para mim,
eu vivia me metendo em brigas e procurando por problemas em cada esquina.
E de tanto procurar por problemas, eu encontrei Francesco Carbone.
Me meti em uma discussão no cassino e fiz uma bagunça e tanto por lá. Não
sei como ele conseguiu enxergar algum potencial em mim, mas foi isso que o
magnata do cassino fez.
Enxergou algo dentro de mim.
Ele conversou comigo e disse que sabia formas de me ensinar a
controlar a raiva e usar a cabeça da forma correta, e que isso me
transformaria em alguém novo e melhor. E o passado não importaria mais,
porque aquele Nicholas estaria morto e enterrado.
Até consigo ouvi-lo dizer dentro da minha cabeça “A raiva não é ruim,
mas você precisa ter controle sobre ela. Você tem que dominar esse
sentimento e não o contrário.”
E é por isso que estou aqui. Depois de ter sido treinado e aprendido
tanta coisa com Enrico, eu preciso provar que sou capaz de fazer parte da
família. Eu preciso mostrar que o Don[1] pode confiar em mim.
— Não, por favor — o homem suplica ao tossir sangue perto dos meus
pés. Encaro a pequena poça de sangue e sinto nojo dele. De todas as
maldades que fez com aquela criança.
Com a respiração ofegante, puxo o gatilho de uma vez e a cabeça dele
vai para atrás antes de cair para o lado, sem vida.
Enrico se aproxima, pousando uma das mãos no meu ombro e dá uma
batida de leve, visivelmente orgulhoso por eu ter acabado de matar alguém. E
o mais estranho disso tudo é que não estou arrependido.
Eu acho que parte do antigo Nicholas acabou de morrer com o monstro
que eu matei.
Encaro o homem sem vida sentado na cadeira e não sinto nada.
Nenhum vestígio de remorso ou culpa. Para falar a verdade, eu sinto que fiz a
coisa certa. Acabar com a vida de um homem como ele... é a coisa certa a se
fazer.
É justiça.
Ou vingança.
Enrico me ensinou que as duas são a mesma coisa. O que diferencia, é
a pessoa por detrás de cada ação. Talvez tenha sido um pouco de justiça e um
pouco de vingança pela aquela pobre garota, que teve a vida interrompida.
— Fez a coisa certa, garoto — Enrico fala como se tivesse lido meus
pensamentos. Abre um sorriso largo. — Estou orgulhoso de você. — Pega a
arma da minha mão e eu noto que não estou mais tremendo.
Isso é o que estou me tornando ou apenas é quem eu sou de verdade?
— Ele tem família? — pergunto, de repente.
Enrico respira fundo.
— Não importa — é a única resposta que recebo. — Ele teve o que
mereceu, Nicholas. Não esqueça disso, certo?
Assinto, mas não digo nada.
Ele sai do galpão e em meio minuto está de volta, acompanho de outros
homens que começam a limpar o local como se não fosse nada demais.
Enrico para na minha frente e eu desvio a atenção para ele.
— Você fez bem, mas preciso dizer isso. Não hesite tanto da próxima
vez, porque ele não hesitaria se os lugares estivessem trocados. É isso que
você precisa manter em mente. Cada homem do nosso meio é culpado de
alguma forma, não existe ninguém inocente e com certeza, não merecem
misericórdia. Somos todos monstros.
— Eu sei.
— Ótimo. — Enrico envolve um braço no meu ombro e me puxa para
fora do galpão. — Agora vamos, o Don quer ver você.
Lanço uma olhadela por cima do ombro para a entrada do galpão e eu
sei que minha vida está indo por um caminho que eu desconheço, mas que ao
mesmo tempo, parece certo, como se fosse sempre para ter sido assim.
E ainda não sei se isso é o estou me tornando ou é apenas a escuridão
dentro de mim, mas sinto que será uma versão melhor e cruel de mim
mesmo.
A partir de hoje, minha vida nunca mais será a mesma.
Chego em Toronto exausto, mas não posso faltar ao enterro da minha
própria mãe. Passo os olhos pela mobília de requinte e suspiro. A casa está
perfeita, como antes de eu ir embora, mas nada parece igual. Tanta coisa
mudou nos últimos anos, que até parece que outra pessoa cresceu aqui, não
eu.
Deixo as malas de qualquer jeito no pé da escada e peço ao motorista
para me levar até o cemitério onde minha mãe vai ser enterrada. Ao entrar no
carro, sinto o peito doer. É tão estranho, ainda não consigo acreditar que
minha mãe se foi.
Por causa do trânsito, tudo demora e o pensamento que ecoa dentro da
minha cabeça como um mantra é que não posso decepcionar Lawanda de
novo. Ou deixá-la passar por essa perda sozinha. Eu sei que estava meio
hesitante em vir para cá, mas Julian[2] tem razão, minha irmã precisa de mim.
Ela também é minha família e eu farei qualquer coisa para protegê-la.
Chegamos depois de quase vinte minutos e noto em frente ao cemitério,
repórteres de plantão que aguardam com as câmeras, microfones, gravadores
prontos para atacar. E é o que fazem assim que os olhos curiosos me captam.
— Sr. Farley, por favor, você vai assumir a Corporação Farley?
— Sr. Nicholas Farley, você voltou pela morte da sua mãe ou apenas
por interesse nos negócios da família?
— O que tem a dizer sobre o boato de que o senhor será o novo CEO
da Corporação Farley?
Perguntas me bombardeiam e antes que possa explodir de forma
agressiva, Mattéo o motorista da família Farley que me trouxe até aqui,
empurra os repórteres e me guia até dentro do cemitério.
— Obrigado — agradeço sem jeito quando já estou longe dos flashs e
perguntas.
Se não fosse por ele, eu teria feito merda e em menos de vinte quatro
horas minha cara estamparia jornais e revistas de fofocas por ter agredido
algum imbecil e não por estar de volta à cidade em que eu nasci.
— Não por isso, senhor. É o meu trabalho — é o que ele diz.
Em meio aquelas tantas pessoas, avisto Lawanda chorando nos braços
de Schavier, nosso tio, irmão mais novo do nosso pai. Ela parece bem menor
do que realmente é, indefensa e sozinha, mesmo nos braços de um parente tão
próximo.
— Nicholas? — ela grita, surpresa.
Corre até mim e me encara com seus olhos azuis rodeados de olheiras
vermelhas, e sem aviso prévio, começa a desenfrear socos no meu peito,
usando toda a sua força. Para ser sincero, eu não esperava uma reação
diferente.
Quando fugi de Toronto, minha mãe passou quase um ano procurando
por mim e ao me encontrar, se decepcionou, porque eu não quis voltar para
minha antiga vida. Ela não me pertencia mais.
Minha irmã me ligou tantas e tantas vezes, e até foi atrás de mim,
querendo me fazer mudar de ideia, mas eu já estava tão estabilizando e
envolvido com a família Carbone[3], que não quis voltar aqui e lembrar que
meu pai morreu.
Eu fui fraco e deixei minha irmã e mãe sozinhas.
— Seu imbecil. O que está fazendo aqui? — dispara, alterada.
— Sinto muito, Lawa.
— Não se chame assim — crispa ao acertar com força um tapa no meu
rosto. — Perdeu esse direito quando não quis voltar. Você perdeu esse direito
quando me abandonou.
Respiro fundo, contraindo o maxilar, mas assinto. Ela tem razão.
— Mesmo que não vá fazer diferença pra você, eu estou aqui. Por você
— digo, num tom baixo e com a garganta seca.
Ela chora.
E mesmo sabendo que ela me odeia no momento, corto a nossa
distância com um passo e a puxo para os meus braços. Minha irmã resiste no
começo e tenta se soltar de mim, mas acaba cedendo e chorando nos meus
braços.
— Eu te odeio — murmura.
— Eu sei, sinto muito.
Aperto minha irmã contra o peito e beijo o topo da sua cabeça, olhando
para o caixão preto, onde minha mãe descansa, pronta para ser enterrada e
esquecida. Porque é isso que acontece quando você morre... você é
esquecido.
Schavier se aproxima de nós, pousa uma das mãos no meu ombro e
pressiona com um pouco de força. Acho que está tentando passar algum tipo
de apoio, mas não surte efeito em mim.
Ele é o parente de sangue mais próximo que Lawanda e eu temos
agora, talvez, o único. No entanto, nunca consegui gostar dele de verdade.
Nunca senti verdade nas suas palavras ou ações.
E também nunca senti ligação com ele.
Schavier e nada, é quase a mesma coisa para mim.
— Por que veio, Nick? Por que está aqui? — minha irmã murmura nos
meus braços, me fazendo engolir em seco.
— Não podia deixar você sozinha. Me desculpe.
Ela é apenas uma garota de dezenove anos e tenho que ser o seu
alicerce. No momento, sou tudo o que ela tem. Mesmo que eu tenha feito
muita merda nessa vida, preciso cuidar da minha irmã agora.
Lawanda é minha responsabilidade.
— Vou cuidar dela — Schavier diz e eu viro meu rosto para olhá-lo nos
olhos. Ele não parece surpreso por eu estar aqui, é como se já me esperasse.
— Não se preocupe, Nick. Eu cuidarei da sua irmã.
Contraio a mandíbula. Eu não preciso que ele cuide da minha irmã.
Passei oito anos da minha vida me cuidando bem e sozinho. Meu tio não
sabe, mas aquele garoto que foi embora de Toronto depois da morte do pai,
morreu.
E se tem uma coisa que sou capaz de fazer nessa vida, é de cuidar
minha irmã. Mais do que ele imagina.
Quando Mattéo estaciona o carro em frente à mansão, minha irmã dá
um salto para fora do veículo. Respiro fundo, pensando em formas de lidar
com ela. Antes do final do enterro, Lawanda já tinha reconstruído a barreira
invisível que nos separa e ficado ao lado do nosso tio, me ignorando.
Completamente.
Saio do carro e entro em casa, alcançando Lawanda no pé da escada.
— Precisamos conversar — digo, a voz soando muito firme mesmo
sem querer.
Ela segura o corrimão com força até deixar os nós dos dedos brancos e
só então, se vira para me encarar. Os olhos claros irradiando fogo ao mesmo
tempo em que ela eleva o canto da boca com ironia.
Porra Deus. Ela cresceu tanto. Quando fui embora, Lawanda era apenas
uma garotinha de doze anos. E agora? É quase uma mulher e tem cara de
quem vai me tirar do sérios inúmeras vezes.
— O que você quer, Nick? — questiona ao cruzar os braços na altura
dos seios. — Não temos o que conversar, você já pode ir embora. A mamãe
já foi enterrada. Não foi só pra isso que você veio?
Suspiro e passo a língua no lábio inferior. Faço um esforço enorme para
não explodir com ela e agir como um babaca. Ela está sendo irritante, mas
está no seu direito. Não fui o melhor irmão durante os últimos anos.
— Eu...
— Você o quê? — me interrompe. — Não tente ser o que você não é
— emenda, enfurecida. — Eu não preciso de você aqui, pode voltar pra
Montreal e continuar se escondendo como fez durante todos esses anos.
Minha vida será melhor quando você for embora.
Dou um passo para frente, mas ela recua dois.
— Eu sinto muito, Lawa.
— Não me chame assim, Nicholas. — Abre um sorriso falso para mim.
— Não somos íntimos. Você me abandonou quando eu mais precisei de você.
E agora? Eu não preciso mais — murmura com os olhos marejados, e eu
tenho vontade de socar a minha própria cara.
Socar minha cara até fazer minha irmã parar de sofrer.
— Não vamos forçar isso... uma relação entre nós — é ela quem diz,
porque de repente, perdi a voz. — Fique ou vá embora, tanto faz pra mim —
acrescenta ao girar nos calcanhares e subir as escadas.
Quando decidi voltar, eu sabia que não seria fácil me reconectar com a
minha irmã, mas ver o quanto ela me despreza e o quanto a fiz sofrer, me
deixa irritado. Furioso comigo mesmo.
Eu sou um cretino.
— Tenha paciência, Sr. Farley — Mattéo diz, me fazendo olhá-lo por
cima do ombro. — Ela está magoada com você, mas você é tudo que ela tem
agora.
Nego com a cabeça.
— Ela tem Schavier — digo, contraindo o maxilar.
— Verdade — ele murmura e assente. — Se precisar de mim, sabe
onde me encontrar — é o que fala antes de ir embora e me deixar sozinho.
Eu nunca me dei bem com o meu tio. Ele nunca fez algo de ruim
diretamente para mim, mas não gostava do jeito que olhava para o meu pai.
Tinha algo em seu olhar. Era inveja, como se cobiçasse tudo que o irmão
mais velho conquistou.
O nosso pai era um bom homem e via bondade nas pessoas, então, em
nenhum momento conseguiu enxergar essa maldade em Schavier. Mas uma
pessoa normal veria? Nós somos criados para amar nossos familiares e
acreditar que eles nunca serão capazes de nos fazer mal.
No entanto, isso é apenas uma grande mentira.
Minha irmã é meu sangue e eu fiz mal para ela, antes quando não
aguentava mais viver aqui depois de ter perdido o meu pai, e agora, ao voltar.
Lawanda tem razão, eu a abandonei e perdi qualquer direito de estar presente
na vida dela.
Eu magoei minha irmã e vou pagar o preço por isso.
O celular dentro do meu terno toca, varrendo meus pensamentos.
Quando vejo o nome de Julian saltitando na telinha, atendo no mesmo
instante.
— Como foi? — é a primeira coisa que pergunta.
— Péssimo — é a minha resposta.
Ele respira fundo do outro lado da linha.
— Eu sei que o momento é delicado, mas você precisa resolver um
problema que surgiu. É um homem... ele fugiu de Montreal, depois que
descobrimos que estava com uma casa de prostituição. Você sabe o que fazer,
Nicholas.
É por isso que estou solteira há um ano...
Em vez de conhecer um cara legal e com gostos parecidos com o meu,
estou aqui, tentando me vingar de um homem escroto.
Depois de pedir uma bebida, sento em uma das mesas altas, perto da
mesa do DJ, que remixa música pop e faz a multidão no meio da boate
dançar. De onde estou, tenho uma visão perfeita do primeiro andar, onde fica
o escritório do velho, que é dono dessa porcaria de lugar. Por causa da parede
de vidro, até consigo vê-lo mexer no seu computador ultrapassado.
Que idiota. A boate é bem frequentada e um ingresso para entrar aqui
custa quase um rim, nem para comprar um computador de ponta para colocar
no próprio escritório. Que mão de vaca.
Bebo um gole da minha bebida que não faço a mínima ideia do que é e
depois, tiro o tablet de dentro da bolsa. Não foi difícil hacker o computador
dele, é burro demais para manter informações importantes ou segredos
guardados.
Para o telão de led atrás do DJ, envio as fotos do dono fodendo uma
mulher que não é a sua esposa. As pessoas demoram mais do que eu gostaria
para perceber o que está acontecendo, mas quando isso acontece, elas
paralisam.
— Eu amo minhas habilidades — murmuro para mim. — Você é
incrível, Lexie Rogen.
E minha cartada final é o vídeo, no qual ele diz coisas nojentas e
cretinas.
É claro que eu tive o trabalho de borrar o rosto da mulher, mas ele está
com a cara e o pinto estampado no telão da sua boate.
Quando o DJ nota a atenção das pessoas no telão, ele paralisa e se vira
para ver o que está acontecendo e é quando a música cessa, que o dono nota
que algo de errado está acontecendo.
Pela parede transparente, ele vê sua imagem nua e o pinto nojento nas
mãos. Dá um soco no vidro e começa a esbravejar alguma coisa, me fazendo
rir. Mas sei que é minha hora de ir embora.
Nem tenho tempo de levar isso em consideração, porque a minha mesa
junto da bebida e o tablet são derrubados no chão por um homem que é
jogado. O olhar dele cruza com o meu por um milésimo de segundos, mas
mesmo com a pouca luz da balada, noto que são claros.
De repente, tem um brutamonte em cima dele, que tenta enforca-lo
depois de ter lhe acertado um soco no rosto.
As pessoas na casa noturna que não saem de perto, estão observando a
cena, espantadas, mas ninguém faz nada. Então, por um momento de
adrenalina ou sei lá o quê, saio de cima da cadeira e a seguro com veemência
e tento acertar as costas do brutamonte.
Infelizmente, não surge nenhum efeito nele, além de ficar bravo
comigo. Ele sai de cima do cara quem estava tentando enforcar e se vira na
minha direção, fazendo meu coração acelerar.
— Ah, merda.
Recuo rápido e tento pegar minha bolsa e tablet com a tela trincada,
mas nem consigo correr, o homem me puxa pelo braço, apertando com força
enquanto tento me soltar. Por sorte, o homem com quem ele está brigando,
arranca as mãos dele de mim e desenfreia um soco nele e os dois voltam a
brigar.
E essa é a minha deixa para ir embora.
Como em modo automático, meus olhos passam pelo primeiro andar e
eu sei que o dono da boa me viu, pois está me encarando. Apresso os passos,
pensando que devia ter escutado meu melhor amigo e não ter vindo aqui hoje.
Saio pela entrada lateral da boate, dando de cara com um corredor
pequeno e úmido. Estou prestes a correr para avenida movimentada, quando
alguém me puxa pelo casaco. Engulo em seco, encarando o dono da boate,
que está acompanhado de outro cara, que com certeza não vai ser amigável
comigo.
— Você fez aquilo — conclui, sozinho.
E se ele não tivesse chegado a essa conclusão, eu teria ficado
decepcionada. O cara me assediou no meu local de trabalho e eu jurei que ia
fazê-lo pagar caro por ter passado a mão em mim. E bem, eu disse isso ontem
e hoje, cá estou, metida nessa confusão.
O velho se aproxima de mim, puxando minha jaqueta e dominada pela
adrenalina que ainda corre no meu sangue, dou um chute nas bolas velhas
dele, fazendo-o se contorcer de dor e cambalear até me soltar.
O seu fiel escudeiro se aproxima, tirando a merda de uma arma de
dentro das calças e aponta para mim, mas antes mesmo que possa destravá-la,
o cara que caiu por cima da minha mesa, surge e dá um golpe certeiro nele.
E para minha surpresa, quando o dono da boate faz menção de que vai
ajeitar postura, ele acerta um soco no seu rosto também, e o velho cai no chão
que nem gelatina.
— Você está bem? — pergunta, a voz soando rouca e ecoando no meu
corpo como ondas quentes.
Assinto, observando-o. De alguma forma, ele parece familiar, mesmo
que eu não me envolva com caras como ele: alto, forte e sarado, usando
jaqueta de couro e com cara de quem é podre de rico.
Tudo bem, eu já namorei um homem quase rico, mas com certeza, não
como ele. A jaqueta que está cobrindo seus braços cheios de músculos deve
custar mais que o preço do aluguel do meu apartamento.
— Obrigada — murmuro ao encontrar minha voz. — Estava tudo sobre
controle — emendo antes que meu cérebro filtre as palavras.
Noto o musculo do seu maxilar contrair e os olhos claros, que parecem
tão severos e intensos, me encaram com certo desgosto. Ele deve ser aquele
tipo de homem que acha que uma mulher não pode se defender sozinha. Bem,
eu não faço muito o tipo de dama em apuros.
— O senhor está bem? — pergunta um homem ao surgir pela saída
lateral. — Quem é você? — pergunta para mim.
E o que eu faço?
Seguro minha bolsa com força e saio correndo rumo à avenida,
atravessando a rua com carros em movimento e quase sendo atropelada, mas
só paro os pés quando estou na entrada do metrô. O coração bate tão rápido,
que me faz achar que estou tendo um ataque cardíaco.
Merda.
Da próxima vez, escutarei os conselhos de Danny e agirei do conforto
da minha casa. É melhor, seguro e não preciso correr tanto como agora.
Preciso escutá-lo também quando diz que preciso voltar para academia.
Atravessei uma rua correndo e parece que estou tendo um ataque
cardíaco.
Se a vida é feita de sorte e azar, a minha com certeza está tombando
mais para o azar. Ou talvez, seja apenas as consequências das minhas
escolhas batendo na porta e cobrando a conta.
— Demitida? — repito o que minha gerente acabou de dizer.
Ela passa uma das mãos no emaranhado de cabelos ruivos e ajeita os
óculos de armação grossa.
— Eu sinto muito. — Suspira. Não parece feliz em ter que me mandar
ir embora, mas não tem escolha. A ordem para minha sentença já foi dada. —
Você ferrou com um cliente, Lexie.
Fecho os olhos por uma fração de segundos e levo ar até os pulmões.
— Ele passou a mão em mim, Rochelle. Três vezes, mesmo depois de
eu ter pedido para parar. Eu avisei que se ele não parasse, pagaria pelos seus
atos.
— Eu sei e sinto muito por ter acontecido isso, mas você não devia ter
vazado aquelas fotos e vídeo. Acabou com o casamento do cara. Meu Deus,
garota, você foi na boate dele. Enlouqueceu? Sabe quanto eu tive que
implorar pra ele não ir à polícia?
Mordo o lábio com força, tentando controlar a raiva que cresce dentro
de mim.
Eu acabei com o casamento dele? Eu fiz um favor para aquela pobre
mulher. O homem é um escroto, pervertido e tarado que não respeita a
esposa. Um ordinário, que merece ser castrado. Ter fotos e vídeos
comprometedoras vazadas não é nada comparado ao que ele merece de
verdade.
Se arrependimento matasse... com certeza, eu estaria morta e enterrada
agora. Droga! Devia ter feito algo bem pior do que apenas vazar aquelas
coisas. Perdi meu emprego por algo que nem valeu tanto a pena no final.
— Sinto muito, garota.
Assinto e finjo um sorriso.
— Tudo bem, é um desperdício de talento trabalhar aqui — resmungo,
saindo detrás do balcão e caminhando até a porta com acesso exclusivo para
os funcionários.
No vestuário, troco o uniforme azul com logo da loja de eletrônicos e
visto meu macacão jeans. Tiro todas as minhas coisas do armário e enfio
dentro da bolsa antes de sair.
— Venha na segunda para a rescisão de contrato — Rochelle diz e eu
assinto ao passar por ela, tentando parecer indiferente. — Se cuide, Lexie.
Sorrio.
— Você também.
Saio da loja e caminho até o estacionamento exclusivo para
funcionários. Ao parar em frente ao meu fusca amarelo e ver minha imagem
refletida na janela, dou uma respirada funda e começo a pensar no que fazer.
Trabalhar aqui não era maravilhoso, mas foi a única coisa que consegui
depois de me formar. Para ser sincera, a única coisa que eu aceitei e bem, me
aceitou do jeito que eu sou.
Mas agora, aquela vaga no departamento de engenharia de segurança
digital não parece tão ruim. Eu sei que seria chato, para falar a verdade, foi
por isso que eu recusei. Eu teria que usar terninhos sem graça e ter um chefe
irritante que ficaria no meu pé porque sou meio impulsiva. A loja de
eletrônicos não era o melhor lugar do mundo, mas eu tinha liberdade e me
dava bem com a Rochelle e os outros funcionários.
Eu tenho que parar de querer mais da vida e aceitar as oportunidades
que estão cruzando meu caminho. Mesmo que sejam oportunidades que
pareçam chatas e que vão me dar cabelos brancos.
Devo ser a única programadora da minha turma que está tão na merda
assim. O que eu fiz para merecer isso? Me formei como uma das melhores da
classe, mas mesmo assim, cá estou eu, caindo de cabeça, estatelando no
fundo do poço.
Tudo bem que meu temperamento não é um dos melhores, por isso fiz
mais inimizades que amizades no tempo da faculdade. Mas mesmo assim, um
completo desperdício de talento.
Com um safanão, abro a porta do fusca e entro, jogando a bolsa no
banco do carona. Coloco a chave na ignição e tento ligar o carro, que
resolveu não funcionar para completar o meu grande dia de merda.
Ótimo.
O dia está perfeito agora. Não poderia ser mais humilhante.
Estou prestes a dar um soco no volante, quando meu celular toca, me
impedindo de agredir o carro. Estico o corpo sobre o banco e pego o aparelho
de dentro da bolsa. É meu pai. Apesar de ficar hesitante, recuso a ligação.
Não estou com vontade de ouvi-lo no momento e conversar com ele
pode fazer meu dia ficar pior.
Eu sei que ele está tentando manter um relacionamento saudável
comigo, mas ainda não consigo colocar uma pedra no passado e esquecer
tudo que aconteceu com apenas um piscar de olhos.
O aparelho nas minhas mãos volta a tocar. Respiro fundo e reviro os
olhos. Impaciente, encaro o painel, me preparando para recusar a chamada, e
acabo me surpreendendo ao ver o nome de um antigo amigo da minha mãe
preencher a telinha.
— Senhor Durant? — falo ao atender. — Acho que ligou pra pessoa
errada — emendo.
Eu sempre me dei bem com os amigos da minha mãe, mas a última vez
que nos falamos foi no enterro dela. Ele sumiu e nunca mais tive notícias.
Cheguei a pensar que estava morto. Ok, não é para tanto. Eu sabia que ele
não estava morto.
— Preciso falar com você, Lexie. É importante.
— Hãm? — murmuro, confusa. — Nós não nos vemos há não sei
quantos anos e do nada você precisa falar algo importante comigo?
— Exatamente.
— Eu não estou entendendo nada — retruco.
— Pode me encontrar em meia hora? Naquele café em frente a sua
antiga universidade? — é a última coisa que fala ao desligar na minha cara.
Bufo e jogo o celular no banco do carona. Faço o sinal da cruz antes de
tentar fazer meu fusca funcionar novamente. Ao ouvir o barulho do motor,
sorrio, agradecida por ter sido abençoada por um milagre.
Coloco o pé em cima do acelerador, mas não saio do lugar. Lanço uma
olhadela para o celular no banco ao lado e pondero se devo ou não ir
encontrar o senhor Durant. O que ele pode ter de importante para falar
comigo?
Decido ir por dois motivos.
Primeiro, eu não tenho nada melhor para fazer.
Segundo, eu sou muito curiosa.

Encontro o senhor Durant sentando em uma das mesas do lado de fora


do café. Foi eu quem acabou de perder o emprego, mas é ele quem está com
uma aparência horrível. Tem barba por fazer, os cabelos estão assanhados e a
blusa social está toda amassada.
Enrugo o nariz ao puxar a cadeira de frente para ele e sentar.
— Lexie. — Sorri, olhando para mim. — Você cresceu. Está muito
parecida com a sua mãe.
Sinto os meus lábios se repuxarem em um sorriso.
Ouvir que estou parecida com a minha mãe é bom, me faz sentir mais
próxima dela.
— Obrigada.
Relaxo os ombros e descanso as costas no encosto da cadeira,
observando o homem velho à minha frente.
— Gostei do seu estilo. — Aponta para as mexas roxas no meu cabelo
loiro. — Tem personalidade.
Assinto em silêncio e espero.
Acho que eu posso dizer que Durant era um dos melhores amigos da
minha mãe. Os dois se conheceram ainda jovens e fizeram parte de um grupo
de hacktivismo[4] por muitos anos.
E Durant não era o tipo de amigo que aparecia em datas
comemorativas, mas de vez em quando, surgia na nossa porta e era muito
bem recebido pelos meus pais. Mamãe o tratava como um irmão mais novo.
— Eu tenho um trabalho pra você.
Semicerro os olhos e mordo o lábio inferior, desconfiada.
— Como assim, um trabalho? — questiono.
Eu deveria estar feliz de uma oportunidade de trabalho aparecer assim
tão de repente, como mágica, bem na minha frente. No entanto, eu sempre fui
uma garota esperta e mesmo quando mais nova, eu sabia que o senhor Durant
é alguém que normalmente traz problemas.
E bom, de problemas, minha vida já está cheia.
— Eu tenho observando você por anos, Lexie — começa a falar,
fazendo meu coração dar um salto duplo dentro do peito. — Já faz um ano e
o seu ex-namorado ainda não sabe como perdeu todo aquele dinheiro. — Ri
baixo, como se a situação fosse divertida. — Você é talentosa como a sua
mãe.
Ergo o queixo e tento me manter firme.
— Não sei do que você está falando — minto.
É claro que me orgulho de ter deixado meu ex-namorado pobre.
Embora eu continue achando que ter desviado dinheiro dele para instituições
carentes tenha sido um gesto muito generoso da minha parte, aquilo foi efeito
de um par de chifres que ganhei de presente misturado a muita raiva.
— Não sabe mesmo, the zero? — fala o nome de hacker que foi da
minha mãe, e agora, é meu. Apesar de estar surpresa, finjo estar calma. —
Não minta pra mim. Sou mais experiente do que você.
Contraio o maxilar e respiro fundo.
— O que você quer?
— É um trabalho, vão pagar bem e não é perigoso.
Assinto, desdenhosa.
— Então... por que você não vai lá e faz? — resmungo.
Ele abre um sorriso convencido.
— Bom, a pessoa pra quem você vai trabalhar é um antigo amigo da
sua mãe, e claro, você tem mais charme do que eu pra esse tipo de trabalho
— ele diz, como se isso explicasse muita coisa.
— O que você quer dizer com isso?
Há oito anos, eu estava sendo treinado para me tornar o CEO da
corporação Farley e era o que eu queria também, assumir o lugar do meu pai
e fazer os negócios serem um sucesso. No entanto, eu mudei. E agora, não
tenho intenção nenhuma de assumir alguma posição na empresa. Isso não tem
mais nada a ver comigo ou com a minha vida.
E eu vim aqui para acertar as coisas com a minha irmã e convencê-la de
ir embora comigo, o que acho cada vez mais difícil de acontecer. Lawanda
tem feito um esforço enorme para evitar cruzar comigo.
Ela me odeia e não esconde isso.
Talvez eu tenha que levá-la na marra. Não vejo um caminho diferente
para o que eu quero fazer.
— Senhor Farley, está me escutando? — o advogado da minha mãe
fala, chamando minha atenção. Ele respira fundo e endireita os óculos de
grau. Está sentado no sofá de frente para mim e parece impaciente. — Por
favor, preste atenção no que estou falando — diz, num tom severo.
Lanço um olhar duro para ele e ergo uma sobrancelha. O advogado fica
visivelmente desconfortável e acaba afrouxando o nó da gravata. Ótimo. E
espero que seja a primeira e última vez que esse velho me trate como se eu
fosse uma criança.
— Como eu estava dizendo — balbucia, mas a minha atenção é
dispersa de novo ao notar com a visão periférica, minha irmã descendo as
escadas.
Ela está usando uma blusa social com blazer moderno por cima e saia
de cintura alta combinando com os sapatos de saltos. Não parece em nada
com uma garota de dezenove anos, e isso me deixa inquieto.
— Ai, meu Deus. O que aconteceu com o seu rosto? — pergunta e vem
na minha direção, mas quando se dá conta do que está fazendo, recua
imediatamente. — Já andou arrumando briga por aí? Tão típico de você.
Cerro os dentes e decido ignorar os questionamentos ou falar sobre o
meu trabalho da noite passada. Como ela reagiria se soubesse que passei a
noite anterior torturando alguém e depois eliminei o cara como se não fosse
nada? Lawanda não entenderia a vida que levo e isso não a aproximaria de
mim de qualquer forma.
— Aonde está indo? — quero saber.
Ela ergue uma das sobrancelhas para mim, igual como fiz agora a
pouco com o advogado. Isso me irrita, porque Lawanda parece muito
comigo. Droga. Parece demais e não sei por quanto tempo aguento.
— Estou indo trabalhar.
Depois de ouvir as palavras, levanto do sofá.
— Trabalho? Você trabalha?
Lawanda cruza os braços na altura dos seios e sorri debochada. E eu
fico me perguntando como aquela garotinha se transformou nesse projeto de
adolescente irritante e mal humorado.
— Você parece surpreso, Nicholas Farley, mas sim, eu tenho um
trabalho. E se não sair agora, vou me atrasar. — Ela dá um passo para frente,
mas dá ré e encara os soldados[5] que vieram de Montreal até aqui. Minha
irmã revira os olhos. — E peça para os seus seguranças não me seguirem.
Não sou criança e sei me cuidar sozinha — dito isso, ela dá as costas e vai
embora.
Troco um olhar com o soldado que estava em pé na soleira da sala, em
silêncio, faço um gesto para a porta de saída.
— Seja discreto — aviso, e ele assente sem dizer nada.
Viro o corpo e encaro o advogado, esperando pelas explicações.
Lawanda sempre foi aquele tipo de garota que adorava esbanjar dinheiro e
odiava acordar cedo. Ia para escola, porque nossos pais ameaçavam cortar a
sua mesada se faltasse aula. E agora, além de acordar cedo, ela trabalha?
— Ela é assistente pessoal do seu tio.
— O quê? — retruco, carrancudo. —Tá de brincadeira.
— Não. Vai fazer um ano que os dois estão trabalhando juntos.
Cerro os dentes, tentando controlar a vontade de socar a parede
próxima a mim. Lawanda e Schavier estão mais próximos do que eu
imaginava. Como vou tirá-la das garras dele?
Merda...
Mas como as coisas seriam diferentes? Meu pai morreu e eu fui
embora, deixando uma garotinha de doze anos. É claro que ela se agarraria ao
nosso tio. Schavier era a única figura paterna que restou a ela.
— Como eu estava falando... — o advogado volta a falar. — Você e
Lawanda detém quarenta e seis por cento dos direitos da corporação Farley.
O conselho de acionistas é bem rigoroso e eu não posso garantir que você...
— Mande preparar uma sala pra mim. Começarei a trabalhar ainda essa
semana.
Ele pisca devagar, parece não acreditar nas palavras que acabaram de
sair da minha boca.
Para ser sincero, nem eu sei o que deu na minha cabeça. Trabalhar na
Corporação? Isso é sinônimo de problema. E algo me diz que meu tio não vai
gostar tanto de me ter por perto, todos os dias.
— Seu tio tinha razão... — o homem fala, pensativo.
— O que disse? — indago com o cenho franzido. — O que meu tio
disse? — emendo.
— Que você mostraria interesse nos negócios quando soubesse da sua
irmã — comenta, me deixando com um gosto azedo na boca. — Ele conhece
bem vocês dois.
— Não fale isso de novo. Meu tio não sabe nada sobre mim — eu digo,
sério.
O advogado engole em seco e assente ao ficar de pé.
— Sim, senhor. Providenciarei tudo na empresa.
Ele estende a mão em cumprimento e depois vai embora.
Tenho certeza que é a ideia mais absurda que tive em muito tempo, mas
preciso me reaproximar de Lawanda. Não posso ir embora e deixá-la aqui,
outra vez. Precisamos ficar juntos.
E eu sei que isso não vai acontecer se ela continuar me evitando o dia
inteiro.
Que loucura...
É o primeiro pensamento que me invade a cabeça ao descer do Uber.
Atravesso a rua e me deparo com um prédio espelhado de trinta
andares, que reflete o céu azul claro e algumas das nuvens em formato de
algodão. Há um aglomerado de repórteres em frente ao edifício. Eles correm
como abelhas em direção a um homem que caminha no rumo de uma
limusine estacionada na entrada principal.
Antes dele entrar no carro, o olhar cruza com o meu por alguns intensos
segundos, que conseguem quase me deixar sem ar. Noto que franze o cenho,
mas não se prende muito a isso.
E algo estala dento de mim.
É ele. O homem que derrubou a mesa e quebrou meu tablet na boate.
Nicholas Farley, o bilionário de trinta e quatro anos, que foi embora da
cidade depois da morte do pai. Desde que o homem colocou os pés em
Toronto, só se fala dele nos sites de fofoca, programas de entretenimentos e
até no jornal local.
Ele deve ter 1,85cm de altura mais ou menos, é tão forte como um
lutador de MMA. Rosto quadrado e barba ralinha, cabelos claros e rente à
cabeça, e mesmo com cara amarrada, o cara é lindo.
Não faz o meu tipo, mas é um pedaço de mau caminho.
Os repórteres o enchem de perguntas, mas ele ignora e entra no carro.
Depois que o enxame se desfaz, solto um suspiro e endireito os ombros
antes de entrar no prédio. Na recepção, eu digo a uma das mulheres no balcão
que tenho hora marcada com Schavier Farley. A recepcionista tenta não ficar
me analisando, mas não tem sucesso.
Quando resmungo um monte de palavras inaudíveis e reviro os olhos
impaciente, ela fica sem jeito e começa a dançar rápido com os dedos em
cima do teclado do computador, e em meio segundo me entrega um crachá de
visitante.
— Obrigada.
— Vigésimo nono andar.
— Ah, hum, ok. Obrigada.
Ela abre um sorriso singelo ao mesmo tempo em que aponta sutilmente
com uma das mãos na direção que devo ir.
Paraliso no meio do saguão e olho as portas automáticas que dão na
direção da rua e pondero se devo ir embora. O que estou fazendo com a
minha vida? Eu sei que preciso de dinheiro e fazer um trabalho desse, com
certeza vai me deixar tranquila por algum tempo, mas mesmo assim.
Alguém distraído me empurra e é isso que me tira do êxtase.
— Sinto muito — murmura sem olhar para mim e continua o seu
trajeto até os elevadores.
Respiro fundo e estufo o peito.
— Já que estamos aqui, vamos em frente — digo baixinho.
Caminho até os elevadores e entro no primeiro que vejo aberto.
Observo todas as aquelas pessoas em terninhos pretos/cinzas segurando
pastinhas de couro. Olho-me de cima para baixo e por um segundo, me
arrependo por não ter escutado meu melhor amigo e ter vestido algo mais
formal.
Estou me destacando demais.
Quando chego no meu andar, dou de cara com outra recepção toda
ornamentada e uma mulher bem arrumada. O lugar é chique e o sofá perto
das janelas de vidro parece caro demais, como todo o resto aqui.
Mostro o crachá e digo que tenho hora marcada com o Schavier Farley.
É claro que ela me dá uma olhada bem generosa, analisando de baixo para
cima, e só depois pede para eu aguardar um minuto.
— Ok.
Estou prestes a me sentar no sofá branco e macio, quando ela diz que
Schavier vai me receber agora e faz um gesto com a mão para que eu me
aproxime dela. Por instinto, passo as mãos nos cabelos e seguro com mais
força que o necessário a alça da minha bolsa tiracolo.
Sigo-a até uma grande e refinada porta de madeira gigante.
— Sr. Farley — ela diz de forma sutil ao entrar. — A senhorita Rogen.
— A mulher abre espaço e eu entro, em silêncio.
É impossível não ficar admirada com o lugar.
As janelas são de vidro e vão do chão ao teto, fazendo com que o
centro de Toronto pareça minúsculo olhando daqui. As paredes são em cores
cinzas e não há um arranhão sequer no piso laminado.
Eu acho que qualquer móvel dessa sala, desse prédio, deve valer mais
que o aluguel do meu apartamento.
O Sr. Schavier está sentado à sua mesa extensa e organizada. Só olha
para mim quando estamos a sós.
— Senhorita Rogen, é um prazer finalmente conhecê-la — ele fica de
pé e abre um sorriso estranho. Ele tem idade para ser meu pai, mas tenho que
confessar, tem um certo charme.
— Você é a cara da Emily. — Se aproxima de mim e eu engulo em
seco, pensando no que dizer.
— Estou ouvindo muito isso ultimamente — murmuro.
Ele ri, como se o que acabei de dizer fosse uma piada.
— Venha, sente-se, por favor — pede e é o que eu faço. — Sua mãe era
uma mulher incrível — comenta ao sentar de frente para mim.
Concordo com um aceno de cabeça.
— Como conheceu minha mãe? — pergunto, curiosa.
Durant não me deu muitos detalhes, só disse que o homem para quem
eu vou trabalhar é poderoso, e que ele e minha mãe foram muito próximos.
Mas apenas isso. O que se parar para pensar, não é nada.
Eu só fiquei sabendo do nome do homem hoje, antes de vir para cá.
Durant fez um mistério do caramba. Ele tinha medo que eu descobrisse
alguma coisa sobre Schavier?
— Eu namorei sua mãe quando ela estava na faculdade — fala, de
repente e eu me engasgo com a saliva. Ele ri, de novo. — Muito surpresa? —
quer saber.
Olho o homem por cima dos cílios e sinto meu coração apertar. Ele não
faz o tipo de homem com quem minha mãe namoraria. Ela gostava de
homem nerd e bobo, por isso casou com o meu pai.
— O que quer comigo? — retruco, e algo estala dentro da minha
cabeça. Ai, meu Deus. Eu sei o que está acontecendo aqui. Por isso Durant
não quis me dizer nada, porque se eu desconfiasse de algo assim, não teria
colocado os pés nesse lugar. — Eu sinto muito desapontá-lo, mas não sou sua
filha — falo antes que o cérebro processe as palavras.
Ele explode em uma risada.
— O quê? Minha filha? — Balança a cabeça de um lado para o outro.
— Eu sei que você não é minha filha, acredite.
Endireito-me na cadeira e engulo em seco.
— Então? O que quer comigo?
Schavier sorri, me olhando com intensidade.
— Eu preciso de alguém de confiança e com as suas habilidades. —
Respira fundo e bate com a tampa da caneta no amontoado de papéis em
cima da mesa. — Sua mãe era uma amiga muito leal e me ajudou quando
precisei. Acho que você pode fazer o mesmo por mim.
— Durant é de confiança também — digo, sem ter certeza. — Por que
não ele?
— Ele não se encaixaria num lugar como este.
Enrugo a testa, confusa.
— Como assim?
— Preciso que trabalhe aqui... na Corporação Farley — fala, estudando
minhas expressões.
Respiro fundo, quase aliviada. O homem precisa de alguém para o
departamento de T.I, é isso? E eu achando que era algo mirabolante.
Trabalhar em uma empresa como essa vai enriquecer o meu currículo.
Sorrio, animada, o que não dura nem dez segundos.
— Como era de se imaginar, meu sobrinho começará a trabalhar aqui
ainda esta semana e ele precisará de uma assistente pessoal. Ou seja, você. Eu
sei que é diferente das mulheres que trabalham aqui — fala, julgando minhas
roupas, meu cabelo. — Mas acho que você é perfeita pra trabalhar com ele.
Com certeza, Durant não se encaixaria como assistente pessoal. Ele não tem
charme — zomba.
— Como é? Assistente pessoal? — retruco, sem conseguir esconder
minha desaprovação na voz. — Senhor, eu sou... — Fico em silêncio por
alguns segundos, escolhendo as palavras certas. — Eu me formei em T.I e
não em secretariado.
Ele ri das minhas palavras. Droga, Deus! Estou começando a achar
muito irritante toda vez que ele usa essa boca para rir.
— Não se preocupe, as suas habilidades serão bem aproveitadas,
senhorita Rogen. Na verdade, é isso que eu espero do nosso acordo. Você me
entende?
— O quê?
— Meu sobrinho tem segredos e eu quero saber tudo sobre ele. Pra
quem ele liga e pra onde vai, quem são os contatos. Deve existir algo
enterrado na vida de Nicholas que vai me ajudar a não perder tudo que eu
construí durante todos esses anos. Por isso, quero que seja meus olhos e
ouvidos quando começar a trabalhar com ele.
Pisco devagar, tentando assimilar tudo que acabei de ouvir. É pior do
que eu pensava. Ele quer me contratar para trabalhar com espionagem
industrial. Meu Deus, me ferrei.
— Que tipo de trabalho minha mãe fez pra você? — questiono,
sentindo um frio na barriga.
Eu sei que minha mãe trabalhava do lado ilegal, mas sempre teve um
propósito. De alguma forma, o grupo de hacktivismo queria ajudar as
pessoas. Mas Schavier não me parece o tipo de homem que se preocupa com
isso. Em ajudar as pessoas.
— Não vai querer saber, senhorita Rogen. Eu sei que sua mãe era uma
heroína pra você, melhor continuar com esse pensamento.
Sinto os olhos arderem e a garganta áspera.
— Como sabe disso? Sobre o que eu penso da minha mãe? Você disse
que namoram no passado, mas foi passageiro ou duradouro? — quero saber.
— Isso não é problema seu, senhorita Rogen. Sua mãe e eu... melhor
manter as coisas como estão agora, em segredo. Não faça perguntas, você não
vai gostar das respostas que tenho.
Movo a cabeça de um lado para o outro, meio atordoada.
— Eu não sei se posso fazer isso, senhor.
— Você pode — é o que ele diz, me fazendo olhá-lo. — Não vai
prejudicar ninguém, além do meu sobrinho. Por sete anos eu venho mantendo
os negócios estáveis, não posso deixar Nicholas colocar tudo a perder,
simplesmente porque ele quer brincar de ser CEO.
Fecho os olhos por uma fração de segundos e nego com a cabeça,
tentando organizar meus pensamentos.
— Mas a empresa é dele também — me ouço falando e nem sei o
motivo por estar tentando amenizar a situação. Eu nem o conheço. — Por que
não podem trabalhar juntos? Por que prejudicá-lo?
— Seu trabalho é fazer tudo que eu mando e não questionar...
— Ainda não é o meu trabalho — interrompo-o e ele arqueia uma
sobrancelha para mim. — Eu não aceitei nada ainda. Então, por favor, não
me trate como se eu já fosse sua funcionária, ou um fantoche, porque eu não
sou.
Ele assente.
— Certo. — Suspira e mexe no nó da gravata antes de tornar a falar. —
Muitas pessoas dependem de mim, senhorita Rogen, e meu sobrinho pode
colocar tudo a perder. E sinceramente, não estou a fim de ver meu trabalho
indo embora pelo ralo. Nicholas não é mais um homem de negócios, mas eu
sou.
Volto a olhá-lo, ainda pensando no que ele disse sobre a minha mãe. O
que ela fez? Que tipo de trabalho ela fez para ele?
— Não tenha medo. Nada disso vai prejudicar você — fala, sorrindo.
— E prometo que quando ele for embora, vou contratá-la como chefe do
departamento de T.I da nossa empresa. Terá um emprego estável e com um
salário generoso.
Ele olha para mim, ansioso, mas eu não consigo dizer nada.
— Não precisa me dar uma resposta agora, eu posso esperar. Talvez,
não muito, mas posso fazer isso. Se sua mãe estivesse viva, ela aceitaria um
trabalho assim sem problema nenhum, porque Emily sempre confiou em
mim.
Enrugo a testa.
— Parece que vocês eram muito amigos também. Não foi um namoro
passageiro, não é? É claro que não. Você fala dela como se a conhecesse
como a palma da sua mão — murmuro.
— Ela era muito importante pra mim. Por alguns anos, a coisa mais
importante da minha vida.
Saber daquilo me deixa com um gosto amargo na garganta, e é como se
eu não conhecesse minha mãe de verdade. O que é loucura, eu a conheci
bem, vivia na sua cola e ela me ensinou tanta coisa.
Eu conheço minha mãe melhor do que ele. Eu conheço...
— Que tipo de trabalho minha mãe fez pra você? — pergunto de novo,
sem ter muita certeza se quero ouvir a resposta.
Schavier se levanta da cadeira acolchoada de couro brilhante e estende
a mão para mim.
— Algo me diz que você vai descobrir, cedo ou tarde. — Abre um
sorriso cínico. — Espero vê-la em breve, Lexie Rogen — fala, me fazendo
estremecer, e a essa altura do campeonato, fico aliviada de saber que é hora
de ir embora.
— Você vai mesmo fazer isso? — Danny, meu melhor amigo, pergunta
com semblante aflito ao parar na soleira da porta do quarto. — Preciso
confessar. Eu achei que fosse recusar.
Eu também achei que não fosse fazer isso. Mas ontem, tentei hacker o
computador de Schavier e não consegui. Isso me deixou com uma pulga
daquelas atrás da orelha. O que o homem está escondendo? Além de
descobrir que tipo de trabalho minha mãe fez para ele, quero saber dos seus
segredos também.
Por que vou fazer isso? Porque sou curiosa e é meio que divertido.
Analiso minha imagem no espelho de chão com toalheiro perto da
janela. Não pareço em nada com aquelas recepcionistas em seus terninhos de
corte moderno e saias estilo lápis, mas acho que tem um certo charme usar
blazer com calças jeans e tênis all star.
— Eu preciso fazer isso — é o que digo, cruzando meu olhar com o
dele através do espelho. — E bem, não sei se você lembra, mas eu fui
demitida e preciso pagar aluguel — lembro-o dos fatos recentes.
Ele respira fundo e penteia os cabelos negros com as pontas dos dedos.
Danny sempre foi muito bonito e carismático. E é o homem mais
próximo de mim e que me conhece como ninguém. Temos gostos parecidos
para música, séries, filmes e costumamos passar o final de semana jogando
CS:GO[6]. É o meu par ideal (mesmo que seja sarado e um guru da
musculação) mas como a vida não é fácil, ele é gay.
E ele não pegaria na minha genitália nem se estivesse prestes a morrer.
Nós nos conhecemos no dia em que me mudei para Toronto. Ele foi o
bom vizinho que me ajudou a organizar minhas caixas de mudança e
comprou jantar para mim. No começo, eu pensei que ele estivesse fazendo
isso por interesse, mas aos poucos, descobri que Danny é uma pessoa
bondosa.
— Você pode morar comigo. Meu apartamento nem é tão longe, então
não sofreria toda aquela adaptação estranha com os vizinhos — brinca, me
fazendo rir.
O apartamento de Danny fica de frente para o meu e mesmo sendo
tentador ir morar com ele, eu gosto de ter meu espaço. E de qualquer forma,
meu melhor amigo é um cara, digamos, namorador, então, sempre tem algum
homem desconhecido saindo do seu apartamento pela manhã.
Não quero ter que lidar com gente estranha e nem atrapalhar as fodas
dele.
— Obrigada, mas não posso voltar atrás agora — comento ao pegar a
bolsa em cima da cama e vasculhar dentro até encontrar o que eu procuro. —
Já tenho um crachá. — Balanço o cartão de plástico na mão antes de colocá-
lo no pescoço.
— Prometa que terá cuidado.
Encaixo a alça da bolsa no ombro e caminho até ele, seguro seu rosto
pálido com as duas mãos e encaro os olhos azuis com cílios grossos e negros
de dar inveja a qualquer mulher que queira ter cílios perfeitos.
— Vou me cuidar.
Dou um beijo exagerado em uma das suas bochechas, deixando uma
leve marca de batom rosa. Ele faz cara feia e limpa o rosto com as costas das
mãos, e eu começo a rir. Danny odeia quando sou melosa.
— Antes de ir pode me fazer um favor?
— Tem cinco minutos — é o que digo, passando por ele e indo até à
cozinha e enchendo uma xícara com café. — Estou contando.
Danny me segue.
— Preciso de um computador novo, pode me ajudar?
Assinto depois de tomar um gole generoso de café preto. Coloco a
xícara na pia e dou uma piscadela para ele.
— Te dou uma lista até meio-dia.
O rosto do meu amigo se ilumina com um sorriso largo e cheio de
dentes.
— Você é a melhor, sabe disso, não é?
— Obrigada por notar — retruco e caminho na direção da porta, Danny
me acompanha. — Me deseje sorte.
— Boa sorte — murmura, me observando com afinco. — Tome
cuidado com aquele homem. Pessoas poderosas demais sempre têm algo a
esconder. Às vezes, algo ilegal ou horripilante. Não entre em confusão,
Lexie.
Giro os olhos, mas concordo. Ele tem razão. Schavier Farley não é
alguém simples. E não me parece o tipo que brinca em serviço. É claro que
ele é um homem perigoso e muitas coisas ruins sobre ele devem estar
escondidas a sete chaves.
No entanto, eu não gosto de ficar vendada em certas situações e
“intrometida” pode até ser considerado meu segundo nome.
Ele quer que eu fique de olho no sobrinho dele? Tudo bem, vou fazer
isso já que estou sendo paga. Mas também, vou manter meus olhos abertos e
focados em Schavier Farley e vou descobrir que tipo de trabalho minha mãe
fez para ele no passado.
Aquele homem não é alguém com quem minha mãe se envolveria e
mesmo assim, os dois até namoram. Tem algo estranho nessa história e eu só
vou sossegar quando descobrir tudo.
Tudo.
Quando chego na corporação Farley, uma das recepcionistas do
vigésimo andar, me leva até o lugar onde vou trabalhar. Para minha surpresa,
antes da sala principal, há uma menor, com decoração clean, mesa média,
cadeira confortável, armários e um computador, que para minha decepção e o
nível do lugar, não é de última geração.
E a única coisa que separa o meu espaço da sala do Sr. Farley, é uma
parede de vidro transparente.
Ótimo. Além de espionar Nicholas Farley, vou sentar numa cadeira de
frente para ele e ficar encarando aquela cara carrancuda e bonita.
— Se precisar de algo, meu ramal é o duzentos e vinte e um — ela fala
com um sorriso cordial estampando no rosto. — Boa sorte no seu primeiro
dia.
— Obrigada, eu acho que vou precisar.
Ela assente e me deixa sozinha.
Coloco a bolsa em cima da cadeira, mas antes tirando o meu tablet de
dentro e um dos dispositivos de escuta que eu trouxe. Olho para a porta que
dá acesso ao corredor antes de entrar na futura sala do Nicholas Farley.
Conecto o aparelho com o wi-fi do lugar e fico contente ao perceber
que a internet é rápida. Antes de sentar na cadeira, grudo o dispositivo
debaixo da mesa dele e ligo o seu computador para começar o processo de
espalhamento de tela.
Sorrio quando tudo é concluído com sucesso.
Tão fácil...
Não existe nada que o Sr. Farley fará nesta empresa que passará
despercebido aos meus olhos.
Antes de levantar e ir para a minha mesa, observo o porta-retratos
próximo a mim. É uma foto de família. Nicholas, a irmã e os pais. Ele está
tão feliz, sorrindo, como se nada de ruim pudesse alcançá-lo. Não parece em
nada com o homem que eu vi na boate ou aquele saindo da empresa outro
dia, ignorando repórteres.
— Você fica bonito sorrindo... devia fazer isso mais vezes — murmuro,
lembrando das pesquisas que fiz sobre ele ontem.
Em todas as matérias que ele aparece e as fotos tiradas de paparazzis,
Nicholas está com uma cara carrancuda, quase como se fosse impossível ser
feliz. Mas também, o cara acabou de perder a mãe. Não deve ser fácil sorrir
depois disso.
Quando minha mãe se foi, eu vivi um inferno e sorrir não era uma
prioridade. Na verdade, não morrer de fome e me manter viva era a única
coisa que importava naqueles anos tenebrosos.
Ajeito o porta-retratos e levanto para sair da sala, antes de chegar à
minha própria mesa, Nicholas Farley entra, me fazendo prender o ar.
A primeira coisa que acontece são os olhos azuis e severos dele
cruzarem com os meus, causando um arrepio da espinha até o couro
cabeludo. O homem é bem mais bonito de perto e muito alto também. O
arrependimento de não ter colocado salto alto assola minha cabeça. Parecer
pequena na frente de um homem como ele não me agrada nem um pouco.
Ele está usando terno preto de design moderno, sem gravata, calças
sociais e sapatos que parecem custar uma fortuna. Tem uma postura rígida e
as expressões do rosto parecem inflexíveis. E não preciso vê-lo sem camisa
para saber que tem músculo pra caramba por debaixo do tecido.
As fotos nos sites de fofoca não fazem jus ao homem na minha frente.
Eu nunca gostei desse tipo, tão forte e com essa cara carrancuda, que
pode deixar uma mulher irritada ou quem sabe, fazê-la querer tirar a calcinha.
Mas preciso confessar, Nicholas Farley tem seu charme.
Quem estou tentando enganar? O homem é um pedaço de mau
caminho.
— Quem é você? — pergunta, e a voz grossa me atinge como um
estalo, e depois ecoando no meu corpo como ondas quentes. Abro a boca para
falar, mas parece que perdi a voz. — Não sabe falar? — emenda, e voilà, me
deixa irritada.
Parece que essa cara fechada não vai me fazer querer tirar a calcinha,
apenas me deixar com raiva. Ótimo, melhor assim.
— Estou falando com você — diz de forma pretenciosa e em seguida,
semicerra os olhos para mim. — É aquela garota da outra noite. No bar.
Respiro fundo e assinto de leve, mas acho que ele não percebe, pois os
olhos estão analisando meus cabelos loiros com mechas roxas, recém
retocadas.
Estava esperando de verdade, tendo muitas esperanças, que ele não me
reconhecesse. O cara acha que me salvou e pode pensar que eu devo algum
tipo de favor a ele por causa disso.
Como não falo nada, ele lê com os olhos o nome do crachá, que
descansa no meu blazer.
— Lexie Rogen — fala, num tom ríspido.
Que cara arrogante.
A aparência carrancuda combina com a personalidade que
aparentemente, não é uma das melhores.
— Ela é sua assistente pessoal — o homem que está ao seu lado e eu só
percebi agora, fala. Ele é quase da minha altura e está começando a ficar
calvo. — Seu tio a contratou.
Os olhos do cretino dançam pelo meu corpo, dos pés à cabeça e param
nos meus cabelos de novo. Nicholas Farley está me analisando e eu não gosto
nenhum pouco disso. Não gosto de ser julgada por um homem. Muito menos
por alguém como ele.
— Assistente pessoal? — fala, pensativo. — Você é diferente do resto
das secretárias daqui. Não se encaixa em nada. Tem certeza disso?
— Sim, eu sou diferente e não me encaixo em nada aqui, porque não
sou uma peça de quebra-cabeça. Sou uma pessoa. E me diga, existe algum
problema em ser diferente? — questiono, presunçosa. — Senhor —
acrescento com sarcasmo.
Ele fica calado, apenas contrai o maxilar e me observa com os olhos
semicerrados, como se eu fosse a merda de uma aberração. Furiosa, eu volto
a tagarelar.
— Pare de olhar desse jeito, senhor. Eu não mordo. Então, não se
preocupe, está seguro comigo.
Ao fechar a boca, tenho certeza que começamos com o pé esquerdo e a
minha vida neste emprego não será nada fácil. Danny já me disse que eu
preciso controlar meu temperamento, mas é difícil, às vezes. Ou sempre.
O homem ao lado dele pigarreia, tocando seu braço ridículo e
musculoso, e o faz entrar na sala antes que diga algo para mim. Ou me demita
de uma vez. Não sei qual dos dois. Talvez, ele já esteja com vontade de me
demitir.
Parabéns, Lexie Rogen. Você é a melhor.
Encosto a bunda na beirada da mesa e segurando o tablet, cruzo os
braços na altura dos seios e observo Nicholas Farley através da parede de
vidro. Quando dou por mim, estou encarando o traseiro bonito dele.
É um idiota, mas é impossível não ficar olhando essa bunda.
Definitivamente, é resultado de muitas e muitas horas na academia. Deve ser
um daqueles loucos que tem fissura em manter um corpo saudável e bonito.
Bem, espiando daqui, posso concluir que deve valer a pena ser gostoso
assim e com certeza chama atenção... se você gosta desse tipo de ser humano,
o que não é o meu caso, é claro. Sempre apreciei o conteúdo e não braços
firmes e ombros de nadadores.
Balanço a cabeça, tentando me recompor e para de pensar besteira, e
acabo notando que Nicholas está me olhando com aqueles olhos severos e
expressão fechada. Parece que está tentando me eliminar apenas com a visão.
Bufo.
As revistas de fofoca não mentiram quando disseram que ele havia se
tornado um homem implacável. Só esqueceram de acrescentar que é um
idiota arrogante também.
Um idiota arrogante e sarado.
Entro na sala com Christopher, o advogado da mamãe na minha cola.
Ele fecha a porta, e me incomoda a fato de ser tudo de vidro e ter os olhos
verdes da garota com mechas roxas no cabelo e argolas grandes penduradas
nas orelhas, em cima de mim.
Além de ser a garota mal agradecida daquela noite, é diferente de tudo
que eu já vi. Mas preciso confessar que é estranhamente linda e tem uma
irritante língua afiada. Não faz o tipo magra modelo de passarela, tem curvas
e um quadril saliente, que harmonizam com as coxas grossas.
Não preciso desse tipo de distração. Ou talvez, eu precise. Mas não
parece que ela foi com a minha a cara e a distração que eu gostaria no
momento, Lexie não me daria nem se eu implorasse.
A garota é presunçosa demais, me chamou de senhor como se fosse um
xingamento. E nunca tinha acontecido isso, mas eu me senti um velho na
frente dela, e de verdade, não gostei dessa sensação.
— Assistente pessoal? — penso em falar alto, mas a voz acaba soando
baixa. Olho por cima dos cílios e vejo a garota esticar o pescoço que nem
uma girafa curiosa para me bisbilhotar. — Eu não preciso de uma.
Muito menos de uma que parece uma adolescente rebelde com cabelo
colorido pronta para arranjar confusão e me tirar a paz interna. Não preciso
de mulheres me dando dor de cabeça, já basta a minha irmã.
Ele fecha os olhos por uma fração de segundos e depois assente.
— Sim, você precisa. — Christopher dá alguns passos e fica de frente
para mim. — Você está fora dos negócios há sete anos. Acredite quando eu
digo que as coisas mudaram e agora é tudo diferente. Uma assistente pessoal
vai salvar sua vida aqui.
— Ótimo — resmungo.
Completamente desanimado, caminho até as janelas de vidro que vão
do chão ao teto e enfio as mãos nos bolsos ao observar o centro de Toronto.
A última coisa que eu quero no momento é estar aqui, mas Lawanda não me
deu outra opção.
O que faço com ela? Talvez eu deva arrastá-la contra a vontade e levá-
la para Montreal. Vai continuar me odiando, talvez odeie mais, no entanto,
vai estar sob minha proteção.
E segura.
— Gostou da sala? — o advogado pergunta atrás de mim. — Não é tão
grande, mas é uma das melhores deste andar.
Dou uma breve olhada ao redor e não vejo nada de interessante. O
lugar é todo decorado com móveis de requinte, lustres, aparelhos modernos e
ornamentada com quadros abstratos que eu não faço a mínima ideia de quem
pintou.
— Entediante — assumo, de mau humor.
Christopher resolve me ignorar, mas ouço a respiração funda e
impaciente dele. Nem para disfarçar que está me aturando apenas em respeito
à minha falecida mãe. Ok, não tenho sido a melhor companhia nos últimos
dias, mas as coisas estão indo para um caminho diferente do que eu imaginei.
Meus planos eram chegar em Toronto, passar uma semana com a
minha irmã, convencê-la de ir morar comigo em Montreal e deixar tudo isso
aqui para trás. É claro que onde quer que meus pais estejam agora, estão
muito decepcionados comigo por eu não querer fazer parte dos negócios, mas
isso não é mais a minha vida. Deixou de ser há muito tempo.
Não me vejo mais sendo um CEO e resolvendo processos
administrativos. O “eu” de sete anos atrás morreu junto do meu pai naquele
acidente de carro.
— Se precisar de algo, me ligue.
Faço um gesto com a mão ao me virar e ele vai embora, me deixando
sozinho sob os olhos curiosos de Lexie, minha assistente pessoal e excêntrica.
Decido chamá-la até minha sala.
— Precisa de algo, senhor? — de novo, Lexie fala a última palavra com
certo sarcasmo e isso me incomoda mais do que deveria.
Também não estava nos meus planos pedir nada demais, queria apenas
que ela me trouxesse alguns relatórios dos investimentos dos últimos meses.
Já que estou aqui, quero ficar por dentro dos assuntos importantes. Mas
resolvo deixar pra lá o meu lado racional e ajo como um imbecil.
— Sim, um café — digo ao erguer uma sobrancelha. Ela prensa os
lábios em linha reta e a contragosto, assente. Está prestes a sair quando
continuo: — Odeio café instantâneo, por isso, quero um duplo da cafeteria no
final da esquina. Com açúcar. Se não tiver minha dose de glicose pela manhã
fico de mau humor.
Lexie abre um sorriso sarcástico.
— Eu acho que o problema de mau humor não é a glicose... senhor —
diz, me encarando com as duas pedras verdes.
— O que disse?
— A verdade — retruca, e me lança um olhar cortante. E algo nele faz
o meu pau latejar. Eu estou mesmo ficando excitado com o fato de ela está
me provocando? — Eu disse que já estou indo buscar o café duplo e com
açúcar.
Fecha a porta com mais força que o necessário e sai das minhas vistas.
Não tenho controle, sinto a boca se curvar num sorriso pequeno. Que mulher
irreverente. Talvez ter uma secretária como ela seja o que não vai me matar
de tédio.
Estou indo na direção da mesa quando meu celular notifica uma
mensagem. Solto um suspiro a contragosto quando vejo o nome de Dena no
remetente.
“Por que não me disse que estava de volta? Estou com saudade”
Não me dou ao trabalho de enviar uma resposta. Ignorá-la é a melhor
coisa que eu posso fazer no momento, mesmo que ela seja uma distração
gostosa e fogosa. Foi um erro me envolver com ela, porque Dena é parte do
meu passado e pelo visto, ainda existem sentimentos não resolvidos.
Mas às vezes, é difícil pensar direito, ainda mais quando ela aparece
pelada na minha frente.
Sento em frente ao computador e o ligo ao mesmo tempo em que
remexo nos papéis em cima da mesa. Minha atenção cai sobre uma pasta
transparente e eu abro, encontrando dentro o currículo da Lexie.
Ela tem vinte e cinco anos e é solteira, o que não me espanta. Ela deve
intimidar os caras que tentam se aproximar para um relacionamento íntimo.
Fico surpreso ao saber que ela é formada em T.I, é fluente em francês,
mandarim e espanhol. Tem alguns trabalhos acadêmicos publicados sobre
gestão da tecnologia da informação e os únicos lugares em que trabalhou
foram lojas de aparelhos eletrônicos e assistência técnica.
Lexie é uma garota inteligente, mas por que está trabalhando como
assistente pessoal? Não faz sentindo.
Acabo pesquisando sobre ela na internet, mas não encontro nada
pertinente. A garota tem uma conta privada no Instagram e nenhuma foto na
conta do Facebook é pública. Desisto de tentar entendê-la e me concentro no
meu atual problema: Lawanda.
E talvez: Dena.
Alguns minutos mais tarde, Lexie volta para o escritório com o meu
café. Entra na sala se equilibrando com a bolsa, o tablet em uma das mãos e
um suporte de papelão com os dois copos de café.
Tem um sorriso cínico no rosto, que eu não compreendo. É como se ela
soubesse de algo que eu não sei.
Ela não se encaixa aqui. Tem esse cabelo longo e cheio de mechas
roxas que chamam atenção a dez metrôs de distância. Loiras nunca foram o
meu tipo preferido, mas preciso admitir que talvez eu esteja começando a
rever minhas preferências.
— Café duplo com açúcar — diz, reprimindo os lábios. Eu não sei qual
é a graça, mas Lexie não é alguém que possa entender, mas mesmo assim, eu
me ouço perguntando, curioso:
— Você é inteligente, por que está trabalhando aqui como minha
secretária? Não faz sentindo algum pra mim.
Ela respira fundo e revira os olhos ao torcer a boca e fazer uma careta
engraçada. Nem ao menos se dá ao trabalho de esconder a irritação que está
sentindo por causa de mim no momento.
— Leu meu currículo?
— Era o mínimo que eu podia fazer — retruco, mais áspero do que
pretendia. — Não sabia que era sigiloso — emendo com desdém.
Lexie concorda com um aceno de cabeça e prensa os lábios antes de
começar a falar.
— Apesar de eu ter me formado como uma das melhores alunas da
minha turma, eu não sou muito disciplinada e nem muito sociável. Digamos
que meu temperamento... não é um dos melhores.
— Sério? Não tinha notado — falo, tomando um gole de café para
esconder o sorriso.
— Não se preocupe, senhor Farley, meu temperamento não vai estragar
a nossa relação. Já o seu, não posso garantir nada... — ela produz um som
mínimo e prolongado, me fazendo ficar na dúvida se escutei certo.
— O que disse, Lexie?
— Nada, senhor, apenas a verdade. Nua e crua.
— Você odeia estar aqui, não é? — pergunto sem fazer rodeios. —
Trabalhando comigo?
— Por quê? Porque eu não me encaixo aqui? Ou é por causa do meu
cabelo? Ou talvez, seja por eu não parecer uma modelo comercial? — rebate,
os olhos afiados me encarando. — Eu agradeceria se o senhor não ficasse me
julgando.
— Eu não estou julgando você — rebato, a voz soando firme e fazendo
a garota engolir em seco. — Então, não me julgue também.
Ela assente.
— Eu preciso do emprego — admite, mordendo o lábio inferior e aos
poucos, transformando a boca carnuda em um meio sorriso. — E eu sei que
sou inteligente demais e poderia estar fazendo outras coisas no momento,
mas preciso desse emprego por tantos motivos que o senhor não entenderia.
Mas podemos começar pelo salário, eles pagam muito bem aqui. E claro, que
não posso virar uma sem-teto.
As palavras dela me roubam uma curta risada. Ela é totalmente louca.
— Ok. — Respiro fundo e decido ser sincero. — Eu sei que não sou
uma pessoa fácil de lidar e começamos com o pé esquerdo. Mas se você
precisa do trabalho, tudo bem, não serei um cretino. Pelo menos, na maior
parte do tempo. Então, eu acho que podemos ser uma equipe.
Por alguma razão inexplicável, os olhos de Lexie vacilam e ela une as
sobrancelhas loiras, ficando com a expressão amuada. Fico encarando-a até
se recompor e colocar um sorriso no rosto.
— Certo.
Fico de pé e estendo a mão, que Lexie fica olhando por uma eternidade
antes de pegar e apertar, mas nosso contato não dura nem dois segundos.
Tomamos um choque e a garota recua um pouco, evitando me olhar nos
olhos.
— Desculpe — ela sussurra, sem jeito.
Devagar, Lexie direciona os olhos para mim e sem saber o motivo,
sinto um desconforto na garganta e não consigo dizer nada ou desviar das
duas esmeraldas que me encaram com intensidade.
— Pelo visto, já anda muito ocupado com a sua secretária — Dena fala
ao entrar na minha sala sem bater, me surpreendendo. — Você não toma
jeito, Nick.
Depois de receber a mensagem de Dena, eu sabia que ela apareceria na
minha frente mais cedo ou mais tarde, no entanto eu não estava contando que
fosse agora, tão cedo. E sei que temos um lance ou tínhamos, a última vez
que nos vimos as coisas caminharam para um rumo meio complicado, mas
não estou a fim de lidar com ela agora.
Lexie dá um passo para trás e fica alternando a atenção de Dena para
mim.
— Mal chegou e já está se esfregando com a sua secretária? — rosna,
entre os dentes, como se “secretária” fosse um insulto, se é que isso faz
algum sentindo. — Seu gosto decaiu muito, agora gosta de vagabundas de
quinta categoria.
Os olhos de Dena dançam pelo corpo de Lexie, uma mistura de
indignação e ódio.
— Perdão, mas ela está falando comigo? — Lexie me pergunta,
levantando as sobrancelhas, depois solta uma risada seca. — Uau.
— Saia daqui. Agora — Dena ordena.
— É o único aviso que darei. — Lexie ergue o queixo para Dena. —
Não ouse falar comigo desse jeito outra vez. Não me desrespeite, porque eu
não estava fazendo nada demais e o mais importante, não estava
desrespeitando a senhora. Então, seja mais educada.
A única coisa faço é ficar observando a garota, que encara Dena de
maneira desafiadora. Ela não tem medo de nada ou papas na língua. É o tipo
de pessoa que sabe se defender sozinha.
— Vai deixar essa garota falar assim comigo? — Dena questiona.
Respiro fundo, começando a perder a paciência. Eu sei que ela está no
direito de ficar irritada e talvez, ela queira voar em cima de mim e cortar
minhas bolas por eu ter ido embora e não ter dito nada a ela, e depois ter
voltado como quem não quer nada e ter a fodida até não aguentar mais,
depois sumir e voltar de novo. Porém, Lexie não tem nada a ver com isso.
— Lexie — é o que digo, fazendo a garota de cabelo meio roxo olhar
para mim. — Eu preciso de um minuto.
Ela pisca devagar e assente, em seguida, caminha em direção à porta,
sem conseguir desviar dos olhares da minha ex-noiva.
Saio detrás da mesa, mas não ouso me aproximar. Manter certa
distância de Dena é o melhor que posso fazer no momento. Porra. Eu sou um
idiota. Se ela não tivesse aparecido aqui, eu nem teria tido o trabalho de ir
procurá-la. Talvez, eu a procurasse quando estivesse entediado, o que é uma
merda.
Dena cruza os braços na altura do peito e me encara com os olhos
semicerrados. Mesmo brava, ela está ainda mais bonita do que a última vez
que nos vimos e pelo visto, de pavio curto também.
— Oi, Dena — digo.
— Pare de brincar comigo, Nick. Isso cansa — esbraveja. — Quando
soube que estava aqui, pensei que fosse me procurar. Mas parece que só faz
isso quando quer... — a frase morre e ela move a cabeça em negativa.
— Eu voltei pela minha mãe e irmã. Não existe outro motivo, Dena.
Ela abre um sorriso sarcástico.
— Sempre tão cretino — murmura, enrugando o nariz e unindo as
sobrancelhas. — Eu realmente pensei que as coisas fossem ser diferentes
agora, mas estava enganada.
— Dena, eu nunca menti pra você e sempre deixei claro o que eu queria
— falo, fazendo-a engolir em seco.
Eu fui um babaca ao abandoná-la sem dar nenhuma explicação e foi um
erro ter voltado aqui pela primeira vez. Anos atrás, mesmo depois de ter
mudado, eu senti saudade de casa, mas já tinha partido o coração da minha
irmã e mãe ao falar que não voltaria. Então, eu bati na porta de Dena, que me
acolheu e bem, transamos. Depois disso eu fui embora sem dizer nada, e
voltei de novo, quando precisei resolver um problema que envolvia a máfia
Carbone em Toronto.
Sempre fui sincero com Dena e nunca prometi que voltaríamos a ficar
juntos ou que casaríamos no futuro, mas isso não a impediu de xeretar e
descobrir o que acontece de verdade na minha vida e ir atrás de mim em
Montreal.
E o óbvio aconteceu, nós transamos de novo.
E eu cometi o erro de foder com ela toda vez que aparecia na minha
porta com saudades ou chorando por ter o coração partido por um imbecil,
que não era eu.
— O que está fazendo aqui? — pergunto.
— É só isso que tem a dizer, Nick? — rebate e me olha incrédula.
Parece com alguém preparado para se jogar em cima do meu pescoço e me
estrangular. Tudo bem, eu mereço. Eu mereço o ódio dela. — Não aja como
se eu não fosse nada — sussurra.
Massageio as têmporas, sentindo que uma veia do meu pescoço estar
por um triz de explodir. O dia mal começou e eu sinto que não tenho mais
energias para continuar enfurnado neste escritório até o final da tarde. Preciso
distração. Preciso de uma distração, que infelizmente ou não, Dena não me
dará.
Talvez seja melhor assim.
— Não estou aqui pra consertar os erros do nosso passado.
Ao me ouvir, os olhos dela se enchem de lágrimas. Sem dizer nada, se
aproxima de mim e dá um tapa no meu rosto e depois outro. Contraio o
músculo da mandíbula, fazendo força para me controlar e não agir como um
cretino arrogante.
Eu amei Dena por metade da minha vida. Quando aquele Nicholas que
queria se tornar CEO da empresa da família ainda existia. Mas agora, o
homem que ela amou, morreu e não existe nada que eu possa fazer em
relação a isso.
E ela não entende. No fundo, Dena tem esse pensamento imaturo de
que pode me mudar e me fazer ser o que eu era antes, mesmo depois de eu ter
dito tantas vezes que é algo impossível.
Não tem como eu ser o que antes, porque um pedaço da minha alma
está faltando.
— Não vamos ter esse tipo de discussão aqui.
Dena balança a cabeça, soltando uma risada desdenhosa.
— Por quê? Está com medo de estragar as coisas com a sua nova
conquista? — pergunta, olhando para Lexie por cima do ombro. A garota
abaixa os olhos quase que de imediato e começa a anotar alguma coisa na
agenda.
— Ela é apenas minha secretária, Dena.
— Até quando ela será apenas sua secretária?
Abro a boca para argumentar, mas fecho logo em seguida e fico em
silêncio.
— Sabe o que é pior? — pergunta, mas não espera que eu responda. Os
olhos dela estão brilhando por conta das lágrimas contidas. Ou talvez, eles
cintilem por causa da decepção e raiva também. — Durante todos esses anos,
eu amei você. Amei do jeito que você é, mas não parece significar alguma
coisa pra você, Nick.
Engulo em seco, mas decido que é hora de ser sincero e acabar com
isso logo de uma vez. O sexo com ela é incrível, mas não vale a dor de
cabeça. E Dena merece alguém melhor e parar de ter o coração quebrado por
mim.
— Você não me ama, Dena, apenas acredita que sim. Nós nunca
daríamos certo. Nem antes, nem agora. Não esqueça que eu te abandonei sem
pensar duas vezes. Pare de tentar encontrar sentido pra nós, porque não
existe.
— A próxima vez que quiser foder alguém, ligue pra uma prostituta ou
pra sua secretária.
— Tchau, Dena.
Ela morde o lábio inferior e desvia dos meus olhos. Finge um sorriso e
passa as mãos entre os cabelos longos e negros, depois respira fundo e
endireita a postura ao voltar a me encarar.
— Você continua um cretino. Não mudou nadinha.
Concordo com um aceno de cabeça, sem ter vontade de dizer nada.
Nada do que saia da minha boca vai fazer Dena se sentir melhor ou menos
magoada. E para o bem dela, é melhor ficar longe de mim.
— Eu não devia ter vindo aqui — admite mais para si do que para mim.
— Eu não devia.
Penso em concordar com um aceno de novo, mas desisto no meio do
caminho.
Dena tem razão, não devia ter vindo, foi um erro. Foi um erro porque
eu sou um cretino que não vai fazer as coisas serem diferentes entre nós. Sou
um cretino que não vai mudar só porque ela ainda acha que ama o homem
que um dia foi seu noivo.
— Você merece alguém melhor — falo, ela começa a rir e em seguida
retruca com desdém:
— Não me diga.
— Se cuida, Dena.
Dena gira nos calcanhares e se afasta, batendo a porta com força e
pisando duro. Não ousa nem olhar para mim, mas para próximo à mesa de
Lexie e encara a garota, que endireita os ombros e devolve com um olhar
afiado.
E mesmo com o clima tenso, Lexie ainda consegue abrir um sorriso
para minha ex, que resmunga algo e sai do meu campo de visão de vez.
Fecho os olhos por uma fração de segundos e respiro fundo. Toronto...
eu nunca devia ter colocado os pés aqui de novo. Teria sido mais fácil se eu
tivesse mandando alguns dos soldados sequestrar minha irmã.
Com certeza, eu teria evitado esse tipo de situação.
— Minha vida é uma droga — resmungo para o meu melhor amigo e
depois tomo a bebida do shot de uma vez. Preciso de álcool na cabeça, no
sangue, talvez assim, eu consiga pensar com clares — Ele não podia
continuar sendo um babaca comigo? — De forma dramática, me debruço
sobre o balcão do bar e choramingo.
Danny faz cara feia.
Nós estamos num barzinho que fica em um quarteirão depois do prédio
onde moramos. Ao chegar em casa, depois de mais um dia de trabalho na
Corporação Farley, troquei de roupa e resolvi arrastar Danny até aqui, porque
precisava de álcool na cabeça, no sangue, talvez assim, eu conseguisse pensar
com clareza.
É lógico que nada disso acontece. Me sinto pior, mas não consigo parar
de mandar para dentro do corpo shots de vodcas, que descem queimando a
garganta e me dão uma sensação ruim no estômago.
— Você é estranha. Tá sendo tão ruim assim? — quer saber.
— Sim, porque desde de ontem ele tá sendo meio que legal comigo e
isso dificulta. Qual é, eu tô meio que traindo o cara com esse negócio de
espionagem — sussurro a última palavra.
— Tá bem, então prefere passar o dia como gato e rato? Ter um
relacionamento saudável com o seu novo chefe não é melhor? Huh? Não tá
pensando direito, Lexie.
— Isso, gato e rato... era exatamente do que eu precisava — digo ao me
endireitar. — Ele não parece ser tão ruim — murmuro e fico pensando na
conversa que ouvi dele com a ex-noiva. Bem, ouvi partes dela, na verdade. —
Só um pouco, mas menos do que eu esperava, infelizmente. O que eu faço?
Minha vida é uma droga.
Eu não entendo os motivos pelo qual fizeram Nicholas sumir. “Sumir”
entre aspas. A mãe dele fez várias coletivas de impressa, dizendo que o filho
havia decidido viver uma vida amena, buscando a si mesmo, longe dos
negócios e morando em outro país.
Depois disso, a mídia foi meio que silenciada.
É claro que ainda não morava aqui quando tudo isso aconteceu, mas
nas pesquisas que eu fiz, descobri que ele não estava em outro país coisa
nenhuma, e sim, morando em Montreal. E por incrível que pareça, é a minha
cidade natal. No entanto, nas minhas pesquisas ilegais, eu descobri que a Sra.
Farley, que Deus a tenha, gastou uma quantia significativa para o assunto da
“ausência do filho” se dar por encerrado.
— Tô ferrada — fungo, chateada.
Meu melhor amigo balança a cabeça de um lado para o outro, cético.
— Ai, Lexie. Você é malandrinha, eu sei, mas não nasceu pra ser a
garota má. Por que aceitou embarcar nessa? O que vai fazer? — quer saber,
mas ele mesmo chega a uma conclusão e diz: — Peça demissão e venha
morar comigo, vou te sustentar. Eu já aceitei que você é meu carma —
brinca, na tentativa de me fazer rir, mas não consegue.
Respiro fundo e faço um sinal com a mão para o barman me servir mais
uma dose de vodca. Tomo tudo de uma vez assim que ele termina de encher
meu copo de shot. Dou outra respirada, pensativa.
O que vou fazer?
Continuar trabalhando, é claro. Hoje foi o meu segundo dia e não foi
tão difícil, embora, no começo, eu tenha pensado que Nicholas e eu seríamos
uma dupla de gato e rato. Venhamos e convenhamos, a nossa primeira
impressão foi péssima, mas quando eu disse que precisava do emprego, ele
falou que não seria um cretino na maior parte do tempo.
E meio que foi fofo, sei lá. Será que sou eu mesma pensando assim? Ou
apenas o álcool já fazendo efeito?
Sem perceber, sorrio ao lembrar que ele buscou meu nome da internet.
O que ele pensou que encontraria? Se fosse “eu” dando uma busca na
internet, seria capaz de descobrir um mundo de segredos. Mas ele? O cara
nem usa redes sociais.
— Por que tá sorrindo? — Danny pergunta ao estalar com o dedo
polegar e médio perto do meu rosto. — No que tá pensando?
— Ai, meu Deus. Eu tô sorrindo? — retruco, incrédula. — Me mate,
por favor. — Inclino-me sobre Danny e o sacudo pelos ombros. — Me mate,
por favor. Eu estou implorando.
Ele ri e bebe um gole generoso de cerveja e diz logo em seguida:
— Dramática, como sempre. Por isso que eu te amo.
Não demora muito para Danny perceber as olhadelas do homem do
outro lado do balcão e a atenção ir de mim para ele. Suspiro e balanço a
cabeça ao pedir por mais uma dose de vodca.
Meu melhor amigo engana muito bem. Tem uma carinha de garoto
inocente, com olhos grandes e azuis e um sorriso meigo. Não parece o tipo de
homem que vai partir o coração de alguém, mas na realidade, Danny é um
pegador.
Nos conhecemos há um pouco mais de cinco anos e eu já o vi com mais
namorados do que eu posso contar com os dedos das minhas mãos. Não sei se
sinto pena dos homens que tiveram o coração partido por ele ou inveja de ele
sempre estar com um romance novo.
— Me dê cinco minutos — ele fala para mim, mas os olhos curiosos
estão na direção do outro lado do balcão. — Não, dez. Talvez, quinze.
Bufo.
— Já comecei a contar — aviso, checando a hora no relógio de pulso.
Sorrindo, Danny se arrasta até sair da banqueta e se afasta de mim, indo
ao encontro do seu príncipe encantado. Ou, a próxima foda inesquecível.
Quem sabe, o próximo namorado. Se for namorado, não sei se aprovo,
preciso avaliá-lo primeiro. O último compromisso sério de Danny tinha tanto
ciúme de mim, como se de repente, meu melhor amigo fosse começar a
gostar de vaginas.
Observo Danny abordar o homem e os dois começarem uma conversa
com trocas de sorrisos e tudo. Ele leva jeito quando o assunto é flerte. Tão
diferente de mim.
Na hora em que noto que Danny vai demorar bem mais de quinze
minutos, eu reviro minha bolsa até encontrar o tablet. Vamos ver se o Sr.
Farley está fazendo algo de interessante no exato momento.
Por sorte, eu consegui espelhar o celular de Nicholas também. Ontem,
quando ele foi almoçar fora e esqueceu o aparelho em cima da mesa, é claro
que voltou para buscá-lo, mas eu já tinha feito o que precisava. Como
sempre, rápida e ardilosa.
Vasculho o celular de Nicholas, mas a única coisa interessante nas
últimas horas, foram trocas de mensagens de texto com alguém chamando
Julian. Curiosa, decido ver o conteúdo da conversa.
Julian: Quando você volta?
Nicholas: Preciso de mais uma semana. Algum problema?
Julian: Sim, com os cubanos. Mas nós damos conta, não é grande
coisa.
Nicholas: Ainda não consigo fazer minha irmã me acompanhar de
bom-grado. Ela é pior que a Romie.
Julian: Não pode simplesmente trazê-la contra a vontade dela? O
resto você resolve quando estiver aqui.
Nicholas: Não acho que seja tão fácil assim, ela me odeia.
Julian: Droga.
Nicholas: Eu preciso de Liam aqui.
Julian: Aconteceu alguma coisa?
Antes que possa terminar de ler a conversa, Danny senta na banqueta
ao meu lado de supetão, me assustando e fazendo com que eu desligue o
tablet de uma vez e o guarde dentro da bolsa.
Ele franze a testa, visivelmente desconfiado.
— O que você estava aprontando?
— Nada — retruco rápido demais para ser verdade. — Conseguiu o
que queria? Já podemos ir embora?
Danny retira o celular do bolso da calça jeans e gesticula com o
aparelho na minha cara, mostrando na telinha colorida o número do seu novo
pretendente.
— Preciso de um favor — começa a falar, me fazendo suspirar e negar
com a cabeça.
Eu já sei o que ele quer, porque desde que descobriu as minhas
“habilidades”, vive me pedindo coisas desse tipo e infelizmente, sempre
acabo cedendo.
— Eu ainda nem falei o que quero.
— Eu já sei e a resposta é não — resmungo, ficando de pé e pegando
minha jaqueta jogada na outra banqueta e passando pelos ombros. — Não sou
sua pesquisadora de internet pessoal.
— Não, mas é minha melhor amiga e não vai me deixar sair com um
psicopata — diz, como se isso explicasse muita coisa. Me pego rindo. — Por
favor? Só preciso saber se ele tem antecedentes criminais, se é casado ou sei
lá, se tem filhos. Esse tipo de coisa, apenas.
Respiro fundo e encaro meu melhor amigo, fazendo esforço para
segurar o riso.
Ele sempre vem com essa desculpa e no fim, Danny me faz desenterrar
até as notas escolares do ensino médio de algum pobre coitado. O que acaba
de me dar uma ideia bem interessante. Ou talvez, seja apenas pura
curiosidade genuína.
Será que Nicholas Farley foi um bom aluno na escola?
Ou na faculdade?
Que tipo de aluno ele era?
Faço uma nota mental de fazer algumas pesquisas quando chegar em
casa.
— Não acho que seja uma boa ideia — falo enquanto pego minha bolsa
e vasculho, procurando minha carteira com dinheiro.
— Por favor? — insiste ao pegar no meu pulso e me olhar de jeito
meigo, como um filhote de gatinho desamparado. — Não é difícil, vai. Se tá
na internet, você descobre.
— Você me superestima, Daniel. Não é tão simples assim — minto.
É claro que para mim, invadir um computador não é tão difícil. Acho
que fazer algo desse tipo já deve estar no meu modo automático, mas não
quero ceder tão rápido. Ele sempre consegue tudo o que quer, preciso fazê-lo
implorar um pouco.
Faço careta para Dany e sacudo a cabeça.
Ele revira os olhos de forma exagerada e tira a bolsa das minhas mãos,
colocando-a no próprio ombro.
— Ah, por favor. Você monta computadores desde os sete anos de
idade.
— Eu nunca devia ter contado isso pra você.
Danny dá de ombros, sorrindo de maneira carinhosa.
— Por favor? Eu te arranjo um namorado, se isso for te fazer sentir
melhor — fala, em seguida, deposita um beijo na minha bochecha, me
fazendo sorrir. — O que me diz? Combinado assim? Hãh?
Às vezes, é uma droga, mas não existe nada nesse mundo que eu não
faria por Danny, meu melhor amigo e porto seguro.
É claro que continuarei a desenterrar coisas sobre os passados dos seus
pretendentes, além de ser divertido fazer isso, gosto de ver meu amigo feliz.
Vê-lo feliz é importante para mim.
— Vamos embora?
Danny balança a cabeça de um lado para o outro, negando.
— A noite vai começar agora — diz, apontando com indicador para o
mini palco do outro lado do pub com um telão e datashow. Droga. Hoje é dia
de karaokê e meu melhor amigo adora me fazer passar vergonha. — Não me
faça implorar.
— Não quero — é minha única resposta.
Ele chama o barman e pede uma dose dupla de uísque, que o homem
serve em um copo de cristal sem gelo. Danny pega o copo e beberica,
fazendo cara feia e depois me oferece o copo.
— A vergonha vai embora com isso, beba.
Contrariada, enrugo o nariz e encaro a bebida antes de mandar para
dentro o líquido todo de uma vez. É impossível não fazer cara feia, tem gosto
horrível. Nem tenho tempo de me recompor, meu melhor amigo me arrasta
até o karaokê.
Danny para de frente para o notebook em cima mesinha bistrô alta no
canto esquerdo do palco e escolhe uma música. Quando vejo “Sweet
Dreams” da Annie Lennox preencher a tela do projetor, tento recuar e sair de
fininho, mas meu amigo me segura pelo pulso.
— Vai ser divertido — murmura, tentando segurar o riso. — Eu
prometo.
— Desde quando passar vergonha é divertido? — resmungo e faço
bico, mas não surte nenhum efeito nele. — Vou matar você.
Ele abre um sorriso largo ao dizer.
— Tá bom, mas pode ser depois da música?
Ao entrar no pub, tenho a confirmação do que infelizmente, eu já
esperava. Não é o mesmo do dono. O bar que meu pai e eu frequentávamos
há oito anos, não tem nada a ver como o estabelecimento de agora.
As paredes escuras deram lugar a tijolos pequenos e coloridos, o chão
cinza não harmoniza em nada com o resto. Há mesas e sofás em cores
diferentes, como se uma criança do jardim de infância tivesse resolvido
decorar o lugar.
O que antes era frequentado por homens de negócios, deu espaço para
jovens universitários. Além, é claro, da música horrível em um volume
absurdo preenchendo todo o pub. A voz feminina aguda é desafinada e
incomoda até a minha alma. Talvez, meus tímpanos não existam mais depois
desta noite.
Cogito ir embora quando reconheço a dona da horrível voz.
Lá em cima do palco, dança de um lado para o outro, minha secretária
excêntrica. O emaranhado de cabelo loiro com mechas roxas está preso em
um coque bagunçado e sexy. Trocou as calças jeans por um vestido rosa claro
e de seda, que cai até a altura do meio das coxas, o que me faz reparar que
Lexie tem belas pernas.
Belas até demais.
Parecem ter sido feitas para abraçar o corpo de um homem. Sem me dar
conta, minha cabeça começa a viajar numa imagem de Lexie jogando a
cabeça para trás enquanto recebe sexo oral e tem as pernas em volta de
alguém.
Balanço a cabeça, espantando o pensamento malicioso que acabou de
me atingir como um tufão.
Caminho até o bar e me acomodo na banqueta antes de pedir uma dose
dupla de uísque. Olho por cima do ombro e vejo a minha secretária dançando
ao mesmo tempo em que canta com um homem, que só noto agora.
— Ela é horrível — comento quando o barman me serve a bebida. —
Devia ser proibido deixar alguém como ela pegar num microfone ou subir
nesse palco.
O barman ri, mas não diz nada.
Volto com as vistas para Lexie e a voz desafinada não está melhorando,
mas ela parece feliz. O que acaba me fazendo pensar que não lembro da
última vez que tive alguma diversão além de sexo.
Lexie interrompe a voz bruscamente ao me notar. Sussurra algo no
ouvido do homem em cima do palco e entrega o microfone a ele, depois pega
uma bolsa perto da caixa de som e desce, caminhando até mim. Antes de ela
chegar onde estou, o cara já escolheu outra música e está cantando, salvando
os ouvidos de todos dentro do bar.
Ela sorri para mim.
— O que está fazendo aqui? — pergunta, se jogando em cima do
balcão. Ao me encarar, percebo as pupilas dilatadas e bochechas bem
coradas. Lexie está meio alta. — Não sabia que você curtia lugares como
esse. Não combina em nada com você e esse seu jeito de cachorro bravo —
emenda, sorridente.
Franzo o rosto para ela.
— Como é? — retruco, cético.
— Cachorro bravo — repete, como se eu não tivesse entendido essa
parte. — Gosta de lugares assim?
— Não curto, na verdade — falo e penso em explicar o que aconteceu,
mas não parece que ela vai entender alguma coisa. Então, mudo de assunto.
— Estava prestes a ir embora quando te vi cantando.
Pego o copo de cristal e tomo um gole generoso de uísque.
— Gostou do que viu, senhor Farley? — questiona, os lábios carnudos
se transforando em um sorriso travesso. Alguns fiapos de cabelos caem do
coque e vão parar em seu rosto corado, devagar, as pontas dos dedos os
prendem detrás da orelha.
Acho que ela nem tem noção de como está sendo sexy agora.
— Na verdade, não — resmungo, fazendo Lexie fechar o rosto em uma
expressão dura. — Meus ouvidos... acho que fiquei meio surdo depois de te
ouvir cantar.
— Você disse que não seria mais um cretino.
— Sim, na maior parte do tempo — retruco.
A testa dela franze e os lábios também. A garota se inclina para frente,
pronta para soltar um monte de sermão, mas o braço dela esbarra no copo em
cima do balcão, fazendo com que ele caia no chão e o vidro estilhace, mas
não sem antes derramar o líquido na minha calça jeans. Bem em cima do meu
pau.
— Droga — resmungo.
— Ai, desculpa — ela sussurra e se apressa em pegar um punhado de
guardanapo em cima do balcão para tentar reparar o estrago. — Não me
demita por isso. Por favor. Pode parecer que não, mas foi sem querer.
Quando noto o que ela está prestes a fazer, tento impedi-la, mas Lexie
não deixa, então com certa força e pressa, começa a passar os guardanapos no
meu pau enquanto pede desculpas repetida vezes.
— Lexie, pare — digo e agarro seu pulso. Ela me olha por cima dos
cílios e morde o lábio inferior. Sem conseguir me conter, meus olhos fixam
na boca rosada dela. — Está tudo bem. — Solto-a quando recupero a linha do
raciocínio.
Ela assente.
— Olha, eu moro aqui perto, se você quiser, podemos ir até o meu
apartamento e posso lavar suas calças — comenta ao sentar na banqueta ao
meu lado. — Eu vou ser demitida, não, é? Ai, droga. Vou ser demitida. Você
não tem pena de mim? Te disse que preciso do emprego.
— Você é desastrada — é a única coisa que falo.
Lexie respira fundo.
— Às vezes — assume em voz baixa e relaxa um pouco os ombros. —
Péssima segunda impressão eu causei, né?
Concordo com um aceno de cabeça, mas não digo nada sobre o assunto
e peço outra bebida ao barman. Lexie está mais bêbada do que eu pensava,
pois não consegue tirar os olhos das minhas calças.
— Perdeu alguma coisa aqui?
— Você nunca sorri? — Surpreendo-me ao ouvir a pergunta de Lexie.
Os olhos esmeraldas sobem até meu rosto e me prendem em um olhar
indecifrável. Tento entender o que se passa na cabeça dessa mulher, mas não
tenho sucesso. — Por que você sempre fica com essa cara?
— Que cara? — retruco eu, sério.
Ela aponta com indicador na direção do meu rosto.
— Essa de agora, como se quisesse espantar um pobre coitado — diz
de forma sucinta. — Não custa nada sorrir de vez em quando, sabe? Apenas
relaxe os músculos do rosto e deixe acontecer. É simples.
Abro a boca para retrucar, mas sou impedido quando o homem que
estava cantando com Lexie em cima do palco se aproxima de nós e o barman
que acabou de servir uísque em um novo copo para mim.
— Ted, bagunça aqui — o cara fala para o barman, gesticulando com a
mão para os cacos de vidro no chão. — Oi. — Estende a mão para mim. —
Então, você é o novo chefe da minha garota? O bilionário Nicholas Farley?
Por algum motivo que desconheço, ouvi-lo chamar Lexie de “minha
garota” me dá uma sensação estranha e desconfortável no peito. Ela tem
namorado? Por alguma razão, fico surpreso.
— Sim — murmuro, trocando um aperto de mão com ele. Apertando
mais forte que o necessário, que é devolvido com a mesma intensidade.
— Eu sou Daniel Gustin. Seja bonzinho com ela, tá bem? Caso
contrário, Lexie pode vazar alguns nudes seus na internet. Não que me
importe de verdade com isso.
Arqueio uma sobrancelha e mesmo sem entender, encaro a garota ao
meu lado. Como assim vazar fotos minhas?
— Daniel! — Lexie repreende.
E ele ri, sentando na banqueta próximo da sua garota, colocando um
braço em volta do pescoço dela. Antes que eu possa falar algo, Lexie fica de
pé, tomando cuidado para não pisar nos cacos de vidro.
— Tchau, estamos indo embora — avisa, puxando Daniel pela gola da
camisa, que só tem tempo de jogar algumas notas de dólares em cima do
balcão antes de ser dominado pela garota.
Observo os dois sumirem porta afora e termino o resto da bebida em
um gole generoso. Pego a carteira de dentro da jaqueta e jogo algumas notas
em cima do balcão também e quando ele faz menção que vai me dar o troco,
eu recuso com um movimento de cabeça.
Saio do estabelecimento com a sensação de que preciso de um banho.
Essa garota destrambelhada tinha que ter derramado bebida justamente em
cima do meu pau. As coisas com Lexie parecem que nunca serão fáceis. Ou
simples.
Caminho até o carro estacionado do outro lado da rua e me deparo com
Lexie e Daniel na esquina. Eles estão discutindo com dois homens e ela
parece uma gata selvagem protegendo o filhote.
Ela não só tem cara, como é a própria encarnação da confusão. Como
pensei, nada de simples ou fácil quando se trata dessa garota de cabelo
colorido, desastrada e de língua afiada.
Quando Daniel leva um soco no rosto, desisto do carro e vou até eles,
mas antes mesmo que eu possa chegar perto, Lexie acerta vários chutes no
saco de um dos homens, enquanto Daniel tenta segurar o outro para não
atacar a loira brava.
Ok, e eu que pareço com cachorro bravo?
O cara golpeado cai no chão, gemendo de dor.
— Não me chame de vadia, eu realmente odeio essa palavra — rosna
entre os dentes e tenta puxar Daniel, mas o segundo homem agarra a garota
pelo braço. — Quer um chute no meio das pernas também, otário?
Uno as sobrancelhas.
Ela é corajosa.
O homem levanta a mão para lhe acertar um tapa, mas eu impeço que
faça isso ao segurar seu braço e apertar o pulso com força. Ele se contorce e
tenta se soltar de mim, no entanto, não consegue.
Ao olhar nos olhos dele, noto que é apenas um moleque. Se eu der um
soco, posso mandá-lo direto para o hospital com nariz e dentes quebrados. É
um tipo de estrago que faço sem remorso nenhum.
— Nicholas... quer dizer... senhor — Lexie balbucia, recuando alguns
passos. — Eu não preciso que me defenda. Não faço o tipo de dama em
apuros e eu sei me virar sozinha — resmunga.
Ignoro as palavras de Lexie, porque não é a primeira vez que noto que
ela é mal agradecida. Então, lanço um olhar duro para o garoto à minha
frente, que parece arrependido de ter se metido no caminho da loira.
— Sua mãe não te deu educação? É feio bater em mulher.
— Me solta, seu velho — resmunga.
— Você tem que tomar uma decisão — digo, e ele me olha, sem
entender. — Se pedir desculpas aos dois, eu não quebrarei sua mão — é o
que falo num tom áspero, mesmo sem saber o que aconteceu. Quando ele fica
calado, aperto mais o seu punho e giro, o fazendo choramingar. — Ainda não
entendeu, garoto? Eu vou quebrar se não pedir desculpas. Vamos, peça.
Agora! — ordeno.
— Eu sinto muito, eu sinto muito, eu sinto muito.
Viro o rosto e encaro Lexie, que ainda está em choque e pergunto:
— Está bom assim? — Ela apenas assente em reposta, sem conseguir
dizer nada em voz alta. Solto a mão do garoto e ajeito minha jaqueta. —
Corra — dou outra ordem, e moleque ajuda o parceiro caído no chão a
levantar, depois saem correndo.
— Uau. Você bota medo mesmo, hein? — é Daniel quem fala com a
mão no rosto machucado. — Obrigado.
Concordo com um aceno de cabeça.
— Por que fez isso? — a loira questiona com as sobrancelhas unidas.
— Estava tudo sobre controle.
— De nada. — Dito isso, me viro e faço o caminho de volta para o meu
carro, mas sou interrompido quando a garota me alcança e para bem na
minha frente. Perto demais. Quando nota a nossa proximidade, ela dá um
passo para trás e balança a cabeça de um lado para o outro. — O que foi
agora, Lexie Rogen?
— Obrigada — sussurra, me encarando com intensidade, de forma que
as duas esmeraldas parecem tentar me desvendar. — E me desculpa por
molhar suas calças, de verdade. Não foi minha intenção.
Respiro fundo e contraio o maxilar.
— Eu já estava quase esquecendo disso.
— Ah, oh. — Ela leva uma das mãos até a boca para esconder o grande
“o” que os lábios carnudos estão fazendo agora. — Me desculpe, de novo.
— Você e o seu namorado conseguem chegar em casa sem arrumar
confusão? — me ouço perguntando.
— Ele não é meu namorado — retruca, estreitando os olhos para mim.
— Apenas, um amigo.
Sem saber o motivo, gosto de saber que ele não é namorado de Lexie.
— Então? Conseguem chegar sem se meter em confusão?
Lexie prensa os lábios e sorri de forma meiga, depois concorda com um
aceno de cabeça. O vento ricocheteia entre nós e até me vejo levantando a
mão e tirando o fio de cabelo de grudou entre os seus lábios convidativos,
mas me contenho.
Merda. Eu mal a conheço e acho que essa garota começou a foder com
a minha cabeça. Isso é um problema.
Ela passa por mim, correndo na direção de Daniel que ficou esperando
na esquina. Mesmo que tenha tentado me controlar, é mais forte que eu e
acabo olhando para trás, só para perceber que Lexie também tem atenção
voltada para mim.
Não estava nos meus planos bater uma pensando em Lexie, mas é
exatamente isso que estou fazendo no momento, debaixo do chuveiro,
massageando o meu pau duro enquanto penso nela.
Ontem, quando voltei do pub, uma amiga com quem eu transava de vez
em quando, me ligou quando soube que eu estava em Toronto. Fui encontrá-
la e depois de uma taça de vinho, eu extravasei todas as minhas frustrações na
foda. Ou tentei. Mesmo depois de algumas horas bem ocupado com ela, ainda
não conseguia tirar Lexie da mente. Parecia que a garota na minha cabeça
tinha vida própria e não queria ir embora.
Então, acabei sonhado que as belas pernas de Lexie abraçavam meu
corpo enquanto eu a chupava com vontade. Claro que acordei mais animado
do que o normal e cá estou eu, aliviando minha tensão no chuveiro.
Gozo. E é bom. Bom pra cacete.
Agora tenho uma imagem bem sexy dela impregnada na minha cabeça.
Nua, exibindo as curvas deliciosas, a pele macia e lisinha, tudo perfeito. E ela
é tão sensível, receptiva, que só de pensar nisso, me deixa de pau duro de
novo e com vontade absurda de gozar pensando nela.
Eu perdi a cabeça, mas é exatamente isso que eu faço. Com uma
pegada firme, volto a massagear minha ereção, reprimindo um grunhido e
deixando os pensamentos indecentes e imorais sobre ela me dominarem de
novo. Mesmo me sentindo a merda de um adolescente na puberdade e um
tarado, é muito bom.
É ótimo para falar a verdade.
Eu deveria parar por aqui e não pensar nela desse jeito de novo, mas
não acho que seja tão fácil me livrar da imagem que criei na cabeça. É claro
que se tivesse chance, a levaria para minha cama, mas não acho que Lexie
faça o tipo de garota com que eu deva me envolver numa relação dessas.
Além de ser uma bocuda, não me parece ser mulher que vai para cama
com qualquer um. É muito convicta para fazer uma coisa dessas, e eu
sinceramente, não preciso de um relacionamento que não seja o bom e velho
sexo sujo.
Depois do banho, desço para tomar café da manhã. Vejo a mesa na sala
de jantar posta, mas nada de Lawanda. Talvez seja uma péssima ideia, mas
tomo a iniciativa de uma reaproximação e vou até o quarto dela.
Lógico que as únicas coisas que ganho são resmungos e um bater de
porta na cara. Minha irmã está testando todos os limites da minha paciência e
estou a um triz de arrastá-la até o carro e levá-la para Montreal a força.
Dou uma batida firme na porta de novo, mas ela não responde. Então,
eu entro, enfurecido com a merda da situação.
— Eu disse que não quero falar com você. Me deixa em paz —
esbraveja ao me ver entrar sem permissão. — Saia, Nick!
— Sou um péssimo irmão, eu sei. Estou tentando de verdade me
reaproximar de você, mas estou cansando.
Ela cruza os braços na altura dos seios e abre um sorriso sarcástico, que
me deixa ainda mais irritado. É uma pirralha que adora torrar minha
paciência, destruir minha sanidade mental.
Quando foi que Lawanda se tornou tão insuportável? Ainda lembro
daquela garotinha adorável, que gostava de usar tranças e comer doces antes
do jantar. Mas parece que ela morreu também.
— Vai fazer o que? Me abandonar de novo? — retruca, fazendo as
palavras me atingirem como um soco na boca do estômago. — Nick... —
murmura e respira fundo, passando as mãos nos cabelos claros e longos. —
Tá bem, eu entendo. Você tem uma vida em Montreal, mas a minha vida não
está lá. E tá na sua cara que não quer ficar aqui, então, por que insistir nessa
relação? Eu e você... somos um caso perdido. Não tem mais jeito pra nós.
Os olhos dela brilham por conta das lágrimas, mas ela não chora, em
vez disso, solta uma risada sarcástica, que ecoa pelo quarto e em seguida,
ergue o queixo ao endireitar os ombros.
— Lawanda...
Dou um passo para frente, mas ela levanta uma mão, me impedindo de
continuar.
— Eu olho pra você e não te reconheço. E acho, que é o mesmo quando
você olha pra mim. — Solta um suspiro entrecortado. — Nick, perdemos sete
anos da vida um do outro, eu acredito que isso não tem conserto.
Minha irmã pega a bolsa em cima da cama e passa por mim, me
deixando sozinho no quarto. Fecho a mão em punho e tento me controlar para
não extravasar a raiva esmurrando uma parede.
Odeio admitir e não vou dizer isso em voz alta, mas ela tem razão.
Lawanda tem uma vida aqui e ao que parece, viveu muito bem sem mim
durante todos esses anos. Para ela, eu sou apenas um estranho que tem o
mesmo o sobrenome.
Não devia ter ignorando minha irmã e mãe por tanto tempo assim. Era
minha responsabilidade ter encontrado uma forma de conciliar a máfia e a
família, mas agora, parece que é tarde demais para fazer isso.
Saio do quarto de Lawanda, pensando no que fazer. Talvez a minha
relação com ela seja um caso perdido, mas ainda não estou pronto para
desistir de tentar mantê-la na minha vida. E ainda preciso descobrir algumas
coisas antes de ir embora.
Encontro Mattéo no fim da escada, mas o dispenso. Eu sei que ele é
motorista da família há anos e sempre levou minha mãe para todos os
lugares, mas a verdade é que eu não preciso dele. E ao que parece, nem
Lawanda, já que ela dirige o próprio carro.
Peço para um dos soldados pegar meu carro na garagem. Enquanto
espero, observo as imagens que estampam os porta-retratos em cima da mesa
de madeira no centro do hall de entrada.
Fotos em famílias...
Elas me deixam com uma sensação estranha no peito. Não sou mais o
homem dessas fotografias, mas o passado ainda continua sendo meu.
— Está pronto — Theo diz, chamando minha atenção. Concordo com
um aceno de cabeça e peço a chave do carro. — Não devia ir sozinho. Não
depois de ter descoberto a escuta — ele contesta.
Eu confio em Theo. Ele é um bom soldado, é leal e de confiança. Está
sempre disposto a fazer qualquer coisa. Eu o treinei bem, mas odeio o fato de
ele achar que precisa tomar conta de mim.
— Não preciso que ninguém cuide de mim. Sou perigoso até mesmo
sem uma arma — é o que digo, erguendo a mão para pegar a chave.
Theo não parece gostar do que ouviu, mas não é burro, então fica
quieto e assente mesmo a contragosto. Dá um passo para o lado e eu saio da
mansão, indo rumo ao meu carro estacionado na entrada com Theo na minha
cola.
— Fique de olho na minha irmã — ordeno antes de entrar no veículo.
— Mas seja discreto. Ela é esperta — aviso, fazendo o homem concordar
mais uma vez.
Quando entro no espaço em que fica minha sala e de Lexie, paraliso os
pés por alguns segundos e observo a garota de cócoras, mexendo nos cabos
do computador. Sem permissão, meus pensamentos viajam para horas atrás,
onde eu usava a imagem que criei dela para gozar.
Eu sou um babaca tarado.
Pigarreio, fazendo-a erguer as vistas para mim.
Ela está usando saia longa na cor verde clara com um cinto preto e um
par de botas de couro. Ao levantar e ficar de frente para mim, noto o top azul
escuro, que deixa os seios bem evidentes e convidativos, e um casaco rosa
por cima.
A garota parece um estranho arco-íris abrasivo. Lexie não tem nada a
ver com este lugar e parece ter chutado o balde e decidido que não vai tentar
se encaixar com a corporação Farley.
Ela me encara, mas não consigo dizer nada logo de imediato.
Eu não lembro de ter conhecido muitas garotas nerds, mas sei que
Lexie é uma. Li alguns dos seus artigos publicados na internet e embora não
tenha entendido muita coisa, dá para notar que foi escrito por alguém
inteligente. E ela se formou na universidade de Toronto como uma das
melhores da turma. No entanto, eu nunca imaginei que uma garota nerd fosse
tão... estranhamente colorida, atraente, quente, gostosa e única e é claro, dona
de um belo par de pernas, que me fizeram gozar hoje cedo.
— Bom dia, senhor Farley.
— Bom dia. Você está bem? — quero saber. — Conseguiu chegar em
casa sem entrar em confusão?
Lexie prensa os lábios e assente.
— Sim, cheguei em casa sem fazer um grande estrago pelo caminho,
obrigada pela preocupação.
— Ótimo. — Enfio uma das mãos no bolso da calça jeans e olho na
direção dos cabos do computador. — O que está fazendo? — pergunto,
intrigado.
— Ah, isso? — Gesticula com o cabo entre os dedos com unhas
pequenas pintadas de preto. — Deu um probleminha no... — a frase dela
morre e surge um negar de cabeça. — Esquece, se eu falar, você não vai
entender mesmo.
Arqueio uma sobrancelha e a olho com intensidade, mas continuo em
silêncio.
— Uau. Eu... eu.. bem, eu não quis ofender — balbucia.
Suspiro e sem dizer nada, entro na sala e me acomodo na cadeira
acolchoada de frente à mesa, de frente para Lexie, que me encara de cenho
franzido e lábios prensados.
Disco o número do seu ramal e ela atende no primeiro toque.
— Café? — pergunta, sugestiva. — Duplo e com uma dose de açúcar
da cafeteria da esquina?
— Não. Eu quero os nomes de todas as pessoas importantes da
Corporação Farley.
— Como?
— Investidores, sócios e acionistas. Tudo — digo, e ainda olhando-a
através da parede de vidro, vejo Lexie assentir.
— Algum problema? — questiona.
— Curiosidade. Algum problema? — é o que retruco como resposta.
— Claro que não, senhor. Trarei em alguns minutos — fala e encerra a
ligação, em seguida, sai do meu campo de visão.
Não quero me envolver no trabalho de verdade, é apenas uma desculpa
para tirar os olhos e ouvidos de Lexie de cima de mim. Ela é muito curiosa e
isso pode ser um problema.
Deslizo a mão para debaixo da mesa e desligo a escuta. Depois de
descobrir sobre o dispositivo, tinha decido agir como se não soubesse de
nada, mas agora, preciso falar com Thomas e não quero ninguém ouvindo
minhas conversas importantes.
Quando Liam chegar, pedirei que descubra onde o aparelho foi
fabricado e claro, o comprador, embora eu tenha uma intuição muito forte
que isso tem a ver com o meu tio. Eu sei que ele não está feliz por eu ter
voltado. Droga, nem eu estou, embora pensar na minha mãe me deixe com
um aperto no peito. Mas se ele acha que posso ser uma ameaça, bem,
Schavier não tem ideia, mas eu sou mesmo.
Uma ameaça que ele não vai querer enfrentar.
— Tá gostando de brincar de CEO?
Ao ouvir a pergunta de Liam, lanço um olhar duro para ele, que o
garoto nem percebe.
— Não sou o CEO, meu tio é. E não estou brincando aqui.
— Ah, entendi.
Já passam das vinte e uma quando ele e eu chegamos na Corporação
Farley. Além dos seguranças e os dois soldados que nos acompanham,
ninguém mais nos vê entrar no prédio.
— Isso tudo é seu? — pergunta assim que entramos no elevador e eu
aperto o botão do nosso andar. Liam não me deixa responder, pois vai logo
emendando com um tom cheio de divertimento. — Acho que você é mais
rico que o Julian, quem diria, quem diria. Você poderia estar vivendo num
apartamento melhor, lá em Montreal, sabe? Talvez em um penthouse...
Os soldados dentro do elevador trocam um olhar, e eu me viro para
observar Liam. Ele é atrevido, mas é apenas um garoto. Então, embora queira
dar uma prensa nele por estar me fazendo sentir um idiota, decido ignorar,
mesmo parecendo algo impossível.
Julian e Noah gostam desse nerd, e meu melhor amigo me pediu para
ter paciência com ele.
E bom, eu preciso de Liam. Ele é inteligente e esperto, entende de
computadores como ninguém e se tem alguém capaz de desenterrar qualquer
coisa na internet, é ele. O garoto sabe fazer coisas incríveis quando está na
frente de um computador com acesso ao wi-fi, e no momento, ele é minha
solução.
Ao chegarmos no andar, acendo algumas luzes e caminhamos rumo à
minha sala, mas peço que os soldados esperem do lado de fora. Liam dá uma
boa olhada por todo o cômodo antes de sentar de frente para o computador.
Retiro a escuta debaixo da mesa e desligo antes de entregá-la a ele.
— Não é de uso militar, o que facilita o meu trabalho — fala,
analisando o dispositivo com cautela. — Pode trazer um café pra mim?
Talvez demore um pouco.
Solto uma respiração forte e encaro Liam com a mandíbula contraída.
O garoto engole em seco e assente, levantando as mãos em rendição ao dizer:
— Sem café, já entendi.
— Sem café — repito, de mau humor.
Sento na cadeira de frente para Liam e o observo ligar o computador.
Ele pega o tablet de dentro da mochila que trouxe e conecta alguns cabos ao
aparelho, desliza os dedos sobre as teclas do computador e faz algo que com
certeza, eu não entenderei nem com muito esforço.
Ficar esperando Liam fazer o trabalho dele não é como eu estava
planejando passar minha noite, mas é a única coisa que posso fazer momento.
Depois de alguns minutos, Liam faz uma careta para monitor e coça a
nuca antes de encaminhar a atenção para mim.
Endireito-me na cadeira.
— Qual é o problema? — quero saber.
— Alguém emparelhou o seu computador — é o que diz.
— Fez o quê? Fale na minha língua.
Os dedos finos dele voltam a deslizar sobre as teclas de maneira ágil,
fazendo um barulho insistente.
— De forma simples, alguém sabe tudo o que você faz nesse
computador. Espero que não tenha pesquisado coisas comprometedoras,
porque...
— Liam — interrompo e o garoto assente ao entender meu olhar sério.
— Foco.
— Ok. — Respira fundo e o barulho de teclas continua por um longo
segundo, até ele voltar a falar de novo. — Pronto. Emparelhamento desfeito
com sucesso.
— Quem fez isso? — questiono, intrigado.
— Acho que você vai ter que pedir pra alguém me trazer aquele café —
fala, sugestivo ao mesmo tempo em que tenta segurar um riso.
— Tenha cuidado, Liam — aviso. — Eu não sou Julian. Ele gosta de
você, mas eu não — murmuro.
Não tenho nada contra Liam, mas na maioria das vezes, ele é
insuportável.
O garoto troca um olhar comigo e balança a cabeça, concordando.
Quando finalmente acho que ele vai tomar juízo e me tratar de forma
respeitosa, abre a boca de novo e solta algumas asneiras.
— Você não é muito sociável, sabe disso, não é? — pergunta ao erguer
uma sobrancelha para mim. — Não precisa matar as pessoas de medo com
essa cara — emenda.
Solto um suspiro longo. Estou a um triz de perder a paciência com esse
moleque.
— Liam — é o que digo, entre os dentes, encarando-o de forma severa.
— Foco — alerto.
— Ok, ok.
Ele volta a trabalhar no computador e depois de passar um tempo
entediado esperando, estou decidido a não ficar as próximas horas olhando
para cara dele. Liam é uma peça essencial para família Carbone, mas isso não
anula o fato de ele parecer um adolescente irritante. Fico de pé, me
preparando para deixá-lo sozinho na sala, quando me chama.
— Encontrei.
Giro nos calcanhares e caminho até próximo dele, olhando a tela do
computador.
— Lexie Rogen... foi ela quem comprou a escuta — diz, me fazendo
sentir uma sensação estranha no peito. — Você a conhece? — pergunta e
dança com os dedos sobre os teclados. — Ah, merda! Ela trabalha aqui? —
questiona, elevando o tom da voz.
— É minha secretária.
— Ela é gata — comenta, mas nem tenho vontade de falar nada sobre.
A única coisa que faço é ficar encarando a foto de Lexie no monitor.
Não faz nem quatro dias que estamos trabalhando juntos, mas não consigo
demolir a sensação de traição do peito. Eu tentei não ser um cretino, mas no
meio do caminho me fizeram de idiota. Nada que vem do meu tio pode ser
bom, e ele foi quem a contratou, então é claro que ela está metida nessa
confusão.
— Foi ela? Quem mexeu no meu computador também? — quero saber,
mas já tenho as respostas. Ela é uma programadora que está trabalhando
como secretária, é lógico que foi Lexie. — Descubra tudo sobre ela.
Ele assente, respirando fundo.
— Você quer que eu invada o computador dela? — sugere ao erguer
uma sobrancelha grossa. — Não sei se sabe, mas pessoas guardam segredos,
computadores não. Eles dizem muita coisa sobre uma pessoa, se é que você
me entende.
Se Liam acha que pessoas conseguem guardar segredos, ele é muito
ingênuo e não sabe como o mundo funciona de verdade, mas resolvo não
discutir com ele sobre esse assunto.
Então, eu dou a ordem.
— Invada o computador de Lexie. Quero saber tudo sobre ela.
Essa malandrinha mexeu com a pessoa errada.
— Quem é essa gata? — Liam murmura ao ver minha irmã passar por
nós e caminhar na direção da porta. Embora esteja curiosa, ela nos ignora
completamente, coisa que sabe fazer como ninguém.
Me ignorar deve ser quase como o seu segundo emprego.
Já são quase nove horas da manhã e Lawanda está indo trabalhar. É
difícil vê-la tão focada em algo, tão adulta e responsável. Quando a olho,
ainda consigo ver aquela garotinha doce de doze anos. E apesar de parecer
inútil, é aquela garotinha que não me deixa desistir dessa minha irmã crescida
de agora.
— Minha irmã mais nova — resmungo ao caminhar na direção do
escritório do meu pai.
Mesmo depois de tantos anos que ele se foi, minha mãe deixou tudo no
lugar, como se a qualquer momento o papai pudesse voltar e ficar com a
família de novo. É triste, mas de alguma forma, bonito.
O que me faz pensar no que ela passou por ter me perdido também. Eu
fiquei tão recluso e não me importei com nada além dos meus sentimentos,
minha culpa e reneguei minha família que ainda continuava viva. Acho que
nunca vou conseguir me redimir por isso.
Talvez eu nunca consiga me perdoar por estar dirigindo o carro que
causou o nosso acidente e tirou a vida do meu pai. Na verdade, não sei como
me perdoar ou esquecer o que aconteceu no passado.
Estou prestes a fechar a porta, quando noto que Liam me seguiu.
Preciso dele, por isso ainda está aqui e ao que parece, vai que ficar por
mais alguns dias.
Na noite passada, o garoto descobriu muita coisa sobre Lexie. Que
além de espelhar o meu computador, ela fez isso com o meu celular também.
E os e-mails que trocou com o meu tio. O conteúdo? Informações sobre mim.
E o pequeno rastro que deixou ao tentar invadir o computador de
Schavier, o que não faz sentindo. Se eles estão trabalhando juntos, por que
Lexie fez isso? O que essa garota está planejando?
— Irmã mais nova? Proibida, né? — Liam fala ao unir as sobrancelhas
e me passar o tablet que está segurando.
— Exatamente. O que é isso? — questiono ao olhar a tela escura cheia
de códigos binários, que eu não faço a mínima ideia do que significa.
— Mandei uma mensagem criptografada pra Lexie — comenta ao dar
de ombros e estende a mão, pedindo o aparelho de volta.
Franzo o cenho, cético.
— Você fez o quê?
— Calma, só quero irritá-la um pouco. E mesmo assim, eu tinha que
deixar minha assinatura — fala, como se eu fosse entender o que isso
significa. — Meu ego agradece.
— Eu acho que você tá apaixonado por ela — digo eu, irritado.
Ainda não consigo deixar pra lá a sensação de que Lexie me fez de
idiota. Só o que me faltava é Liam querer engatar um romance com ela. E
droga, eu bati algumas pensando nessa garota. A situação podia ser mais
fodida?
Como ela consegue me deixar excitado e irritado? Porra.
— Existe uma grande possibilidade, tenho que admitir. Ela é linda,
gostosa, esperta e é tão boa quanto eu quando o assunto é computadores e
essas coisas — se gaba, me fazendo bufar.
Liam abre um sorriso zombeteiro.
Quando invadiu o computador de Lexie, ele fez parecer que encontrou
a sua alma gêmea. Achou a garota autêntica e ficou doido ao descobrir que
ela joga online alguma coisa idiota que eu esqueci o nome.
Acredito que não tenha diferença entre Lexie e Liam, eles têm gosto
parecido para música, jogos online e filmes.
Na verdade, existe sim.
Eu gosto menos de Lexie agora e mesmo assim, ainda quero bater
algumas pensando nas pernas bonitas dessa cretina. Qual é o meu problema?
Não é falta de sexo. Talvez eu seja um tarado incorrigível.
— Amor proibido — ele murmura mais para si do que para mim. —
Tem seu charme, não é? — Me olha de rabo de olho, esperando que eu
concorde.
— Você tem sorte de ser inteligente, Liam — retruco, balançando a
cabeça de um lado para o outro e dou uma batida firme no ombro magro. —
Alguma novidade sobre o meu tio?
Ele nega com a cabeça e passa os dedos finos entre os cabelos negros.
Depois de descobrir que o meu tio fez, decidi que ele merece ser
investigado também. Se está com tanto medo que eu tome seu lugar na
Corporação e até colocou alguém na minha cola, ele deve ter segredos que
não quer que sejam revelados.
— Escuta, não foi fácil hackear o computador da Lexie, foram muitas
barreiras a serem vencidas antes de eu finalmente conseguir. Ela é muito boa,
mas é claro, eu também sou. No entanto, o seu tio está em outro patamar.
Você sabia que a segurança digital da corporação Farley é uma das melhores
que eu já vi? Firewall, protocolo IPSec...
— Converse na minha língua — interrompo, começando a remexer nos
papéis em cima da mesa. — Sem linguagem técnica.
— Resumindo, eu falhei, mas não se preocupe, vou continuar tentando.
Isso aguçou a minha curiosidade. E claro, mexeu com meu ego — resmunga,
revirando os olhos e voltando a mexer no tablet.
Assinto.
Liam é um pé um no saco, mas é esforçado, o que eu admiro. Talvez
seja por isso que ele é tão importante para família Carbone, embora ainda
nem seja um membro oficial da nossa organização.
Ao ver Nicholas entrar na sala com aquela cara amarrada de poucos
amigos, eu sei que o meu dia vai ser difícil. Porque parece que não basta eu
ter acordado e descoberto que meu computador foi hackeado por um idiota e
saber que meu emparelhamento foi desfeito, meu chefe tem que estar com
essa expressão de bunda também.
Entra, passa por mim e nem dá bom dia.
— Mal educado — resmungo e tomo um susto daqueles quando o
telefone em cima da mesa começa a tocar.
Levo a mão até o coração e respiro fundo, tentando me controlar.
Levanto os olhos e noto que Nicholas está me encarando ao mesmo tempo
em que coça o queixo. Hoje está com barba por fazer, e Deus, fica muito
bonito nele. Aponta com indicador para o próprio telefone quando não atendo
o meu, e eu me dou conta de que é ele quem está me ligando.
— Venha aqui — ordena sem nem me dar a chance de dizer “oi”. O
cretino desliga na minha cara.
Respiro fundo e prendo os cabelos em um rabo de cavalo antes de
levantar e ir até ele. O homem fica observando meus passos através da porta
de vidro e isso me deixa com um calor estranho na espinha. Talvez, entre as
pernas também.
Qual é o meu problema? Bem, talvez eu esteja enganada, mas acho que
sinto um pouquinho de atração física por esse ser humano, que mais parece
um brutamonte arrogante.
— O que posso fazer pelo senhor? — pergunto, tentando parecer
cordial. Vou devolver essa falta de educação dele com gentileza.
Ok, não prometo nada, mas tentarei.
Nicholas abre a primeira gaveta da mesa de madeira refinada e tira a
escuta que eu havia deixado na sala. Sinto todo o sangue do meu rosto sumir
e o coração dar vários pulos dentro do peito. Engulo em seco, pensando
rápido em possíveis desculpas.
— Eu sei que é sua, não tente mentir pra mim — é o que diz, com a voz
firme e que parece ser capaz de me matar aqui mesmo. — Por quê?
— Eu... — paro no início da frase. Não tenho nada a dizer a meu favor.
Acho que esse é o meu fim.
— O que meu tio quer? — pergunta, me fazendo piscar devagar.
Abro a boca para falar, mas infelizmente, não sai nada. Nunca fui
encurralada desse jeito e não estou gostando da sensação. Merda. Merda.
Merda. Onde foi que eu fui me meter?
Nicholas levanta da cadeira e caminha devagar até mim, sinto o
coração vacilar algumas batidas e eu prendo a respiração, assustada. E
mesmo que esteja querendo colocar medo em mim, não posso deixar de
reparar que ele fica bem atraente com essa pose de macho alfa.
Nunca pensei que machos alfas fossem me atrair desse jeito, mas
droga...
— No momento, não estou gostando muito de você, Lexie. No entanto,
serei legal, porque tratá-la mal vai contra todos os meus princípios. Então,
vou perguntar mais uma vez, o que o meu tio quer?
Sinto a garganta áspera e uma sensação estranha nas entranhas, que até
conseguem me deixar meio tonta. Não sei se é medo ou adrenalina. Talvez,
seja um pouco dos dois. Meu Deus, socorro.
— Nada — minto.
Eu devia estar contando a verdade agora, mas não sei do que Schavier é
capaz se souber que andei abrindo a boca por aí. Ainda não consegui
descobrir nada sobre aquele velho, preciso ter cuidado também.
Nicholas sorri de jeito sarcástico.
— Eu sei que é malandrinha, Lexie, mas não se engane, você não é
uma garota má.
Como é?
Estufo o peito e é minha vez de soltar uma risada seca. Por alguma
razão inexplicável, fico ofendida por ele achar que eu não sou uma garota má.
Esse cara nem me conhece direito e acha que sabe alguma coisa sobre mim?
— Não se engane você, Nicholas — retruco, entre os dentes. — Não
sabe nada sobre mim, e sim, pra sua surpresa, eu posso ser a garota má
também.
Quem fica surpresa sou eu com o que acontece em seguida. Ele desvia
os olhos azuis e severos de mim e dá um soco forte na mesa, bem em cima do
dispositivo, quebrando o aparelho em vários pedacinhos. E depois, volta a me
encarar e eu sei que deixei o homem puto.
— Não me teste, garota.
— Por que não? — rebato antes que meu cérebro filtre as palavras.
Ok, talvez eu esteja gostando de deixá-lo tão irritado, o que não tem
lógica. A cabeça de Nicholas só falta soltar fumaça e ele parece com alguém
que pode acabar comigo, e não é de um jeito sexy e que vai me deixar
ofegante e com as partes íntimas latejantes.
Ainda bem que eu sempre posso chutar bolas.
— Está demitida — ele avisa, ficando de costas para mim. — Tem
cinco minutos para sumir desse andar. Não ouse me contrariar.
— Não pode me demitir, não foi você que me contratou — falo ao
cruzar os braços na altura dos seios, cravando os pés no chão.
É claro que ele pode me demitir, mas eu endoidei, porque no momento
está sendo fascinante provocá-lo. Talvez, eu goste do perigo. E faz tempo que
não me sinto assim, tão viva na mesma intensidade que estou morrendo de
medo.
Prendo a respiração por alguns segundos quando Nicholas corta a nossa
distância com dois passos largos e fica com o rosto bem próximo ao meu.
Droga. Ou ele fica bem mais atraente quando está irritado ou eu fiquei doida
de vez.
Eu aposto nos dois.
— Não me faça tirá-la a força daqui.
— Faça isso — murmuro sem conseguir tirar os olhos dos dele. — Vai
me arrastar pra fora do prédio? No momento em que você tocar em mim, vai
perder toda a razão.
Nicholas contrai a mandíbula.
Sem aviso prévio, ele toca meu braço. É um toque firme, mas que não
me machuca. Muito pelo contrário, envia ondas quentes por todo o meu
corpo e arrepia os pelinhos dos meus braços, me fazendo perder as
estribeiras.
Mas é Nicholas quem me solta.
— Não apareça mais aqui — diz e desvia as duas pedras azuis de mim,
e volta a ficar de costas, apoiando os braços na mesa de madeira.
Engulo em seco.
Tentando colocar um pouco de juízo na minha cabeça, saio da sala de
Nicholas e caminho até a minha mesa, recolhendo os meus pertences. E sem
olhar para trás, deixo o cômodo e rumo até o elevador, que por sorte abre as
portas assim que chego em frente.
Quando vejo quem está dentro, tenho vontade de dar meia volta e
esperar pelo próximo, mas não acho que Schavier me deixaria fugir de
qualquer forma.
— Aonde está indo? — indaga curioso, me fazendo morder o lábio
inferior.
Penso em mentir, mas ele descobrirá cedo ou mais tarde que o sobrinho
me mandou embora, então é melhor falar de uma vez.
Dou de ombros ao dizer.
— Fui descoberta. Nicholas me demitiu.
Sinto o coração se agitar ao ver Schavier apertar em um dos botões e
travar o elevador.
— É melhor o senhor pensar bem no que vai fazer, porque tem uma
câmera de segurança aqui no elevador e isso quer dizer que são provas.
Ele enruga a testa, visivelmente confuso, mas em vez de dar atenção ao
que acabei de falar, Schavier solta um suspiro longo e pega o celular de
dentro do bolso da calça social e digita rápido uma mensagem para alguém.
E então, olha para mim ao questionar.
— O que aconteceu?
Engulo o caroço na garganta, mas respondo à pergunta.
— Ele descobriu a escuta que escondi debaixo da mesa e... — paro de
falar e me perco em pensamentos ao ligar as peças do quebra-cabeça.
Droga.
Se ele sabe da minha ligação com o tio, com certeza, mandou alguém
invadir meu computador e xeretar meus e-mails. Confesso que não esperava
que uma pessoa como Nicholas fosse ser tão esperto a ponto de ter a ideia de
hacker meu computador. Ele não me parece ser muito o tipo que pensa com a
cabeça de cima.
Surpreendente, irritante, mas surpreendente.
— Ainda está me escutando? — Schavier fala, chamando minha
atenção. — O que você falou pra ele?
— Por que não me disse que tinha outro hacker na área? Eu teria me
preparado e me protegido melhor — resmungo, segurando com força a alça
da minha bolsa. — Tem noção disso? Você querendo descobrir coisas sobre
Nicholas, achando que ele é só um playboy sem nada na cabeça, mas talvez
ele já esteja um passo à frente e saiba muito sobre você. Ou tudo, eu não sei
— falo antes que meu cérebro processe as palavras.
— O que disse? Tem outro hacker?
Assinto.
— Sim — murmuro de cara fechada. — Ouça, eu sou boa pra caramba
e não é fácil admitir isso, mas ele é tão bom quanto eu — assumo.
— Quem é? — Schavier quer saber.
Noto vincos se desenharem na sua testa. Ele parece uma mistura de
confusão e fúria. Ai Deus, por que eu tive que abrir a boca e dizer isso? Não
está com cara que o velho vai deixar barato.
— Ainda não sei.
Ele assente e prensa os lábios em linha reta.
— Eu preciso que descubra tudo o que puder sobre isso, Lexie. —
Passa as mãos no terno bem passado e endireita a postura. — É o seu novo
trabalho e isso é uma ordem, caso não tenha ficado claro — articula, me
fazendo ter vontade de revirar os olhos.
— Ainda vou ter meu trabalho no departamento de T.I? — quero saber.
Schavier me encara de maneira profunda, mas não diz nada. Em
seguida, aperta um dos botões, destravando o elevador. Não parece que ele
vai me dar algum emprego além do que estou fazendo agora. Esse mentiroso
de merda.
Fico com uma sensação estranha no estômago.
Lá se vai meu emprego no departamento de T.I de uma empresa
renomada de tecnologia...
— Antes de me cobrar, faça seu trabalho direito, senhorita Rogen. Não
gosto de pessoas incompetentes e no momento, você é uma.
Trinco os dentes quando a raiva vem e fecho uma das mãos em punho,
me segurando para não acertar um soco no rosto dele ou melhor, um chute no
meio dessas bolas velhas e enrugadas.
Então, quer dizer que o senhor me acha incompetente? Tudo bem, vou
mostrar minha falta de capacidade hackeando o seu computador e
descobrindo todos os seus podres, velho cretino.
Homens poderosos sempre têm algo a esconder e com ele não deve ser
diferente.
Não demorou muito para descobrir a mensagem que Black, meu
querido invasor, deixou para mim. Era um boneco de corpo pequeno e cabeça
grande em pixel, dançando moonwalk de forma engraçada, e no fim,
descendo as calças e mostrando a bunda para mim.
Parece que a mensagem foi enviada por alguém de cinco anos.
Devolvi na mesma moeda a gentileza ao hackear o seu computador.
Seu nome é Liam Cooper e não fiquei tão surpresa ao ver que é apenas um
garoto que nem se formou ainda, mas tem talento, assim como eu fui, ele é
um dos melhores da classe.
Se ele não fosse tão infantil, seria um charme.
Quase pulo da cadeira quando meu celular começa a tocar em cima da
mesa. Vejo o nome de Schavier na tela e fico tentada a não atender, mas já
venho o ignorando por algumas horas. E ele faz muito o tipo de homem que
não gosta de ser ignorado.
— Oi... senhor Farley.
— Quero ouvir boas notícias, senhorita Rogen — é a primeira coisa
que diz, e eu começo a me perguntar se falta de educação é coisa de família.
— Descobriu alguma coisa?
Respiro fundo, tentada a mentir, mas chego à conclusão de que é
melhor falar de uma vez o que sei e me ver livre dele. Posso enlouquecer se
Schavier me chamar de incompetente de novo.
— Sim. O que você quer fazer? — começo a questionar, mas como não
tenho respostas, continuo: — O que vai fazer?
— Me diga o que descobriu — é o que responde.
— Liam Cooper, nasceu em Montreal, vinte e um anos, universitário,
filho único, solteiro, sem antecedente criminal, tipo sanguíneo O negativo e
saudável. Precisa de mais alguma coisa? — pergunto, debochada.
— Não — retruca e desliga na minha cara.
Faço careta para o smartphone e por um segundo, tenho vontade de
arremessá-lo contra a parede ou jogá-lo pela janela, mas lembro que ainda
faltam algumas parcelas para terminar de pagar, então o coloco em cima da
mesa de novo.
Volto a me concentrar em Schavier e a merda da sua segurança digital
de ponta. Eu sei que ele é CEO de uma empresa de tecnologia, mas só
alguém que tem muito a esconder para usar uma barreira tão forte em nível da
CSIS[7]. Mas não se preocupe senhor Farley, vou descobrir todos os seus
segredos. Ou boa parte deles.
Só me dou conta de que se passaram horas, quando sinto o estômago
reclamar de fome ao roncar. Levanto da cadeira e me alongo, arrastando os
pés até a cozinha e procurando algo na geladeira para comer.
Fico decepcionada quando não encontro nada.
Volto para minha mesa grande na sala e pego meu celular, enviando
uma mensagem de texto para Danny, mas ele não me responde, o que me faz
concluir que deve estar saindo com o carinha que conheceu noite passada.
Algo chama minha atenção na tela de um dos computadores. É meu
Facebook notificando uma nova solicitação de amizade. Reviro os olhos
quando vejo que é Liam Cooper.
O que esse garoto tem na cabeça?
Volto a sentar e aceito a solicitação e antes mesmo que eu possa enviar
uma mensagem para ele, Liam me manda algo.
Liam: Fiquei na dúvida me aceitaria ou não.
Lexie: Que diferença isso faz? Aposto que você entraria na minha
conta e se auto aceitaria. Não tinha escolha. E eu gosto de escolher minhas
batalhas.
Liam: É meio verdade. Enfim, oi.
Lexie: Oi. O que você quer?
Liam: Preciso te perguntar algo.
Lexie: Vai em frente. Acho que outra vez, eu não tenho escolha.
Liam: Essa aqui é mesmo você, né?
Liam enviou uma foto.
É uma foto minha de dois anos atrás, fazendo cosplay[8] da Canário
Negro para a comicon de Toronto[9]. Eu não tinha a pretensão de parecer tão
sexy, mas a verdade é que eu fiquei um colírio usando couro preto. Bem
gostosa, mas de um jeito sexy.
Lexie: Sim, por quê?
Liam: Acho que estou apaixonado por você. Porra. Você é gata demais
e ainda temos gostos parecidos. Lexie, você é meu presente de natal.
Lexie: Há, há, há. É uma pena, não gosto de homem mais novo.
Liam: Não seja má comigo.
Embora tenha tentado não rir, é impossível. Liam parece o tipo de
pessoa com quem eu teria feito amizade na faculdade. Por azar ou não, meus
colegas de classes eram muito chatos e andavam sempre em uma espécie de
linha reta. E eu estava sempre pronta para alguma pequena travessura virtual
ou não.
Depois de alfinetar Liam por mais dez minutos, decido ignorá-lo e
pedir pizza. Ainda estou brava por ele ter hackeado meu computador. Me
senti como se ele tivesse bisbilhotado minha gaveta de calcinhas.
E um homem não deve mexer na gaveta de roupa íntima de uma mulher
sem permissão.
Dois dias depois...
— Por favor, não me diga que isso no seu cabelo é um salgadinho
cheetos — Danny fala assim que me vê. Escancaro a porta e dou um passo
para trás, e com um gesto de cabeça, o convido para entrar. — Você está
fedendo, Lexie — resmunga ao passar por mim e enrugar o nariz.
Passo as mãos nas madeixas desordenadas e encontro um salgadinho de
cheetos que estava comendo mais cedo. Como isso veio parar aqui? Não faça
a mínima ideia. Danny faz cara de nojo. Não posso culpá-lo, ainda não me
olhei no espelho, mas devo estar um caos total.
— Estou trabalhando numa coisa.
— E pelo visto, não está tomando banho, sua porquinha. Já
conversamos sobre isso, não lembra? Banho é bom, não esqueça disso. A
pele e cabelos agradecem. Por que tá sempre tentando se sabotar? Você é
linda, mas assim, desse jeito que tá agora, ninguém merece.
— Eu sei, mas faz tempo que não fico assim.
— Talvez seja primeira vez nesse ano, mas amiga, você precisa mudar
os hábitos, porque tá fedendo a dez metrôs de distância, porquinha.
Respiro fundo e relaxo os ombros. Acompanho meu amigo até a sala e
sento no sofá, colocando o salgadinho em cima da mesa de centro. Ele tem
razão, não estou tomando banho e nem dormindo. Na verdade, eu nem vi o
tempo passar. Fiquei tão concentrada em descobrir o que Schavier esconde,
que não me dei conta de que passei dois dias em claro.
Estou exausta.
E pelo visto, fedendo. Fedendo muito.
— Você tá uma bagunça — ele resmunga.
— Eu sei, obrigada.
Danny se acomoda do outro lado do sofá, mantendo uma distância
segura e me analisando com seus olhos azuis e meigos.
— Não está indo trabalhar?
— Fui demitida, na verdade, antes de ontem. Sem emprego de novo.
Acho que isso é minha sina.
— Uau. Esse é o seu recorde. Nem uma semana direito e já foi
chutada? — questiona, pasmo. — O que aconteceu?
Dou de ombros e pego uma mecha de cabelo e cheiro. Meu Deus!
Além de estar fedendo, tem óleo para fritar algumas batatas fritas. Até parece
que eu morri e esqueceram de enterrar.
— Por onde andou? Você sumiu também — rosno, fazendo cara feia.
— É só arranjar um namorado que esquece mim.
As sobrancelhas grossas dele se unem e em seguida, Danny nega com a
cabeça, cético. Passa os dedos entre os cabelos negros e grossos e dá uma
respirada funda, parecendo alguém que está implorando por paciência para
lidar comigo.
— Não seja dramática, eu estava trabalhando. Eu disse que passaria uns
dias fora por causa das fotos — quando ele fala, algo na minha mente clareia.
É verdade, na noite em que fomos no pub aqui perto, Danny me avisou.
— Ah.
— Foi um problema por causa do meu olho roxo. — Aponta com
indicador para o resto perfeito e arregala bem os olhos. — Estou usando
maquiagem, por isso continuo lindo.
Danny trabalha como um modelo comercial há quase seis anos. Quando
o conheci, ele fazia trabalhos pequenos e servia como substituto para outros
modelos, mas agora, meu menino já cresceu tanto.
Não vai demorar para ele se tornar a versão masculina da Kendall
Jenner e ser um dos modelos mais bem pagos do mundo. Torço muito por
isso. Ele merece e batalha muito para conseguir dar uma vida melhor para
mãe, que mora numa fazendinha quase falida em Milton[10].
— Vá tomar um banho, por favor. Vamos sair pra comer algo — pede,
suspirando e prensando os lábios. — Não tem como você viver em sociedade
desse jeito.
Bufo, mas fico de pé. Antes de caminhar até o banheiro, encaro as telas
dos meus computadores. Ainda não consegui atravessar a barreira de
segurança de Schavier. Isso está me deixando doida.
— Anda, porquinha — Danny resmunga, se levantando e me
empurrando pelos ombros no rumo do banheiro. — Lave bem esse cabelo,
ok?
— Sim, senhor — sussurro.
— Boa garota — rebate, me roubando um sorriso. — O que seria de
você sem mim? — pergunta, mas não me deixa responder, pois me joga
dentro do banheiro e fecha a porta num solavanco. — Banho. Agora!
Ao ver minha irmã vomitando no banheiro feminino enquanto
surpreendentemente, Liam segura seus cabelos loiros na tentativa de ajudar,
eu me pergunto quando e como os dois se tornaram tão próximos.
Quando ela me nota, estica a mão para que eu não chegue perto.
Lawanda teria dito algo, mas foi interrompida com mais vômito.
Eu tinha saído apenas por algumas horas. Fui encontrar uma modelo
russa, afinal, eu precisava continuar extravasando meu estresse de alguma
forma que não fosse me masturbando com a imagem das pernas de Lexie
invadindo a porra da minha cabeça.
Para meu desgosto, isso vem acontecendo mais do que gostaria.
Assim que cheguei em casa, Théo me avisou que Liam e Lawanda
tinham saído sem que ninguém percebesse. Antes que pudesse colocar a
cabeça para trabalhar e encontrá-los, recebo uma mensagem de Liam falando
que não conseguia conter minha irmã, que estava bebendo demais. E cá
estamos nós, em um banheiro imundo de uma boate cheia de adolescentes
drogados.
— Eu falei pra não chegar perto — Lawanda diz, limpando a boca com
as costas das mãos. Fica de pé e se equilibra ao segurar um dos braços de
Liam.
— Na verdade você não disse nada, Lawa.
Minha irmã morde o lábio inferior antes de resmungar:
— Saia daqui, Nick.
— Não — retruco, e ela desvia a atenção de mim, fazendo cara de
choro. — Depois conversamos — aviso a Liam quando o noto abrir a boca
para começar a dar desculpas.
— Ok — ele diz.
— Não brigue com Liam — Lawanda murmura, me fazendo erguer
uma sobrancelha. — Eu o trouxe aqui e não contrário. — Ela caminha até a
pia e lava a boca com água da torneira.
Troco um olhar com Liam e a única coisa que ele faz é assentir.
— Espere lá fora — embora pareça uma ordem, falo em um tom
comedido. — Não vá muito longe.
— Sim, senhor — murmura com sarcasmo, roubando um sorriso de
Lawanda, me dando um vislumbre daquela garotinha de anos atrás. Desde
que cheguei aqui, acho que é a primeira vez que a vejo quase sorrir.
— Você está bem? — pergunto quando Liam nos deixa sozinhos. —
Por que beber desse jeito? Você nem tem idade pra isso.
Ela funga e amarra os cabelos loiros em um rabo de cavalo ao se olhar
no espelho sujo.
— O que você acha? — rebate, virando o corpo para mim e me olhando
de maneira profunda. — Minha vida é uma droga — sussurra e noto os seus
olhos claros marejados. Vê-la assim me incomoda.
— Você quer que eu vá embora da sua vida, Lawanda?
Ao ouvir a pergunta, as lágrimas começam a irromper dos seus olhos e
o queixo da minha irmã começa a tremer. Dou um passo para frente, na
tentativa de consolá-la, mas Lawanda recua.
— Você sumiu, Nick — choraminga. — Quando eu te encontrei, não
doeu? Eu te implorei pra voltar pra mim, pra nossa família. Eu precisava de
você, mas... — a frase morre e ela respira fundo, ainda chorando e fazendo eu
me sentir um babaca inútil. — Mas você não precisava de mim.
As palavras dela me atravessam como uma faca no coração. É claro que
doeu. Ainda lembro como se fosse ontem. Uma Lawanda de treze anos e a
mamãe, as duas tinham ido até Montreal atrás de mim, e minha irmã
implorou para que eu voltasse para casa, mas eu não via sentindo em fazer
isso.
Claro que foi duro partir o coração dela, mas eu não consegui fazer
diferente. Eu não consegui ser um homem diferente.
— Lawa...
— Eu acho que ainda preciso de você — diz ao fungar e desviar os
olhos tristes de mim. — Mas no momento, estou muito magoada. Não
consigo colocar uma pedra no passado. Não sei se um dia vou conseguir fazer
isso — admite e morde o lábio inferior ao limpar as lágrimas.
Estou prestes a argumentar quando sou interrompido por Lawanda.
— Não estou com cabeça pra conversar agora, Nick. Você pode só me
levar pra casa?
Prenso os lábios e assinto, mesmo querendo fazer o contrário. Mesmo
querendo consertar os meus erros e fazê-la entender que no momento, ela é a
pessoa mais importante para mim e que vou fazer de tudo para não
decepcioná-la de novo.
Me aproximo de Lawanda. Tiro a minha jaqueta jeans e em seguida,
enfio em seus braços, cobrindo parte do corpo pequeno coberto por um
vestido brilhante e curto demais para o meu gosto.
— Obrigada — sussurra.
Saímos juntos do banheiro e noto que há uma fila de mulheres
enfurecidas do lado de fora, porque Théo impediu que entrassem. Depois de
passarmos, ele recua e as deixa dominarem o banheiro feminino.
Dou uma olhada pelo lugar, na tentativa de encontrar Liam, mas tem
muita gente dançando e o bar está lotado. É como tentar procurar uma agulha
na merda de um palheiro. Impossível.
— Cadê Liam? — pergunto a Théo, tentando soar mais alto que a
música remixada que o DJ da casa noturna está tocando.
Ele se aproxima e aponta para a saída dos fundos da boate.
— Foi fumar um cigarro.
— Pegue o carro me encontre lá — ordeno.
Toco o cotovelo de Lawanda, conduzindo-a para saída dos fundos. Para
minha surpresa, ela não resmunga e nem recua do meu toque, o que para mim
já é uma grande vitória. Um avanço e tanto no nosso relacionamento
quebrado.
Empurro a porta de metal e deixo que minha irmã passe primeiro. Nem
coloco os dois pés para fora da boate direito quando ouço um som de tiro
junto de um grito da Lawanda. A única coisa que consigo ver é um homem
de capuz correndo e Liam no chão, sangrando.
Rápido, alcanço Liam e me ajoelho de diante dele, pressionando o peito
ensanguentado ao mesmo tempo em que tento controlar meus batimentos
cardíacos e pensar com clareza.
Lawanda está chorando atrás de mim.
— Nicholas... — ele sussurra com dificuldade, me fazendo engolir em
seco. — Eu disse que daria minha carteira, mas ele não quis. — Liam tosse
sangue.
— Não fale.
Olho para minha irmã, que está com a respiração ofegante e chorando,
desesperada, cobrindo a boca com as duas mãos. Lawa já perdeu tanta gente,
mas acho que nunca viu alguém levar um tiro tão de perto.
— Chame uma ambulância — peço, mas ela não move nenhum
músculo. — Lawanda! — grito, chamando sua atenção. — Chame uma
ambulância. Agora!
Ela cruza o olhar comigo e estremecida, me obedece.
— Não quero morrer assim, Nicholas... — murmura, me deixando com
uma sensação estranha no peito. Eu disse tantas vezes que não gostava dele,
mas Liam é apenas garoto, não merece isso. Droga. Ele não merece um fim
desses. — Não quero morrer aqui, por favor.
— Você não vai — digo, sem ter muita certeza. — Fique acordado, tá
bem? Você não vai morrer — repito, me sentindo ansioso e com um nó na
garganta.
— Você é um péssimo mentiroso — resmunga, com a voz fraca.
A respiração de Liam fica cada vez mais enfraquecida e eu fico
desesperado, com vontade de tirá-lo do chão e carregá-lo até o hospital mais
próximo. Noto Théo se jogar ao meu lado, com o celular já no ouvido,
tentando fazer algo pelo garoto ensanguentado na nossa frente.
Liam fecha os olhos e se entrega a um sono profundo antes que eu
possa fazer qualquer coisa.
Danny está pagando os nossos cappuccinos, enquanto eu estou bem
acomodada em uma mesinha próximo da janela de uma das nossas cafeterias
favoritas do centro de Toronto, segurando meu tablet e xeretando as fofocas
em um site qualquer.
Uma chamada em destaque me chama a atenção, são os riquinhos do
momento, Nicholas e Lawanda Farley envolvidos em uma das principais
notícias das últimas vinte e quatro horas.
Curiosa, me afundo na pesquisa e não demora nem cinco minutos para
eu saber o que aconteceu. Sinto meu estômago embrulhar e o coração bate
tão rápido, que é doloroso.
Uma tonteira toma conta de mim e eu derrubo meu tablet no chão,
trincando a tela do aparelho novo. Preciso me agarrar com força ao material
frio de madeira para não tombar para o lado. Meus pensamentos todos
bagunçados, como um turbilhão, me deixando absorta as coisas ao meu redor.
Isso não pode ter acontecido...
Não pode...
Meu amigo toca minha mão e eu me assusto.
— Você está bem? — ele quer saber.
Eu o encaro com a visão embaçada, mas não consigo formular nada
para dizer. Merda. Não pode ser. Isso não pode estar acontecendo de verdade.
Onde foi que eu fui me meter? Que merda eu fiz? Droga. Droga.
— O que aconteceu? — Danny pergunta. — Você tá pálida, Lexie. O
que aconteceu? Fala comigo.
Sem responder à sua pergunta, levanto e saio do café, parando na
calçada e olhando com atenção a rua, desconfiada. Mas não vejo nada de
suspeito. Meu amigo, que parece muito confuso, para ao meu lado, trazendo
com si os dois copos de cappuccino.
Respiro fundo, tentando me controlar e não pirar de vez, mas sem
conseguir me conter, as lágrimas escapam dos meus olhos sem controle e eu
choro em silêncio, com o coração pesando uma tonelada.
— Lexie, você está me assustando. Fala comigo.
— Ele... eu... é minha culpa — admito e dói no meu peito. É o tipo de
culpa que não conseguimos nos livrar apenas com perdão. É o tipo de culpa
que te acompanha a vida inteira e te destrói. — Você tinha razão, eu não
devia ter...
Danny coloca os copos de cappuccino em cima da mesinha próximo a
gente e segura meu rosto entre as mãos, me pedindo para respirar fundo e
devagar. Parece impossível no momento, mas eu tento fazer o que ele pede.
Continuo chorando e ele me envolve em um abraço protetor.
— O que é sua culpa?
Afasto-me de Danny e prendo meus olhos aos dele. É um cara bom, me
consolando e mesmo sem saber, está com aquela expressão de alguém pronto
para dizer que não preciso me culpar por nada, que as coisas acontecem
porque têm que acontecer, que a vida é assim, com muitas idas e vindas.
Mas é tudo mentira.
Não pode ser coincidência. A vida não é feita disso, eu sei. E fui eu
quem disse ao Schavier quem Liam era. Eu falei tudo para ele. A culpa é toda
minha.
O sangue da morte dele está nas minhas mãos, marcando meu coração e
minha alma. Nicholas tem razão, eu não sou uma garota má. Porque a única
coisa que consigo pensar em fazer agora é fugir e deixar que a culpa tome
conta de mim.
Os polegares de Danny limpam minhas lágrimas nas bochechas.
— Ele morreu — murmuro com o coração apertado. — E é minha
culpa. Eu causei isso. Não sou uma boa pessoa — emendo com a voz
embargada.
Os contos dos olhos do meu amigo franzem e ele não parece entender
nada do que sai da minha boca, mas fica ao meu lado, secando minhas
lágrimas e dizendo que vai ficar tudo bem.
Mas será mesmo?
Eu não sou burra, eu sabia que Schavier era perigoso, mas não a ponto
de fazer isso. Não a ponto de acabar com a vida de alguém inocente. Meu
Deus, ele era só um garoto, que nem tinha se formado ainda. Como ele pôde
fazer isso?
Droga. Droga.
Como minha mãe conseguiu namorar um homem como ele?
Como é que eu fui me envolver com um homem como ele?
Danny me faz sentar em uma das cadeiras de madeira do lado de fora e
entra na cafeteira, voltando alguns segundos depois. Está segurando meu
tablet quebrado e uma garrafinha de água. Desenrosca a tampa e me fez beber
um gole generoso, depois passa a mão em cima da minha cabeça, como se eu
fosse um filhotinho de gato assustado.
— Vamos pra casa. Lá, se você quiser, nós conversamos.
Engulo em seco e ao olhar minhas mãos, noto que estão tremendo e
quando pisco, por um milésimo de segundo, vejo sangue nelas. Espantada,
levantando num solavanco, deixando a garrafinha de água cair no chão e
derramando o resto do líquido.
— No que você se meteu, Lexie? — Danny questiona com uma linha
de preocupação entre as duas sobrancelhas grossas e escuras. — Estou
preocupado com você.
Choro de novo, mas dessa vez, tento limpar meus olhos e fungo.
— Eu acho que fiz merda — assumo. — Acho que fiz merda das
grandes, Danny. E eu não... não sei o que fazer.
Os olhos do meu melhor amigo brilham de um jeito melancólico, o que
acaba me deixando mais triste ainda. Não quero preocupá-lo ou envolvê-lo na
minha vida toda errada. Pisco rápido, tentando segurar as lágrimas.
— Eu vou ficar bem — minto. E pelo visto, muito mal, porque Danny
nega com a cabeça, descrente e estende a mão espalmada. — O que você
quer?
— Me dê o seu celular.
Entrego a Danny e quando um carro buzina alto para uma bicicleta na
rua e o motorista começa a xingar o ciclista, levo a mão até o peito. Meu
coração dói e a espinha está arrepiada, como se meus instintos estivesse me
avisando que corro perigo.
Danny enfia o celular no meu bolso jeans e eu volto a encará-lo, ainda
meio atordoada.
— Vamos pra casa — peço, mas não consigo mover nenhum músculo
do meu corpo. Meu corpo está ondulando de medo.
Ele assente e entrelaça a mão na minha, me puxando para atravessar a
rua na faixa de pedestre e deixando os cappuccinos em cima da mesa da
cafeteria. Não sei o que seria de mim sem Danny no momento.
— Obrigada, amigo.
— Pelo o quê? — questiona sem olhar para mim.
— Por ficar ao meu lado, mesmo quando estou agindo que nem louca
— murmuro.
Danny me olha por cima do ombro e abre aquele sorriso meigo que é
capaz de aliviar um pouco a angustia do meu coração. Meu amigo me faz
acreditar que às vezes, a alma gêmea e o amor da vida de alguém são pessoas
completamente diferentes.
Porque Danny... eu sinto que ele é minha alma gêmea, e no fundo, eu
sei que sou a dele também.
Théo me entrega um pano para limpar o sangue das minhas mãos.
Passo o tecido branco entre os dedos, encarando o imbecil desmaiado à
minha frente e pensando nas últimas três horas.
Sinto que foi uma perda de tempo. Tentei fazê-lo falar alguma coisa,
mas ele não disse nada que eu quisesse ouvir. É apenas um pedaço de merda
que recebeu uma ordem e dinheiro de alguém que ele nem conhece para
seguir e tentar acabar com Liam.
— O mande para Montreal. Julian e Noah vão querer conhecê-lo — é o
que falo para Théo, mas ele não me obedece e fica me encarando com as
sobrancelhas franzidas. Odeio por ele estar questionando as minhas decisões
na frente dos outros.
— Não acho que ele vai resistir até lá. Não seria melhor...
— Não me importa. Só mandem — interrompo-o, o mau humor
palpável. — E limpe tudo.
— Sim, senhor — Théo responde, depois encaminha a atenção para os
outros soldados e começam a fazer o que eu ordenei.
Jogo o pano sujo de sangue no chão e me viro para sair do galpão
abandonado. Caminho na direção do meu carro estacionado e entro ao
mesmo tempo em que sinto o celular vibrar dentro da jaqueta. Ao ver o nome
de Dena, recuso a ligação. A merda do meu dia foi longo demais, e eu não
tenho forças ou vontade para discutir com ela.
Ou com qualquer outra pessoa.

Frustrado e irritado com tudo que aconteceu, dirijo até a mansão.


Ainda não tenha provas, mas eu sei que Liam quase perdeu a vida por
causa do meu tio. E por causa de mim também. Ele ter levado um tiro no
peito depois de ter tentando hackear Lexie ou o computador de Schavier não
é a merda de uma coincidência. Não sou burro e não acredito nessas coisas.
E mesmo que eu não conheça de verdade essa garota, no fundo, estou
torcendo para que ela não tenha nada a ver com isso. Ser uma marionete do
meu tio, tudo bem, mas ter ajudado de alguma forma na tentativa de acabar
com a vida daquele garoto é uma coisa que não posso aceitar de braços
cruzados.
Ao chegar em casa, ouço barulho de televisão e caminho até a sala.
Encontro Lawanda sentada no sofá, vestindo robe de seda e vendo um
programa de televisão. Os olhos parecem distantes, como se não estivesse
aqui de verdade.
— Você está bem?
Ela respira fundo e me olha, a expressão amuada. Sem esperar que ela
me mande ir embora ou deixá-la sozinha, sento ao seu lado e estico a mão
para tocar o cabelo loiro e assanhado.
— A culpa é minha — murmura, o queixo tremendo. — Não devia ter
feito o Liam ir comigo. Eu só queria provocar você e sei lá, mas no fim, ele
morreu por minha causa, Nick. Sinto muito.
Puxo-a contra meu peito e deixo que chore.
Foi por um triz que Liam não morreu, mas a sua situação não é uma das
melhores. Estamos apenas esperando a autorização médica para transferi-lo
para um hospital em Montreal. Deixar vazar a notícia de que ele morreu nos
fundos de uma boate, foi a forma que encontrei de protegê-lo do meu tio. E
mesmo que seja duro, não posso contar a verdade a Lawanda.
Não agora.
Minha irmã não está preparada para saber que Schavier tentou matar
Liam. Para ser sincero, eu nem sei se ela acreditaria nisso. Aquele desgraçado
tem as garras nela e ainda não sei como livrá-la disso.
— Não foi sua culpa. Nunca diga isso de novo.
— A polícia pegou o assassino? — quer saber.
— Pegou — minto, fazendo-a suspirar. — Não se preocupe, certo? Não
pense nisso, Lawa.
Ela assente.
— A mãe dele já sabe? — questiona, os olhos claros brilhando por
conta das lágrimas contidas. — Ele é filho único, não é? Liam me disse.
— Não vamos falar disso.
— Não tem como você me proteger disso, Nick. Eu vi quando o cara
puxou o gatilho e não consigo parar de pensar nisso. Parece um filme
horroroso que eu não consigo esquecer — admite.
Foi por causa de Lawanda que conseguimos encontrar o homem o
culpado. Minha irmã tinha visto o rosto dele e depois de ter dito como ele era,
coloquei alguns homens nas ruas de Toronto para encontrá-lo. Demorou um
dia inteiro para achar aquele pedaço de merda, mas encontramos.
E bem, agora, ele vai desejar estar morto.
Julian e Noah serão piores do que eu, porque Liam é alguém importante
para família Carbone.
— Não se preocupe com isso.
Lawanda levanta de uma vez e abraça o corpo depois de limpar as
lágrimas com uma das mãos.
— Eu preciso sair — é o que fala, fazendo-me unir as sobrancelhas. —
Não espere acordado. Não vou dormir em casa — avisa, girando nos
calcanhares e saindo da sala.
É claro que me incomoda a autonomia da minha irmã. Seria mais fácil
se ela fizesse o que eu mando e ficasse em casa, onde posso cuidar da sua
segurança. Ou em lugares onde meus homens possam protegê-la sem que ela
dê um show na rua.
Ela não é fácil. E infelizmente, não é mais uma criança também.
Por isso, eu tive que colocar um rastreador no seu carro. Claro que senti
como se tivesse traindo a confiança que ela nem tem em mim, no entanto,
fico mais tranquilo assim e um pouco menos preocupado.
Tiro o celular da jaqueta e digito uma mensagem para Théo, avisando
que minha irmã está prestes a sair de casa e que quero alguém na cola dela.
Eles odeiam trabalhar de babá, mas uma ordem é uma ordem.
Quando chego frente a guarita da mansão Farley, desço do meu fusca
amarelo. Noto que foi uma péssima ideia ter vindo aqui, mas não sei se
conseguiria ter feito diferente. Meu bom senso e a culpa que estão assolando
meu peito não teriam me deixado fazer outra coisa.
Há dois seguranças dentro da cabine e um deles me olha de cara feia
enquanto balbucia algumas palavras que não faço a mínima ideia do que
sejam. Levo ar até os pulmões e seguro com força a alça da bolsa antes de
endireitar os ombros e tomar coragem para falar com eles.
Bato com os nós nos dedos no vidro da janela e o homem de cara feia
levanta da cadeira, se aproximando. Eu nunca tinha visto uma guarita grande
desse jeito. Dentro no local tem espaço para duas cadeiras confortáveis, mesa
para cafeteira e frigobar. Olho rápido para o lado esquerdo e vejo as imagens
da câmera de segurança na tela do computador.
— Eu quero falar com Nicholas... com o senhor Farley — me corrijo e
sinto o coração dar um pulo dentro do peito. O maldito passeia com os olhos
de baixo para cima, me analisando e em seguida, arqueia uma sobrancelha
para mim. — Você não fala minha língua? — resmungo quando percebo que
ele não moveu nenhum músculo.
Sem dizer nada, pega o rádio comunicador em cima da mesa e dá
alguns passos para trás. Sem tirar a atenção de mim, fala com alguém do
outro lado da linha. Tento ouvir, mas não entendo nada, apenas burburinhos e
palavras soltas.
— Nome? — pergunta sem sair do lugar.
— Lexie... Lexie Rogen.
Ao me ouvir, o outro homem dentro da guarita pega uma prancheta e
procura por algo nas folhas de papéis e para meu desgosto, nega com a
cabeça para o segurança com o rádio comunicador.
— Eu sinto muito, mas...
— O quê? — retruco, quase gritando e impedindo o homem de
continuar falando. — Você só pode tá brincando com a minha cara. — Sem
conseguir me controlar, bato na janela de vidro com a mão espalmada,
espantando o cara que continua sentado.
— Eu peço que a senhora...
— Não me chame de senhora, eu não sou velha — rosno entre os
dentes e estou pronta para começar a xingá-lo quando um carro para ao meu
lado. Ao olhar, reconheço a motorista, é Lawanda Farley, a irmã mais nova
de Nicholas.
— Eu conheço você — murmura, pensativa. — É a secretária do meu
irmão — conclui sozinha.
Assinto, engolindo em seco.
— Pode me ajudar? Eles não querem me deixar entrar e eu preciso falar
com o seu irmão — decido apelar.
Eu realmente preciso falar com Nicholas, talvez só assim eu consiga
aliviar um pouco da minha culpa e bem, se eu estiver certa, ele corre perigo.
O tio dele é perigoso e eu não posso ter mais sangue nas minhas mãos.
Não vou aguentar.
Lawanda se inclina para o lado e abre a porta do carro para mim. Lanço
um olhar desdenhoso para o segurança de cara feia e mostro o dedo do meio
antes de me acomodar no banco do carona da dona da porra da mansão.
— Obrigada — murmuro, e ela assente, quase sorrindo e pisa no
acelerador quando a cancela levanta, liberando passagem. Entramos numa
espécie de estrada de pedra com árvores dos dois lados. — Sinto muito pelo
que aconteceu — me ouço dizendo.
Lawanda me olha de esguelha e suspira.
— Sente muito por eu ter visto um cara ser baleado na minha frente? —
rebate, meio alterada. Fico sem jeito e quando nota que foi grossa, ela sacode
a cabeça e morde o lábio inferior. — Eu sinto muito. É que... é minha culpa.
Enrugo a testa e fico sem entender. Como a morte de Liam pode ser
culpa dessa garota? Não faz sentindo. Abro a boca para falar, mas fecho no
instante que a vejo começar a balbuciar.
— Eu... eu... eu queria irritar meu irmão, então, arrastei o amigo dele
até lá. E Liam, ele era tão doce, sabe? Não foi difícil convencê-lo a ir comigo.
— Sacode a cabeça e noto algumas lágrimas transbordarem seus olhos. — É
culpa minha. Nick disse que não é, mas não consigo pensar diferente.
— E ele tem razão. Não é culpada por isso — é o que digo, me
sentindo péssima.
Não é culpa dela, é minha. É o meu fardo, mas não consigo falar mais
nada para fazê-la se sentir melhor. Sou uma idiota mesmo. Alguém está
carregando o fardo que devia ser apenas meu.
Ela estaciona o carro em frente à mansão e eu desço depois de
agradecer a carona. Observo a fachada toda em pedras cinzas e fico sem
fôlego, o lugar parece um castelo. Tem três andares, porta dupla e as
molduras das janelas são feitas de madeira envelhecida. E para combinar com
todo o resto, ou não, há dois homens vestindo preto do lado de fora,
escoltando a entrada da mansão.
Na cola de Lawanda, eu entro. No hall de entrada há um porta guarda-
chuva ornamentado, poltronas entalhadas em madeira que parecem ter vindo
direito do século XV, um abajur de requinte descansando em cima de uma
cômoda pequena e uma mesa redonda no centro com um vaso de flores
frescas e cheia de fotos em família.
Acho que o hall de entrada é do tamanho do meu apartamento inteiro.
Nem tenho tempo de pedir para Lawanda chamar Nicholas, pois ela
caminha rápido no rumo das escadas e me deixa sozinha, sem saber para
onde ir. Abro a bolsa e procuro pelo meu telefone, discando o número de
Nicholas.
É claro que ele não atende.
Ouço passos e ao inclinar o corpo e pescoço para o lado, vejo um
homem vestindo preto vindo na direção do hall com o celular colado no
ouvido. Ele não me nota de início, então continua falando.
— ... sim, o médico já liberou a autorização, podemos levar Liam. — É
como um soco certeiro no estômago e eu preciso segurar com força na mesa
para não estatelar no chão. É impossível não sentir os olhos arderem.
— Sim, senhor. — O homem encerra a ligação e para de frente para
mim, com as suas sobrancelhas erguidas. — Quem é você e o que está
fazendo aqui?
Respiro fundo e engulo o caroço na garganta.
— E-eu preciso falar c-oom Nicholas — digo a ele, gaguejando. — É
importante e muito urgente. Pode dizer que Lexie Rogen está aqui?
Em algum momento da nossa conversa de poucos segundos, ele para de
me ouvir e passeia com os olhos pelas minhas roupas. Por que todos os
homens fazem isso? Tudo bem que eu sai de casa usando um conjunto de
moletom de cores diferentes e um tênis que parece maior que o meu pé, mas
eles não deviam me avaliar desse jeito, como se estivessem me dando notas
ou tentando decidir se sou bonita.
As pessoas não são o que elas vestem e nem a beleza que aparentam
ter. Eu por exemplo, pareço inofensiva, mas contribui para acabar com a vida
de alguém inocente.
— Vai ficar me olhando com essa cara de imbecil ou vai chamar o
Nicholas? — falo antes que eu meu cérebro processe as palavras.
Ele inclina o pescoço para o lado e enruga o nariz, fazendo cara de
nojo. E sem aviso prévio, toca meu braço com mais força que o necessário e
tenta me levar para fora da mansão, mas eu resisto.
— Tá me machucando, idiota — resmungo, no entanto ele nem dá bola.
— Me solta! — berro.
Cravo os pés no chão e dificulto o trabalho dele de me tirar daqui. Com
a habilidade que aprendi nas aulas de deseja pessoal que fiz no ensino médio,
consigo me soltar dele, e isso o deixa irritado. O homem estufa o peito e vem
para cima de mim, me preparo para dar um chute certeiro no meio das bolas
dele, quando ouço a voz de Nicholas.
— O que está acontecendo aqui?
O homem que até pouco tempo estava me machucando, paralisa.
— Eu preciso falar com você — me apresso em dizer e dou um passo
para frente, mas o idiota ao meu lado me segura pelo braço. — Me solta ou
vou chutar o seu saco — ameaço.
— Ela vai mesmo fazer isso — é só o que ele fala e o homem solta o
meu braço, faltando apenas fazer continência diante de Nicholas. — Venha.
— Dito isso, dá as costas para mim e adentra a casa.
Tento me recompor e o sigo até uma porta que fica numa espécie de
corredor pequeno. Ele coloca a mão na maçaneta e gira, me fazendo reparar
que é a primeira vez que o vejo com os braços expostos. As veias que saltam
do seu antebraço são sexys e me fazem engolir em seco, me deixando com
um calor estranho no corpo.
— Entre — ele diz quando fico paralisada na porta. — Lexie, eu
realmente não tenho o dia todo e não estou muito paciente hoje, então... —
acrescenta, fazendo aquela cara de bunda.
Dou dois passos para frente e estou dentro da sala, com o coração
latejante. É um escritório, com sofás de couro e estantes cheias de livros.
Sinto que sou o completo contraste do lugar, já que aqui, está tudo no lugar,
enquanto eu, sou uma bagunça total.
— Eu sinto muito — começo, com a voz baixa, escolhendo as palavras
certas. Nicholas que deve estar a três metros de distância, une as
sobrancelhas, deixando um risquinho adorável entre elas. — Sobre Liam... eu
sinto muito.
O corpo dele tensiona, o que me faz perceber que é um assunto
delicado. Ótimo, porque é para mim também. Ainda mais, porque eu, sou
culpada de tantas formas pelo fim da vida de Liam.
— Eu não sabia que se importava com ele — é o que fala, e a sua voz
me atinge como um banho de água fria. — Veio aqui só pra isso? Dizer que
sente muito?
Nego com a cabeça e prenso os lábios, sentindo os olhos arderem.
A vontade que tenho é de dar meia volta e ir para casa, mas não ficaria
em paz com a minha consciência. E eu passei a noite em claro, ensaiando
formas de dizer isso a Nicholas.
— Ele morreu por causa de mim — admito e sinto o ar deixar meus
pulmões. — Sim, eu trabalho... trabalhei pro seu tio. Ele... — A frase morre e
engulo o choro quando noto que Nicholas me encara impassível.
— Continue falando, Lexie — ordena, sério.
— Ele não queria perder a posição dele na Corporação pra você e por
isso me contratou, pra descobrir coisas sobre você que pudessem te
prejudicar de alguma forma. — Respiro fundo e fecho os olhos por uma
fração de segundos. — Liam... eu falei dele pra Schavier depois que ele
invadiu meu computador e... ele morreu. Eu não sou burra, isso não é
coincidência. E eu juro... eu não sabia que algo assim aconteceria com Liam.
— As lágrimas irrompem dos meus olhos sem que eu consiga controlar.
Nicholas fica calado, apenas me encarando e isso consegue me deixar
mais nervosa, assustada. Não sei se ele está acreditando em mim e isso é
desesperador. Agarro a alça da minha bolsa com força e olho para os meus
pés, pensando nas próximas palavras.
— Você tem que acreditar em mim. Por favor.
— Por que eu faria isso? — rebate.
— Eu não sabia que algo assim aconteceria, se eu soubesse... não teria
ajudado Schavier. Nunca. Não teria aceitado esse emprego pra começo de
conversa. — Limpo o choro com as costas das mãos. — Seu tio, é um
homem perigoso, mas não consigo encontrar nada que possa provar isso. Eu
tentei encontrar algo que pudesse ligar ele com a morte de Liam, mas nem
consigo invadir o computador dele — admito, chorando.
Ele suspira, como se tivesse saído do transe.
— Aquele garoto... morreu nas minhas mãos, Lexie. Ele... — O
músculo do maxilar contrai ao desviar os olhos furiosos de mim. — Eu sou
culpado, não devia tê-lo trazido pra cá, mas o sangue dele está nas suas mãos
também.
— Eu sei — admito em um sussurro, mordendo o lábio inferior. — Eu
sei e sinto muito. Ele não merecia isso. Se eu pudesse teria feito diferente,
mas esse é o problema, né? Não tem como voltar atrás.
Os olhos dele brilham, não sei de tristeza ou de ódio. Suspiro, na
tentativa inútil de acalmar meu coração com batimentos desenfreados. Mordo
o lábio inferior ao perguntar.
— Ele sofreu?
— Não — fala, mas não consigo acreditar na resposta. — O que você
disse pro meu tio? Sobre mim? — quer saber.
Sacudo a cabeça de um lado para o outro.
— Nada. Eu não consegui descobrir nada. Não sei se você lembra,
mas... fui demitida antes de completar uma semana de trabalho — retruco, e
mesmo que tenha tentado soar normal, a voz saiu meio rancorosa.
— Ainda está trabalhando pra ele?
Arregalo os olhos, perplexa e mesmo sem ter direito, muito irritada. Eu
vim aqui para assumir minha parcela de culpa e ele acha que ainda estou
trabalhando para a merda do tio dele?
— Claro que não — retruco, alterada. — Você acha que eu viria aqui
se ainda estivesse trabalhando com ele? Depois do que ele fez com o Liam?
Embora eu tenha certeza que você não vai acreditar, mas eu não sou um
monstro. Sou uma pessoa que fez merda e vai viver pra sempre com essa
culpa.
Ele suspira e faz um gesto quase imperceptível com a cabeça,
concordando. Pega o celular do bolso traseiro da calça jeans e digita alguma
coisa, e só então, volta a atenção para mim.
E eu não sei o que pensar.
— Eu tenho um problema e preciso voltar pra Montreal — avisa e eu
assinto, entendendo o recado. Dou um passo para atrás e antes que possa sair
da sala, ele continua. — Aonde pensa que está indo? Você vem comigo.
Preciso que resolva algo pra mim.
Franzo o cenho, confusa.
— O quê? Eu? Por quê? — balbucio.
Nicholas corta a nossa distância e eu tenho que levantar o queixo para
encarar os intensos olhos azuis e severos dele. São cortantes, mas sexys pra
caramba. O homem parece que está sempre bravo. Acho que nunca o vi sorrir
pessoalmente.
— Eu tenho um problema e não conheço ninguém como você.
— Um problema? Além do que aconteceu com Liam? — questiono,
sem saber se eu devia ou não estar fazendo perguntas.
— Sim.
— Eu não posso voltar pra Montreal — admito.
— Por causa do seu pai? — retruca e eu enrugo a testa. Antes que
possa perguntar como ele sabe disso, chego à conclusão de que graças a
Liam, Nicholas deve saber muita coisa sobre mim.
Decido ignorá-lo.
— O que você quer de mim?
— Liam... — articula com a voz firme, olhando dentro dos meus olhos.
— Ele é... era importante pra minha família — ele diz como se isso fosse
explicar muita coisa.
— Como assim? O que você quer dizer?
— Vamos.
Nicholas pega meu cotovelo e eu tento ignorar a comichão que o seu
toque quente causa em mim. Ele me arrasta até para fora do escritório, mas ao
contrário do homem do hall de entrada, não me machuca, apesar do toque
firme.
— Eu não posso ir com você.
— Isso nunca esteve em cogitação, Lexie.
Consigo me soltar dele no hall de entrada e está na cara que Nicholas
fica irritado, mas foda-se, ele não pode me arrastar assim. Quem ele pensa
que é? Esse homem arrogante e sarado pode ser podre de rico e dono de
muita coisa, mas não de mim.
— Eu não vou com você! — esbravejo.
Ele respira fundo, parece com alguém que está implorando por
paciência. Tomo um susto quando Nicholas se inclina e aproxima o rosto do
meu, me fazendo sentir a sua respiração contra mim.
— Eu já desconfiava sobre o que meu tio tinha feito, você só confirmou
todas as minhas suspeitas.
— Ah — é o único barulho que sai da minha boca.
— Mas agora me diz, o que acha que vai acontecer com você, Lexie?
Não acha que pode ser o próximo alvo do meu tio? — questiona, sério.
Abro a boca para falar, mas não consigo dizer nada. Ele tem razão.
Droga. Eu não tinha parado para pensar nisso. É claro que Schavier vai
querer eliminar qualquer coisa ou testemunha no meio do caminho.
Pisco devagar, sentindo falta de ar.
— Respire fundo — ele pede, ou ordena, não sei. — Fique calma,
Lexie.
— Seu tio vai me matar também — falo e ouvir que posso morrer a
qualquer momento não é lá muito reconfortante ou animador. — Ele vai me
matar. Eu sei, ele vai. Ah, merda. Eu não devia ter aceitado o emprego.
— Ele não vai tocar em você — Nicholas diz, me fazendo olhá-lo
confusa, mas fico em silêncio.
Noto o peito dele subir e descer, e quando me dou conta, estou
dançando com os olhos sobre os braços musculosos cheios de veias expostas,
fantasiando a possibilidade de ele me proteger de algum possível evento
catastrófico.
Ai meu Deus, eu acho que preciso de sexo.
— Está me ouvindo, Lexie? — ele chama minha atenção.
— Hãm?
Nicholas revira os olhos, impaciente.
— Vamos, eu não tenho o dia todo.
Gira nos calcanhares, mas fico no mesmo lugar, sem conseguir dar um
passo para frente. Quando ele nota que não o estou seguindo, vem ao meu
encontro em passos firmes e com aquela expressão carrancuda desenhada no
rosto.
— Você disse que eu preciso resolver algo. O que isso significa? —
pergunto, entrelaçando os braços contra o corpo.
— Significa que você vem comigo.
— Tem a ver com computadores, né? Não posso resolver o problema
daqui? — questiono com o coração acelerado. Nicholas abre a boca para
argumentar, quando Lawanda surge no fim das escadas. Ela oscila as vistas
de nós para as malas no hall que eu nem havia notado estarem ali.
— Você está indo embora?
— Sim — ele murmura, encarando a irmã. — Eu preciso levar Liam de
volta, a mãe dele precisa vê-lo.
Ouvir aquilo me deixa com um gosto amargo na boca e uma sensação
de areia nos olhos. Por causa de mim, uma mãe está chorando pela morte de
um filho agora. Por causa de mim, alguém inocente morreu.
— Você volta? — Lawanda pergunta, mas Nicholas não consegue
responder. — Você não volta — conclui em voz alta.
— Eu volto quando você precisar de mim. — Ao ouvir as palavras
dele, ela vira o rosto e tenta esconder os olhos marejados. — Deixei meu
endereço e alguém vai ficar aqui cuidando de você.
Sem dizer nada, ela dá as costas e sobe as escadas, pisando duro.
— Você vai deixá-la aqui? Sozinha? Você perdeu o juízo? Eu disse que
o seu tio é perigoso — falo baixo e quando me dou conta, estou segurando o
braço forte de Nicholas. Afasto-me rápido e sacudo a cabeça, tentando me
recompor. — Não pode deixá-la aqui, sozinha.
— Ela não vai ficar sozinha — é o que fala para mim. — E mesmo
assim, Schavier ama minha irmã, porque a criou desde que ela tem doze anos.
Não acredito que vá fazer mal a ela.
— Tem certeza disso? — questiono, intrigada.
— Não estaria indo se não tivesse.
Dito isso, ele volta a tocar meu braço e me puxar para fora da mansão.
Abre a porta do carro e me espera acomodar no banco traseiro, em seguida,
ocupa meu lado, sem olhar para mim.
— Meu melhor amigo... — digo e devagar, ele vira o rosto na minha
direção. — Eu posso ter falado algumas coisas pra ele — admito, tristonha.
— Tenho medo que algo de ruim aconteça.
Nicholas assente, mas não diz nada. Pega o celular de dentro do bolso
da calça e os dedos ágeis digitam alguma mensagem para sei lá quem, mas
sem saber o porquê, fico meio aliviada.
Talvez ele proteja Danny também. Espero que sim.
— Meu carro — volto a falar.
— O que tem ele?
— Tá estacionado na frente da guarita.
— Não se preocupe com isso, Lexie.
— Realmente não posso ficar aqui? — insisto, mas Nicholas decide me
ignorar. — Preciso avisar meu melhor amigo que vou ficar uns dias fora. —
Tiro o celular da minha bolsa e gesticulo com o aparelho, Nicholas faz que
sim com a cabeça mais uma vez. — Ele vai ficar bem, né? Danny?
— Ninguém vai fazer mal ao seu amigo.
— Obrigada.
Digito uma mensagem para Danny e noto que nem tremendo eu estou.
Devia estar com medo, já que do nada, Nicholas decidiu que eu vou para
Montreal com ele, porque preciso resolver um problema que eu nem sei o que
é e porque ficar aqui é perigoso.
No entanto, mesmo com essa expressão assustadora e sexy que ele tem,
parece seguro ficar com Nicholas.
— Você é corajosa — fala, de repente.
Olho para Nicholas, confusa.
— Como assim?
— Você veio até a minha casa falar a verdade.
Respiro fundo e assinto.
— Mas eu poderia ter mentido e você estaria levando uma inimiga pra
sei lá onde no momento — murmuro. Droga. O que deu em mim? Acabei de
dar ideia que eu poderia estar mentindo.
Nicholas vira o rosto para mim, os olhos cortantes dançando pelos
meus.
— Eu sei quando alguém está mentindo pra mim, Lexie. Você pode ser
malandrinha e irritante, mas não é uma mentirosa. Isso também é um aviso.
Saberei sempre que estiver mentindo. Então, te darei um aviso, nunca minta
— fala, e eu respiro fundo, assentindo.
Eu não sei se isso foi uma espécie de elogio ou ameaça, mas aos meus
ouvidos, soou sexy pra caramba.
— Por favor, não me obrigue a fazer isso — Lexie fala com os olhos
marejados. Acabamos de estacionar o carro em frente a uma casinha de um
andar com fachada de tijolos vermelhos. — Eu não posso fazer isso. — Ela
limpa algumas lágrimas que ousaram fazer caminho pelas bochechas
salientes com as costas das mãos.
— Por que não?
Lexie olha para mim.
Eu devia estar odiando a garota no momento, mas não consigo. Ela não
é uma pessoa ruim, só se envolveu com quem não devia. Mesmo que eu
tenha dito que o sangue de Liam está nas mãos dela, a verdade é que não está.
O único culpado de tudo que aconteceu sou eu. E meu tio.
Ela foi corajosa o suficiente para ir atrás de mim e assumir a culpa que
acha que tem. Isso é de se admirar. Lexie não fugiu ou se escondeu do
problema. Conheço homens que se acham corajosos, fortes e não tem uma
parcela da bravura dessa garota.
E é claro que eu não estava pensando direito quando a enfiei dentro do
carro e a trouxe para cá, mas não podia deixá-la sozinha em Toronto,
correndo o risco de meu tio fazer alguma coisa.
E eu preciso da ajuda dela de verdade.
— Eu tinha quinze anos quando minha mãe morreu — fala baixo, com
a voz embargada e em seguida, volta a olhar para casa do seu pai. — E ele
não conseguiu lidar com a dor, então me abandonou por anos, e quando
voltou, era um alcoólatra. — Lexie chora em silêncio, me fazendo notar que o
assunto ainda é muito delicado para ela.
Não consigo impedir de me sentir um idiota.
— Eu não fiquei sozinha, sozinha. Tinha minha avó, mas mesmo assim,
era o meu pai. Ele devia ter ficado comigo, não? Doeu ser abandada por
alguém que supostamente era pra me amar acima de tudo. Mas quando meu
pai voltou, eu fiquei feliz. Qual filha não ficaria? — Deixa escapar uma
risada seca e entrelaça os dedos das mãos. — Mas ele estava tão quebrando,
que não conseguimos ser felizes de novo.
— Lexie... — murmuro, sem saber o que dizer.
— Ele está tentando, sabe? Só que ainda não consigo e me sinto uma
péssima filha por isso. Um dia, vamos resolver os nossos problemas, mas não
hoje. — A garota cruza o olhar com o meu e eu engulo em seco. Os olhos
verdes foram sempre tão afiados quando se direcionavam para mim, mas
agora, só parecem tristes. — Não me obrigue a fazer isso, Nicholas.
Assinto.
Bato no banco do motorista e o soldado pisa no acelerador, entendendo
a ordem sem que eu tenha que dizer em voz alta. A garota ao meu lado funga
e me encara com os lábios carnudos prensados.
— Obrigada.
Quase vinte minutos mais tarde, estamos entrando no meu apartamento.
Ela cruza os braços na altura dos seios e conforme vai caminhando para o
meio da sala, os olhos curiosos passeiam pela mobília.
Lexie não parece mais tão triste e sem saber o porquê, fico aliviado.
— Então, quer dizer que você faz o estilo minimalista? É bem diferente
da mansão em Toronto, mas até que eu gostei. Não é tão intimidador como a
sua cara.
Finjo uma tosse, fazendo-a me olhar.
— Desculpe — murmura e tenta esconder o sorriso. Respira fundo e
assente ao fazer um bico com os lábios convidativos. — Não se preocupe,
será como se eu não estivesse aqui.
Sorrio de lado.
— Acho que isso é impossível.
Lexie pisca rápido e une as sobrancelhas. O rosto para mim é como um
ponto de interrogação.
— Por quê?
— Você chama muita atenção.
A garota abre a boca para retrucar, mas semicerra os olhos e volta fazer
bico, parecendo trabalhar as engrenagens da cabeça fértil por detrás dos olhos
verdes esmeraldas.
— Tem razão — concorda e eu até me pego sorrindo por causa disso.
— Ah, então quer dizer que você sabe sorrir? — pergunta, transformando a
boca atrevida em um sorriso também.
— Às vezes — resmungo.
— Onde eu vou ficar?
— Tem um quarto de hóspedes ali. — Aponto para um canto do
apartamento atrás dela. — E tem um banheiro no final do corredor.
— Ah, tá certo. Eu não trouxe roupa, como vamos fazer? Você meio
que não me deu opção de passar em casa e fazer as malas.
E eu tento. Eu tento de verdade. Mas sou um tarado e é mais forte do
que eu. Então, meus olhos flanam sem vergonha nenhuma o corpo de Lexie e
eu até consigo imaginá-la andando nua pelo meu apartamento, me
provocando com as belas pernas e me fazendo desejar as suas curvas. Me
fazendo querer afundar nesse corpo quente e sinuoso.
Uau.
É uma visão e tanto e deixa meu corpo em chamas.
Talvez, eu tenha que me aliviar mais tarde... pensando nela. Droga.
Vou fazer isso sem sombra de dúvida. Ainda mais sabendo que ela vai estar
perambulando por aqui, tão perto de mim.
Tento me recompor e pensar com a cabeça de cima. Mesmo que eu
queira e no momento, parece que eu quero muito, não posso levar a coisa
para o outro lado. Ou melhor, para minha cama.
Lexie me parece o tipo que não se conformaria sendo apenas mais uma
na minha cama e eu nem lembro a última vez que eu fiquei sério com uma
garota.
Talvez sete anos atrás?
Nós dois nunca daríamos certo. Ela é muito diferente de mim.
Enquanto eu enxergo tudo em preto e branco, Lexie vê tudo colorido. E a
garota é inteligente demais para se envolver com um homem como eu.
— Que tamanho você veste? — pergunto e sem conseguir me controlar
de novo, danço com as vistas pelo corpo dela. Droga. Se controle, Nicholas.
Não seja um babaca. — Vou pedir pra alguém comprar algumas roupas.
— Ah, claro. — Sorri sem jeito. — Como você já deve ter percebido,
meu quadril é um pouquinho grande... — E eu paro de ouvir o que ela está
falando e a atenção cai sobre os seus quadris.
Ela tem razão. É um belo quadril e tem uma bunda saliente, daquelas
que dá vontade de sair dando palmadas toda vez que for malcriada ou
simplesmente para ter a mão segurando esse rabo bonito.
Não é nada exagerado, é sexy pra caralho. Como vou sobreviver a isso?
Só de pensar no corpo dela, automaticamente estou enviando ondas para o
meu pau e estou a ponto de ter uma ereção.
— Nicholas — ela chama. — Você ouviu o que eu disse?
— Claro — minto. — Qual é o seu tamanho mesmo? — pergunto,
sério, tentando esconder o fato de que eu estava me imaginando com a mão
na bunda dela.
Acho que não foi uma boa ideia trazer Lexie para o meu apartamento.
No canto direito da sala, perto das janelas da varanda, os técnicos da
loja de informática ajeitam em cima da mesa grande, os computadores de
ponta que comprei para Lexie.
— Uau — Lexie fala ao surgir na sala, admirando os computadores
montados. — Qual é a ocasião?
Os dois técnicos paralisam com a visão da garota usando short curto,
que valoriza os quadris salientes e regata preta, ressaltando a comissão de
frente enquanto seca os cabelos loiros com uma toalha branca.
Com os nós dos dedos, dou três batidas fortes na mesa, tremendo o
teclado e mouse ao mesmo tempo em que assusto os moleques. Ergo uma
sobrancelha e depois olho para os computadores.
Eles entendem e voltam a trabalhar.
Para meu desgosto, Lexie se aproxima dos técnicos e começa uma
conversa chata sobre processadores, que eu não faço a mínima ideia do que
significa. A malandrinha ainda tem a cara de pau de reclamar da minha
internet para os moleques.
Fazendo força para não ficar olhando Lexie e as pernas de fora,
acompanho os técnicos até a porta.
— Tô falando sério, você precisa de uma internet com conexão de fibra
óptica — resmunga ao colocar a toalha no ombro e arrastar a cadeira de
frente para a mesa e acomodar a bunda nela. — Sua vida vai melhorar depois
disso.
— Ok, obrigado pela informação — retruco com um tom claro de
sarcasmo. Aproximo-me de Lexie, tentando ficar numa distância segura. —
Preciso que faça algo.
Ela pega uma mecha de cabelo molhada e coloca entre os lábios
carnudos e rosados por uma fração de segundos, e em seguida, assente,
pensativa. Devagar, os olhos grandes e verdes se encaminham para mim e me
prendem num olhar curioso.
— É algo ilegal, né? — questiona. — É claro que é ilegal — acrescenta
e solta um suspiro longo.
— Não é nada diferente do que você já faz — digo, tentando
tranquilizá-la. Ela franze o cenho, confusa. — O quê? Hackear o computador
de alguém não é crime no seu mundo?
— Eu prefiro dizer que é um passatempo — murmura ao mexer nos
ombros como uma garotinha inocente. — Crime é um termo meio pesado.
Meus lábios repuxam de leve ao ouvi-la. Ela não pode estar falando
sério. Mas Deus, ela está sim.
— Ok, passatempo — murmuro e ela sorri, contente. — Lexie —
chamo e ela fica séria, me encarando. Antes que possa voltar a falar, a
campainha toca. Giro nos calcanhares e rumo na direção da porta.
É Thomas.
Ele dá uma batidinha no meu ombro e vai longo entrando, fazendo um
barulho estranho com a boca ao se deparar com a loira molhada de frente para
o computador na sala.
— Oi — Lexie sussurra.
— Oi, eu sou Thomas. Thomas Greenwood. — Ele se aproxima dela e
estende a mão, que a garota pega ao ficar de pé. — E você é?
— Lexie Rogen — é o que diz, fazendo Thomas arquear uma
sobrancelha para mim.
Thomas se afasta de Lexie, que volta a atenção para o computador e
vem até mim, me empurrado na direção do hall de entrada do apartamento.
Ele abre a boca para falar, mas fecha e inclina a cabeça para dar uma espiada
na loira.
— Sério? — indaga, cético. — Não é essa garota que trabalha para o
seu tio? — questiona, tentando manter o nível da voz, mas não consegue.
— Trabalhava — corrijo.
— O que ela está fazendo?
— Ajudando — é a minha única resposta.
— Como isso aconteceu? Não faz vinte e quatro horas que você disse
que tinha quase certeza que Schavier mandou matar Liam e que Lexie Rogen
trabalha para o...
— Trabalhava — corrijo de novo, fazendo-o soltar um suspiro de
chateação.
— O que acha que vai acontecer com essa garota quando ele souber
que ela está aqui? Com você? Com certeza, vai vir atrás dela e as coisas
podem não ficar bonitas.
Assinto, contraindo o músculo do maxilar ao sentir um gosto amargo
na boca.
— Eu vou protegê-la — falo antes que meu cérebro processe as
palavras. Thomas me observa, incrédulo. — O que foi? — emendo,
começando a ficar irritado.
— Você e Julian Carbone... são farinha do mesmo saco — conclui em
voz alta. — Os dois homens da família com senso de proteção sempre
ativado. Típico. Não podem ver uma donzela em perigo.
— Cala a boca.
— Certo, proteja a sua garota. Mas antes... — diz ao pressionar com
força contra meu peito a pasta de plástico cheio de papéis que está segurando.
— Tudo que você precisa para mudar a sede matriz da corporação de cidade.
Mesmo assim, ainda precisa da aprovação do conselho pra fazer isso
acontecer. Não vai ser fácil.
— Certo.
— Andei dando uma olhada, existem alguns prédios à venda no centro.
Estão aqui todas as minhas recomendações.
Respiro fundo e assinto.
— Obrigado, Thomas.
Ele inclina a cabeça de novo para o lado, a fim de observar Lexie. Faço
o mesmo e noto que ela está com os dedos ágeis passando pelos teclados do
computador, fazendo alguma coisa. Ou fingindo que está fazendo algo e
ouvindo nossa conversa, que não é uma das mais discretas.
— Boa sorte — fala, dando uma batida forte no meu ombro. Se afasta
de mim e vai se despedir de Lexie, depois volta para perto da porta. — Te
vejo mais tarde — fala ao parar na soleira, mas o impeço de sumir corredor
afora quando pergunto baixo.
— Como estão as coisas com Liam?
— Melhorando — responde com um sussurro e vai embora.
Volto para sala e jogo a pasta em cima da mesinha de centro. Lexie
levanta e vem até mim, ficando perigosamente próxima demais. Consigo até
ver os bicos dos seus seios redondos e empinados enrijecidos.
É uma tentação do caralho.
— Julian Carbone? — questiona com os olhos e boca escancarados. —
Esse Julian Carbone, por alguma razão, é o mesmo Julian Carbone que é filho
do Francesco Carbone? — pergunta o óbvio.
— Sim, por quê?
Lexie respira fundo e senta no sofá, estupefata.
— Meu Deus — murmura.
— Que foi?
Ela levanta os olhos e franze os lábios rosados, transformando o rosto
em uma tremenda careta engraçada. Lexie passa os dedos entre os cabelos
molhados e em seguida, pousa as mãos nos ombros, massageando a si
mesma.
— Quando você disse que Liam era importante pra sua família, não era
a família de sangue que estava se referindo, não é? Não era a família Farley
de quem você estava falando, não é?
Encaro Lexie, que continua a massagem nos próprios ombros e fazendo
com que os seios fiquem ainda mais visíveis. Não consigo dizer nada. Ela
sabe de algo que eu não estava preparado para discutir agora. Ou talvez,
nunca.
— Eu pensei que era lenda urbana... — sussurra.
— O quê? — me ouço perguntando.
— Você é um mafioso — fala, me deixando sem palavras mais uma
vez. Ela é esperta demais. Como chegou a essa conclusão tão rápido? — Não
faça essa cara — acrescenta, revirando os olhos e bufando.
Lexie fica de pé, começa a andar de um lado para o outro e roer as
unhas pintadas de preto. Decido sentar no sofá e observá-la. Apesar de
parecer um momento crítico, é bom admirar as belas pernas passeando na
minha frente.
— Achei que era mentira.
— O quê? — é a única coisa que pergunto.
— Só sabe dizer isso? — retruca, e eu a encaro, sério. Ela suspira e
fecha os olhos por uma fração de segundos, e volta a sentar no sofá, próximo
de mim. — Eu cresci aqui. Minha mãe me contava histórias sobre a família
Carbone, mas eu pensei que fosse lenda urbana, sei lá.
Assinto, mas decido não dizer nenhuma palavra sobre. Sinto que nem
se eu quisesse, ela me deixaria falar agora. As engrenagens do cérebro de
Lexie parecem estar trabalhando a mil por hora.
— Mas tudo faz sentindo. — Olha para mim, as duas esmeraldas mais
verdes do que de costume. — Você e todos aqueles homens de preto na
mansão. E a coisa ilegal que você quer que eu faça. É problema da máfia, né?
— questiona, porém, não quer respostas. — É claro que é da máfia.
Levanta de novo e volta a andar para lá e para cá.
— Por isso... você não voltou quando a sua mãe veio atrás de você —
diz, me surpreendendo. Como ela sabe dessa merda? Antes que tenha a
chance de questionar, ela continua: — Foi por isso também, que ela gastou
toda aquela fortuna para manter a mídia sobre controle.
— Andou pesquisando sobre mim.
Ela revira os olhos.
— Se tá na internet, eu descubro, não fique ofendido — retruca,
mordendo o lábio inferior. — Droga. Seu tio deve saber disso, sobre você —
deduz, sozinha.
— Como?
— É claro que sabe, por isso me contratou. — Ri sozinha. — Ele queria
me usar, é claro. Schavier esperava que no fim, você mesmo acabasse
comigo.
Enrugo a testa, confuso. Encaro a garota ligada no duzentos e vinte à
minha frente.
— Está tirando conclusões precipitadas.
De supetão, ela senta perto de mim. Tão próximo, que eu engulo em
seco ao sentir o cheiro de sabonete e shampoo que o corpo e cabelos estão
exalando para o meu nariz. É um cheiro bom e que está me impedindo de
raciocinar.
— Não, eu não costumo estar errada — admite, me fazendo levantar
uma sobrancelha para ela. Venho fazendo tanto isso nos últimos dias, que
daqui a pouco, o ponto de interrogação vai ser a única expressão possível no
meu rosto. — Minha mãe me contou muitas histórias sobre a família
Carbone, mas eu nunca acreditei de verdade. Achei que fosse mentiras pra me
manter longe dos meninos.
— Longe dos meninos? — questiono, intrigado.
Ela respira fundo e depois começa a rir sozinha.
— Eu sempre... entrei em confusão, porque parece que ela gosta de
mim. E os irmãos Carbone sempre chamaram muita atenção. Eu só tinha
quatorze anos e sei que eles nunca olhariam pra mim, mas não conhecia uma
garota da minha idade que não tivesse uma queda por eles. Então, minha mãe
tinha medo que eu me apaixonasse, por isso, ela me contava essas histórias
para me manter longe deles. Imagina como seria se uma garota de quatorze
anos se apaixonasse por um mafioso? Loucura, né? Exatamente, era o que
minha mãe pensava.
Me pego sorrindo.
— Sua mãe era inteligente — digo, e ela assente de lábios prensados e
uma expressão adorável no rosto. — Você também, Lexie. Muito.
— Obrigada. — De repente, noto um lampejo de preocupação passar
por seus olhos. — Liam fazia parte da máfia, não é?
— Mais ou menos — é o que respondo.
— Vou pagar com a minha vida? — pergunta. Os olhos brilhando de
tristeza e o canto da boca franzido. — Eu sinto muito sobre ele.
— Não se preocupe, Lexie. Você não corre perigo comigo — digo,
quase como se fosse uma promessa.
Ainda não tinha contado a Julian ou Noah sobre Lexie ter falado com o
meu tio sobre Liam, e eventualmente, o garoto foi baleado. É claro que eles
não vão ficar contentes quando descobrirem.
Mas ela também é apenas uma garota, que se meteu com a pessoa
errada e pelo que parece, vive metendo os pés pelas mãos. Não merece pagar
com a vida pelo que aconteceu com Liam.
Já o meu tio...
E eu sei que deveria dizer algo agora e deixar Lexie mais tranquila, mas
sinto que ainda não é a hora de contar sobre Liam. Não posso arriscar a vida
daquele garoto de novo, preciso primeiro dar um jeito em Schavier.
— Obrigada, Nicholas — sussurra, sem desviar os olhos de mim. — Eu
vou te ajudar... ajudar vocês com o problema.
Concordo com um aceno de cabeça, mas não digo nada.
— Sabe? Não sei o que é pior. Estar nas garras do seu tio ou nas garras
da máfia — brinca de repente, quase me roubando uma risada. — Muito cedo
pra fazer piada? — Arqueia uma das sobrancelhas loiras para mim, rindo e
fazendo o som ecoar pela sala inteira.
Depois que meu pai se foi e eu me juntei à família Carbone, eu aprendi
a gostar da solidão. Aprendi a gostar de ficar sozinho. Isso era quase um
hábito, na verdade. No entanto, olhando Lexie rindo agora, por algum motivo
que eu não sei o que é, ela me faz questionar meus gostos.
Ela me faz questionar a solidão que vive dentro de mim há tantos anos.
Decido deixar Lexie na sala, se divertindo com os computadores.
Preciso de espaço e ficar perto dela não vai me ajudar na minha nova missão:
manter meu pau longe dela. Caminho até o quarto enquanto tiro a camisa no
meio do caminho e ao entrar no banheiro da suíte, meus pés paralisam.
Droga.
Tem uma calcinha de seda branca e um sutiã da mesma cor pendurados
no box.
Claro que quando trouxe Lexie para meu apartamento, não estava
pensando nos problemas que teria que enfrentar. Como por exemplo, ela
sendo ousada o suficiente para usar o meu banheiro em vez do que fica no
corredor.
Entro e fecho a porta, encarando a calcinha como se ela tivesse vida
própria. Isso com certeza será munição para minha imaginação tarada no final
da noite.
A calcinha dela parece chamar por mim, mas controlo meus instintos
primitivos e vou para o chuveiro como se não estivesse pensando que a seda
branca estava cobrindo a bocetinha dela horas atrás.
— Computador hackeado com sucesso. Mais um crime para a conta,
muito obrigada — falo ao levantar da cadeira e alongar os braços.
Propositalmente, giro o corpo e decido admirar Nicholas se exercitando na
varanda.
É a primeira vez que vi alguém usar o espaço da sacada de casa para
fazer uma mini academia, mas Deus, uau, valeu muito a pena. E é uma
distração e tanto. É difícil me concentrar no que tenho que fazer quando o
ouço soltar gemidos involuntários ao fazer barra fixa.
Eu nunca gostei de academia, por isso que nunca consegui me desfazer
da minha pequena saliência na barriga. Mas Jesus amado, se esse homem for
meu personal trainer, eu encaro uma esteira sem problemas.
Confesso que não entendia bem quando Danny ficava animado ao ver
um homem sarado todo suado. Mas acho que isso está começando a fazer
algum sentindo dentro da minha cabeça.
E eu não sabia que podia me interessar por esse tipo de ser humano,
mas é isso. Ele consegue mexer comigo e me deixar confusa e excitada na
mesma medida. E não faço a mínima ideia do que fazer com essas sensações
que os olhares dele causam em mim.
Não faz nem vinte e quatro horas que estamos sob o mesmo tempo e já
aprontei ao usar o banheiro da suíte e e deixar roupa íntima pendurada no
box. O que deu em mim? Não faço a mínima ideia, mas hoje cedo pareceu
divertido provocar.
Porém, ele não disse nada.
Talvez, eu também não faça o tipo ideal de Nicholas. Um homem como
ele parece gostar de modelos magérrimas, que gostam de comer salada e
vivem na academia para perder uma grama a mais que ganharam no final de
semana.
E definitivamente, estou longe de ser uma modelo de passarela ou me
portar como uma.
De repente, Nicholas se pendura e passa as pernas na barra, deixando o
corpo invertido. Engulo em seco quando ele começa a fazer abdominais de
cabeça para baixo. É incrível, os músculos das suas costas e barriga parecem
se transformar toda vez que ele sobe com o tronco.
Foi por isso que demorei mais do que o normal para invadir o
computador de uma pessoa comum. Nicholas malhando é minha distração.
Ao notar que estou olhando/babando, ele desce da barra, pigando suor e
me deixando com água na boca. Pega a garrafinha de água em cima do banco
de academia e toma um gole generoso, em seguida, atravessa as portas de
correr da varanda e vem até mim, parando três passos de distância.
Apesar de tentar não continuar secando o corpo dele, é impossível.
Parece que tem imãs nos meus olhos e eles não conseguem desviar dos
gominhos na barriga de Nicholas. Ele tem algumas cicatrizes e eu fico me
perguntando como as conseguiu. Mas mesmo assim, é lindo. É tudo tão
definido e visivelmente duro, que dá vontade de levar os dedos até o
abdômen dele e tocar para senti-lo de alguma forma.
— Como conseguiu essas cicatrizes? — a boca pergunta antes que o
cérebro processe as palavras, e quando me dou conta, estou com a mão indo
no rumo do abdômen delicioso dele. Paraliso no meio do caminho. — Eu
sinto muito, não é da minha conta.
— Conseguiu algo? — quer saber. E eu de verdade, penso em
responder, mas ainda estou numa espécie de êxtase, sem conseguir parar de
admirar essa obra de arte. — Lexie? Meus olhos estão aqui.
Surpreendentemente, Nicholas toca meu queixo e me faz encarar as
duas pedras azuis e hipnotizantes, que são seus olhos.
— Uhum — murmuro.
— Converse comigo.
Dou um passo para trás e engulo em seco, respirando fundo e tentando
colocar a cabeça em ordem. Ainda não sei o que fazer com o fato de eu me
sentir atraída por ele, mas preciso me controlar.
— Sim — falo com certa dificuldade. — Não foi tão difícil, me dê
alguns minutos e logo terei algo relevante pra você.
— Ok. Vou tomar um banho.
Dito isso, ele passa por mim e eu prendo a respiração para o bem da
minha saúde mental. Observo-o colocar a garrafinha em cima da ilha da
cozinha, que é ligada à sala e em seguida, caminhar rumo ao seu quarto.
Por que diabos ele me avisou que vai tomar banho? É como abastecer
minha cabeça fértil.
Dou algumas respiradas fundas antes de sentar em frente ao
computador de novo e tentar focar no meu trabalho. E em questão de
minutos, a imagem do corpo sexy de Nicholas evapora da cabeça e eu fico
horrorizada com o que encontro no computador do policial.
Ele é dono de um site de pornografia infantil na dark web[11].
Enojada, arrasto a cadeira para trás e levanto, caminhando até a cozinha
para beber água. O coração acelerado e a cabeça pensando em maneiras de
punir esse homem nojento. Ele é policial, devia proteger as pessoas, mas é
apenas um monstro disfarçado na pele de cordeiro.
Decidida a fazer alguma coisa sobre o assunto, volto para o
computador, reúno todas as informações relevantes e armazeno em um pen
drive, em seguida, envio em um e-mail anônimo. Estou tirando o dispositivo
da CPU quando Nicholas retorna do banho.
Tento ignorar o cheiro de sabonete cítrico que o seu corpo exala e
começo a falar.
— O que está pensando em fazer com ele?
Nicholas prensa os lábios e suspira, parece estar tentando decidir se
deve ou não me contar o que tem em mente.
— Ele é corrupto. Por anos, nos ajudou, mas agora, ele simplesmente
quer trabalhar por conta própria e usar o nosso porto pra contrabandear
heroína.
— Vocês são donos do porto? — questiono, pasma. — É claro que sim.
Vocês são donos da cidade inteira — concluo sozinha, sem saber como me
sentir em relação a isso.
— O que encontrou?
— Depende — retruco.
— Depende do quê? — pergunta, rompendo a nossa distância e sem
aviso prévio, pega a o pen drive das minhas mãos, mas por incrível que
pareça, foi um gesto delicado. — O que tem aqui?
— Vou perguntar de novo, o que está pensando em fazer?
Os olhos severos se prendem aos meus de forma enigmática, me
hipnotizando e me fazendo querer mais. Nicholas me faz querer mais de algo,
que eu não faço a mínima ideia do que é.
— Matá-lo de medo e colocá-lo no lugar dele, se não der certo... bem,
eu... — Nicholas não termina a frase.
Sem pensar muito, pego o pen drive das mãos grandes de Nicholas,
tentando não estremecer com o calor que sinto ao roçar meus dedos nos dele.
— Eu preciso de mais.
Uma linha surge entre as suas sobrancelhas.
— Como assim?
Respiro fundo e ergo os ombros, decidida, confiante e certa do que
tenho que fazer. Colocar esse homem no lugar dele não é nada. Ele é
perverso e nojento, merece pagar por todas essas coisas nojentas.
— Ele é dono de um site de pornografia infantil e acredite em mim, tem
milhares de fotografias eróticas de crianças no computador dele. Esse
homem... — Gesticulo com o pen drive, a respiração acelerada. — Ele
merece mais.
— O que está pensando em fazer?
— Eu deduzo que ele conheça o seu rosto...
— Sim — me interrompe.
— Mas não o meu. — Sorrio, me sentindo confiante. — Vou fazer uma
denúncia anônima, mas antes, eu quero enquadrá-lo... sem comprometer
vocês, é claro — digo, mais animada do que pretendia. Droga, colocar um
monstro desse atrás das grades é pra lá de emocionante.
— Não é uma boa ideia, Lexie.
— Na verdade, é um ótimo plano.
— Isso nem é plano de verdade — resmunga, pegando o pen drive de
novo. — Não vou deixar você se encontrar com ele, Lexie. Aquele homem
não é brincadeira.
— Essa é minha vida. — Tomo o pen drive dele e coloco dentro do
meu decote, erguendo uma sobrancelha de forma desafiadora. Quero ver ele
vai meter a mão aqui e pegar agora. Droga. Seria legal se ele fizesse. — Você
precisa me deixar fazer isso.
— É perigoso.
— Não é. Não muito. Eu marquei um encontro em um local público —
assumo e finjo um sorriso. — E temos exatamente... — Pego a mão de
Nicholas entre as minhas e checo a hora no relógio de pulso. — Uma hora.
— Você fez o quê?
— Eu sou um pouco impulsiva.
— Um pouco? — questiona, sarcástico. — Não vamos fazer isso, está
fora de cogitação.
Respiro fundo e fecho os olhos por um milésimo de segundos,
suplicando por paciência para lidar com ele.
— Você pode vir comigo e cuidar da minha retaguarda — é o que digo,
saindo de perto dele e caminhando na direção do quarto de hóspedes em que
estou dormindo. Nicholas resmunga algumas coisas que escapam aos meus
ouvidos. — Eu estarei pronta em vinte minutos — grito antes de fechar a
porta do quarto.
Retiro o pen drive de dentro do decote e o encaro por alguns instantes.
— Você vai apodrecer na cadeia, cretino.
É claro que Nicholas estragou todos os meus planos e não me deixou
ficar cara a cara com o Hernandez, o policial corrupto, pedófilo e filho da
puta que eu quero castrar. Quando sai do quarto, pronta para dar uma de
super heroína, o homem já tinha outras sugestões de planos e nenhum deles
envolvia eu me encontrar com o nosso criminoso.
E cá estamos nós, em cima de uma moto, estacionados em frente a um
banco rústico feito de tronco de árvore, em uma rua movimentada de
Montreal, do lado oposto do café, onde eu combinei de me encontrar com o
policial.
E só viemos até aqui, porque eu insisti muito. Muito mesmo. Não foi
fácil convencê-lo de sair do apartamento. Na cabeça de Nicholas, tudo já
tinha se resolvido e bastava esperarmos. Bastava eu esperar, com a bunda no
sofá e de braços cruzados.
No entanto, eu preciso ver para crer.
— Ele apareceu — digo, levemente surpresa ao reconhecê-lo entrar no
café e se acomodar em uma das mesas próximos da janela. Confesso que no
fundo, fiquei na dúvida se Hernandez apareceria ou não.
— Hernandez tem muito a perder... carreira, família, reputação —
Nicholas comenta ao virar o rosto para mim e levantar a viseira do capacete.
— Eu espero que ele perca tudo — murmuro, sem remorso nenhum.
Quero que esse animal doente seja infeliz pelo resto da vida.
O garoto que Nicholas pagou para entregar o envelope para Hernandez,
entra no café e como combinado, ele entrega os documentos, dá as costas e
vai embora, sem dizer nada. Desconfiado, o policial confere a sua entrega e
fica pálido, trêmulo, o que faz o meu coração acelerar de certa felicidade,
preciso confessar.
Hernandez levanta rápido e sai da cafeteria, olhando para os lados antes
de caminhar na direção do carro estacionado.
— É meio decepcionante — admito. — Eu esperava... eu não sei o que
esperava, mas com certeza mais do que isso — murmuro.
— Não se preocupe, Lexie. — Nicholas diz ao checar a hora no Rolex
em seu pulso. — A essa hora, a delegacia já recebeu várias cópias dos
arquivos. Não tem como Hernandez fugir. A vida dele acabou.
— Você tem certeza?
— Absoluta — é o que diz ao abaixar a viseira do capacete e levantar
com a ponta do pé, o descanso da moto, depois, se inclina para frente,
segurando o guidão. — Segura firme em mim — pede.
De repente, uma imagem pra lá de fantasiosa preenche a minha cabeça:
Nicholas nu e com o corpo colado ao meu. As minhas pernas abraçam sua
cintura e ele beija meu pescoço enquanto sussurra “Segure firme em mim”.
Ah, merda.
Já comecei a ter sonhos eróticos protagonizados por Nicholas. E o pior,
estando acordada. Se antes achava que tinha jeito para mim, agora sei que
não tem. Tô total e completamente ferrada.
Um gemido involuntário escapa dos meus lábios.
— Qual o problema, Lexie?
Respiro fundo e envolvo os braços no corpo torneado, duro e quente de
Nicholas, engolindo o nó na garganta e tentando acalmar meu coração. Não
dá certo, é claro. No momento, meu corpo parece querer entrar em
combustão.
— É que eu acabei de imaginar você falando isso em um momento
íntimo. Muito íntimo.
Ele não diz nada, mas o sinto respirar fundo. E eu sei que se estivesse
de frente para mim, estaria me olhando com aquela expressão impenetrável e
sexy, que já me irritou vezes demais em tão pouco tempo.
Nicholas acelera a moto e eu faço exatamente o que ele pediu. Me
agarro firme a ele e sinto o coração doidinho para sair do peito. Que droga.
Onde foi que eu fui me meter? Por que pensamentos assim estão assolando
minha cabeça?
Tento lembrar das minhas origens e das coisas que eu gosto, e o mais
importante: Nicholas não faz o meu tipo.
Nicholas não faz o meu tipo.
Nicholas é gostoso pra caramba, mas não faz o meu tipo...
Nicholas é gostoso pra caramba e eu acho que faz o meu tipo...
Merda.
Acho que não consigo pensar com clareza enquanto estou aqui,
abraçando o corpo cheiroso, quente e duro de Nicholas, que ao mesmo tempo
parece tão macio e convidativo. É como se ele dissesse “Oi, estou aqui, baby.
Toque em mim, me use e faça o que quiser.”
É tentação demais para mim.
Quando ele entra no estacionamento do prédio, eu só falto sair voado
na moto. Distância. Preciso de distância. Tiro o capacete e respiro fundo, na
tentativa inútil de me recompor.
— Você está bem? — quer saber.
Eu realmente não devo fazer o tipo dele. O cara não está nem abalado
por ter meus seios, que são uma comissão de frente bem chamativa, roçando
nas costas dele, enquanto eu, sinto que uma comichão incontrolável dentro de
mim.
— Ótima — minto.
— Eu preciso sair — fala, e eu assinto, agradecendo em silêncio por
isso. — Tenho que... é sobre Liam.
Ouvir aquilo me desestabiliza completamente e um arrepio horripilante
passa pelo meu corpo, deixando uma sensação ruim no peito. Por algumas
horas, eu tinha esquecido. Tinha esquecido que aquele garoto morreu por
minha causa.
Mas Nicholas está indo no enterro dele. Nada mudou.
Mordo o lábio inferior e assinto de novo. Sem ter vontade ou coragem
de dizer alguma coisa, dou as costas para Nicholas e segurando o capacete
com força, caminho até o elevador e o chamo.
No momento em que as portas de metal se abrem e eu entro, caio em
prantos, pedindo desculpas em silêncio a Liam.

Ainda estou trabalhando na missão de hackear o computador de


Schavier quando Nicholas chega. Ele ficou fora por mais de três horas e
embora eu tenha tentando não ficar contando o tempo, eu fiz isso.
Ele não está bem. Os olhos azuis parecem cansados e tem um pouco de
olheira em volta deles. Nicholas parece abatido, como se fosse difícil demais
pensar ou enfrentar algo. Talvez seja Liam.
— Como foi?
— Triste — resmunga, tirando a jaqueta e jogando no sofá, e em
seguida, solta uma risada seca. — Ainda não tive coragem de encarar a mãe
dele.
Vai até a cozinha e tira uma latinha de cerveja de dentro da geladeira,
abre e em seguida, senta na banqueta e toma um gole generoso, fechando a
face em uma expressão dura. Se já não tivesse visto antes, eu diria que é
impossível um rosto como o dele sorrir.
Sem ter certeza, me aproximo e de mansinho, ocupo a banqueta de
frente para ele e o analiso em silêncio. Ele está se culpando pelo o que
aconteceu com Liam. Mesmo assim, ainda foi mais corajoso do que eu.
Nunca teria coragem de assistir o enterro dele, mesmo de longe.
— Sinto muito — murmuro, fazendo-o erguer o rosto para mim. Os
seus cílios longos batem devagar e eu tenho a sensação de ficar inebriada
com o calor dos olhos azuis e intensos de Nicholas. — É minha culpa.
— Pare de dizer isso.
— Eu aceitei trabalhar pro seu tio, porque... — não consigo terminar a
frase, então, tomo ar e mordo o lábio inferior antes de continuar. — Minha
mãe... ela ainda é minha heroína. Mas Schavier disse que no passado, ela
trabalhou para ele. Eu quero descobrir o que minha mãe fez, mas no fundo,
tenho medo. Tenho medo de destruir a imagem que eu tenho dela na minha
cabeça. Nas minhas lembranças.
Sacudo a cabeça e enrugo o nariz, fingindo um sorriso e faço um gesto
com a mão no ar, na tentativa de deixar o assunto pra lá. Não devia ter
começado esse tipo de conversa. Isso não vai diminuir ou justificar a minha
parcela de culpa de qualquer forma.
— Não se culpe pelo que aconteceu com Liam. — Bebe outro gole de
cerveja sem tirar as vistas de mim. — Eu te falei naquele dia... você é bem
malandrinha, mas não é uma garota má.
Assinto e sinto os lábios se transformarem em um sorriso de verdade.
— Foi melhor ouvir isso agora, do que da outra vez — retruco, e
Nicholas suspira, aliviando a expressão do rosto. — Eu vou conseguir
encontrar alguma coisa sobre o seu tio. Por Liam. Por você também. Quem
sabe, pela minha mãe.
— Quando foi atrás de mim em Toronto, você tinha tanta certeza sobre
ele — Nicholas fala, franzido de leve a testa. — Por quê?
Respiro fundo e apoio os braços em cima do balcão ao mesmo tempo
em que ergo os ombros, endireitando a postura.
— Eu nunca fui o tipo de garota que faz muitas amizades, mas eu
aprendi a ler as pessoas e não costumo estar errada sobre isso. Tem algo nele
que... eu não sei, não me cheira bem. E o computador de Schavier está sendo
um desafio. É segurança demais pra uma pessoa comum ou um CEO.
— Liam falou algo parecido — murmura, encarando a cerveja à sua
frente. — Estou com o notebook dele. Será que pode te ajudar em alguma
forma?
Arregalo os olhos, animada.
— Sim, com certeza.
Sem dizer nada, Nicholas fica de pé e se arrasta até o quarto e em meio
minuto, está de volta, segurando um notebook com uma das mãos, é por um
triz que não me pega bebendo da sua cerveja solitária em cima da ilha.
— Obrigada — agradeço, pegando o notebook com as duas mãos e
levantando a tampa antes de colocá-lo em cima do balcão. Quando ligo, fico
surpresa ao ver que o fundo de tela do computador é uma foto minha. — Uau.
— É você? — Nicholas pergunta, ligeiramente interessado.
Olho-o por cima do ombro e o vejo estudando a minha imagem vestida
de canário negro. Poderia mentir e dizer que não sou eu , mas Liam escolheu
justamente a foto em que eu não estou usando máscara.
— Sim — murmuro. — Foi pra comicon. Não me julgue — aviso e
sem saber o motivo, me sinto meio vulnerável ao ver que ele ainda não tirou
os olhos do computador.
— Eu não disse nada.
— Pare de olhar — ordeno, mas ele não me obedece. — Nunca viu
nada parecido antes?
— Só no halloween, na verdade — comenta. — Mas não eram como
você. Geralmente, eram meninas pequenas pedindo doce — murmura,
esquentando as minhas bochechas. Ele ainda está com os olhos vidrados na
foto e eu não sei se está gostando ou me caçoando. Talvez, esteja caçoando.
— Isso não é fantasia de halloween — resmungo, contrariada.
— Não?
— Eu disse que foi pra comicon — retruco, alterada.
— Ah, certo — é o que diz, me irritando. Fecho a tampa do notebook
de uma vez e ele encaminha o rosto para mim. — Acho que Liam estava
apaixonado por você — contesta.
Reviro os olhos e me arrasto da banqueta até descer, em seguida, pego
o notebook e vou até o espaço que estão os computadores e me acomodo na
cadeira confortável. Sinto que Nicholas ainda tem a atenção voltada para
mim, mas o ignoro.
Sempre tive orgulho de tudo que eu sou e nunca me importei de ser
taxada como esquisita na escola ou na faculdade. Mas por que pensar que ele
está me caçoando mesmo que discretamente, mexe tanto comigo?
Só sei que não gosto de ter um homem como ele me analisando ou
tirando sarro com a minha cara.
— O quê? O que você fez? — Noah questiona, se inclinando para
frente ao apoiar os braços sobre a mesa de madeira e me observar com a
expressão séria. — Você tá brincando comigo, não é?
Noah é um bom líder, ele foi criado para se tornar Don[12], mas ainda é
estranho vê-lo sentando no lugar do senhor Carbone. Ainda consigo ver o
antigo Don, escolhendo um charuto e o acendendo antes de começar qualquer
reunião.
Eu sinto falta dele. Francesco Carbone era como um segundo pai para
mim e sempre me tratou bem, mesmo quando eu era apenas um soldado e não
tinha direito de falar muito, apenas seguir ordens.
— Não — é minha resposta.
Ele passa a mãos entre os cabelos revoltos e dá uma respirada funda,
nitidamente de paciência esgotada.
Quando entrei para família Carbone, eu aprendi que não se deve mentir
em hipótese alguma. Apenas, quando a organização corre perigo. E na real,
eu poderia esconder o fato de que Lexie trabalhou para o meu tio, mas isso
iria contra tudo que eu aprendi com o senhor Carbone e claro, com Enrico.
— Você está protegendo a garota que quase causou a morte de Liam?
— questiona, mais uma vez. — Onde estava com a cabeça?
— Ela não tem culpa do que aconteceu — começo a falar, fazendo
todos na mesa me olharem com um ponto de interrogação no rosto. — Eu
quase causei a morte de Liam. Eu quase causei quando pedi que ele fosse pra
Toronto. Foi o meu problema com Schavier que fez Liam ser baleado. Se
você quer culpar alguém, Don, culpe a mim, não ela. Estou pronto para
assumir a responsabilidade.
Julian contrai o músculo do maxilar e me encara furioso, como se
estivesse a ponto de me dar um soco e me fazer calar a boca. É claro que ele
não aprova minha decisão de proteger Lexie, mas a garota não é culpada pelo
que aconteceu com Liam.
E não estou a fim de deixar aquela garota sem proteção. Por quê? Não
faço a mínima ideia, mas é a minha vontade no momento. Proteger Lexie do
meu tio. Isso soa bem aos meus ouvidos, mesmo que só esteja dizendo as
palavras em pensamento.
Noah suspira.
— É claro que não vou culpar você, Nicholas. Você é o meu irmão
também — fala, meio contrariado.
Noah parece estar sendo sincero e não acho que vá me culpar de
alguma forma, mas talvez queira me dar alguns socos por ter feito algo que
ele, o chefe da família, desaprova. E ok, não tem problema. Eu sempre fui
muito prudente em todas as minhas escolhas, em todas as ações e foi a
primeira vez em sete anos que eu agi por impulso.
— Você confia nela? — Noah quer saber.
— Sim — respondo, para minha surpresa, muito convicto. Eu já confio
muito naquela garota e talvez, não devesse, mas a verdade é que não sei
como voltar atrás. — Sim, eu confio.
O Don assente, sério.
— Ela é sua responsabilidade a partir de agora — fala, como se
estivesse ordenando e a única coisa que faço é concordar com um aceno de
cabeça. — E o seu tio?
— Não se preocupe, vou resolver isso sozinho.
Ele solta uma risada seca, incrédulo e sacode a cabeça de um lado para
o outro.
— Seu tio é o nosso problema também. Ele pode não ter puxado o
gatilho da arma que quase matou Liam, mas ele fez isso. E eu... gosto daquele
garoto. E você é um de nós, é nossa família. Schavier precisa pagar com a
vida dele pelo que fez.
— Eu concordo.
— E tem mais uma coisa — fala, semicerrado os olhos para mim. —
Parabéns, Nicholas. Sua garota acabou de ganhar o trabalho do Liam por
tempo indeterminado. Peça que ela investigue o seu tio — ordena, me
deixando hesitante.
— O quê? — é o que eu digo.
— Ela resolveu o problema com Hernandez, não foi? Ela é útil pra nós
e precisamos dela até Liam estar cem por cento recuperado — ele fala, como
se fosse simples.
Merda.
Eu sei que ela já está trabalhando e tentando encontrar algo contra o
meu tio. No entanto, quando trouxe Lexie, eu não queria envolvê-la com a
máfia, apenas que me ajudasse a resolver um problema e ficar de olho
naquela encrenqueira. Mas ficar no lugar de Liam? Acho que isso é coisa
demais para ela.
— Uma mulher? — é Gabriel quem pergunta, o caporegime[13] mais
antigo da família Carbone. — Liam é quase um membro da nossa
organização e você quer colocar uma mulher no lugar dele? — questiona,
abismado.
Noah vira o rosto devagar para encará-lo e ergue uma sobrancelha.
— Eu acho que você esqueceu com quem está falando, Gabriel.
— Eu sinto muito, Don.
— Melhor assim — Noah resmunga. — Não contrarie minhas vontades
— avisa, com a voz firme.
— Não é isso — Gabriel volta a falar. Pigarreia e engole em seco ao
notar que Noah ainda o encara. — Mas é uma mulher. Nós nunca tivemos
uma mulher tão envolvida com a nossa família, com os nossos negócios.
— Qual é o problema? — o Don retruca a Gabriel.
— Ela... não sabemos se podemos confiar nessa garota ainda. Envolvê-
la com os nossos problemas é coisa grande.
Sem aviso prévio, Naoh fica de pé e todos ao redor da mesa fazem o
mesmo. Julian não está mais tão irritado e Thomas, o conselheiro, parece
estar se divertindo com a situação.
Ele sempre foi um cretino.
— Ela é responsabilidade do Nicholas — é o que diz, dando o assunto
por encerrado. — Acabamos por hoje. — Dá as costas e sai da sala, Thomas
vai atrás, na cola dele.
Ah, droga! Aquela garota ser minha responsabilidade pode acabar com
a minha vida.
— Tá feliz agora? — Julian pergunta, de repente. — Por que fez isso?
— Por que cuidou da Jolina? — me ouço retrucando e ele me olha
cético. — Eu sei que você não confia nela, mas confie em mim. Ela não será
um problema.
Não será um problema para máfia, mas talvez seja um problema para
mim.
Julian cruza os braços na altura do peito e ergue uma sobrancelha, mas
assente de leve em seguida. Não está contente, no entanto, concordou
comigo, o que já é muita coisa. Ele é muito teimoso e não muda de ideia
facilmente.
— Eu ainda acho que é uma péssima ideia — é Gabriel quem diz, me
irritando.
Alguns meses atrás, eu ficaria calado. Porém, agora, eu também sou um
caporegime e posso retrucar ou bater de frente com ele sem me preocupar em
estar desrespeitando a hierarquia da família.
— Já entendi, mas guarde isso apenas pra você, Gabriel — resmungo,
saindo do escritório e dando de cara com a senhora Carbone no corredor
pequeno que dá na direção da sala de estar. — Oi.
— Querido. — Ela sorri, segurando meu rosto com as duas mãos e
depositando um beijo em cada bochecha. — Você está bem? Conseguiu
trazer sua irmã?
— Ainda não.
Ela suspira, deslizando com as mãos até os meus ombros e dando
tapinhas. Troca um olhar cúmplice com Julian, que acabou de parar ao meu
lado, e depois, volta com os olhos redondos na minha direção.
— Preciso conversar com você.
Assinto, encarando Julian de esguelha.
— O que aconteceu?
Carlota envolve um braço no meu e me puxa para caminharmos até a
sala. Observo-a por uma fração de segundos e noto que tem os olhos
semicerrados, como se buscasse no fundo da mente as palavras certas para
começar a falar.
— Você lembra da Shalom, a filha do Enrico? — quer saber.
— Não — minto.
— Como não? Eu sei que o pai dela já morreu, mas ele foi um membro
da família. Quando você chegou aqui, ele ainda era vivo. Como não se
lembra dela? Está mentindo pra mim — fala com um tom divertido e se perde
em uma risada. — Como você sabe, Julian não casará com ela, mas eu ainda
preciso que alguém case com aquela garota. Era o desejo de Francesco.[14]
Paro de caminhar e me desvencilho dos braços dela, olhando-a nos
olhos.
— Não está pensando em...
— Sim, exatamente isso — me interrompe. — Você está sozinho há
muito tempo. Eu te conheço há muitos anos e nunca o vi sério com uma
garota. Que tal, Shalom? Ela é linda, brilhante e será uma ótima esposa.
— Estou bem sozinho — é o que digo, mas a mulher não se dá por
convencida. Parece que me casar com Shalom se tornou a sua missão de vida.
— Não me peça isso, Carlota.
Julian ri, logo atrás de mim, me deixando irritado. Bufo, sem paciência.
Me casar com Shalom, se isso não é a porra de um pesadelo, eu não sei o que
é. Eu prefiro morrer sozinho do que casar com ela.
— Vocês fazem um belo casal.
— Eu passo — retruco.
Julian ri de novo, mas dessa vez resolve abrir a boca para dizer algo.
— Mamma[15], Nicholas tem alguém agora.
— O quê? — rosno.
— Ah, sério? — Carlota abre um sorriso largo e me olha feliz. Segura
meu rosto e me faz olhá-la nos olhos. — Isso é ótimo, querido. Eu quero
conhecê-la.
— Por que está feliz? — Julian resmunga. — Quando soube de Jolina,
a senhora ficou uma fera. Não lembra disso?
Carlota torce a boca e fecha os olhos por alguns segundos antes de
começar a argumentar.
— Mio figlio[16], você sempre teve um péssimo gosto para escolher
mulheres. Graças a Deus, Jolina é divina. — Respira fundo e abre um meio
sorriso para mim. — Nicholas sempre foi sensato, um verdadeiro cavalheiro
com as mulheres.
Julian me encara com uma expressão de quem está discordando, mas
não diz nada sobre. Sorrio para Carlota e assinto devagar, torcendo para que
ela nunca mais toque no assunto de querer me casar de novo.
— Ela não é minha garota, é apenas uma garota — falo, e na minha
cabeça isso soava melhor.
— Então, quer dizer que você está disponível pra casar? — Carlota
quer saber.
— Não — rebato e solto um suspiro longo. — Preciso ir, tenho
compromisso.
Estou prestes a girar o corpo, quando ela me intercepta e me coloca no
mesmo lugar de antes. Suspiro, contido. Eu amo Carlota, ela é incrível, me
acolheu como filho e cuidou de mim, não me deixou passar os feriados
importantes sozinho, mas às vezes, ela é muito... obstinada.
— Traga a garota amanhã para o jantar. Às oito. Certo? — Carlota
pergunta e quando abro a boca para recusar o pedido, ela faz um estalo de
reprovação com a língua e balança a cabeça de um lado para o outro,
negando. — Ok, Nicholas?
Finjo um sorriso.
— Sim, senhora — murmuro, odiando a ideia do jantar.
Sempre consegui fugir de alguns jantares em família que a senhora
Carlota insiste em fazer. Mas ao que parece, amanhã é um daqueles dias, que
mesmo com as melhores das desculpas, eu não vou escapar das garras dela.
— Obrigada, querido.
Ela dá uma batidinha de leve no meu rosto e vai embora, me deixando
sozinho com Julian entre o hall de entrada e a sala de estar. Ele nem esconde
o fato de estar se divertindo às minhas custas.
— Ninguém consegue dizer não pra mamma. Eu acho que não existe
um homem nessa família que não abaixe a cabeça pra ela. — Julian diz com
um estúpido sorriso emoldurando o rosto. — Talvez esse seja o talento dela
— acrescenta, dando as costas para mim ao se afastar.
Respiro fundo e fico exausto só de pensar em como convencer Lexie a
vir jantar com a família Carbone.
Depois de ouvir as palavras de Nicholas, tento assimilar a informação.
Estupefata, me permito cair de bunda no sofá, e levanto os olhos, o encarando
por cima dos cílios. Ele nem me preparou psicologicamente para receber a
notícia, apenas disse tudo de uma vez e eu que sobreviva.
— Isso não parece um pedido — murmuro e começo a massagear
minhas têmporas. — Não tenho escolha, né? É o meu fim.
— Não, claro não — diz, e dá um passo para frente, na minha direção,
mas desiste no meio do caminho e recua. — Ninguém vai fazer mal a você,
eu prometo. Protegerei você.
Ele não parece estar mentindo, então isso é como combustível para me
fazer ficar de pé e me aproximar de Nicholas. Ergo o queixo para encará-lo
com intensidade. Os cílios loiros e longos são hipnotizantes, e os olhos azuis
me dão a sensação de estar fitando o oceano.
Eu sinto que passei daquela fase de negação e já admiti para mim
mesma que estou a fim de um homem como ele, que é puro músculo e
arrogância. Não faço a mínima ideia de como aconteceu, não temos nada a
ver um com o outro, mas parece que existe um imã em Nicholas, me
chamando.
Ou talvez seja apenas a falta de sexo mexendo com a minha cabeça.
— Por quê? — sussurro. — Por que vai me proteger? Eu já te disse, eu
sei me defender sozinha.
Antes que a coragem vá embora, pouso as mãos em cima do peito dele
e engulo em seco. É duro que nem pedra. Meus olhos descem até o seu
abdômen e observam minhas mãos, que deslizam devagar, em contrapartida,
minha respiração acelera.
Volto a olhá-lo e percebo que Nicholas continua sério. Por Deus, o
homem não está nem piscando. Tudo bem, ele deve estar acostumado com
mulheres passando as mãos por aqui, se esbaldando nesse corpo idiota e
gostoso.
— Certo, então. Me proteja, Nicholas — falo.
Pela primeira vez, vejo os olhos dele vacilarem. Ah, merda. É minha
perdição. Eu não sabia que um homem assim podia se desestabilizar e muito
menos que fosse ser uma coisa tão cativante.
Para minha surpresa, de maneira firme, sedenta, ele envolve as mãos
grandes nos meus pulsos e eu deixo escapar um gemido involuntário. Antes
que possa ficar animada demais, Nicholas me afasta dele, mas não me solta.
— Não brinque com fogo, Lexie, porque você pode acabar se
queimando.
— E qual é o problema de me queimar?
— Você pode se queimar — repete ao soltar os meus pulsos e eu sinto
falta do calor do seu toque voraz. — Ou pior.
Arqueio as sobrancelhas.
— O que pode ser pior?
— Você pode acabar gostando. E se gostar, pode apostar que estará
perdida, Lexie.
— Perdida como? — quero saber, me aproximando de novo e sem
conseguir desviar dos seus olhos. — Me mostre — sussurro.
Não sei o que deu em mim, mas estou gostando dessa interação.
— Não faça isso, você não é garota pra mim — fala baixinho, deixando
uma sensação esquisita dentro do meu peito.
— Como você sabe?
Tento me manter no controle e não surtar porque estou levando um fora
de um homem bonito e gostoso.
— Por que estou olhando nos seus olhos agora — murmura, e noto as
duas pedras azuis brilharem e aos poucos, fica um tom mais escuro. — E
você não me conhece de verdade.
— Você também não me conhece de verdade e mesmo assim, me
trouxe pra sua casa e disse que me protegeria.
Ele desvia dos meus olhos e noto o peito subir e descer com a respirada
funda. De mansinho, volta a me encarar de forma tão intensa, que prendo o ar
por alguns intermináveis segundos.
— Isso é diferente — fala entre os dentes. — Você sabe o que eu sou e
pra ser sincero, eu não sou muito diferente do Hernandez.
Reviro os olhos, incrédula.
— Como você não é diferente daquele pedaço de merda? — retruco,
alterada. — Hãm? Eu já chequei o seu computador e não encontrei fotos
comprometedoras de crianças — digo antes que o cérebro processe as
palavras.
— Você fez o quê?
Cruzo os braços na altura dos seios e o encaro, fazendo bico e
levantando uma sobrancelha. Ok, eu admito que falei demais. Mas é sério que
ele não esperava que eu fizesse isso? Logo eu? Euzinha?
— Esquece — grunho. — Não me dê desculpas, Nicholas, apenas diga
logo que eu não faço o seu tipo.
Ele bufa, visivelmente irritado.
— O que você tem na cabeça? — esbraveja, me fazendo engolir em
seco. — Olhe pra mim, Lexie. O que você acha que eu faço? Meu trabalho...
você não aguentaria saber das coisas que fiz, das coisas que eu precisei fazer.
— Você está me subestimando.
Nicholas nega com a cabeça e tenta desviar dos meus olhos. Por
impulso, eu rompo a nossa distância e seguro seu rosto, mantendo a nossa
conexão. Não faço a mínima ideia do que estou fazendo, mas parece certo.
— Eu não sou bom, Lexie — admite em voz baixa. — O meu mundo, o
que eu faço... você não estaria perto de mim se soubesse da minha vida com
detalhes.
Engulo o nó na garganta de novo.
— O que você teria feito com Hernandez? — pergunto, a voz soa
rouca. — Se ele... se ele não tivesse feito o que você queria, o que teria
acontecido com ele?
Meu coração acelera.
Eu sei o que teria acontecido com Hernandez. Nicholas é um mafioso e
eu não sou burra, no entanto, quero ouvir isso da boca dele. Quero que seja
sincero e talvez, eu pire de vez e saia correndo, no entanto, estou disposta a
arriscar.
Ainda não compreendo completamente o meu fascínio por ele, mas sei
que parte é por essa adrenalina que sinto correr pelo meu sangue de forma tão
avassaladora sempre que ele está perto.
É como uma faca de ponta afiada. Estamos cientes das chances de nos
machucarmos, mas dá vontade de tocar e sentir a dor. E talvez, eu goste
disso. Dessa sensação de perigos, dor, adrenalina.
— Eu teria matado Hernandez — fala, sem pestanejar e o sinto a minha
respiração acelerar. — Está com medo de mim?
Nego com a cabeça, sem conseguir dizer as palavras em voz alta.
Nicholas acabou de assumir que teria matado um homem, mas eu não
estou correndo para longe dele. Em vez disso, parece que meus pés criaram
raízes no chão e o coração está batendo tão alto dentro do peito, que me
pergunto se ele pode ouvir.
— Você não é garota pra mim, Lexie — murmura, murchando meu
coração e fazendo minhas mãos caírem do seu rosto. — E eu não estou a fim
de decepcionar você, porque é isso que vai acontecer se você continuar
criando expectativas em relação a mim.
Dou um passo para trás, tentando fingir que as palavras de Nicholas
não me abalaram. Coloco um sorriso largo no rosto e assinto. Bem feito para
mim, ele tinha me dado um fora e eu insisti, acabei ganhando outro de brinde,
que mais pareceu aquela bola perdida na aula de educação física que vai
sempre na direção do meio da nossa cara.
Ressentida, resolvo tagarelar.
— Expectativas? Não estou te pedindo em casamento, talvez uma noite
de sexo intenso, sei lá.
Tudo bem, é melhor eu parar de falar ou as coisas podem ir para um
caminho que vai me matar de vergonha.
— O quê?
— Pois é — não consigo calar a boca. — Não se preocupe comigo,
Nicholas. É apenas a minha seca falando mais alto. Um ano sem sexo pode
mexer com a cabeça de uma mulher. E você não ajuda, fica andando pra lá e
pra cá sem camisa e com esse corpo sarado... e na maioria das vezes todo
suado.
Nicholas pisca devagar.
— Um ano? Um não sem sexo?
— É só isso que você ouviu?
Ele finge uma tosse e afrouxa o nó da gravata.
— Amanhã preciso que você venha jantar comigo na casa da família
Carbone — fala, de repente mudando de assunto.
— O quê? Tá brincando, né?
Sem me responder, ele gira nos calcanhares e me deixa sozinha na sala.
Jogo-me no sofá de cara fechada e autoestima destruída. Droga. Por que
diabos fui dar em cima de um mafioso? Quer merda! Se tivesse sido um nerd
que nem Liam, nunquinha que eu teria levado um fora desses.
É isso que dá. Por que de repente meu tipo ideal mudou? Eu sempre
gostei de caras que soubessem o significado de sonserina e grifinoria, que
gostassem de filmes de super heróis ou de volta para o futuro.
Esse é o meu tipo ideal.
Não um brutamonte de um metro e oitenta em cinco, musculoso pra
caramba e com um tanquinho definido, que é um assassino da máfia nas
horas vagas. De homens assim, eu preciso correr para longe como o diabo
corre da cruz. E não ficar tentando entender o porquê não sou garota para
eles.
Merda.
O que eu tenho na cabeça?
Eu ainda não sei o que estou fazendo aqui...
A mansão da família Carbone é, digamos, exuberante. Há dois leões
enormes e assustadores em mármore na entrada e a porta de madeira maciça é
quase o triplo do meu tamanho.
Tenho a sensação que esse jantar é só com a passagem para ida.
— Relaxe — Nicholas diz, levando a mão no rumo do botão da
campainha. Enrugo o nariz e faço bico. Relaxe? Aham, tá bem. — Não faça
essa cara.
— É a única que eu tenho — resmungo, fazendo o mafioso ao meu lado
suspirar e contrair a mandíbula. Quase sorrio, irritá-lo pode se tornar a minha
nova missão de vida. — Relaxe — retruco, a voz cheia de desdém.
Ele não tem tempo de dar algum sermão, porque a porta grande se abre.
Do outro lado, está uma mulher que tem quase a minha altura, exibindo um
corpo em forma dentro de um vestido vermelho e chique, cabelos negros que
caem até a altura da metade dos ombros, olhos redondos e de cor castanho
escuro. O rosto dela se ilumina com um sorriso assim que vê Nicholas.
Sem dizer nada, a mulher envolve as duas mãos no rosto dele e
deposita um beijo na bochecha esquerda e outro na direita. Fala alguma coisa
que escapa aos meus ouvidos e olha para mim.
— Carlota, essa é a Lexie. Lexie Rogen. E Lexie, essa é Carlota
Carbone — Nicholas fala, sem jeito.
— Oi. — Estendo a mão e tomo um susto quando a mulher me puxa
para perto, segurando meu rosto e depositando um beijo em cada bochecha,
em seguida, me encara de um jeito profundo e enigmático. — Muito prazer.
Ainda sem falar nada, ela toca no meu cabelo, especificamente, nas
mechas em roxo desbotado e em seguida, os olhos descem devagar pelo meu
vestido verde turquesa estampado com pequenas flores vermelhas.
Ela está me analisando.
— Lexie — sussurra meu nome e direciona a atenção para Nicholas,
que evita olhá-la. — O prazer é meu — acrescenta, voltando com as vistas
para mim.
Ao chegarmos na sala de estar, dou de cara com o que me parece, a
família inteira. Os irmãos Carbone estão aqui, em pé, parados e me encarando
com certa curiosidade. E há duas outras garotas, uma garota asiática de
sorriso gentil e outra que me encara como se eu fosse louca.
Bom, talvez eu seja mesmo.
A irmã caçula é a primeira a dar um passo para frente e vir até mim.
— Oi, eu sou a Romie — fala, mas eu já sei quem ela é. Eu vivi tempo
suficiente em Montreal para conhecer mesmo que de longe, a família
Carbone. Sem aviso prévio, ela me abraça e me deixa sem jeito. —
Interessante conhecer a namorada do Nick, eu pensei que ele fosse morrer
solteiro.
Nicholas pigarreia, visivelmente irritado com o comentário.
— Ah, entendo, mas eu não sou a namorada dele, na verdade. Nosso
relacionamento é puramente profissional. Não estamos juntos dessa maneira
romântica, sabe? — digo e fico feliz ao notar que minha voz soa firme.
— Ah — Romie parece decepcionada. — Sério? Nossa...
A senhora Carlota troca um olhar com os dois filhos e depois encara
Nicholas, que tem o maxilar contraído.
Noah se aproxima, se apresentando. E eu confesso que tinha imaginado
um monstro na minha cabeça, que me deixaria acorrentada num quartinho
sujo em algum subsolo, já que ele me deu o “emprego” de Liam sem nem ao
menos me dar a chance de recusar. No entanto, ele não parece tão ruim, o que
me surpreende de verdade. Agora, não sei a sua esposa, Haylie, pensa o
mesmo que eu, pois me dá um aviso em forma de um sussurro: fuja.
Enrugo a testa para ela e fico tentando entender. Meu Deus, será que
eles mantêm a garota em cárcere privado? O coração acelera. Eu sabia que
esse jantar era apenas com passagem de ida.
Nunca mais vou sair dessa casa.
Estou presa com essa família mafiosa para sempre.
Julian se aproxima, apresentando a noiva, Jolina. Ela sorri para mim e
me dá um abraço apertado e carinhoso. Não está com cara de quem quer sair
correndo e parece gostar de toda a família, o completo oposto de Haylie.
— Eu ainda não sei o que estou fazendo aqui — murmuro para
Nicholas e respiro fundo. Acho que no fundo, nem ele mesmo sabe. Ou
talvez, saiba e não queira me dizer. Ele não tem cara de que gosta de falar
sobre as coisas ou sentimentos.
— Eu já passei por isso — Jolina diz, se aproximando de mim com um
sorriso travesso emoldurando todo o rosto. — Não se preocupe, ela é
assustadora, mas não morde — emenda com um sussurro e olha de esguelha
para Carlota que acabou de sair da sala de estar.
Solto uma risadinha.
Nicholas se afasta de mim e vai ao encontro dos irmãos Carbone ao
mesmo tempo em que Romie se junta a nós. E Haylie continua sentada no
sofá, com cara de quem está odiando tudo e todos.
— Ela não parece feliz — me ouço comentando, observando a garota
sentada no sofá de pernas cruzadas. — Estão obrigando a garota a ficar aqui?
— pergunto e quando me dou conta, sacudo a cabeça. — Isso não tem nada a
ver comigo, desculpe.
— É complicado — Romie murmura, olhando-a por cima do ombro.
— Você é o oposto dela — digo a Jolina. — Você gosta mesmo daqui,
da família toda e não está parecendo que vai fugir na primeira oportunidade
— acrescento e mordo o lábio inferior.
Ela ri.
— Como Romie disse, é complicado. E eu amo Julian, e bem, já tentei
fugir, não deu muito certo — admite, nos fazendo rir.
Nós olhamos os garotos conversando perto do carrinho de bar com
rodízios feitos de madeira e com detalhes em metal dourado enquanto
saboreiam um uísque que deve ser mais velho que eu.
Nicholas me olha, mas eu desvio.
— É apenas trabalho mesmo? — Romie pergunta, tentando esconder o
sorriso. Ela tem os olhos claros arregalados e curiosos direcionados para
mim. — Você e ele... eu sinto uma tensão sexual. Acho que ele está a fim de
você.
Suspiro.
— Definitivamente, não. O bonitão ali já deixou bem claro que não sou
garota pra ele e talvez, tenha razão.
— Não desista ainda. Eu sei que ele pode ser um pé no saco, mas é um
cara legal — Romie fala como se fosse fácil.
— É complicado — é o que digo, murchando a expressão da garota.
Rio de leve.
Ela é diferente. As revistas de fofoca dizem que a herdeira do magnata
do cassino é uma patricinha que adora baladas e entrar em confusão. Tudo
bem, talvez ela ainda goste de entrar em confusão, mas é um doce.
Antes de irmos para a sala de jantar, a matriarca da família se junta a
nós. É uma senhora de cabelos brancos super meiga. Diferente da senhora
Carlota, não me olhou como se estivesse me analisando por nenhum minuto.
Parecia apenas feliz por eu ter entrado na vida de Nicholas, mesmo eu
tentando explicar inúmeras vezes que não somos um casal.
O decorrer da noite não é ruim e eu me senti bem recebida por eles. São
bem unidos e acolhedores, e fiquei feliz de saber que durante esses anos
Nicholas esteve em boas mãos. E sei o quanto isso é louco, mas uma família
de mafiosos deve ter o seu lado bom também.
Quando nos aproximamos da moto estacionada em frente à garagem da
mansão, ele me passa um dos capacetes.
— Preciso comprar tinta de cabelo, pode me levar no supermercado?
— pergunto antes de subir na Ducati.
Nicholas não me responde, mas me encara de um jeito como quem diz
“não sou o seu motorista”. E bem, ele não é, mas a verdade é que o mínimo
que pode fazer é me levar na merda do supermercado e me esperar comprar
minha tinta de cabelo.
— Não fique resmungando, eu vou levar você — fala, me fazendo
notar que eu estava falando sozinha. — Suba — ordena e depois abaixa a
viseira do capacete.
Subo na moto e me acomodo atrás dele, mas não me agarro a Nicholas.
— Não vai me pedir pra segurar firme em você dessa vez? — questiono
com sarcasmo.
Ontem eu já tinha levado um fora, mas não consigo simplesmente ficar
de boa e não provocar ou cutucar minha própria ferida. É uma loucura sem
tamanho, mas no fundo, eu sinto como se pudesse fazê-lo mudar de ideia em
relação a mim.
O que é burrice, Nicholas e eu não somos compatíveis e ele já deixou
isso bem claro, como água cristalina. Preciso cair na real e parar de pensar
nele dessa forma.
— Lexie — é o que diz, num tom de repreensão.
— Ok, já entendi — retruco, me inclinando para frente e, passando as
mãos em volta do seu corpo musculoso e duro. — Já estou segurando firme
— emendo, agradecendo pelo capacete esconder o meu sorriso.

— Você vem ou vai ficar esperando? — pergunto a Nicholas depois


que ele para com a moto no estacionamento do supermercado e eu desço ao
mesmo tempo em que tiro o capacete e coloco no banco.
Calado, ele desce da Ducati e tira o capacete, revelando a expressão
carrancuda, é claro. Reviro os olhos e balanço a cabeça, girando nos
calcanhares e entrando no supermercado com Nicholas na minha cola.
No setor de cosméticos de beleza, eu procuro minha tinta nas
prateleiras lotadas e quando encontro, faço o homem segurar algumas
caixinhas para mim. Ele não fica contente, mas não reclama.
Dou as costas e caminho até a seção de bebidas do supermercado,
procurando qualquer vinho sem álcool. Por causa de Danny, eu passei a
adorar vinhos horrorosos com zero teor de álcool.
Achei!
— O que está fazendo, Lexie?
— Não é óbvio? — pergunto de forma pretenciosa. — Eu preciso de
um pouco disso no meu sangue.
— Não — fala ao tirar o vinho que escolhi da minha mão e colocar de
volta na prateleira. — Você fica desastrada quando bebe.
Seguro a vontade de rir. Se ele ainda não percebeu que não tem álcool
nenhum na garrafa, não sou eu quem vai falar.
— Mas isso não é problema seu, é problema meu — resmungo,
pegando o vinho de volta.
Ele respira fundo e noto o músculo da mandíbula contrair e uma veia
saltar no pescoço. Os olhos azuis e severos me encaram de maneira intensa,
deixando um rastro de arrepio pela minha espinha e fazendo meu sangue
esquentar.
— É problema meu, porque você está na minha casa — rosna, tirando o
vinho das minhas mãos e colocando de volta no lugar.
Bufo, revirando os olhos e me preparando para falar quando uma voz
familiar soa atrás de mim falando meu nome.
— Lexie? É você?
Paraliso, sem conseguir mover um músculo. O coração e a respiração
aceleram, fazendo meu peito doer. De forma protetora, Nicholas toca meu
cotovelo e olha por cima da minha cabeça e depois volta com as vistas para
mim.
— Você está bem? — ele quer saber.
Assinto, sem conseguir dizer as palavras em voz alta.
Devagar, me viro e encaro meu pai. Sinto os olhos arderem, mas
nenhuma lágrima ousa cair. Os seus lábios se curvam em um pequeno sorriso
e aos poucos, empurrando o carrinho, ele se aproxima de mim, meio
inseguro.
— Oi, pai.
A cidade de Montreal tem um milhão e setecentos e oitenta mil
habitantes, milhares de supermercado, mas Nicholas me trouxe justamente no
que meu pai se encontra fazendo compras.
Eu sei que tenho sido uma péssima filha nos últimos dois anos. Ele
mudou, está na cara que sim. Não tem mais aquele cabelo assanhado e barba
por fazer. Meu pai realmente largou o álcool e procurou ajuda, e vem
tentando ser um bom pai, mesmo que para mim, pareça que é um pouco tarde
demais.
Dois anos. Faz dois anos que meu pai está tentando se reconectar
comigo, mas a única coisa que venho fazendo é ignorá-lo, dizendo a mim
mesma que ainda não estou pronta para colocar uma pedra no nosso passado
de merda.
No entanto, o vendo aqui e agora, na minha frente, é estranho. Um
misto de sentimentos. Eu amo e sinto saudades, mas olhar para ele ainda é
uma lembrança de todos os anos que eu tive que me virar sozinha depois que
minha mãe morreu.
— Quando você voltou?
— Faz uma semana — sou sincera.
— Você está bem? — pergunta com um sorriso pequeno desenhado no
rosto.
— Sim — minto. — E o senhor? Tudo bem?
Meu pai assente e os olhos focalizam Nicholas, que está ao meu lado,
sério e em prontidão, como se estivesse preparado para me defender. Se não
fosse um momento tão tenso, eu teria sorrido para ele.
— Quem é você?
— Nicholas Farley. — O homem ao meu lado estende a mão e troca
um cumprimento com meu pai. — Eu sou...
— Meu namorado — interrompo Nicholas e quando percebo, já estou
tagarelando igual a uma louca. — Ele é meu namorado e por isso estamos
aqui, eu vim conhecer a família dele. Nicholas, esse é o meu pai, Martin
Rogen.
Nicholas está me olhando incrédulo, já o meu pai parece ter acredito na
minha mentira.
— Então a coisa é séria? Fico feliz, querida.
— Obrigada. — Minha visão fica embaçada e eu preciso piscar rápido
para as lágrimas não ousarem fazer caminho até a boca. — Enfim,
precisamos ir.
— Ah, certo, certo. — Ele se afasta do carrinho e fica bem próximo de
mim, parando um passo de distância. — Podemos jantar qualquer dia desses?
Eu voltei a cozinhar — murmura, me roubando um meio sorriso.
Ele amava fazer pratos difíceis no jantar, mas depois de se afundar no
álcool, cozinhar era a última coisa que ele queria fazer na vida. É bom saber
que ele voltou aos antigos hábitos. Aos antigos hábitos saudáveis.
— Claro — balbucio, sem ter tanta certeza.
Ele abre outro sorriso e leva a mão até o meu rosto, tocando por uma
fração de segundos. Respiro fundo e me viro, pegando a garrafa de vinho e
segurando com força. Troco um olhar com Nicholas e digo antes de caminhar
na direção do caixa.
— Eu preciso disso.
Assim que entramos no apartamento, ela vai direto para a cozinha. Pega
uma xícara de dentro dos armários e enche de vinho, bebendo tudo que nem
água. Desde que encontrou o pai no supermercado, Lexie ficou muda, o que é
bem estranho.
Às vezes, é difícil fazê-la parar de falar e agora, está sem dizer
nenhuma palavra por quase meia hora.
— Vai com calma — digo quando ela enche a xícara pela segunda vez
e toma um gole generoso de vinho.
Lexie enruga o nariz e torce a boca, resmunga um monte de palavras
que não entendo. Bom, pelo menos a garota já está falando. Segurando a
garrafa com uma mão e a xícara com a outra, ela caminha até a mesinha de
centro e repousa o vinho no material de vidro, depois se acomoda no sofá,
sentando de pernas cruzadas.
— Sinto muito por ter dito que você era meu namorado. Era melhor do
que dizer que estou aqui e nas garras da máfia por causa das minhas decisões
ruins — ela fala, desdenhosa. — Sei que deve ter sido difícil pra você fingir
que é namorado de uma garota como eu.
Nego com a cabeça e me aproximo dela, observando-a beber vinho
como se fosse água e ela precisasse disso para sobreviver.
— Tudo bem, não tem problema.
— Idiota — retruca.
— O que disse?
— Eu perguntei se você quer vinho — mente na maior cara de pau, e
sem saber o porquê, eu acabo sorrindo. Ela é insana, abrasiva, mas é
divertida. Lexie é uma garota que me tira completamente da minha zona de
conforto. — Huh? — Gesticula com a xícara.
— Esse vinho deve ser horrível.
Vou até a mini adega na cozinha e tiro uma garrafa de vinho de
qualidade. Estou prestes a pegar uma taça quando Lexie finge uma tosse e me
julga com os olhos verdes, em seguida, levanta a xícara.
Desisto da taça e pego outra xícara, me aproximo dela e me acomodo
ao seu lado.
— Esse vinho deve ser mais velho que eu — resmunga, fazendo bico.
— E é, mas é ótimo.
— Não sei não, Nicholas.
Ela ergue a xícara para mim, pedindo vinho. Respiro fundo e abro a
garrafa, enchendo o seu copo, apenas um pouco. Eu não sei se consigo ligar
com uma Lexie bêbada no momento. Ela toma um pequeno gole e lambe o
lábio inferior, me deixando hipnotizado.
— Tem razão, é gostoso.
Dou meio sorriso e coloco um pouco de vinho para mim.
— Seu pai está tentando melhorar, não é? — me ouço perguntando.
Ela engole em seco e coloca a xícara em cima da mesinha de centro.
— Sim e eu sei que sou uma péssima filha por estar evitando o meu
pai, mas podemos não falar disso? Por favor? — pede. — Vamos falar de
como eu não sou garota pra você, mas a família Carbone acha que sou sua
garota.
Fecho os olhos por uma fração de segundos e aliso o topo da cabeça,
pensando no que dizer. Não sei o que falar e a única explicação coerente é
que eu sou a merda de um cretino.
— Não quer conversar sobre isso? Tudo bem — fala, e por incrível que
pareça, ela está calma. — Então vamos conversar sobre mim e a minha
situação. — Cruza os braços na altura dos seios e estica as pernas, colocando
uma por cima da outra e me dando uma visão significativa das coxas.
Discretamente, engulo em seco.
— Não sei por quanto tempo ficarei em Montreal, mas sei que não
posso e nem vou ficar aqui morando com você. Eu preciso de um
apartamento, da minha privacidade e de um banheiro só pra mim, porque
tenho certeza que você não quer me ver saindo do banheiro usando apenas
toalha todos os dias. Ou pendurando minhas calcinhas no box.
Ah, porra, eu quero sim.
Sou um tarado, mas é isso. Eu quero sim, vê-la desfilando de toalha
pelo meu apartamento. E até usei a calcinha dela para bater uma e sei como
isso é pervertido. Quero Lexie, quero me enterrar nesse corpo pequeno, mas
não sei se devo corromper uma garota como ela.
— Podemos ver isso com calma — é o que digo.
— Não, com calma não. — Balança a cabeça de um lado para o outro.
— Não me sinto confortável aqui desde ontem, quero ir embora — admite.
— Por quê? — pergunto, sentindo uma onda de curiosidade assolar
meu peito. — Por que quer ir embora?
Lexie morde o lábio inferior e desvia as vistas, encarando a noite atrás
da porta de vidro da varanda.
— Porque... — a frase dela morre. — Porque você... — Respira fundo
e volta a olhar para mim. E eu noto que estou ansioso pela resposta dela,
embora tenha uma leve impressão de saber sobre o que se trata. — Porque
você me deu um fora. Um não, dois. Minha autoestima está abalada.
— Ah, isso?
— Como assim, ah, isso? — retruca, irritada.
Ela fica de pé em um solavanco, balançando a saia do vestido. Não
consigo tirar os olhos das pernas de Lexie e imaginar que faz um ano que
ninguém toca, lambe ou morde essa pele macia, me deixa louco. Quando
percebo que está se aproximando de mim, escoro as costas no encosto do
sofá.
— O que você pensou que fosse?
Que você quer ir embora, porque eu sou a porra de um assassino?
— Nada — resmungo, desviando dela e colocando a xícara em cima da
mesa. — Melhor você ir dormir.
— Não me deixe falando sozinha. — Lexie fica na minha frente e
coloca a mão no meu peito, me impedindo de continuar. — Eu odeio isso, de
verdade. Vamos conversar.
Respiro fundo e fecho os olhos, suplicando por paciência. É mais fácil
lidar com um bando de homens armados querendo acabar comigo do que
ficar tão próximo de Lexie. Eu mal a conheço e ela já consegue me deixar tão
inquieto e excitado.
Foi uma péssima ideia trazê-la para minha casa.
— Por que você é tão fechado? Conversar sobre sentimentos faz bem
— ela murmura, sem tirar a mão de mim.
— Não existe nada de bom sobre mim que eu queria falar, Lexie.
— Mentiroso — ela rebate. — Por detrás dessa máscara ranzinza deve
ter alguma coisa.
— Não tem.
É claro que ela nega com a cabeça, não acreditando em mim. Seria
inesperado se ela acreditasse.
— Lexie — murmuro e sem pensar duas vezes, tomo seu rosto entre as
minhas duas mãos e ela arfa em surpresa. — Sabe por que você não é garota
pra mim?
Ela nega com a cabeça outra vez, os olhos verdes me encarando com
intensidade.
— Porque eu não sou homem pra você. E sim, eu quero muito levar
você pra cama, mas não posso fazer isso.
— Você quer me foder? — pergunta, engolindo em seco logo em
seguida.
Suspiro e sorrio, incrédulo. Passo de leve o polegar nas bochechas
salientes e levemente rosadas.
— Eu sou o tipo de homem que faria coisas cruéis pra te proteger. Você
entende isso, Lexie? Eu não hesitaria em nada se você fosse minha e
estivesse correndo perigo.
Lexie respira fundo, parece hipnotizada com as minhas palavras. Não
era exatamente esse tipo de reação que eu estava esperando. Uma pequena
parte de mim, quer que ela me empurre e me mande ficar longe.
E a outra parte, acha uma tentação corromper uma garota como Lexie.
— Não respondeu minha pergunta.
— O quê?
— Você quer me foder?
— Não parece óbvio? — rebato, passando a língua no lábio inferior. —
Mas você merece mais, Lexie.
— Eu não sou garota pra você e você não é homem pra mim. Tá bem,
já entendi — sussurra, sem tirar os olhos de mim. — Mas então, posso
concluir que sentimos atração um pelo o outro, certo?
— Lexie...
De repente, ela fica na ponta dos pés e sem nenhum aviso, morde o
meu lábio inferior, fazendo o meu corpo inteiro arrepiar e o meu pau pulsar.
Ela vem de novo, os lábios com gosto de vinho tocam os meus e a língua
passa devagar pela minha boca, me provocando, me testando.
— Você está bêbada — murmuro, sem conseguir me afastar dela. — É
melhor parar com isso.
Lexie abre um sorriso maroto, encarando meus lábios e depois voltando
para os olhos.
— Não estou, acredite em mim.
E ela se aproxima de novo, mordendo meu lábio inferior e descendo
com a boca até a linha do meu maxilar e em seguida, pescoço.
Sem conseguir me conter, eu encosto Lexie na parede do corredor,
roubando um gemido arfante dela. Devoro os seus lábios com força e
urgência, como se a coisa mais importante do mundo fosse comer a boca
dessa garota encrenqueira.
Meu corpo reage de imediato quando a sua língua entrelaça com a
minha, e eu sinto que ela é combustível para o meu, nosso fogo. Envolvo as
mãos nos seus cabelos loiros e puxo, arrebatando outro gemido dela.
Eu sei que o certo é mantê-la distante de mim, dos meus monstros e da
minha vida cheia de bagagem pesada, mas não sei se consigo. Lexie está
mexendo com a porra da minha cabeça e é deliciosa demais para ficar longe
das minhas mãos, da minha boca.
As mãos pequenas de Lexie puxam meu cabelo com força, me
pressionando contra ela enquanto nossos lábios e língua se movimentam
numa dança sedenta, avassaladora e intensa. O corpo dela também reage e
sinto o seu quadril se encaixar em mim de maneira perfeita e a ouço soltando
um gemido delicioso ao sentir minha ereção contra a sua barriga.
Puxo-a ainda mais para mim, mordiscando os seus lábios e
mergulhando a língua dentro da sua boca, sem conseguir me controlar.
Minhas mãos soltam o seu rosto e passeiam pelas curvas do seu corpo.
Ela é deliciosa.
Encaixo uma das mãos no seu quadril e Lexie levanta a perna,
abraçando minha cintura, me deixando louco. Deslizo com as pontas dos
dedos sobre a sua coxa e ela geme de novo, aprovando meu toque.
Lexie afasta o rosto um pouco, interrompendo o beijo. A garota tem a
respiração ofegante, mas as mãos continuam ágeis e começam a desabotoar
minha camisa. Eu não devia ir tão longe com ela, mas sou incapaz de recuar
agora.
Levo as mãos até a barra do vestido, ansioso para tirar o tecido que
cobre o seu corpo pequeno, que não foi tocado por ninguém há um ano.
Droga, eu vou me esbaldar nas curvas e partes sensíveis do corpo de Lexie.
Para meu desgosto e infelicidade, antes que possa arrancar o vestido,
uma agitação do lado de fora do meu apartamento me chama atenção.
Mordendo o lábio inferior, ela desce com a perna da minha cintura e
me encara de jeito devasso. Ela é um demônio sexy e de cabelo colorido.
Definitivamente, meu calvário, minha perdição.
Lexie me ajuda a abotoar a camisa, o que me rouba um meio sorriso.
Sem dizer nada, a garota encosta os lábios molhados nos meus de novo e em
seguida, passa as mãos nos meus cabelos, como se estivesse penteando.
Antes de ir na direção da porta, colo meu corpo ao seu de novo e subo
com a mão até o queixo delicado, prendendo os olhos verdes e curiosos aos
meus por alguns segundos. Ela sorri e então, eu aproximo meu rosto e roço os
lábios no lóbulo da sua orelha.
Ela deixa escapar outro gemido.
Sorrio, satisfeito, ajeitando o volume das calças, tentando esconder a
ereção latejante que a loira causou em mim.
Na medida que caminho até a porta, os burburinhos ficam mais alto e
quando giro a maçaneta, me deparo com meus homens segurando o amigo de
Lexie. Ele se debate enquanto tenta falar, mas ninguém dá a chance de o
garoto terminar uma frase.
— Ei! Seu idiota! — Lexie esbraveja, passando por mim que nem um
raio e indo para cima de Théo com tudo. — Solta! Agora! — ordena, me
fazendo arregalar os olhos.
É uma garota muito corajosa.
— Eu não recebo ordens de você — Théo rosna, com raiva.
— Solte o garoto — é só o que preciso falar para Théo e outro soldado
se afastarem de Lexie e o amigo. — Não fale assim com ela de novo,
entendeu? — pergunto, a voz soando firme e áspera na mesma medida. —
Você entendeu, Théo? — insisto, começando a ficar irritado.
— Sim, senhor.
— Ótimo — resmungo.
Lexie puxa o amigo para entrar no apartamento, mas não sem antes
fazer careta ao passar por Théo, que contrai a mandíbula, mas fica quieto e de
olhos abaixados. Dou um passo para o lado e permito que os dois entrem.
Lanço um olhar afiado para os soldados antes de entrar.
— Como você me encontrou? O que está fazendo aqui? — a garota
pergunta.
Tento decidir se fico na sala ou vou para o quarto e dou privacidade aos
dois. Decido ficar, porque eu também estou curioso. Naquela noite no bar,
Daniel foi apresentado como amigo e chamou Lexie de “minha garota”
mesmo não sendo namorado. E agora, o cara veio até aqui atrás dela. Isso soa
estranho demais para mim. Não pode ser apenas amizade.
— Você vem ignorando minhas ligações faz uma semana. Eu fiquei
muito preocupado. Não sei, Lexie, mas mandar uma mensagem de repente
dizendo que vai viajar e passar uns dias fora? Que desculpa é essa? — Daniel
retruca, irritado e olha para mim. — E o que você está fazendo aqui? Com
ele? Não faz sentindo pra mim.
— É uma longa história. — Lexie suspira e cruza os braços na altura
dos seios. — Como me achou?
— Instalei GPS no seu celular naquele dia. — Ele tira o celular do
bolso e gesticula para Lexie. — Fiquei preocupado.
— Tão fofo.
— E muito curioso pra saber o que você está fazendo em Montreal.
Você não pisa nessa cidade há sei lá, uns seis anos? E de repente, passa uma
semana aqui? Muito estranho — fala, me olhando de esguelha.
— Eu sei, mas surgiu um trabalho, Danny. Tipo, daqueles muito
importante — ela explica.
O amigo enruga o nariz, visivelmente desconfiado.
— E você tem tomado banho? — indaga, e eu fico sem entender, mas
não está com cara de que Lexie vai esclarecer alguma coisa sobre isso.
Ela se aproxima e segura as mãos dele, me deixando com um gosto
amargo na boca. E para piorar a situação, Lexie passa os dedos nos cabelos
de Daniel, penteando, como fez comigo minutos atrás. Ela costuma fazer isso
em todo mundo?
— Vou explicar tudo, eu prometo.
— Não, não vai — é o que digo.
— O quê? — Lexie questiona, me observando por cima dos ombros. —
O que você disse?
— O que você ouviu — resmungo, carrancudo.
Ela dá um passo para longe do amigo e vem até mim, pisando duro. O
moleque revira os olhos e se joga no meu sofá, como se não tivesse nada
melhor para fazer. Contraio a mandíbula, encarando a audácia dele.
— Qual é o problema? Ele é o meu melhor amigo, eu conto tudo pra
ele.
Respiro fundo e ergo uma sobrancelha para a garota irritada à minha
frente.
— Não pode sair contando o que está fazendo, Lexie. — Volto a olhar
o garoto folgado na minha sala. — E eu não confio nele.
Ela estreita os olhos para mim e depois começa a rir, balançando a
cabeça.
— Ora, ora, quem diria, Nicholas Farley.
— Do que está falando?
Lexie leva as mãos espalmadas até o meu peito e eu finjo não sentir a
onda de calor que o toque dela provoca no meu corpo e começa descer para o
meu pau.
— Tá com ciúme de mim?
— Eu? Claro que não — retruco rápido demais para ter alguma verdade
nas minhas palavras.
Abre um sorriso travesso e fica na ponta dos pés para depositar um
beijo no canto da minha boca.
— Não tenha ciúmes. Entre você e eu, Daniel escolheria você, sem
piscar. Ele é gay — sussurra a última palavra.
— Não estou com ciúmes — rebato, sem ter tanta certeza.
Estou com ciúme dela? Impossível. Não sinto esse tipo de coisa. Ciúme
é coisa de gente insegura e eu não preciso desse sentimento na minha vida.
Com um dar de ombros, Lexie volta para perto do amigo e o puxa pelo
braço, levando-o para dentro do quarto de hóspedes e fechando a porta logo
em seguida. Não consigo impedir de ficar irritado.
Ele é gay...
Ele é gay...
Droga.
Estou com a ciúme da Lexie e o melhor amigo gay? É claro que sim.
Com certeza, deve ser a coisa mais deprimente e vergonhosa que aconteceu
comigo em anos.
Como eu pensei... Lexie é meu calvário.
Contei tudo para o meu melhor amigo.
Ou quase tudo. Eu deixei de fora a parte que o chefe da máfia Carbone
praticamente me deu o “emprego” de Liam sem me dar chance de recusar o
convite. Danny não precisava ter esse tipo de preocupação comigo.
Sou uma encrenqueira de carteirinha, isso é verdade, e muitas vezes
levei confusão para nossas vidas, mas agora, eu preciso que ele fique de fora
disso. Não me perdoaria se algo de ruim acontecesse com Danny.
E ele aceitou bem o fato de eu estar na casa de um mafioso.
E embora não esteja gostando muito, Nicholas ainda não enxotou meu
melhor amigo para fora do seu apartamento.
— Uau — Danny sussurra.
Segurando uma xícara de café, ele arrasta uma banqueta da ilha da
cozinha até próximo de mim e senta, sem conseguir tirar os olhos da varanda.
Para ser mais específica, sem tirar a atenção de Nicholas malhando na
varanda.
Ele está pendurado na barra fixa, descendo o corpo de forma lenta e
sexy, depois voltando para o topo. É claro que o homem tem que estar todo
suado e sem camisa, me fazendo contar mentalmente os gominhos do
abdômen.
Mordo o lábio inferior, tentando controlar meus instintos de ir até ele e
ficar observando de perto, ou passar as mãos pelo seu corpo torneado e
quente. Eu perdi completamente o meu juízo, mas é isso. Estou atraída por
ele e não estou a fim de recuar.
Eu quero Nicholas.
Eu quero Nicholas... mesmo sabendo quem ele é de verdade.
Sempre fui aquela garota que ficava com os mocinhos e me machuquei
muito por isso. Ou foi um par de chifres ou foi um término por mensagem de
celular. Surpresa, nerds são babacas também. Mas eu nunca fiquei com
alguém como o Nicholas, que tem cara de que vai mudar minha vida e fazer
dela uma aventura. Uma aventura trágica ou não, ainda não tenho certeza.
E talvez, eu queira mesmo brincar com fogo.
Ainda mais se o dono do fogo for Nicholas. Não vou me importar de
me queimar no meio do caminho.
— Essa é a sua visão de todos os dias? — Danny pergunta antes de
bebericar o café. — É uma tentação e tanto. Agora tá explicado porque você
não voltou para e nem deu notícia — acrescenta num sussurro.
Respiro fundo e desvio a atenção de Nicholas. Vê-lo malhar não vai
ajudar em nada no meu trabalho, só vai atiçar minha imaginação fértil e me
fazer querer me jogar nos braços musculosos dele.
É basicamente isso que venho fazendo, porque não tenho vergonha na
cara. Não lembro de ser tão atirada assim alguma vez na minha vida, mas
parece que Nicholas atiça todos os meus instintos primitivos.
E eu odeio quando ele tenta resistir ou me afastar.
E sei que não nos conhecemos há tanto tempo ou bem, mas não gosto
de verdade quando eu tento me aproximar e ele recua, como se no momento
em que se abrir com alguém, sua vida inteira fosse desmoronar.
Deslizando meus dedos sobre o teclado do computador, eu digo ao meu
amigo:
— Nem me fale de tentação. Se fosse um nerd, estaria rastejando aos
meus pés no momento. Mas pra fazê-lo me beijar, eu tive que praticamente
fazer uma promessa de joelhos pra São Valetim.
— Você nunca gostou de músculos. Você detestava esse tipo, na
verdade — meu melhor amigo me lembra.
— Eu sei, mas...
Volto a atenção para Nicholas e suspiro, sentindo um friozinho na
barriga, e eu sei que a sensação parece algo romântico, mas não é. Antes de
ter a vida destruída pelo álcool, meu pai era um farmacologista e muito cedo
me ensinou que isso não é nada mais do que uma reação do meu sistema
nervoso por causa da adrenalina e noradrenalina agindo no meu organismo,
inclusive no meu intestino.
— Não consegui resistir — é o que digo.
— Eu entendo — Danny murmura.
Sacudo a cabeça de um lado para o outro e retorno com os olhos para o
monitor do computador, e tenho uma surpresa boa ao notar que consegui o
que venho tentado há mais de uma semana. Eu consegui! Eu consegui invadir
o computador de Schavier!
— Deu certo! — exclamo, sem conseguir conter o sorriso. — Eu
consegui, Danny.
— Conseguiu o quê? — o meu amigo quer saber.
— Fiquei curioso também — ouço Nicholas da varanda, mas faço um
gesto para que os dois esperem um pouco e me concentro nos arquivos de
Schavier. Tem tanta coisa, que me deixa tonta.
Os dois desistem de mim, e sei que Nicholas voltou a malhar por causa
dos gemidos involuntários e pelo Danny suspirando e babando ao meu lado
enquanto olha a tentação ambulante se movimentar.
Enquanto isso, meus olhos não param de captar as coisas no
computador de Schavier e eu fico abismada com cada informação que meu
cérebro absorve sobre ele. Até que algo me paralisa.
— Ah, merda — resmungo, chamando a atenção de Danny, mas não
consigo desviar a atenção da tela para dizer alguma coisa.
Danny foi embora, ele precisava trabalhar.
Mas, me deu duas semanas para resolver todos os meus problemas por
aqui antes de voltar a pirar de preocupação e me arrastar até Toronto.
Concordei, mesmo sabendo que não vai ser tão fácil ir embora.
A máfia vai me deixar voltar para Toronto? Por algum motivo, tenho
uma leve sensação de que não. E por mais louco que pareça, não me assusta
ficar aqui... com Nicholas, fazendo coisas ilegais.
Se antes eu tinha dúvida que perdi todo o meu juízo, agora tenho
certeza. Mas em minha defesa, sempre fui meio desajuizada. Qual tipo de
garota zera a conta bancária do ex-namorado por ter ganhado um par de
chifres? Isso mesmo, garotas desajuizadas como eu.
— Lexie? — Nicholas chama. — O que precisa me dizer? — quer
saber.
Tentei contar ao mafioso o que descobri sobre Schavier assim que
Danny foi embora hoje de manhã, mas uma ligação da máfia, que pareceu
muito importante, fez Nicholas sair e minhas descobertas tiveram que
esperar.
Agora, faz quase meia hora que ele chegou. Abordei Nicholas assim
que os pés dele pisaram no hall de entrada, mas o terno bem passado estava
sujo de sangue e a única coisa que me disse era que precisava tomar banho.
É claro que eu tenho uma leve impressão do que ele estava fazendo,
mas prefiro não saber os detalhes. Se Nicholas estava fazendo algo cruel com
alguém igual ao Hernandez, não me importa.
Ou importa?
Por que quando eu olho para ele, estou sempre tentando encontrar
motivos para justificar os seus atos? O que estou fazendo? Às vezes, eu não
me reconheço.
Observo o Nicholas de banho tomado, usando camisa cinza e calça
moletom caminhando de pés descalços até a cozinha e pegando uma
garrafinha de água de dentro da geladeira.
De mansinho, me arrasto até a ilha e me acomodo na banqueta.
— Você quer as boas notícias ou as más notícias? Eu posso dar um
conselho? — pergunto, com cautela.
Ele suspira e me encara com aquela expressão séria, que nem me irrita
mais, depois, bebe um gole generoso de água antes de responder:
— Se eu disser não, vai adiantar de alguma coisa? — retruca, e eu
prenso os lábios ao negar com a cabeça. — Vá em frente, então.
— Eu aconselho você começar querendo saber das notícias boas,
porque elas geralmente, amortecem as notícias ruins, sabe? — falo, abrindo
um sorriso largo. Nicholas fica calado, apenas dançando com os olhos azuis
intensos pelo meu rosto. — Ok, ótima escolha.
— Comece a falar — ordena.
Assinto, resistindo a vontade de revirar os olhos.
— Eu finalmente consegui hacker o computador do seu tio — digo,
mas ele nem sorri. — Ok, eu esperava um pouco mais de animação da sua
parte. Sabe o quanto foi difícil? Ele tinha uma segurança digital de...
— Lexie. Foco — me interrompe.
— Sim, senhor — retruco, endireitando os ombros e respirando fundo.
Preciso escolher bem as próximas palavras, porque dependendo do que sair
da minha boca, ele pode perder a cabeça. — Eu tenho certeza que o seu tio
sabe quem você é, porque ele tem várias fotos suas de anos atrás. Ele não
perdeu você de vista.
— O quê?
Respiro fundo, tentando controlar meus batimentos cardíacos.
— Ele não é alguém simples. Schavier faz parte de um grupo criminoso
que se auto intitula como “A organização” — faço aspas no ar com os dedos
indicadores e médios. — É ridículo, né? Nem pra escolherem um nome
marcante ou... — Paro no meio da frase quando noto os olhos dele.
Nicholas está curioso, mas sem paciência para os meus devaneios.
Levo ar até o pulmão e continuo.
— Existem políticos, promotores, procuradores, alguns bilionários,
chefes de polícia e por aí vai.
Ele não deixa meus olhos por nenhum segundo, parece hipnotizado
com as minhas palavras, o que me assusta um pouco para falar a verdade.
Nicholas está absorvendo demais as informações.
Pego a garrafinha de água das mãos dele e tomo um gole generoso
antes de falar as próximas notícias ruis.
— Mas existe algo muito estranho... — deixo a frase morrer de novo e
prenso os lábios.
— O que é?
— É sobre o líder dessa organização. Ele não tem nada — digo e
Nicholas enruga a testa, confuso, mas não diz nenhuma palavra, espera que
eu conclua o que estou falando. — Ele é limpo. Tipo, muito limpo. Não
encontrei nada além de uma certidão de nascimento, uma identidade e um
passaporte russo.
Nicholas solta um suspiro irritado.
— Russo? Ótimo.
— Tenho quase certeza que ele usa identidade falsa, mas não consigo
encontrar nada. Como eu disse, limpo. Limpo demais. É meio assustador pra
falar a verdade.
— Me diga o nome dele, vamos encontrar algo — ele fala, convicto.
— Alexander Tikhonov. Eu acho que todos eles são bem perigosos.
— Eu também sou, Lexie.
Assinto, piscando devagar.
— Tem mais... seu tio tem desviado dinheiro da Corporação Farley há
alguns anos — digo de uma vez, fazendo Nicholas contrair a mandíbula e
fechar a mão em punho, quase como se quisesse controlar o ímpeto de
explodir. — Eu rastreei uma movimentação grande que aconteceu nas últimas
semanas e...
— E, o quê? — pergunta e eu mordo o lábio inferior. — Lexie, me
conte o que você descobriu.
— O dinheiro foi usado para pagar um mecânico, um policial e um
médico legista. Alguns dias antes do acidente de carro da sua mãe. Eu acabei
invadido os arquivos do legista e do mecânico. Nicholas, eu acho... que sua
mãe foi... — não consigo dizer a última palavra e sinto o meu peito apertar.
Eu tenho certeza do que aconteceu, mas não consigo dizer em voz alta.
É cruel e triste demais.
— Meu tio matou minha mãe? — ele pergunta, a respiração começando
a ficar acelerada. — Ele matou minha mãe — conclui sozinho quando não
digo nada.
Ele dá as costas para mim e tomo um susto quando num ímpeto de
raiva, acerta com um soco uma das portas do armário de cozinha, fazendo um
estrondo e partindo a madeira ao meio.
Engulo em seco e me arrasto para descer da banqueta até colocar os pés
no chão. Quando Nicholas me vê aproximando, faz um gesto com uma das
mãos, que paralisa meus passos.
— Não se aproxime.
É claro que eu ignoro o seu pedido ou ordem, não sei qual dos dois e o
agarro pelo braço quando passa por mim, pisando duro na direção do quarto.
Nicholas vira o rosto para me encarar e nos olhos dele existe tanta tristeza,
solidão, culpa, que parte meu coração em pequenos pedaços.
— Não faça nada agora, por favor.
Nicholas nega com a cabeça em resposta.
— Não posso ficar parado, eu preciso fazê-lo pagar por ter tirado minha
mãe da Lawanda. Por ter tirado minha mãe de mim — é o que diz, a voz
soando embargada e cheia de culpa, ódio.
Solto o seu braço e dou alguns passos até ficar na sua frente.
— Não agora, não assim. Você precisa pensar e agir com calma. Ele é
perigoso e não está sozinho. Acha que é simples desse jeito? E agora você tá
com raiva, não pode resolver nada assim.
— A raiva é boa, Lexie.
Movo a cabeça em negativa.
— Não. Vamos pensar em uma forma de fazer justiça pelo que
aconteceu com sua mãe. Podemos fazer como Hernandez.
— Por que está tentando me mudar, Lexie? — ele quer saber.
Fico sem reação e não consigo dizer nada.
Eu estou tentando mudar Nicholas? Sim, mesmo que
inconscientemente, estou tentando fazer isso. Mas por quê? Por que quero
mudar alguém que eu mal conheço? O que ele faz ou deixa de fazer não devia
importar tanto para mim. É a sua vida, suas atitudes.
Mas por que eu me importo com isso?
— Eu só... — não sei o que dizer.
— O quê, Lexie? Não quer que eu me torne um monstro? — Nicholas
pergunta, áspero.
Pisco devagar, sentindo os olhos arderem. Prenso os lábios e dou um
passo para trás, sem saber o que falar. No fundo, eu vi algo bom em Nicholas,
mas agora, não sei se é porque eu quis enxergar isso ou se existe mesmo.
— Me diga — insiste.
— Vingança não leva a lugar nenhum — me ouço dizendo.
— Justiça, vingança, é tudo a mesma coisa pra mim.
— Não, não são — retruco.
Ele respira fundo e passa a língua no lábio inferior antes de soltar uma
risada seca.
— Apenas pare — fala num tom firme, focalizando meus olhos. —
Isso... — Faz um gesto com a mão para apontar para o próprio corpo. — Não
é o que estou me tornando, Lexie. O cara na sua frente, é o que eu sou de
verdade. E esse cara, não vai hesitar em tirar a vida do tio.
— Nicholas... — sussurro.
— Você é boa, Lexie. Por isso que não posso ficar com você, porque
quando eu aceitei a minha escuridão, ela se tornou uma amiga e tomou conta
da minha alma. Não desejo o mesmo pra uma garota como você.
Abro a boca para falar, mas é como se tivesse perdido a voz.
E então, ele dá as costas e ruma na direção do próprio quarto e eu fico
parada, sem fazer nada. Porque infelizmente, a verdade é que eu não posso
fazer nada por ele. Não posso fazer nada para salvar Nicholas da escuridão.
Dias depois...
— Oi, pai — murmuro, olhando nos seus olhos. — Aquele jantar, pode
ser hoje? — pergunto e sinto um aperto estranho no peito.
Do outro lado da porta, ele abre um sorriso gentil e dá um passo para
trás, fazendo um gesto com a mão para que eu entre. A casa ainda é a mesma
de anos atrás, meu pai não mudou nada na decoração. E por mais ridículo que
pareça, eu tenho uma sensação de que a qualquer momento minha mãe vai
descer as escadas, falando ou reclamando de algo e nos fazendo rir.
Acompanho-o até a cozinha e sento à mesa com vista para o quintal,
onde passei momentos incríveis com a minha família. Sorrio, lembrando
daquela garotinha inocente e feliz. Naquela época, o meu mundo era tão
diferente e tranquilo.
— Frango xadrez? É o que consigo fazer em menos de quarenta
minutos. Ou podemos pedir comida — meu pai fala ao abrir a geladeira.
— Frango xadrez... parece ótimo.
Ele sorri de novo e começa a tirar os ingredientes de dentro da
geladeira. Observo-o pegar um avental de uma das gavetas do armário e
amarrar na cintura, depois se movimentar de um lado para o outro na cozinha
pequena.
Os meus lábios se repuxam em um sorriso melancólico. Sim, eu sei,
foram muitos anos sozinha, tentando me virar por minha conta e cuidando da
minha avó que já era velhinha na época, mas preciso admitir, sinto falta dele.
Do meu pai, da nossa família.
É claro que olhá-lo ainda dói. Quando precisei do meu pai, ele não
estava aqui, não estava comigo para me consolar, porque preferiu superar o
próprio luto com álcool e ficando longe de mim. No entanto, eu nunca pensei
nele de verdade, na sua dor e de como foi difícil também. A mamãe era o
amor da sua vida e ela morreu.
— O que aconteceu com você? — ele pergunta, de repente. Franzo o
cenho, confusa. — Você está triste — diz, me surpreendendo.
— Não estou triste.
— Eu sei que sou um péssimo pai, mas conheço bem a minha filha. Me
conte o que aconteceu.
Mordo o lábio inferior e tento segurar as lágrimas intrometidas que
decidiram encher meus olhos. Ele tem razão, eu estou triste. A última
conversa com Nicholas me abalou tanto, que nem entendo bem o porquê.
Saber que não posso salvá-lo ou ajudá-lo de alguma forma, acabou
comigo. E ele me afastou de uma maneira tão rápida, que chega a ser cruel.
Eu sei que não temos nada, mas machuca mesmo assim, porque eu acho que
comecei a gostar dele.
Comecei a gostar daquele idiota tão rápido, como se estivesse em
queda em livre e nem consegui me proteger do baque. Foi quase como se eu
fosse de novo aquela adolescente esquisita e na puberdade, se apaixonando
depois de ter esbarrado com um garoto bonito no corredor da escola.
— Brigou com o seu namorado? Ele partiu seu coração? — ele insiste
quando não digo nada.
Suspiro.
— Não vamos falar de garotos, por favor — peço com jeitinho. Ele
assente e volta com os preparativos do nosso frango xadrez. — Estou
morrendo de fome.
— Certo, querida.
— Você ainda ama a mamãe? — me ouço perguntando.
Papai para de lavar o pimentão e fica encarando a água da torneira cair
sobre as mãos. Ok, ele não esperava por esse tipo de pergunta e eu sei que é
uma mudança súbita de assunto, mas nós nunca falamos sobre ela depois que
ele voltou, era como se fosse um assunto proibido em nossas vidas.
— É claro que sim. Ela ainda é o amor da minha vida.
Concordo com um aceno leve de cabeça.
— Pai, você acha que a conhecia bem? — outra pergunta que ele não
esperava ouvir, pois paralisa de novo por alguns segundos antes de voltar a
lavar as verduras. — Eu passei minha vida inteira achando que sabia tudo
sobre ela, mas não tenho tanta certeza disso agora.
— Do que você está falando, Lexie?
Prenso os lábios e engulo em seco ao fungar. Levo uma das mãos até o
meu cabelo e aliso meu rabo de cavalo mal feito.
— O senhor sabe quem é Schavier Farley?
Ele vem até mim, os passos decididos e os olhos brilhando cheios de
preocupação e as sobrancelhas grossas franzidas. Apoia as mãos espalmadas
em cima da mesa e me fita, inquieto.
— Fique longe desse homem — é só o que me diz, baixando a cabeça.
— Como assim, pai?
— Só me obedeça, tá bem? Sei que não mereço isso, por tudo que eu
fiz você passar, mas me escute e fique longe desse homem. Pro seu bem. Não
se aproxima ou fale com ele.
Movo a cabeça em negativa e mantenho meus olhos presos aos seus. Eu
sei que Schavier é perigoso e vou me manter a mil metros de distância, mas
antes, preciso saber o que meu pai não está me contando. Ele conhece
Schavier e pelo visto, não gosta do homem. Mas por quê? O que aconteceu?
— A mamãe... trabalhou pra ele, não foi? — indago, fazendo meu pai
recuar alguns passos. — Por quê? O que ela fez pra um cara como ele? Pai,
me conte, por favor.
Ele dá as costas para mim.
— Você não precisa saber disso.
— Pai! — esbravejo. — Sim, eu preciso saber. Porque... — paro no
meio da frase, fazendo-o passa os dedos entre os cabelos grisalhos antes de se
virar e me encarar de maneira intensa e triste.
— Por quê?
— Eu estava trabalhando pra ele. E eu invadi o computador dele, mas
não encontrei nada que o ligasse com a mamãe — admito, fazendo meu pai
suspirar.
— Droga, Lexie.
— O que está escondendo de mim?
Fico de pé e vou até ele, segurando as mãos geladas. Por um minuto,
sinto que voltamos no passado e eu ainda sou aquela garotinha, sozinha,
perdida e atolado no luto até o pescoço.
Meu pai aperta minhas mãos, chamando minha atenção, é como se
estivesse lendo meus pensamentos.
— Você nunca me deixou dizer isso, mas eu sinto muito por ter ido
embora naquela época. Não consegui ficar, porque toda vez que olhava pra
você, eu via sua mãe e isso doía demais em mim — segreda, e quando me
dou conta, estou chorando em silêncio.
— Foi tão difícil pra mim, pai — assumo, em um sussurro. — Fui
abandonada pelas duas pessoas que eu mais amei na minha vida. Você e a
mamãe.
Os seus olhos transbordam algumas lágrimas também, mas ele me puxa
para um abraço apertado, que consegue me fazer sentir acolhida e amada.
Aperto-o contra o corpo, como se não fosse mais capaz de soltá-lo.
— Eu sinto muito, querida. Sinto muito — fala baixinho enquanto
passa a mão no topo da minha cabeça.
Afasto-me dele e levo ar aos pulmões antes de começar a falar.
— Por favor, me diga — peço, mesmo sabendo que a verdade pode
destruir a imagem que eu tenho da minha mãe na cabeça. Ela é minha heroína
e tudo isso pode ir para o brejo. Mamãe pode se tornar meu maior pesadelo e
destruir todas as memórias boas que guardo dela, no entanto, eu preciso
saber. — Eu aguento — alego, mas não parece que meu pai está acreditando
em mim.
— Sua mãe não era má, Lexie, não esqueça disso.
— O que ela fez, pai?
Ele abre a boca para começar a falar, mas fecha um segundo depois,
sacudindo a cabeça de um lado para o outro. Está tentando escolher as
palavras certas e isso me deixa com uma ansiedade incontrolável e as mãos
trêmulas enquanto suam frias.
— Ela e Schavier eram noivos — fala, e eu preciso piscar algumas
vezes para assimilar a informação.
— Noivos? Minha mãe?
— Eles terminaram depois que sua mãe e eu nos apaixonamos. Não
preciso dizer que Schavier não aceitou muito bem o termino no início, não é?
Quando ele precisou usar o talento dela, não hesitou. Ele sabia das
habilidades de Emily e tudo que ela fez/fazia nas horas vagas.
Sinto a respiração acelerar e o coração galopear no peito.
De repente, mal consigo ouvir as palavras e preciso fazer um esforço
tremendo para me concentrar na voz que sai de sua boca. Não quero acreditar
em nada e estou procurando desculpas dentro da minha cabeça para dizer que
meu pai está errado.
— ... E no fundo, aquele homem odiava ter tido o coração partido por
ela e não se importava em ameaçar nossas vidas para ter o que queria. Por
isso, Emily aceitou trabalhar pra ele. Não teve um dia que ela não se culpasse
por tudo que aconteceu.
— O quê?
Ele continua falando e cada palavra faz meu coração acelerar de uma
forma dolorosa.
Dou um passo para trás, tentando colocar em ordem as informações,
mas nada parece fazer sentindo. Na verdade, acho que estou resistindo. Não
quero acreditar que minha mãe fez algo assim. Não ela. Não minha mãe.
— Fraude bancária? — murmuro, a voz parece ter saído de outra
pessoa. — Minha mãe incriminou um homem inocente?
— Foi preciso, Emily não teve escolha.
Solto uma risada seca.
— Só pode tá de brincadeira comigo. Foi preciso? Desde quando
incriminar pessoas inocentes é preciso? Hãm, pai?
— Querida — meu pai dá um passo para frente, mas recuo. — Emily
não era má, ela fez isso porque Schavier fez ameaças. Infelizmente, ter se
envolvido com ele foi um erro que ela nunca conseguiu reparar.
Dou as costas para ele, sem conseguir ouvir mais nada. Corro até onde
costumava ser o meu lugar preferido na casa, o quartinho no subsolo onde
minha mãe fazia suas atividades ilegais em nome de um bem maior.
Sinto o ar me faltar quando piso no último degrau da escada. Está tudo
no mesmo lugar. Os computadores mudaram muito nos últimos dez anos,
mas eles ainda estão aqui, limpos, organizados, como se alguém ainda
estivesse os usando.
— O que está fazendo, Lexie? — meu pai pergunta atrás de mim,
porém, não tenho vontade de parar e explicar alguma coisa. — Pare! —
exclama quando começo a vasculhar os armários da minha mãe. — O que
você pensa que vai encontrar?
— Eu não sei. Eu não sei o que estou fazendo — admito, chorando.
— Querida, é passado.
— Como ela pôde fazer isso? Ela acabou com a vida de um homem
inocente, pai. Como ela conseguiu dormir a noite? — choramingo.
— Ela não conseguia — ele sussurra. — Sua mãe não tinha escolha e
ela daria a vida por você, Lexie — emenda, murchando ainda mais o meu
coração.
Mesmo contra a minha vontade, meu pai me puxa para os braços. Tento
resistir, mas acabo afundando em seu peito e choro como uma garotinha.
Disco o número de Durant, mas não tenho coragem de completar a
chamada. Fico observando a telinha do celular por quase uma hora antes de
finalmente sentir a determinação que preciso para encarar os fatos.
Meus olhos estão vermelhos e inchados de tanto chorar. E para ser
sincera, eu não quero mais saber sobre o passado da minha mãe. Dói saber
que eu não a conheci de verdade, que a pessoa quem eu admirava e quem ela
é, são completamente diferentes e ainda não sei como lidar com isso.
— Lexie, onde você está? — é a primeira coisa que Durant pergunta ao
atender a ligação.
— Você sabia sobre a minha mãe, né? — devolvo, tentando manter a
voz firme. — Sobre o que ela fez, sobre Schavier, sobre tudo... e mesmo
assim, você me jogou pra ele. Por quê? Por quê? Por que fez isso?
Ele respira fundo do outro lado da linha e fica em silêncio por quase
uma eternidade, me deixando nervosa e irritada.
— É complicado, Lexie.
— Tudo é — retruco.
Mordo o lábio inferior e sento na beirada da cama do meu antigo
quarto. Tantos momentos aqui, com minha mãe. Momentos em que ela foi
tudo para mim, minha heroína, meu alicerce e agora, não tenho certeza de
nada.
— Como teve coragem de fazer isso comigo, Durant? Você é um
amigo da família e eu confiei em você.
Outra respirada pesada.
— Não é fácil dizer não pra ele, Lexie. Eu não podia arriscar isso.
— Por que não? — retruco.
— Porque ele ameaçou minha família também — rebate, me deixando
desestabilizada e sem palavras para dizer em voz alta. — Acha que eu gostei
disso? Eu me ofereci pra fazer o trabalho, mas Schavier não quis. Ele exigiu
que fosse você.
— Por quê? Eu odeio toda essa situação.
— Depois que Emily o largou, Schavier passou a odiar sua mãe, Lexie.
Trabalhar com você era um jeito de... eu não sei, vingança pessoal. Ele é um
doente — diz a última frase em um sussurro.
— Você devia ter me contado.
— Eu quis, mas não podia arriscar a segurança da minha família.
Mordo o lábio inferior com força de novo até sentir gosto de metal e
tento segurar as malditas lágrimas que enchem meus olhos mais uma vez.
Droga. Estou cansada de chorar, parece que sou a merda de um encanamento
com problema.
— Minha mãe... ela acabou com a vida de um homem inocente. Ele se
suicidou na cadeia, Durant — digo com o coração apertado.
Ontem, meu pai me aconselhou a não aprofundar no assunto. Mas eu
sou teimosa demais e queria saber como o homem que minha mãe incriminou
estava. Acabei descobrindo que ele tirou a própria vida.
— Schavier tinha Emily na palma da mão por saber tudo o que ela fez,
sua mãe não teve escolha. Fez o que fez pra proteger a família dela. Sinto
muito, querida.
Durant me faz concluir que ele teria feito o mesmo. Ele condenaria a
vida de uma pessoa inocente para salvar os seus. Mas o mundo não pode ser
assim. Ou pode?
— Os fins justificam os meios?
— Talvez sim, talvez não. Mas Lexie, não culpe sua mãe quando ela só
estava tentando proteger a família. Ela não era uma mulher má e ajudou
muita gente. Não a condene por causa um erro que foi obrigada a cometer.
Aperto o celular com tanta força, que a mão começa a doer, mas não
digo nada.
— Emily não merece ser lembrada por uma coisa ruim que fez no
passado, porque ela era uma grande mulher — volta a falar, me fazendo
prensar os lábios e piscar rápido, na tentativa inútil de segurar as lágrimas. —
Então, trate de encontrar formas de conviver com isso, Lexie e não crie um
monstro na sua cabeça, porque sua mãe era assim.
— Eu sei — é a única coisa que murmuro.
— Como descobriu? — Durant quer saber.
— É uma longa história.
— Eu preciso ir, Lexie — diz, a voz ressoando cheia de preocupação.
— Preciso cuidar dos meus — e sem esperar por respostas, encerra a ligação.
Pego-me olhando para o aparelho nas mãos por alguns minutos e reúno
coragem para mandar uma mensagem de texto a Nicholas.
Ele é a única pessoa que pode proteger as pessoas com quem me
importo no momento.
“Preciso da sua ajuda pra proteger um amigo. Outro amigo.”
Jogo-me na cama e encaro o teto pintado de azul escuro e estrelado,
lembrando do dia exato em que meus pais e eu fizemos isso. Foi um dia tão
normal e feliz. Não parecia que coisas ruins aconteceriam a minha família.
Quem diria que quatro anos depois, eu perderia minha mãe para uma doença.
As lágrimas que eu tanto tentei segurar nos últimos minutos, escapam
dos olhos e fazem caminho até a boca. Elas têm gosto de fel e fazem meu
coração doer de saudade, de raiva, de culpa.
Droga, Lexie. Sua mãe fez o que fez para manter a família a salvo. E
você também acabou com a vida de um garoto inocente, não esqueça disso.
— Tão parecidas, mãe — sussurro entre as minhas lágrimas ácidas.
Talvez esteja na hora de eu tentar encontrar formas de justificar os atos
da minha mãe e aprender a conviver com os seus erros. Com os meus
também.
Dias depois...
Lexie Rogen devia ter vindo com um manual de instrução.
Eu entendo bem de mulheres quando o assunto é levá-las para a cama e
fazer com que cheguem a um orgasmo. Desde que vim para Montreal, eu não
me envolvi sentimentalmente com ninguém. Sexo sem compromisso estava
muito bom para mim. Mulheres diferentes na minha cama, não me cobravam
atenção ou explicações sobre o meu trabalho ou minha vida.
Era perfeito e eu não tinha necessidade de amar ou ser amado por
alguém. E eu gostava mesmo da minha privacidade, da solidão do meu
apartamento. Ficar sozinho, aprendi a gostar e dar valor a isso.
No entanto, me pego preocupado e inquieto por Lexie ter sumido das
minhas vistas. E num ímpeto de raiva, eu até esmurrei um dos meus homens
por não ter ficado de olho na garota. Agora, não consigo encontrá-la em
nenhum lugar na porra dessa cidade.
Como ela conseguiu sair sem que ninguém tenha visto?
Eu preciso de um manual para entendê-la e tenho a leve impressão de
que ela acha o mesmo de mim. Está na cara que a garota não me entende e
não posso culpá-la por isso. É culpa minha.
Aprendi a não deixar as pessoas saberem o que estou sentindo de
verdade. É mais seguro... para mim, apenas. Mas eu sei que quando Lexie me
olha, tenta encontrar algo bom na minha alma, o que me irrita um pouco.
Não existe nada de bom em mim.
Levanto da banqueta quando vejo Lexie entrar no meu apartamento.
Está tão linda, usando short jeans, que deixam uma parte significativa das
belas coxas de fora e uma blusa branca, que realçam os seios.
De maneira tímida, ela abre meio sorriso e os olhos grandes e redondos
dançam pela garrafa de uísque e o copo de cristal em cima da ilha.
— Oi.
— Você voltou — murmuro, me sentindo estranho. — Onde estava? —
pergunto, e sem saber o porquê, estou ansioso.
— Na casa do meu pai, eu precisava de um tempo sozinha — diz e eu
franzo o cenho, começando a negar com a cabeça. — Eu vi seus homens do
lado de fora, mas não me viram. Eu sei me esconder bem — se explica.
Engulo em seco e assinto, mas não sei o que dizer. Talvez, eu saiba,
mas são tantas coisas e sei que nenhuma delas é o que Lexie quer ouvir de
mim. Além de aprender a gostar da solidão, aprendi a ser um cretino.
— E o seu tio?
Respiro fundo e enfio as mãos no bolso da calça moletom.
— Você estava certa — digo, fazendo Lexie arregar os olhos e vincos
se desenharem na testa. — Não sobre vingança ou justiça, mas sobre pensar
antes de agir contra ele.
Minhas ações sempre foram pensadas, mas naquele dia eu fiquei com
tanta raiva, que queria ir até Toronto confrontá-lo e meter uma bala no meio
da cabeça dele. Mas antes que pudesse colocar meu plano em ação, Noah me
interceptou e me lembrou que eu não podia agir com a raiva me dominando.
Eu precisava dominar a raiva primeiro e trabalhar de forma calma e certeira.
É claro que isso significa que não posso ir atrás do meu tio de qualquer
jeito. Não sabemos a sua relevância para essa tal de organização que ele faz
parte e acabar com ele pode resultar em uma guerra que ninguém está
disposto enfrentar.
Só quero dar um fim no meu tio, sem vítimas inocentes do meio do
caminho. Chega de sangue inocente nas mãos.
Ela morde o lábio inferior e dá alguns passos até mim, parando a um
metro de distância. Abre a bolsa tiracolo e tira de dentro um envelope
marrom e me oferece. Hesito no começo, mas acabo pegando.
— Eu andei fazendo algumas coisas — murmura e me deixo hipnotizar
pelos olhos verdes claros.
— O que isso quer dizer? Aonde quer chegar? — pergunto ao
gesticular com o envelope.
— Eu hackeei as câmeras de segurança da casa de Schavier. Está tudo
aí, minhas anotações sobre os horários que os homens trocam de turno. Ele
tem muita segurança pra um homem que mora sozinho.
— Por que fez isso? — quero saber, abrindo o envelope e checando as
informações antes de colocá-lo em cima do balcão. — Você teve muito
trabalho.
— Eu descobri que minha mãe e Schavier foram noivos.
Ouvir aquilo me pega de surpresa e eu não consigo dizer nada de
imediato, então ela continua:
— Ele a ameaçou, por isso, minha mãe mandou um cara inocente pra
cadeira. E lá na prisão, desesperado, o homem tirou a própria vida — fala,
mordendo o lábio inferior e desviando os olhos grandes e brilhantes de mim.
— Ela era minha heroína e agora, eu sinto que não a conhecia de verdade.
Contraio a mandíbula, deixando o ódio que sinto de Schavier acelerar
meu coração.
— Lexie...
Ela finge um sorriso.
— Tá tudo bem. No envelope tem um pen drive, são coisas que podem
levar o seu tio pra prisão. Você decide o que fazer com ele. Eu acho que não
me importo mais — acrescenta a última frase com sussurro.
Abro a boca para falar alguma coisa, mas sou interrompido quando ela
gira nos calcanhares para ir embora do meu apartamento. Mas Lexie não vai,
os pés paralisam e a vejo virando o corpo na minha direção.
— Nicholas... — fala baixinho. — Eu sei quase tudo sobre você. Na
verdade, eu sei o que tinha na internet. Decorei suas notas da escola,
faculdade, essas coisas. — Solta uma risada de leve. — E mesmo que não me
deixe entrar na sua vida, eu preciso dizer isso.
— Dizer o quê?
A língua passa pelos lábios carnudos antes de mordê-los, e então, olha
nos meus olhos de novo, como se fosse capaz de enxergar minha alma.
— O acidente do seu pai... você não é culpado por isso, Nicholas.
— Sim, eu sou, porque eu estava ao volante, Lexie — é a única coisa
que digo.
Ela volta a se aproximar de mim e pega uma das minhas mãos entre as
suas. Torna a me olhar de um jeito que nenhuma mulher ousou me encarar
antes. Lexie não tem medo de mim ou do que posso fazer e ainda continua
tentando me entender.
— Vou voltar pro meu apartamento em Toronto. Minha vida está lá —
avisa, e meu primeiro instinto é negar com a cabeça, como a porra de um
idiota. — E acho que você não precisa mais de mim aqui, mas caso aconteça
algo, você tem meu número.
Seguro-a pelo pulso, de forma firme, mas sem machucá-la, impedindo-
a de continuar caminhando na direção da porta.
— Você sabe que não posso deixar você ir — falo, a voz soando mais
ríspida do que pretendia.
— Por que não, Nicholas? — questiona, os olhos dançando pelo meu
rosto. — É por causa da máfia? Ou por causa de você? — Lexie respira
fundo. — Sinceramente, estou cansada de ficar ganhando foras de você,
então, por favor, me deixe ir. O único jeito de eu ficar aqui é se você me
mat...
Silencio Lexie quando solto seu pulso e envolvo a mão na cintura fina,
puxando-a contra meu corpo.
— Ah — geme. — Por que isso? — indaga, as duas esmeraldas fixando
meus lábios.
Foda-se.
Sem dizer nenhuma palavra, subo com uma das mãos até o rosto
delicado e prendo uma mecha colorida e rebelde atrás da orelha. E devagar,
acaricio a bochecha saliente e rosada antes de encaixar a mão na sua nuca,
entre os cabelos e puxá-la para mim.
Lexie solta um gemido involuntário de novo e isso é tudo que eu
preciso no momento para grudar meus lábios aos seus. Não tem resistência da
parte dela, a boca se abre, me deixando mergulhar a língua nela.
As suas mãos contornam meus braços, me puxando para mais perto, se
entregando totalmente ao beijo sedento e molhado. Quando ela mordisca meu
lábio inferior e volta a envolver nossas línguas, minha ereção desperta.
Ela se afasta um pouco de mim, apenas o suficiente para tirar a bolsa do
ombro e deixá-la cair no chão e num pulo, entrelaçar as pernas na minha
cintura e os braços em volta do meu pescoço, em seguida, torna a me beijar
com vontade.
Desço com as mãos até as coxas dela e aliso, roubando gemidos que eu
engulo com a boca e sentindo-a estremecer em meus braços. Ainda aos beijos
e mordidas, levo-a até o quarto.
Encosto-a na parede, pressionando meu corpo contra o dela e com os
dedos ágeis, seguro a barra da sua blusa e passo-a pela cabeça. Lexie me
encara, a respiração ofegante e os olhos verdes, que estão um tom mais
escuro, queimando de desejo.
Ela se inclina para frente, procurando minha boca e me devorando com
um beijo. Depois com a língua, Lexie percorre meu pescoço e as unhas
pequenas cravam em meus ombros.
Meu pau pulsa em ansiedade, louco para estar dentro dela, desse corpo
pequeno, quente e gostoso. Aperto seus quadris contra a ereção e ela arfa
contra a minha boca ao mesmo tempo em que os dedos passam entre meus
cabelos e puxam de leve.
— Lexie... — grunho no seu ouvido, apertando-a ainda mais contra
mim, roçando de leve minha ereção na parte mais sensível do seu corpo.
Levo-a até a cama e a deito, desamarro um tênis de cada vez e tiro,
jogando-o no chão, e então, subo em cima dela, focalizando seus olhos antes
de mordiscar o lábio inferior e envolvê-la num beijo sedento.
As mãos dela encontram a barra da minha camisa e arrastam para cima,
numa ansiedade para tirar o tecido. Quando ajudo-a passar a camisa pela
cabeça, sinto Lexie passear com os dedos delicados em cima das minhas
cicatrizes e deslizar com as mãos até os meus braços e ombros. Em seguida,
segura meu rosto e me puxa para ela, me prendendo num beijo lento e
intenso.
Seus lábios carnudos se encaixam nos meus e eu sugo com vontade,
fazendo-a fincar as unhas nas minhas costas e envolver num abraço as coxas
deliciosas na minha cintura. Meu pau lateja de tesão e eu preciso me controlar
para não arrancar o resto das roupas dela e ir com tudo.
— Nicholas... — ela geme, me deixando louco.
Procuro o zíper do short e abro, passando o jeans pelas pernas e
relevando uma calcinha de renda sexy. Minhas mãos deslizam pelas coxas
salientes, que parecem implorar para serem lambidas, beijadas e mordidas.
Lexie arqueia os quadris para mim, ofegante e com os olhos inebriados de
tesão.
Pressiono minha ereção contra a sua coxa, roubando um gemido
delicioso dela.
Sem aviso prévio, enfio os dedos na lateral da calcinha e rasgo. Lexie
solta um gritinho de surpresa e me olha de boca e olhos escancarados. Apoia
os cotovelos na cama e me observa jogar a renda rasgada no chão.
— Você faz muito isso? Porque se sim, você vai passar a comprar
minhas calcinhas... ah — geme ao jogar a cabeça para trás, quando deslizo
devagar uma das mãos entre as coxas. — Tudo bem, talvez assim seja um
jeito interessante de pagar pela minha calcinha.
Passo as mãos pela lateral do seu quadril, cintura e vou subindo até
chegar nos seios vestindo sutiã. Com os dedos nas costas, encontro o fecho e
abro, tirando a peça e jogando para o lado. Os seios redondos e lindos
parecem apontar para mim, implorando para serem explorados.
Cubro seu corpo com o meu, sentindo a rigidez do mamilo intumescido
contra minha pele. Beijo seu pescoço, descendo pelo ombro e encontrando o
colo. De forma lenta, vou fazendo uma trilha com beijos e lambidas até meus
lábios encontrarem um dos seios.
Coloco um mamilo na boca, sugando de leve, aumentando a
intensidade quando Lexie pressiona o quadril contra a minha ereção e geme
meu nome de olhos fechados enquanto desliza as mãos sobre o meu cabelo.
— Linda... — sussurro, fazendo Lexie suspirar. — Quero chupar você
inteira.
Sugo o outro seio ao mesmo tempo em que abaixo uma das mãos,
tocando a cintura fina e descendo até entre a parte interna das coxas,
afastando as pernas de Lexie, que se abrem para mim sem nenhuma
resistência.
Lexie já é tão minha... acho que ela nem tenha consciência disso.
Meus dedos deslizam, roçando devagar na sua abertura e no clitóris, e
então, penetro o dedo indicador, roubando um gemido dela e quando ergue o
quadril contra minha mão, enfio outro dedo, sentindo o quanto ela é macia e
está tão molhada, que me deixa louco.
— Tão molhada — sussurro, buscando seus olhos. — Você é linda,
Lexie.
— Nicholas... — geme, fazendo força para não desviar os olhos de
mim. — Eu... — ela não consegue terminar a frase.
— Quero sentir o seu gosto.
Vou descendo com os beijos até chegar no seu umbigo, onde enfio a
língua e noto a sua respiração acelerar mais ainda. Volto a trabalhar com a
boca sobre a barriga e devagar, roço os lábios na pele sensível das suas coxas,
indo até a virilha, chupando os lábios da bocetinha antes de passar a língua no
clitóris.
— Ai Deus! Isso... — ela geme, fechando os olhos e jogando a cabeça
para trás.
Minha língua sobe e desce devagar sobre o clitóris inchado, fazendo-a
abrir ainda mais as pernas, toda entregue a mim. Linda. Sinto uma de suas
mãos no meu cabelo enquanto geme de prazer.
— Delícia — grunho contra a sua bocetinha e volto a passar a língua na
pele quente.
Meu pau está latejando muito para se afundar nela, mas preciso vê-la
gozar primeiro. Quero o seu corpo pequeno e quente derretendo na minha
boca. Quero Lexie delirando de prazer antes de mergulhar com o meu pau
nela.
Encaixo as mãos nos seus quadris e trago-a para mais perto do meu
rosto, e me empenho em lambê-la, chupá-la, massagear o clitóris quente
contra a minha língua. Ela é deliciosa e eu posso me acostumar com isso, vê-
la se contorcendo de prazer na minha cama, puxando meus cabelos e
chamando meu nome, abraçando meus ombros com essas coxas sexys.
É o paraíso.
— Nicholas... — murmura, a voz arfante. — Eu acho que vou... — As
pernas em meus ombros tensionam, então mantenho o ritmo, friccionando a
língua no seu sexo molhado, sentindo o seu gosto, que é tão doce e viciante.
E ela arqueia todo o corpo para frente e aperta as pernas em volta de
mim, soltando um gemido alto e gozando na minha boca, chegando no ápice
do prazer, como se o corpo queimasse em chamas.
É linda, é perfeita.
Lexie apoia os cotovelos na cama e me encara, os olhos verdes
dilatados, a boca entreaberta e a respiração ofegante. Estica a mão e segura
meu rosto, me puxando para ela e me envolvendo num beijo com sabor de
sexo.
As mãos descem até o elástico da minha calça moletom e quando sinto
a mão pequena contra a minha cueca, solto um gemido rouco.
— Uau — ela murmura contra a minha boca. — É grande — emenda,
pressionando o quadril contra o meu pau duro.
— Lexie, eu preciso...
— Sim, sim — me interrompe, sem deixar de massagear meu pau. —
Eu preciso disso também.
Afasto-me dela e desço a calça moletom junto da cueca, ostentando
meu pau e fazendo Lexie engolir em seco e morder o lábio inferior em
seguida. Caminho até a cômoda ao lado da cama, sob os olhos curiosos da
garota. Abro a primeira gaveta e tiro o preservativo.
Antes que possa rasgar o envelope, ela se arrasta na cama e vem até
mim, segurando meu pau com as duas mãos e abrindo a boca. É uma visão de
louco. Os lábios carnudos e rosados de Lexie cobrem meu pau e o meu corpo
inteiro arrepia.
Droga.
Ela chupa, devagar primeiro, lambuzando-o todo e depois passando a
língua na cabeça antes de abocanhá-lo. Um barulho de engasgo escapa da sua
garganta, mas ela não para e mantém os olhos grandes e redondos focados em
mim, estudando minhas reações.
Preciso fazer muito esforço para não gozar que nem um adolescente
com problema de ejaculação precoce, mas é tão difícil. A boca dela é macia e
quente, parece ter sido feita para engolir meu pau.
— Lexie — gemo, e com cuidado, seguro seu rosto com a mão livre e a
puxo para cima, lascando um beijo de língua na sua boca, marcando território
e misturando os nossos gostos.
Rasgo o envelope da camisinha e ela me ajuda a deslizar a proteção
sobre o meu pau. A garota parece gostar de manter as mãos em mim. Sorrio,
entrelaçando as mãos nos seus cabelos e mordiscando seu queixo antes de
jogá-la na cama.
Vou para cima dela, abrindo suas pernas com a minha coxa para
melhorar o meu acesso e encaixando nossos corpos de forma perfeita. Com
uma das mãos, brinco com o pau na fenda molhada e ela reage de imediato,
se contorcendo e soltando gemidos que me deixam ainda mais excitado.
Penetro devagar, deixando-a se acostumar com o meu tamanho e no
mesmo instante, Lexie envolve os braços em volta do meu pescoço e abraça
minha coluna com as pernas, facilitando o meu acesso, ficando toda aberta
para mim.
Os quadris dela se arqueiam e a sua boceta molhada engole o meu pau,
me fazendo perder o controle. Afundo de uma vez dentro de Lexie, que geme
alto, cravando as unhas nas minhas costas e me apertando com as pernas.
Lanço-me para dentro e para fora, num ritmo forte, intenso e delicioso.
Ela gosta, pois continua a me apertar, arranhar e me puxar contra o corpo
pequeno, gemendo meu nome de olhos fechados.
— Olhe pra mim, Lexie — digo, a voz soa como um rugido. E assim,
ela faz, os olhos verdes e redondos se prendem aos meus e eu mal consigo me
conter. Dou ainda mais intensidade aos meus movimentos, entrando com
vigor dentro do seu corpo pequeno e quente.
Engulo um gemido seu ao beijá-la, envolvendo nossas línguas e depois
descendo com beijos pelo pescoço, uma mão na cintura, apertando com força
e a outra cheio do seio redondo e de mamilo rígido.
— Quero ver você gozar de novo — falo, metendo uma vez e depois
outra, enchendo-a completamente com o meu pau.
— Nicholas... eu acho... eu acho... — geme, me fazendo enfiar com
mais força, aumentando as minhas estocadas, ecoando o barulho de dentro e
fora e o som dos gemidos entrecortados.
Lexie deixa escapar outro gemido alto ao se entregar ao orgasmo, me
fazendo quase sorrir. Continuo com o ritmo vaivém, enfiando fundo enquanto
aperto sua cintura com força e mordisco o seu pescoço.
Não demora nada para eu chegar no ápice do meu prazer e gozar de
uma forma tão incrível e maravilhosa, sentindo as pernas da minha garota em
volta de mim, me abraçando, apertando e ouvindo sua respiração cansada.
Saio de dentro dela e me jogo ao seu lado na cama, recuperando o ar
por um segundo antes de tirar o preservativo e tentar acertá-lo no cesto de
lixo próximo. Sem aviso prévio, Lexie vem para cima de mim, roçando a
bunda no meu pau ainda duro e apoiando as mãos espalmadas no meu peito.
— Você é tão gostoso — comenta, arranhando de leve o meu peito e
me fazendo suspirar. — Está cansado? — quer saber.
Nego com a cabeça, esticando os lábios em um sorriso maroto.
Seguro-a pela cintura e com ela em cima de mim, me arrasto até a
cabeceira da cama e fico meio sentando. Deslizo as mãos sobre os seus seios
e barriga, e um pensamento me vem à cabeça.
— Faz uma coisa pra mim?
— O que você quer? — retruca, mordendo o lábio inferior de uma
forma sexy, que poderia ser considerado crime. Ela é uma tentação.
— Usa aquela roupa pra mim — digo, lembrando da foto que não sai
da minha cabeça desde que a vi. Lexie, usando couro preto e com um decote
que é de deixar qualquer um babando. Ah, merda. Quero vê-la daquele jeito,
na minha frente e quero tirar tudo antes de me esbaldar com o corpo dela. —
Aquela fantasia de couro — emendo.
Lexie sorri.
— Não é uma fantasia, mas... eu posso pensar no seu caso — é o que
diz, me fazendo assentir.
— Vou pedir pra alguém ir buscar no seu apartamento em Toronto.
— Eu disse que ia pensar no seu caso e não que usaria.
— Eu sei que você vai usar pra mim — digo, convicto, fazendo-a
revirar os olhos de maneira petulante e atrevida.
— Está muito confiante para alguém que rasgou a minha calcinha —
resmunga.
Com as mãos ainda na sua cintura, eu viro-a de uma vez, colocando
meu corpo por cima do seu. Os olhos verdes e curiosos me encaram,
esperando ansiosos por qualquer coisa que eu vá fazer.
— Eu comprei. Aquela calcinha... eu comprei — falo, roubando um
sorriso sexy de Lexie. — E eu sei que você vai fazer o que eu quero —
murmuro, aproximando a rosto do seu pescoço e deslizando as mãos entre as
coxas.
— Tem certeza disso?
— Uhum.
Meus dedos escorregam para fenda úmida e quente de Lexie e devagar,
penetro um dedo e depois outro, fazendo-a arquear os quadris contra a minha
mão. Tiro o dedo de dentro dela e levo até a boca, chupando e sentindo o seu
gosto.
Ela parece hipnotizada com o meu gesto, o que me faz sorrir.
Sem pressa e estudando suas reações, volto com os dedos para a parte
sensível do seu corpo. Começo a acariciar o clitóris com delicadeza, fazendo
movimentos circulares enquanto Lexie geme e estremece as pernas.
— Hum... eu acho que você sabe exatamente como me fazer mudar de
ideia — sussurra de olhos fechados e começa a gemer baixinho, se derretendo
com os meus toques.
— Goza pra mim de novo.
Ao me ouvir, ela abre os olhos e me encara, o rosto uma mistura sexy
de tesão e arrebatamento.
— Eu acho... eu acho que não tenho escolha — fala, a respiração
acelerada.
Lexie morde o lábio inferior e joga a cabeça para trás, curvando todo o
corpo e deixando escapar gemidos que me deixam excitado pra caralho. Ela é
linda gozando e eu quero ter essa visão só para mim.
Sexo sem camisinha... definitivamente, eu não deveria estar fazendo.
Mas depois de entrar no banheiro para um banho e Nicholas vir atrás de
mim, nu e cheio de mãos e a boca roçando na parte sensível do meu pescoço,
foi difícil pensar em pegar um pacote de preservativo na cômoda do quarto
ou resistir e não me entregar a ele em cima da pia.
No fim do ato, com cuidado, ele me ajuda a descer e liga a torneira para
encher a banheira com água morna. Segurando minha mão, me faz entrar e
em seguida, ele faz o mesmo, sentando de frente para mim.
Sem aviso prévio, as mãos grandes começam a fazer uma massagem
firme e bem provocante em um dos meus pés, sem tirar os olhos intensos dos
meus. Meu Deus, o homem é insaciável.
— Eu achei que fôssemos tomar banho — murmuro, contorcendo o
corpo à medida que a massagem fica intensa. O meio entre as minhas pernas
começa a latejar e ondas suaves percorrem meu corpo.
— O que acha que estamos fazendo? — retruca, estudando minhas
expressões.
— Você está tentando me seduzir... de novo.
Mordo o lábio inferior, tentando dominar as sensações, os batimentos
cardíacos e a respiração acelerada, mas é impossível, não tenho o menor
controle sobre a excitação que está queimando a minha pele.
O rosto dele suaviza conforme um sorriso lascivo vai esticando seus
lábios. Nicholas parece satisfeito com a tortura.
Respiro fundo quando ele troca de pé, e em questão de segundos, meu
corpo volta a incendiar. Fecho os olhos, sorrindo e aproveitando a minha
massagem. Um gemido entrecortado escapa da minha boca no momento em
que as mãos descem até as pernas.
— Vem cá — ele ordena.
Eu nunca fui uma garota obediente, mas droga, eu obedeço sem
pestanejar e me arrasto até ele, que me envolve num beijo lento, quente e
molhado. E então, de mansinho, Nicholas me vira e me faz sentar de costas
para ele.
— Hum... — sussurro ao sentir a ereção contra a minha bunda. Ele é
grande e uau, eu gostei tanto disso. Muito. — Você vai me matar de tesão.
— Isso é ruim?
— Não, só continue. Passei tempo demais na seca.
Encosto minha cabeça contra seu peito e sem dizer nada, Nicholas
levanta uma das minhas pernas e coloca na borda da banheira. Fiquei um ano
sem sexo, mas mesmo antes, não lembro de ter ficado tão exposta para um
homem como estou agora.
Não é só o meu corpo que está exposto e vulnerável. É o meu coração
também.
— Vou fazer carinho em você — murmura no pé do meu ouvido e a
única coisa que faço é prender a respiração. — Você quer?
Assinto de lábios prensados, sem conseguir dizer as palavras em voz
alta.
Eu sinto que estou prestes a desfalecer, mas mesmo assim, eu quero
que ele faça carinho em mim. Nunca tive tantos orgasmos seguidos com
nenhum dos meus ex-namorados e o homem está querendo me levar à
loucura de novo. Se eu não morrer nessa banheira, não morro nunca mais.
De mansinho e de forma incitadora, vejo a sua mão explanando minha
cintura e vai descendo, descendo e os dedos atrevidos encontram a parte mais
sensível do meu corpo. Arqueio meus quadris quando o sinto roçar dois
dedos de leve no meu clitóris, me provocando e observando minhas reações.
— Você é uma delícia, sabia disso? — murmura contra meu ouvido, a
voz soando tão quente e sexy, que tenho a sensação que a qualquer minuto
posso derreter em suas mãos.
De lábios prensados, assinto, fazendo-o ri baixinho e morder o lóbulo
da minha orelha de leve, dando uma intensidade sublime as carícias no meu
clitóris. Gemo ao senti-lo penetrá-lo dois dedos em mim. Fecho os olhos e
aproveitando o momento.
Não demora muito para os músculos do meu corpo começarem a
tensionar, e isso faz com que Nicholas alterne os movimentos circulares e o
vaivém dos dedos. Arfo, amando a sensação.
— Goza na minha mão, Lexie — ordena ou pede, eu não sei, mas não
parece que tenho outra escolha, além de me deixar derreter em suas mãos.
Arqueio todo o meu corpo ao alcançar o meu orgasmo maravilhoso e
mesmo depois de ter me feito gozar, ele continua me tocando, friccionando
os dedos na parte sensível e inchada, ainda roubando gemidos de mim.
E só então, afasta a mão de mim para lamber os dedos, sentindo o meu
gosto e me deixando hipnotizada. Eu adoro quando Nicholas faz isso. Com
delicadeza, desce minhas pernas e eu respiro fundo quando a pele submerge
na água morna.
— Seu gosto é bom — sussurra ao depositar beijos quentes na
curvatura do meu pescoço.
— Agora é oficial, eu preciso de um descanso. Se você me fizer gozar
mais uma vez, eu morro.
Ele ri de leve.
— Não acredito que esse corpo passou tanto tempo sem ser tocado —
murmura, passando com carinho as mãos na minha cintura. — Você é tão
linda, gostosa.
— Você fez um belo trabalho — é o que digo, sorrindo e respirando
fundo. Eu preciso dormir para recarregar minhas energias.
— Fique aqui — fala, de repente.
Franzo o cenho e viro o rosto para olhá-lo nos olhos.
— Como assim? — questiono. — Ficar aqui na banheira? Ou ficar aqui
em Montreal? Ficar no seu apartamento ou ficar com você? — faço as
perguntas antes do meu cérebro filtrar as palavras.
Ele abre a boca para responder, quando o celular começa a tocar de
algum lugar de dentro do quarto. Como no automático, olhamos o cômodo
através da porta aberta. Nicholas se remexe na banheira, mas fica no mesmo
lugar, alisando meus ombros nus.
— Não vai atender?
— Não — é o que ele responde e o celular silencia sozinho, mas antes
que possa falar algo, a música torna a tocar, fazendo Nicholas suspirar em
desgosto.
— Eu acho que deve ser importante — assim que fecho a boca, alguém
bate à porta do quarto de maneira firme e meu coração congela. Arregalo os
olhos e encaro Nicholas, que nega com a cabeça, tentando me tranquilizar. —
Eu tô pelada — sussurro.
Ele ri, aquecendo meu coração.
— Não se preocupe, Lexie — fala, segurando meu queixo com as
pontas dos dedos e alisando minha bochecha. Sorrio e concordo de lábios
prensados.
— Me desculpe interromper — um homem diz do outro lado da porta.
— Mas o senhor precisa ir na mansão Carbone, é importante. Lexie deve ir
também.

No escritório da mansão da família Carbone, eu dou as instruções a


Noah no tablet. Ele abre um sorriso contente, como se eu tivesse dado
poderes ao homem.
Bem, talvez tenha dado mesmo, já que invadi a conta bancária de
alguém que eu não conheço e agora, o chefe da máfia Carbone tem controle
sobre uma quantia significativa de dinheiro de contas fantasmas.
— Isso é incrível. Fantástico — Noah diz, ainda sorrindo.
— O que você vai fazer? — pergunto, fazendo os homens no escritório
me encararem como se eu tivesse xingado alguém importante. — É proibido
questionar? Eu não sabia. Ou só não posso falar quando estiver dentro deste
escritório? — acrescento.
Noto Nicholas fechando os olhos por uma fração de segundos, mas na
real, parece que ele está tentando esconder um sorriso.
— Você é curiosa — Julian comenta, com o cenho franzido. — Tem
certeza de que não é uma irmã perdida da Jolina? A personalidade é muito
parecida.
Noah começa a rir e em seguida fala:
— O dinheiro move as pessoas, querida.
Assinto, sem fazer a mínima ideia de onde ele quer chegar com essa
filosofia barata sobre pessoas e dinheiro. Coloco um sorriso e entrego o tablet
a ele, satisfeita com meu trabalho.
Droga. Satisfeita com meu trabalho ilegal.
Eu tô perdida.
— Pode ir, Lexie — Noah diz.
Como em modo automático, Nicholas vem até mim, tocando minhas
costas com carinho, mas de maneira precisa e me conduz até a porta. Finjo
não sentir meu corpo reagir com o toque dele.
— Vá pro apartamento e descanse, eu te vejo mais tarde.
— Isso é uma promessa de que vai me fazer passar a noite acordada e
gozando? — retruco.
Os lábios dele se curvam em um sorriso cínico.
— Vá e durma, ok?
Antes que possa confirmar, ele se inclina e tasca um beijo necessitado
na minha boca e surpreendentemente, pisca para mim antes de voltar para
dentro do escritório. Fico sem reação, mas acabo sorrindo.
Eu gostei dessa versão. Muito.
— Relacionamento puramente profissional, hein? — uma voz feminina
pergunta, me assustando.
Olho para o lado e encontro Jolina no começo do corredor, encostada
na parede e com um sorriso travesso emoldurado no rosto. Suspiro e me
aproximo dela, sem ter nada a comentar sobre o que ela presenciou.
— Preciso conversar com você, Lexie — ela diz.
— Claro.
Caminhamos até o hall de entrada e paramos próximo ao piano aberto.
— Preciso de um favor, na realidade. — Os olhos dela parecem
ansiosos, então eu assinto, concordando, mesmo sem saber do que se trata. —
Tem uma pessoa que minha melhor amiga e eu estamos tentando encontrar,
mas sem sucesso.
— Algumas pessoas difíceis de serem encontradas, Jolina — murmuro
mais para mim do que para ela.
— Eu sei, por isso estou falando com você.
Suspiro e sorrio.
— Tá bom. Me passa o nome completo e uma foto, eu vou hackear o
sistema de identificação facial da CSIS e tentar encontrar alguma coisa que
possa ajudar — digo, mais animada do que pretendia. — Ai, meu Deus! Eu
falei isso alto demais? — comento, roubando uma risada dela.
— Pode me chamar de Lina.
Estou prestes a falar algo, quando noto Romie descer as escadas, toda
serelepe e sorridente. Ao parar no último degrau, se joga na cunhada e se
engancha em seu braço e pergunta algo sobre ela estar pronta para irem as
compras.
— Quer vir com a gente? — Lina quer saber, mas eu nego com a
cabeça. — Minha melhor amiga já deve estar esperando no Shopping.
— Eu não sei. Tô bem cansada — murmuro.
Romie semicerra os olhos para mim, toda cheia de desconfiança.
— Você tem ficado na casa do Nick e tá bem cansada, mas não parece
triste ou desmotivada. Hum... vocês estão transando, né? É isso!
Pigarreio. Meu Deus, ela é esperta e rápida.
— Você vem pra minha festa de noivado? — Lina pergunta, rindo.
Franzo o cenho e mordo o lábio inferior.
— Eu não estava sabendo de nada — admito, fazendo Romie balançar
a cabeça de um lado para o outro e revirar os olhos. — Quando vai ser?
— Esse final de semana. Uma festa de noivado no cassino. Não é
incrível? — é Romie quem pergunta, muito animada. — Vem, vamos
comprar algum vestido escandaloso e que vai deixar Nick de queixo
caidinho. O que me diz?
Tento segurar o sorriso.
— Eu acho que é uma excelente ideia — Lina dá corda.
Prenso os lábios e finjo pensar por alguns segundos antes de concordar
com um aceno de cabeça. Romie enrosca o braço livre no meu e nos puxa
para saída da mansão, comentando sobre a sua loja de vestidos preferidos no
shopping.
Escolher algo de deixar o Nicholas de queixo caído e talvez, fazê-lo
desejar arrancar meu vestido não parece uma ideia ruim. Ele já mostrou que
sabe fazer coisas incríveis com as mãos salientes e aquele pau grande.
Deixá-lo louco de tesão... minha nova missão de vida.
Lexie me observa da soleira da varanda. Está com uma xícara de café
grande nas mãos, usando uma blusa minha como pijama e os cabelos presos
em um coque bagunçado e sexy.
— Se você vai continuar malhando desse jeito, eu preciso fazer alguma
coisa — comenta, sem tirar os olhos de mim.
Com um pulo, desço da barra fixa, pego a garrafa de água em cima do
banco e me aproximo dela, segurando seu queixo com a ponta dos dedos. Os
olhos curiosos e grandes dançam pelo meu abdômen e a noto engolir em
seco.
— Do que está falando? — Ainda segurando seu rosto, o ergo para
mim. — Meus olhos estão aqui, Lexie.
— Você é tão duro, nem parece de verdade — comenta e o rosto desce
de novo, os olhos caindo no meu corpo e em seguida, a mão livre toca meu
abdômen, me roubando um meio sorriso. — Não sei se você percebeu, mas
não sou sarada.
— Eu gosto do seu corpo assim — falo, fazendo-a revirar os olhos. —
Tem belas pernas e um quadril de tirar o fôlego. É perfeito pra mim.
Sem dar muita bola para o que acabei de falar, a garota gira nos
calcanhares e vai até a mesa do computador, deslizando com os dedos sobre
as teclas e trabalhando em alguma coisa.
— O que está fazendo? — pergunto, encarando o monitor e vendo no
canto superior direito algum programa de reconhecimento facial.
— Procurando alguém pra Lina. Na verdade, procurando alguém pra
melhor amiga dela, a Sophia — é o que diz, colocando a xícara em cima da
mesa e alongando os braços. — Isso conta como serviço prestado à máfia?
Porque eu estou procurando alguém pra melhor amiga dela, mas foi a pedido
da noiva do subchefe. Então... acha que isso vai pagar parte da minha dívida
com a família Carbone? — fala tudo de uma vez, quase atropelando as
palavras.
— Você não tem dívida com a família Carbone, Lexie.
Ela vira o rosto para mim e me olha cheia incredulidade.
— Você tem certeza? Porque eu não — retruca, me fazendo suspirar e
sacudir a cabeça. Eu tinha esquecido como ela gosta de falar e questionar
tudo. A boca bonita dela não tem controle e as palavras parecem que jorram
sem freio algum.
Caminho na direção do meu quarto, mas ela me intercepta no meio do
caminho.
— Não vou dormir aqui hoje, vou ficar na casa do meu pai — avisa, e
sem saber o motivo, fico com um gosto amargo na boca. — E precisamos
conversar sobre... eu vou voltar pra Toronto.
— Lexie...
— Eu sei que a máfia não vai parar de me pedir trabalho, e tudo bem,
na verdade, já me acostumei. O que é maluquice, né? Ficar numa sala com
um bando de mafioso não é tão ruim, o que me faz pensar que talvez, eu
tenha algum proble...
— Lexie — interrompo-a, e ela assente, suspirando.
— Eu sei, eu sei, foco. — Ela finge uma tosse e coloca um sorriso no
rosto. — Todo o meu trabalho, eu posso fazer com um computador, e bem,
existem computadores em Toronto — zomba e ri sozinha.
— Você não pode ir — é o que me ouço dizendo.
Os olhos verdes esmeraldas se prendem aos meus e a expressão no seu
rosto, é séria, na mesma medida que é questionadora. Para ser sincero, parece
que Lexie está me questionando o tempo inteiro.
— Por que não? Você quer que eu fique? — pergunta, levantando uma
sobrancelha para mim, me encurralando de forma atrevida e prepotente.
Sim, é isso mesmo. Não quero que ela vá. Não vou deixá-la ir. Ela é
minha. E eu tenho certeza de que ela ainda não sabe disso, mas Lexie é
minha. E eu a quero por perto, onde meus olhos possam vigiá-la, onde eu
possa protegê-la de qualquer coisa.
E eu sei que ela é uma verdadeira bagunça e eu sempre gostei de ter
minha vida em ordem, e que existe inúmeros motivos para mantê-la longe de
mim, mas não vou fazer a coisa certa. Vou fazer o eu quero. E bem, Lexie é o
que quero agora.
Decepcionada por não ter ouvido nenhuma palavra sair da minha boca,
Lexie dá as costas e volta para o computador. Passo a mão no topo da cabeça,
pensando no que fazer ou dizer, mas sou interrompido com o meu celular
tocando.
Vou até o quarto e apanho o aparelho em cima da cômoda. Ao ver o
número de Thomas, não hesito em atender. Talvez ele tenha algumas
novidades que eventualmente me deixarão feliz. Ou não.
— Lexie tinha razão — é a primeira coisa que fala. — Alexander
Tikhonov é um nome falso e o homem é praticamente intocável. Não foi fácil
fazer as pessoas falarem sobre ele.
— Ninguém é cem por cento intocável — retruco.
— Ele é um ex KGB.[17]
Dou uma respirada funda. É claro que as coisas não seriam simples. O
homem não podia ser apenas um bilionário da indústria automotiva, tinha que
ser um ex-agente sanguinário.
— Isso significa que não posso simplesmente acabar com ele, né? —
resmungo, o mau humor querendo tomar conta de mim.
— Exatamente — concorda, me deixando ainda mais irritado. — Vou
tentar marcar uma reunião com ele, Nicholas. Até lá não faça nada. Eu sei
que você quer vingar a morte da sua mãe, mas precisamos agir com calma.
— Você sempre diz isso, Thomas.
— É meu trabalho.
Apertando o aparelho contra o ouvido e sentindo um gosto amargo na
garganta, encerro a ligação com Thomas. Eu ainda nem fiz nada e a sensação
é que perdi uma luta contra o meu tio.
O aparelho volta a tocar, varrendo meus pensamentos. Quando vejo o
número de Dena piscando na tela, penso em recusar, mas acabo atendendo.
— Nick... — ela murmura, a voz ressoando triste e contida. Ela respira
fundo, parece cansada. — É Lawanda, aconteceu algo.
Observo Lawanda sentada no sofá do meu apartamento. Ela tem uma
perna em cima da outra, não para de balançar o pé calçado de salto alto. Os
braços estão cruzados na altura do peito e os olhos abaixados, envergonhada.
Já eu, soltando fogo pelas ventas.
Esmurrei a parede, xinguei e quebrei a cômoda do meu quarto de tanta
raiva que estou sentindo. Não raiva dela, mas raiva da situação na qual se
encontra. Minha irmã... não posso acreditar nisso.
Faz meia hora que ela chegou, de cara amarrada e arrastando uma mala
de rodinhas. Ainda não disse muita coisa e nem está com cara de quem quer
ficar conversando sobre o assunto.
Dena, minha ex-noiva, a trouxe depois de me ligar e ainda está aqui,
oscilando a atenção de mim para Lawa. E claro, olhando de vez em quando
Lexie, que trabalha no computador.
— Se vai me xingar, comece logo, por favor. Eu fui uma idiota, eu sei
— Lawanda diz, sem olhar nos meus olhos.
Respiro fundo, contraindo a mandíbula.
— Como aceitou fazer uma coisa dessas, Lawa? — Fecho a mão em
punho, tentando controlar o ímpeto de raiva e não socar outra parede ou
quebrar todos os móveis da minha casa. — Droga! — grito, fazendo minha
irmã se sobressaltar um pouco.
Quando olho para ela, ainda consigo enxergar aquela garotinha de doze
anos, que gostava de tranças e comer sobremesa antes do jantar. E é difícil
aceitar que essa mesma pessoa, se tornou adulta e tem um vídeo erótico
vazado na internet.
Minha irmã mais nova tem a porra de um vídeo erótico na internet. E a
merda do vídeo já foi visualizado mais de quinze mil vezes. Porra! Eu estou
com tanta raiva agora, que posso até matar alguém.
Pronto. Emputecido, dou um soco na mesinha de centro, quebrando-a
em vários pedaços. Lawanda encolhe os pés ao mesmo tempo em que Dena e
Lexie se aproximam de mim, querendo checar minha mão.
— Eu estou bem — é o que digo, não me importando com a mão
sangrando. Lexie assente e se afasta, voltando para o computador, tentando
de alguma forma salvar a dignidade da minha irmã, e Dena, ainda continua
me observando.
— Eu sinto muito, Nick. Sinto muito — ela começa a chorar, me
deixando nervoso. — Não sabia que ele ia fazer isso. Eu juro. Ele parecia um
cara legal, ele parecia um cara legal — choraminga.
— Você não tem culpa de nada — digo, me controlando para não
começar a falar asneira. A verdade é que estou desejando, que como mágica,
Lawanda tenha doze anos de novo para que possa enfiá-la num colégio de
freias.
Se o objetivo de vida de Lawanda fosse ser uma freia, minha vida seria
mais tranquila. Porque ao invés de se ajoelhar para chupar o pau de um cara
com uma câmera apontada para sua cara, ela se ajoelharia apenas para rezar.
Droga.
— Vou resolver esse problema, não se preocupe — alego, fazendo
minha irmã assentir. — Você fica comigo a partir de agora.
— Tá bem, vou ficar por alguns dias — é o que diz. Decido concordar,
mesmo tendo consciência de que vou fazer de tudo para manter minha irmã
ao meu lado. — Escondida, sem ter coragem de colocar o pé na rua —
emenda de forma dramática, mas acho ótimo.
— Consegui! — Lexie exclama e levanta da cadeira sorrindo. —
Consegui remover o vídeo de todos os sites — fala, me olhando com afinco e
discretamente, faz um gesto com os olhos na direção na varanda.
— Obrigada, de verdade — Lawa agradece, chorando.
Ela sorri para minha irmã e caminha até a varanda. Sigo-a, mas antes
passando a mão na cabeça de Lawa e depositando um beijo ao sussurrar que
vai ficar tudo bem. Quando chego na varanda, fecho a porta de correr e a
primeira coisa que Lexie faz é pegar na minha mão.
— Está doendo?
— Não — sou sincero.
— Eu invadi o computador do cara, ele é um predador, Nicholas. Há
vídeos de várias garotas e algumas... estão inconscientes. — Engole em seco
e suspira, parecendo escolher as palavras certas para me dizer. — E o vídeo
da sua irmã não foi o primeiro vazado.
Contraio o músculo do maxilar, irritado. Fecho a mão em punho,
tentando controlar a raiva que vem crescendo dentro de mim.
— Consiga o endereço dele.
— O que você vai fazer? — ela quer saber.
— O necessário — é só o que digo, voltando para a sala. — Vá
descansar, Lawanda. Amanhã conversamos.
Ela fica de pé e mordendo o lábio inferior, se aproxima. E
surpreendentemente, envolve os braços em torno de mim, me prendendo em
um abraço apertado. E então, os olhos azuis que são tão parecidos com os
meus, me prendem.
— Obrigada por não me odiar, Nick.
Seguro seu rosto entre as mãos e faço carinho nas bochechas.
— Por que eu odiaria você, Lawa? Não tem culpa de nada.
Ela assente e tenta sorri, depois pega a alça da mala e arrasta até o
quarto de hóspede, sem olhar para trás. Lexie para na soleira da varanda e
fica olhando Dena, que não parece nada feliz.
A verdade é que ela fez uma cara de desgosto ao chegar aqui e ver
Lexie comigo. Usando uma das minhas blusas e caminhando para lá e para
cá, exibindo as coxas bonitas e provocativas.
— Posso dormir aqui também? Já está tarde e eu ainda não comprei
passagem de volta — fala e rápido, lança um olhar de rabo de olho para
Lexie, que torce a boca, fazendo uma cara de insatisfação. — Aliás, quando
ficou tão íntimo da sua secretária?
— Não comece, Dena. Não tô muito a fim de lidar com isso agora.
Ela levanta as mãos em rendição.
— Eu sinto muito. — Abre um sorriso falso para Lexie. — Posso
dormir no seu quarto? Você fica com o sofá ou podemos dividir a cama,
como nos velhos tempos — fala, sugestiva.
— A cama dele está ocupada, Dena — Lexie responde, afiada. — Você
fica com o sofá, se não estiver bom, pode dormir no banco da varanda ou ir
pro hotel mais próximo — rosna, passando por nós, pisando duro na direção
da suíte.
Observo Lexie de costas e confesso, gostei dessa versão ciumenta.
— Você sempre gostou de mulheres delicadas. Por que seu tipo
mudou? — Dena pergunta, curiosa.
Respiro fundo e olho para ela, sem ter vontade de saciar a sua
curiosidade.
— Serei um cretino agora, mas preciso dizer isso. Não tem jeito pra
nós, então, não tente provocar a Lexie achando que vai conseguir algo.
— Nick... — murmura.
— Vá pro Cassino Hotel Carbone, se falar meu nome na recepção, eles
te darão o melhor quarto, tudo por minha conta. Vou mandar um dos meus
homens te levar, é a única coisa que posso fazer por você.
— Eu trouxe a Lawanda aqui, não me trate como lixo.
— Todas as vezes que transamos depois que fui embora... foram erros,
Dena. Boa noite — é o que digo e ela fecha a cara numa expressão dura, mas
eu não me importo.
Vou até o quarto e encontro uma Lexie sentada na cama, mexendo no
tablet e com um bico lindo emoldurando o rosto. Ao me ver ela revira os
olhos e resmunga alguns palavrões. Acho que ela está brava comigo. Talvez
seja com a situação. Ou com os dois.
— Ela é linda — fala, de cara amarrada. — O percentual de gordura
dela é dezesseis. Parecido com o seu, na verdade. — Ela vira a tela do tablet
para mim, mostrando uma calculadora e outras coisas que não faço a mínima
ideia do que são. Cruzo os braços e ergo uma sobrancelha. — Fiz o cálculo,
idade, peso e altura. A droga do casal perfeito.
Assinto, fechando os olhos por uma fração de segundos.
— Eu a mandei pro o hotel do cassino.
Lexie escancara a boca e os olhos, fingindo surpresa.
— Uau, que pena. Ela não quis o sofá? — retruca, depois começa a rir
sozinha. — Pare de me olhar assim.
— Assim como?
— Como se estivesse gostando da situação — rosna, e volta a mexer no
tablet. Sento ao seu lado na cama e faço carinho no seu rosto com o polegar
antes de beijá-la. Quando me afasto, os olhos de Lexie caem sobre a minha
mão machucada. — Vamos cuidar disso — fala de um jeito meigo, me
roubando meio sorriso.
O machucado na minha mão não é nada demais, mas eu a deixo cuidar
de mim. Por alguma razão, isso parece bom. Ser cuidado por Lexie, é bom e
me deixa com um sentimento estranho e reconfortante no peito.
— Depois vamos transar muito — ela acrescenta, rindo.
Ela está brava.
E eu sei disso porque a garota está esmurrando o saco de pancada que
pendurei na varanda como se fosse o seu pior inimigo. Ou talvez, ela esteja
imaginando que sou eu e descontando toda a frustação.
A garota usa um short pequeno, realçando as pernas e levantou a blusa,
fazendo um nó no meio da barriga. Mesmo brava, ela é linda e está sexy pra
caralho toda suada desse jeito. Devia ser ilegal alguém ser uma tentação
provocante e irresistível assim.
Só consigo pensar em me afundar no corpo dela, lamber, morder,
chupar... e sei que ela não vai deixar nenhuma dessas coisas acontecer agora.
Aproximo-me e Lexie nem percebe, continua dando socos desajustados
e sem um ritmo determinado. Nada além da raiva nua e crua contra o saco de
couro sintético a sua frente.
— Se continuar assim, vai torcer o pulso — digo ao encostar no batente
da varanda. — Firme os pés.
— Não pedi sua opinião — retruca, sem olhar para mim.
Talvez, ela tenha me percebido aqui há muito tempo e só esteja
tentando me ignorar.
— Você é pequena...
— Ah, sério? Não tinha percebido — retruca e dessa vez, olha para
mim. — Escuta aqui, falar da minha altura não vai me irritar, porque eu gosto
de ser pequena. Beleza? — diz ela, irritada.
— Não é isso, é que... — é claro que ela me interrompe.
— Eu sei o que estou fazendo, Nicholas. Durante anos, eu tive aulas
de...
A voz dela é cessada e um gemido baixo escapa da garganta quando
sem aviso prévio, minhas mãos agarram uma das suas coxas com força e
separam as pernas para ajudá-la a manter uma base forte e aumentar o
impacto do soco.
— Precisa ter cuidado com a sua base — murmuro e ela assente de
lábios prensados. — Você é pequena e pode usar isso a seu favor.
— Uhum — sussurra.
— Agora tente.
Recuo alguns passos e observo Lexie acertar o saco de pancada, dessa
vez, com um golpe poderoso e forte. Ela sorri, animada e torna a esmurrar,
várias vezes até ficar sem ar e fazer uma pausa.
— Isso é relaxante — comenta ao cruzar o olhar com o meu por um
segundo. — Ainda mais se imaginar que esse saco de pancada é um certo
alguém que estou odiando no momento — rosna.
Meus lábios repuxam em um sorriso.
— Vá, soque de novo. Soque até a raiva passar — oriento, fazendo um
gesto com a mão na direção do saco.
— Não, obrigada. Não gosto de plateia. O espaço é todo seu agora.
Lexie tenta passar por mim, mas a intercepto na soleira da varanda,
segurando seu braço e a impedindo de ir para longe. A atenção dela cai sobre
a minha mão tocando sua pele e não sei o que se passa na cabeça fértil dela,
mas gostaria de saber.
— Eu não sabia que ela...
— Não quero saber — me interrompe e se solta de mim. — Nós
transamos... algumas vezes, mas isso não significa que você me deve
explicações — emenda, um sorriso fraco estampando o seu rosto.
Ontem eu disse para Dena ir se hospedar no hotel do cassino, mas é
claro que ela não foi. Em vez disso, dormiu no sofá, e logo de manhã cedo ao
me ver com a ereção matinal, a sua mão foi direto no meu pau, em uma
tentativa inútil de me fazer fodê-la na sala. E como não podia ser pior, a
Lexie entrou na sala bem na hora em que minha ex tentou me beijar.
Tentou me beijar com a mão no meu pau.
É lógico que a loira não quer ouvir minhas explicações, porque a cena
disse muita coisa mesmo que não signifique nada para mim. Nem fiquei
excitado, mas a única coisa que Lexie enxergou de toda a situação é que eu
estava de pau duro beijando minha ex.
— Não fique brava.
Ela respira fundo.
— Quem disse que eu tô brava? — rosna e quase me faz sorrir. Eu
gosto dessa versão, é bem mais atrevida do que estou acostumado, mas é
incitante. — Não existe motivos pra eu ficar brava.
— Ah, é?
Lexie revira os olhos.
— Vamos fingir que nunca transamos — ela retruca, cruzando os
braços na altura dos seios e os deixando empinados. — Ok? Você consegue
fazer isso?
— Não, isso é impossível. Você consegue? — devolvo, meus lábios
esticando em um sorriso de canto, que deixa a loira enfurecida. — O que
você viu hoje de manhã... não foi nada.
— Pareceu muita coisa pra mim. Seu pau estava duro e Dena estava
apalpando enquanto te beijava.
— Ela não me beijou. E meu pau duro foi uma ereção matinal — me
justifico, o que é estranho. Eu nunca precisei justificar minhas ações, mas
agora é como se estivesse pisando em ovos e sinto que não vou sossegar
enquanto não resolver essa situação com Lexie.
— Algo me diz que ela gostou dessa ereção matinal. Só faltou cair de
boca — murmura, de cara fechada. — Só quero um banho agora e esquecer
tudo.
Corto a nossa distância e deslizo as mãos por seus ombros, fazendo-a
suspirar e fechar os olhos por uma fração de segundos. Gosto do jeito que o
corpo dela reage toda vez que a toco.
— Vamos. Vou fazer carinho em você.
— Tentador, mas vou tomar banho sozinha — murmura, ainda sem
abrir as pestanas. — Não tá merecendo ter uma mulher como eu pelada por
perto — acrescenta, me fazendo rir.
Ela abre um olho primeiro, como se estivesse tentando espiar sem ser
notada, e em seguida, o outro. Fica me encarando como se eu estar rindo
fosse uma novidade. Talvez seja mesmo. Não lembro da última vez que ri à
toa.
— Eu gosto quando você sorri — murmura, sem tirar a atenção de
mim.
— Por quê?
Lexie dá de ombros, sorrindo. Ela gira nos calcanhares e se afasta de
mim, mas antes de entrar no corredor que dá na direção dos quartos, a garota
paralisa e me olha por cima dos ombros.
— Pode me olhar tomando banho, mas não vai poder tocar — é o que
diz e some das minhas vistas.
Levo ar até os pulmões e sigo-a. Vamos ver se não vou poder tocá-la de
verdade. Tranco a porta do quarto e vou até o banheiro, encostando na
soleira enquanto observo Lexie tirar as roupas. Meu pau começa a pulsar em
antecipação com a imagem do seu corpo nu.
— Isso aí é o quê? — questiona, colocando uma mão na cintura e
apontando com o indicar na direção da minha óbvia protuberância contra a
calça moletom. — Não é ereção matinal, porque já é de tarde.
Sinto meus lábios se transformarem em um sorriso de canto.
— Você é a razão disso.
Lexie morde o lábio inferior, tentando esconder um sorriso. E é o que
eu preciso para entrar no banheiro e segurar o seu rosto entre as duas mãos e
envolvê-la em um beijo lento.
Os dedos delicados de Lexie encontram o elástico da calça moletom e
cueca boxer, e sem dificuldade, ela arrasta um pouco para baixo. Afasta a
boca da minha, e deixa as vistas caírem sobre o meu membro duro e que
aponta para ela.
— Você realmente não tá merecendo, mas vamos brincar um pouco —
sussurra, a boca voltando para mim e uma das mãos tocando meu pau e me
fazendo estremecer de tesão.
Lexie ainda vai acabar comigo.
Faço um gesto quase imperceptível com a mão, ordenando o soldado
que desamarre o homem à minha frente, e então, eu tiro o saco de pano que
cobre a cabeça. Ele me olha atordoado e o primeiro instinto é levantar, mas
apoio minha mão no seu ombro e o faço sentar de novo.
Não foi fácil trazê-lo de Toronto para Montreal, mas no fim,
conseguimos sem contratempos.
— O que quer comigo? — pergunta, olhando para os homens ao seu
lado, sem entender nada.
Encaro o desgraçado que vazou o vídeo erótico da minha irmã e dou
um soco no rosto dele, o fazendo quase cair da cadeira. Ainda não me sinto
melhor ou menos irritado. Talvez, depois de desfigurar a cara dele, comece a
surtir algum efeito em mim.
Outro soco.
Outro soco.
Outro soco.
Quebro o nariz do desgraçado. Mesmo assim, não me sinto melhor e
menos irritado. Esse idiota transou com a minha irmã, a filmou em momentos
muitos íntimos e vazou o vídeo em sites pornô, depois se gabou com os
amigos.
Eu odeio esse pedaço de merda.
— Querem dinheiro? — pergunta, cuspindo sangue, como se fosse ter
dinheiro de alguma forma. — Eu posso pagar qualquer quantia — mente.
Lexie já tinha descoberto muito sobre a vida desse filho da puta, e uma
delas, era que ele não tinha nem onde cair morto. Dinheiro? Ele não tem
nada. Nem se tivesse, faria alguma diferença no momento.
Balanço a cabeça de um lado para o outro.
— Não se preocupe, não quero dinheiro — aviso.
O idiota engole em seco e tenta ficar de pé de novo, no entanto, mais
uma vez, eu o sento, dessa vez, apertando seu ombro com força e o fazendo
gemer de dor e implorar para que eu pare.
— Fique sentando — ordeno, e ele assente. Os olhos esbulhados
brilhando de medo. Ótimo. Viro-me e pego o tablet que o soldado estava
segurando e começo a ler em voz alta as informações que Lexie juntou para
mim. — Eleanor Meyer, Mila Paquin, Nayla Maslany, Serinda Carter, Anna
Prout, Lawanda Farley. Esses nomes... soam familiar pra você?
— Não. Eu juro que não — responde rápido demais para ser verdade.
— É uma pena que as provas digam o contrário. — Sem pensar duas
vezes, acerto o tablet na cabeça dele e a testa começa a sangrar. — Filmando
garotas em momentos íntimos e vazando em sites pornôs.
— Não foi por maldade, eu juro — choraminga. O cara é um bundão de
merda. — Se você me soltar, eu nunca mais vou fazer isso e nem vou
denunciar vocês.
Sorrio e me agacho, para olhá-lo nos olhos.
— Eu encontrei coisas interessantes no seu computador, Aiden. — Ao
ouvir seu nome, ele une as sobrancelhas e contrai o músculo da mandíbula.
— Algumas garotas estavam drogadas. Você achava isso divertido? Drogar
uma garota e fodê-la sem consentimento?
Ele não diz nada, apenas me encara com ódio. Não está arrependido,
está com raiva por ter sido pego fazendo algo errado. Respiro fundo e entrego
o tablet quebrado para Théo, que está ao meu lado.
Tiro a 9mm no coldre escondido nas minhas costas e destravo a arma.
Ele esperneia, mas os soldados se apressam e o seguram contra a cadeira.
Aiden chora, implorando para não matá-lo.
— Sua última conquista... foi minha irmãzinha. Ela ficou arrasada e eu
não gostei nenhum pouco de você tê-la colocado nessa situação tão
miserável.
— Não, por favor. Eu posso explicar.
— Fique feliz por eu ter desistido da ideia de castrar você — é o que
digo, mirando a arma em seu peito.
— Não, por favor... eu... — a frase dele morre no momento em que
disparo vários tiros contra o seu peito.
Existe pessoas que não merecem viver, e ele era um desperdício
completo.

Quando entro no meu apartamento, encontro Lawanda na cozinha,


sentada na banqueta, se afundando em um pote de sorvete grande enquanto
resmunga sozinha. Os cabelos longos e loiros estão bagunçados e mesmo
olhando-a de perfil, dá para notar que andou chorando.
— Você tá bem? — pergunto ao me aproximar.
— Nick... não ouvi você chegar — diz, fungando e passando as costas
das mãos nos olhos e em seguida, fingindo um sorriso para mim, mas quando
nota que não me convenceu, deixa os ombros caírem. — Sou uma vergonha
pra nossa família. Acho que todo mundo na corporação viu o meu vídeo.
— Ei — murmuro, cortando toda a nossa distância e tocando o seu
cotovelo. — Não pense nisso.
— Como vou voltar pra minha vida em Toronto? Eu sou tão burra —
rosna, enfiando com força a colher no pote de sorvete e depois levando a
boca. — Burra — repete de boca cheia.
— Precisamos conversar sobre isso — falo, chamando a atenção dela.
— Eu vou transferir o escritório central pra cá.
Vários vincos se desenham na sua testa e ela move a cabeça de um lado
para o outro, confusa.
— Como assim? Não acho que o tio Schavier vá aceitar isso...
— Não me importa — interrompo-a, a voz soando firme, mas me
controlando para não deixar transparecer o quanto eu odeio aquele homem.
Minha irmã não precisa ter o coração partido por ele. Lawanda não pode
saber o que eu sei. — A corporação pertence a nossa família, e não a ele.
— Ele é nossa família, Nick.
— Não a minha — rebato, fazendo-a respirar fundo.
— Ele me criou e esteve comigo durante todos esses anos. E eu sei que
não gosta dele, você nunca gostou, mas o tio Schavier é minha família. Não
podemos virar as costas assim.
Contraio o maxilar, controlando a raiva que tenta me invadir. Só de
pensar nele, eu fico furioso e não consigo pensar direito. Eu preciso dar um
jeito nele, fazer Lawanda esquecê-lo de uma vez por todas.
— Ele não é o papai.
— Eu sei, mas Nick, os lucros subiram muito nos últimos anos.
Subiram por causa dele. — Ela prensa os lábios por um longo segundo e
depois engole em seco. — Você quer se tornar um CEO, é isso?
— Eu não, mas você sim — retruco, fazendo-a unir as sobrancelhas. —
Por que trabalha com o Schavier? — questiono, mas não espero por
respostas. — Um dia você vai administrar os negócios da nossa família.
— Isso é uma ordem ou premonição?
— Os dois — é o que digo.
— Mas mesmo assim, você ainda quer trazer o escritório pra cá? Pra
Montreal? Por quê?
— Lawa, você é minha família. Ou o que restou dela — digo, notando
um lampejo de tristeza passar por seus olhos claros. — E eu sei que você não
precisa de mim, mas eu... eu preciso de você. Não vou deixar você voltar pra
Toronto.
Lágrimas fazem caminho até a boca, mas ela não diz nada.
— Pode me odiar, Lawa, mas vou te manter por perto e cuidar de você
mesmo que não queira. — Desvio dos olhos da minha e encaro a noite
através da porta de vidro da varanda antes de voltar com a atenção a ela. —
Nunca mais deixarei alguém te machucar.
Ela desce da banqueta e envolve os braços em torno de mim, me
prendendo em um abraço. Aperto minha irmã contra o meu corpo e aliso seus
cabelos de leve.
— Eu te odeio, mas... eu te amo também. Não me abandone de novo,
Nick — murmura com a voz embargada.
Afasto-a um pouco e seguro seu rosto entre as mãos.
— Não vou — falo, convicto.
Lawanda assente.
— Você vai me contar? — pergunta, me encarando com intensidade.
— Os seus segredos? Por que não quis voltar pra casa daquela vez? Eu
sempre tive curiosidade sobre a sua vida e o que andou fazendo aqui.
Respiro fundo, afrouxando o nó da gravata.
— Um dia — é a única coisa que digo.
Não parece ser suficiente para minha irmã, mas ela concorda de leve,
aceitando o fato de que um dia, contarei a ela sobre minha vida.
Eu preciso voltar para minha vida em Toronto, mas não estou
exatamente fazendo as malas. Na verdade, estou entrando no apartamento de
Nicholas no exato momento e cada vez que passo por essa porta, eu sinto que
é impossível ir embora dessa cidade.
Não queria deixar um cara mexer tanto comigo assim, mas acho que é
tarde demais para tentar não me apaixonar por ele. Eu já estou no meio do
caminho e não sei como voltar atrás.
Dou de cara com Dena no sofá, as pernas em cima da nova mesinha de
centro enquanto lê uma revista, como se fosse a merda da dona da casa. É
claro que me sinto insegura perto dela. Além de linda, a mulher parece o tipo
ideal de Nicholas. Um casal tão previsível, que me dá enjoo.
Para completar minha insegurança, Dena tinha que ser uma amiga
próxima de Lawanda. Depois que Nicholas sumiu do mapa, as duas se
tornaram próximas, então, parece que estou sempre sobrando quando estou
perto delas.
Não que a irmã mais nova de Nicholas seja uma cobrinha, ela é um
amor e desde que tirei o seu vídeo do ar, Lawanda me dá um sorriso grato
toda vez que olha para mim. O problema é Dena, porque às vezes, ela é a
própria naja.
— Ele não está — ela diz, sem olhar para mim. — Quer deixar algum
recado? — pergunta e me olha por cima dos cílios, e depois fecha a revista,
fingindo um sorriso.
— O que ainda está fazendo aqui, Dena?
— Não te devo nenhuma satisfação, mas já que é uma garota bem
intrometida, vou alimentar sua curiosidade. Lawanda precisa de mim, e
Nick... eu e ele somos próximos.
Aperto a alça da bolsa com força e me controlo para não avançar em
cima dela e assanhar esse cabelo bonito e sedoso. Respiro fundo, levando ar
até os pulmões, na tentativa de desacelerar meu coração.
Eu nunca fui o tipo de garota que entra em brigas por causa de caras.
Sempre odiei isso, na verdade. E não vou me deixar levar pela situação e...
meu Deus! Eu não vou entrar em uma briga por causa de Nicholas, porque é
ridículo e eu não preciso disso.
Para ele, nós não somos nada além de adultos que andaram transando
muito nos últimos dias. E para mim deveria ser o mesmo, mas infelizmente,
não é.
Dou as costas para ela, caminhando na direção do quarto de Nicholas,
tentando pensar em coisas fofas, como filhotes de gatos e cachorros. Preciso
tirar o foco de Dena, não posso me deixar abalar com essa situação de merda.
Tudo bem, eles foram noivos. Mas isso foi há mais de sete anos e não
parece que ela significa alguma coisa para ele. Mas existe um enorme
“porém”, Dena é linda, gostosa e tem um cabelo brilhante. O quadril dela não
é tão grande, parece ter nascido para desfilar em uma passarela.
Droga.
Coisas fofas... foco, Lexie.
— Ei, garota — Dena chama. E não sei o motivo, mas me irrita o tom
que ela usa para me chamar de garota. Me faz sentir uma adolescente. —
Não sei o que tá rolando entre você e o Nick, mas posso te dar um conselho?
Está aí outra coisa que odeio, ela o chamando de “Nick”, como se fosse
a dona dele. Ai, Jesus, eu não gosto dessa mulher. Nem um pouco. Quando a
olho só penso em formas de avançar em cima dela e lhe puxar os cabelos.
Merda. O que está acontecendo comigo?
Não dê corda, Lexie.
Não dê corda...
— Ah, por favor. Uma mulher da sua idade deve ter muito conselhos
— alfineto.
Ela nem é tão velha assim para falar a verdade. Dena tem trinta e cinco,
apenas um ano mais velha que o “Nick”. Mas pareceu certo soltar uma farpa
dessas. Tudo bem, ela vai me fazer sentir como uma estúpida adolescente e
eu vou fazê-la se sentir como uma idiota velha.
— Uma mulher da minha idade? — retruca, cética.
— Quer falar sobre a sua idade ou sobre o conselho? Eu não tenho o
dia todo — rebato, fazendo-a levantar do sofá e inflar as narinas.
— Nick e eu fomos praticamente criados juntos, e eu o conheço como a
palma da minha mão. — Ergue a mão espalmada para mim e um sorriso
cínico estampado no rosto. — Ele é minha alma gêmea. E eu sei que já se
passaram muitos anos e eu... eu tive vários relacionamentos depois dele, mas
Nick sempre esteve no meu coração e voltando pra mim. E eu sei que aquele
cara que me amou, me pediu em casamento, ainda existe, enterrado em algum
lugar dentro dele.
Respiro fundo e mordo o lábio inferior.
Como assim voltando pra mim? Não faz sentindo nenhum, mas
também não estou a fim de entender esses dois.
— Isso não é conselho.
— Vá embora, garota. Antes que seja tarde demais e tenha o coração
partido. — O sorriso cínico volta a estampar o seu rosto bonito. — Não que
eu me importe com o seu coração, mas sei lá, achei que merecia saber disso.
— Obrigada, senhora, mas do meu coração cuido eu — é a única coisa
que digo, pisando duro na direção do quarto de Nicholas e batendo a porta
com mais força que o necessário, me sentindo uma idiota.
Sento na beirada da cama e respiro fundo mais uma vez, odiando Dena
e odiando Nicholas por ter noivado com uma mulher como ela. Não podia ser
alguém feio? Ou menos arrogante?
Tiro o envelope de dentro da bolsa e coloco em cima da cômoda.
Nicholas tinha me pedido uma lista com todas as ligações que o tio andou
fazendo nos últimos meses. Eu ainda não sei o que ele pretende fazer com
Schavier, se vai mandá-lo para prisão ou cemitério.
Talvez, seja o cemitério, o que não me importa, aquele homem é um
monstro e não merece a minha misericórdia.
Hum, acho que estou começando a me tornar uma garota má.
Levanto e vou até o banheiro. Eu bebi mais de meio litro de suco detox
antes de sair da casa do meu pai. Tudo isso para ficar perfeita dentro daquele
vestido que eu comprei no começo da semana.
Deus, quando me tornei assim?
Ao abrir a porta, dou de cara com um conjunto de roupa íntima jogada
no chão. É um sutiã meia taça, e claro, um fio dental de renda rasgado. Meu
coração dá um pulo alto dentro do peito e eu me sinto tão vulnerável, que me
odeio por isso.
Eles transaram? Nicholas tem um histórico de rasgar calcinhas. Pelas
minhas contas, ele já destruiu cinco das minhas. É claro que um homem
daquele não ia conseguir manter o pau grande quieto e dentro das calças,
ainda mais com uma mulher daquelas, tão linda e que parece uma modelo.
Ou talvez, Dena esteja me testando. Colocando pequenas provas por aí,
querendo me fazer acreditar que existe algo entre dois para me tirar de cena.
Ou talvez, eu esteja vendo coisas.
Ou talvez, Nicholas esteja fodendo com ela também. Não é difícil de
acreditar. É isso que acontece com duas pessoas bonitas ficam sozinhas em
quatro paredes.
E bem, essa não vai ser a primeira vez que serei trocada por uma
mulher mais bonita e com um corpo de modelo de passarela. É a história da
minha vida se repetindo, aquela adolescente idiota que se entregou para o
garoto bonito da escola e acreditou quando ele jurou amor e como num piscar
de olhos, foi trocada por outra.
A diferença é que Nicholas nunca me jurou amor. Só me fez gozar.
E não podemos esquecer do meu último namoro. Sem remorso
nenhum, ele me deu um par de chifres bem no dia do meu aniversário e nem
se deu ao trabalho de pedir desculpas.
Talvez esteja no meu sangue ou pior, seja minha sina.
Engulo o nó na garganta e giro o corpo, saindo do banheiro. Estou
morrendo de vontade de fazer xixi, mas preciso ir embora logo, antes que eu
me sinta pior do que já estou me sentindo.
— Já vai? — Dena pergunta assim que me vê colocar os pés na sala.
Respiro fundo e olho para ela.
— Dena, eu sei que você não é uma mulher ruim — começo a falar e
ela cruza o olhar afiado com o meu. — E eu entendo, eu acho... você tinha
um relacionamento perfeito, um noivo perfeito e de repente, tudo
desmoronou. E agora, depois de anos, ele voltou pra sua vida e você sente
que a vida, ele... de alguma forma devem algo a você.
Eu não a conheço bem, mas quando estava tentando encontrar coisas
sobre Nicholas na internet, eu vi Dena nas fotos. Eles pareciam apaixonados
e muito feliz juntos. E olhando tudo de fora, com a minha perspectiva, até
consegui imaginar os filhos deles. Mas depois do acidente, Nicholas desabou,
assim como o relacionamento dos dois.
E ela pode achar que ainda o ama, ou talvez o ame mesmo, e por isso,
está aqui, insistindo nele e agindo como uma cobra cascavel para o meu lado.
Pensando bem, eu acho que ela se sente insegura quando estou por
perto também.
Dena se levanta.
— Você acha que eu estaria insistindo em uma relação depois de tantos
anos se eu não soubesse o que estou fazendo? — questiona, de cenho
franzido. — Ele veio atrás de mim. Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete,
oito, nove... eu parei de contar. Sempre que ele sentia falta da vida antiga,
Nick me procurava. Por isso, eu não posso desistir dele, porque aquele
coração, ainda pertence a mim.
Sinto o peito doer ao ouvir as palavras dela. Eu não estava esperando
por essa, então fico calada, apenas encarando-a, me sentindo uma idiota.
— Eu sei tudo sobre ele, Lexie. Eu conheço a vida que Nick leva —
fala, me fazendo engolir em seco. — Não vou mentir e dizer que ele me
contou, mas eu o conheço tão bem, que não foi difícil descobrir. E eu aceitei,
porque eu o amo. Então, por favor, não tente me ensinar alguma coisa. Você
não sabe nada sobre nós.
— Sim, talvez você esteja certa e eu não saiba, mas você precisa abrir
os olhos. O Nicholas que eu conheço e o Nick que foi seu noivo... são
pessoas completamente diferentes — falo, sentindo o coração murchar.
Dena dá de ombros.
— Não importa, porque eu tenho os dois.
Sem saber o motivo, concordo com um aceno de cabeça e sorrio.
Eu não devia ter me envolvido com Nicholas para começo de
conversar. Ele já tinha me avisado que eu não era garota para ele e ele não era
homem para mim, mas mesmo assim, eu me entreguei.
Dena tem razão, eu vou ter meu coração partido.
E a culpa vai ser inteiramente minha por isso.
Dou as costas para ir embora ao mesmo tempo em que vejo Lawanda
sair do quarto de hóspedes. Ela sorri animada e abre a boca para dizer algo,
quando aceno com a mão, dando tchau e saio porta afora.
Talvez seja o meu sinal para ir embora e deixar tudo para trás. Ou
apenas esteja na hora de eu construir uma barreira para proteger meu coração.
— Tão linda e ao mesmo tempo, tão triste — a matriarca da família
Carbone fala ao parar ao meu lado no bar do cassino. — Eu não gosto dessa
combinação, é poética demais para o meu gosto — zomba, me fazendo sorrir.
Quase todos os convidados já chegaram, e eu cogitei de verdade não vir
para a festa de noivado de Lina e Julian, mas ela é tão gentil, que já
conseguiu conquistar um espaço no meu coração.
E bem, eu comprei esse vestido e foi caro, passei dias me entupindo de
suco detox para não engordar. Seria um desperdício, porque eu estou incrível
e amando minha cintura e meu quadril saliente no momento.
Eu não preciso ser uma modelo de passarela, porque eu tenho espelho e
sei que sou muito gostosa.
— Linda, triste e com raiva — retruco e a senhora Rosa solta uma
risada contagiante. Em seguida, pede uma bebida no bar, me surpreendendo.
Ela é tão velinha e fofa, achei que pessoas nessa idade fossem proibidas de
beber.
— Não me olhe assim — resmunga. — Parece meus netos. Eu ainda
aguento algumas doses e faz bem pra saúde— acrescenta, piscando para mim.
Sorrio.
— Um brinde? — pergunto quando o barman serve sua dose de uísque.
Ela assente, levantando seu copo de cristal e encostando de leve na minha
taça.
— Um brinde a nós, mulheres — fala, e eu movo a cabeça,
concordando. Bebo um gole generoso do espumante e a matriarca toma a
dose de uísque toda de uma vez. — Não fique tão triste, é uma festa e você é
jovem, linda e com tudo em cima.
Nós rimos.
— Depois de algumas taças, começarei a me animar — minto.
Um garçom passa servindo alguns aperitivos e sinto o estômago roncar
de fome. Pego uma espécie de canapé, mas ao sentir o cheiro, enrugo o nariz,
meio enjoada e coloco em cima do balcão. Nunca gostei de comida de gente
rica.
Daria tudo para ter um hamburguer agora e meio litro de refrigerante.
Ok, talvez seja por isso que minha saliência na barriga não vai embora, não
importa o que eu faço ou o quanto eu malhe.
— Enjoada? — a matriarca questiona, os olhos semicerrados dançando
pelo meu rosto. — Isso é muito frequente?
Franzo o cenho e nego com a cabeça.
— Não, nem um pouco. Passei alguns dias tomando muito suco detox
pra entrar nesse vestido. E agora, preciso de comida de verdade, eu acho.
Com delicadeza, a matriarca, leva a mão até meus cabelos e enrola uma
madeixa desbotada no dedo indicador, sorrindo. Já não tem quase nada de
roxo, não retoco as mechas faz semanas. E não é por falta de tinta, é... sei lá.
Talvez eu esteja mudando.
— Você é linda demais pra ficar tão triste, bambina[18] — é o que diz,
prendendo meus olhos aos seus e me encarando de um jeito intenso, como se
soubesse de algo que eu não sei. — Não sei o que aconteceu, mas não se
preocupe. Todos os problemas têm solução.
Assinto, prensando os lábios e sem vontade de falar alguma coisa.
É verdade, existe solução para o meu problema... ir embora daqui e
esquecer a porra das últimas semanas. Apagar tudo da minha vida e tentar
viver como antes, mesmo que pareça impossível.
A matriarca faz carinho no meu rosto e se afasta de mim, indo na
direção dos outros convidados para cumprimentá-los. Minha atenção vai até o
palco, onde uma mulher elegante e de cabelos longos e escuros canta
“Mirrors’ do Justin Timberlake.
“O vazio que se instalou em meu coração é um espaço que agora você
ocupa. Me mostre como lutar e eu vou lhe dizer, baby, foi fácil voltar para
você uma vez que entendi que você estava aqui o tempo todo. É como se você
fosse o meu espelho, oh, meu espelho olhando de volta para mim.”
Eu sei que é uma festa de noivado e estamos aqui para celebrar o amor
de um casal apaixonado, mas estou sem clima para músicas românticas no
momento. Odiando, para ser mais específica.
Quando vejo Nicholas chegar no cassino, decido fingir que não o
conheço. Peço outra bebida no bar e observo o barman preparar meu drink,
como se minha vida dependesse disso.
É claro que ignorar um homem do tamanho e intensidade dele nunca
será uma tarefa fácil, mas preciso salvar o meu amor-próprio. Ou o que restou
do pobre coitado.
— Obrigada — digo ao barman quando ele me entrega a bebida. Tomo
tudo de uma vez, na tentativa de amenizar minha raiva, quem sabe... meu
maldito ciúme.
Maldita hora que fiquei a fim desse cara. Me envolver na vida de
Nicholas só me trouxe problema e dor de cabeça. Além, é claro, de eu ter
sangue de Lian nas minhas mãos e trabalhar para máfia nas horas vagas e não
vagas.
Noto pela visão periférica, ele parar ao meu lado e pedir uma bebida ao
barman. Enquanto espera, mantém os olhos na minha coxa esquerda, bem na
fenda do vestido amarelo.
— Você gosta de chamar atenção — comenta ao pegar a bebida que o
barman serve. Ainda tem os olhos no meu vestido amarelo e devagar, as duas
pedras intensas sobem até o meu decote. — Muita.
— Algum problema? Se não gosta, é só não ficar olhando.
Nicholas respira fundo e toma um gole do uísque antes de colocar o
copo de cristal em cima do balcão.
— Por que está brava comigo? — pergunta, tocando meu braço com
delicadeza. — Está me ignorando desde ontem. O que aconteceu?
— Você aconteceu — retruco e me odeio por não conseguir controlar
meus sentimentos em relação a ele.
— Seja clara — fala, num tom firme.
— Você e Dena... — murmuro, apertando os lábios e me odiando por
estar tão vulnerável no momento. — Você transou com ela? Quando voltou
pra Toronto?
— Lexie... — fala meu nome em uma entonação de repreensão. — Não
vou conversar com você sobre ela. Não vale a pena.
— É fácil, Nicholas. Transou ou não? É uma resposta simples, não faça
rodeios. Sim ou não?
— Por que isso?
Encaro os olhos azuis, que parecem carregar tantos sentimentos ocultos
e me perco neles por alguns segundos até me dar conta de que Nicholas não é
para mim. E ele já tinha me avisado tantas vezes sobre isso, mas não dei
ouvidos. Agora, eu sei, ele não é para mim e nunca vai ser.
— Eu sei sobre vocês... e o que aconteceu durante esses anos —
resolvo ser sincera.
Ele contrai a mandíbula e toma o resto do uísque de uma vez, sem
desviar a atenção de mim, mas não diz nada.
— Não se preocupe, não culpo você. Talvez, eu culpe um pouco. Mas a
verdade é que a culpa é minha também. Você claramente me disse para não
criar expectativas em relação a você... — a frase morre, e ele fica me
observando, me esperando terminar de falar. — E eu meio que acabei criando
— concluo, pensativa.
Ah, droga. Eu sou tão idiota. Nicholas me deu tantos avisos, me afastou
e como uma tola, fiz exatamente o contrário. Me apaixonei por ele e agora,
meu pobre coração está em pedaços.
Mais uma decepção amorosa para minha lista. Muito obrigada, vida.
— Eu não sinto nada pela Dena. É só sexo. Foi só sexo, apenas isso —
diz, chamando minha atenção.
Reviro os olhos e solto uma risadinha seca.
— Acho que ela não sabe disso — retruco com desdém. — Mas não a
culpo por isso. Você a procurava quando sentia falta da sua antiga vida.
Foram muitas vezes, eu sei. Ela faz parte de você, é uma lembrança que
sempre ficará cravada em seu coração.
Ele franze a testa.
— Eu não a procurei tantas vezes — fala, me fazendo suspirar. — Duas
vezes e depois, Dena não largou do meu pé e sim, eu transei com ela sempre
que a via, mas não significou nada.
— Eu não pedi explicação — resmungo e tento me afastar dele, mas
Nicholas me prende ao me segurar pelo cotovelo. — O que pensa que está
fazendo? Me solte.
— Não está pedindo explicação, mas está agindo como se tivesse.
Então, qual é a verdade?
— Vai se ferrar — retruco entre os dentes e me solto dele.
Para minha surpresa, um sorriso cínico logo se emoldura no seu rosto,
me deixando irritada. Estamos no meio ou no fim de uma discussão, eu não
sei, depende do ponto de vista, e o cretino está sorrindo?
— Dance comigo — diz, como se nada demais tivesse acontecido. —
Vamos? — Estende-me uma das mãos espalmadas.
Encaro a mão estendida e pondero, mas acabo colocando minha mão na
sua, tentando ignorar a sensação quente e sedutora que Nicholas irradia para
o meu corpo. Ele me leva até o centro do salão e me puxa de supetão,
roçando meus seios contra o abdômen duro e trincando.
Engulo em seco.
A mão de Nicholas desliza pelas minhas costas até encontrar o cóccix,
me deixando completamente sem ar e excitada. Embora tente, não consigo
deixar os olhos dele nem por um milésimo de segundos e me odeio por isso.
— Sabe de uma coisa?
— Não quero saber — murmuro e suspiro logo em seguida. O seu
corpo grande e quente contra o meu me deixa sem ar e me faz apertar os
músculos entre as pernas. — Comece a dançar — digo, mas é claro que ele
me ignora.
— Eu não gostava de loiras. Mudei de ideia depois de conhecer você
— fala, e se eu não estivesse tão arrebatada, teria revirados os olhos com a
idiotice que acabou de sair da sua boca.
Respiro fundo, me controlando ao mesmo tempo em que me mantenho
em pé. Ainda nem tínhamos começado a dançar, mas os nossos corpos tão
colados, sugavam minhas energias de forma sedutora.
— Não tente me seduzir, não vai funcionar — resmungo, roubando um
meio sorriso maroto dele.
Sem pedir permissão, ele leva uma das mãos até o meu rosto e se
aproxima de mim. Sinto o seu hálito quente e tento recuar, mas Nicholas não
deixa. O polegar desliza sobre o meu lábio inferior e pensamentos indecentes
me invadem a cabeça, como um furacão.
— Não tente fugir de mim, Lexie, porque você já é minha — sussurra,
cheio de convicção.
Abro a boca para retrucar, mas não consigo dizer nada. Nenhuma
palavra sai de mim.
E então, Nicholas traz o rosto para mais perto e roça os lábios nos
meus, me fazendo fechar os olhos. Eu devia resistir, no entanto, é algo
impossível no momento. Quero sentir a boca dele contra a minha de novo, a
língua me invadindo, marcando território sobre o meu corpo.
Agarro seus braços duros e cheios de músculos, e sou eu quem lança a
língua para dentro da boca dele, o envolvendo em um beijo quente, molhado,
suculento e que faz as minhas entranhas se contorcerem.
Parte dos dedos de Nicholas se entrelaçam na minha nuca, entre os
cabelos e ele puxa de leve ao me trazer para mais perto do seu corpo duro e
deliciosamente ardente.
Nossas línguas se encontram e se envolvem em uma dança ritmada,
poderosa e sexy. Ele mordisca meu lábio inferior e quando gemo, Nicholas
engole o barulho com um beijo.
As mãos me apertam e descem até próxima da parte da coxa exposta,
onde ele passa de leve as pontas dos dedos. Gemo, amando ser tocada por ele.
Nicholas tem razão, não adianta fugir.
Reúno forças para afastá-lo de mim e levar ar até os pulmões quando
sinto a ereção crescer contra a minha barriga.
— Vamos com calma, a noite mal começou e eu não comprei esse
vestido pra tirar tão cedo.
O canto da boca dele se estica em um sorriso lascivo.
— Eu posso tirar e colocá-lo de volta no lugar.
Ergo a mão e levo até o rosto quadrado e com barba, e roço as pontas
dos dedos no seu maxilar marcado.
— Não vou deixar você fazer isso — digo, provocando o homem, que
ergue uma sobrancelha e me encara com aquela expressão carrancuda e
selvagem.
Mesmo que ele não esteja merecendo, eu vou amar ter a boca dele
explorando as partes sensíveis do meu corpo, mas não vou dizer nada disso
agora. Ele precisa implorar um pouco para possuir meu corpo de novo.
— Seu rosto diz outra coisa — contesta, me fazendo negar com a
cabeça. — Eu já disse que não adianta fugir.
Sorrio.
— Não vai ser tão fácil colocar as mãos nesse corpinho hoje —
provoco mais uma vez, gesticulando com o indicar na direção do meu corpo e
encarando Nicholas com certa arrogância.
— É o que vamos ver, Lexie — diz ele, me dando uma piscadinha sexy
e fazendo minha espinha arrepiar.
Ah, merda. Eu acho que comecei um jogo que estou condenada a
perder.
Nicholas é um predador.
Passou boa parte da noite me provocando com as mãos e indecências
sussurradas ao pé do ouvido. Foi difícil me concentrar nas pessoas ao redor
quando ele estava com a intenção de arrancar o meu vestido no meio do
cassino.
Mas até agora, estou indo bem na minha decisão ou missão, não sei
qual dos dois. Não vai ser fácil para ele possuir meu corpo esta noite. Ainda
estou irritada com toda a situação Nick/Dena.
Depois de algumas taças de espumante e a cabeça e o corpo começarem
a querer me trair, decido que é hora de ir embora. Despeço-me do casal de
pombinhos apaixonados e estou enfiando a mão dentro da bolsa para pegar
meu celular e pedir um Uber quando Nicholas faz uma pergunta.
— Como você veio?
— Meu pai me deu carona — respondo, dando de ombros. Antes que
possa confirmar minha corrida no aplicativo, ele me impede de continuar. —
O quê?
— Eu te levo.
Sem pedir permissão, Nicholas pousa a mão nas minhas costas e me
conduz até o seu carro no estacionamento do hotel cassino. Meu corpo inteiro
parece entrar em combustão, como se ele fosse gasolina para o meu fogo.
— Vai me levar pra casa do meu pai ou pra sua? Ah, eu acho que vou
ficar com o motorista do Uber — devolvo, as sobrancelhas erguidas e meus
lábios transformados em um biquinho.
Tento me afastar dele, mas não consigo, infelizmente.
— Ainda está brava comigo?
— Não — minto, fechando a cara numa expressão dura. — Só quero ir
pra casa do meu pai.
Só quero ir sozinha e não correr o risco de deixar você me seduzir e
pegar de jeito, me fazendo esquecer que ainda estou brava com toda a
situação que envolve a sua ex-noiva linda e gostosa.
— Venha pra minha — fala, sorrindo.
— Quando chegarmos lá, Dena vai estar esperando no sofá? —
pergunto, a voz soando ríspida. Nicholas não responde, então assinto,
prensando os lábios e ficando cada vez mais irritada. — Não quero ir,
obrigada.
— Lexie... — murmura, meu nome soando dos seus lábios como uma
súplica deliciosa.
— O que é?
— Ela já foi embora, não se preocupe.
— Não acredito. E você ainda não me explicou a calcinha rasgada no
seu banheiro. E antes que diga algo, não é minha. Então, muito obrigada, mas
por n motivos, eu não vou voltar com você, Nicholas.
As sobrancelhas loiras se unem e o nariz enruga.
— Não sei do que está falando.
Finjo uma risada e passo as mãos entre os cabelos, tentando me
controlar.
— Não se faça de bobo.
Nicholas suspira, impaciente.
— As únicas calcinhas que eu rasguei nas últimas semanas foram as
suas — fala, como se isso fosse a explicação para todo o problema.
— Falando disso, precisamos deixar algumas coisas claras — digo,
colocando a mão espalmada em seu peito, quando noto uma aproximação.
Não posso permitir que Nicholas cole o corpo ao meu, será o meu fim. —
Você vai ter que me dar um estoque infinito de calcinhas.
— Por que eu faria isso? Huh? — retruca, o canto direito da boca se
curvando num sorriso malicioso.
— Você vem rasgando todas as minhas calcinhas, Nicholas. Daqui a
pouco, não vou ter o que usar.
— Eu prefiro você sem elas. Você não?
Fecho os olhos por uma fração de segundos, suspirando.
— Tô falando sério.
— Eu também — rebate com um estúpido sorriso no rosto, e de
repente, me encosta contra o carro e eu prendo a respiração ao sentir seus
dedos deslizarem sobre a pele exposta por causa da fenda do vestido. —
Falando bem sério.
De forma indecente e imoral, os dedos de Nicholas encontram a lateral
da minha calcinha e quando noto o que ele está prestes a fazer, finjo uma
tosse. Lentamente e com um sorriso lascivo estampado no rosto presunçoso e
carrancudo, ele vai descendo a calcinha e em vez de impedir, eu olho para os
lados, conferindo se não tem ninguém no estacionamento, olhando essa
pouca vergonha.
Tento controlar as sensações ardentes do meu corpo.
Ele se abaixa, passando o tecido pelo meu pé esquerdo, alisando minha
canela com malícia, e depois passa pelo outro e volta a ficar de pé, nivelando
nossos rostos antes de encarar minha calcinha.
— Adoro branco.
— Me devolva — murmuro, sem conseguir me mover, sentindo um
latejar entre as pernas, como se um terremoto e tsunami tivessem resolvido se
instalar bem ali, na parte mais íntima e sensível do meu corpo.
Movendo a cabeça em negativa, ele guarda a calcinha dentro do terno
bem passado e caro, em seguida, volta para perto, colocando o corpo quente e
cheio de músculo contra o meu e sussurra:
— Pra você não dizer que eu só rasgo suas calcinhas.
Engulo o nó na garganta, extasiada.
Devagar, seus olhos descem até a minha boca e por instinto, eu molho
os lábios, me sentindo ansiosa, esperando que ele me arrebate com um beijo.
E droga, eu sei que estou tentando resistir, mas espero muito que ele faça
isso.
A ponta do dedo polegar traça o contorno da minha boca e então, ele
corta a nossa mínima distância. Fecho os olhos ao senti-lo mergulhar os
lábios em mim, me devorando com um beijo cheio de paixão, entrelaçando as
mãos nos meus cabelos na nuca e me invadido com a língua precisa e
exigente.
Não existe nada que eu possa fazer no momento, além me entregar a
ele e me permitir ser consumida por esse fogo que incendeia em nossos
corpos.
— Nicholas — gemo contra sua boca, sentindo-o sugar minhas
energias enquanto derreto em seus braços.
— Você é minha — sussurra de maneira implacável, mordiscando meu
lábio inferior e descendo com a boca no meu queixo até encontrar a parte
sensível do meu pescoço e enfim, cravar os dentes no meu ombro nu, me
roubando gemidos.
Quando sinto a protuberância de Nicholas contra a barriga, sei que
estou perdida.
Ele se afasta um pouco, apenas o suficiente para meter a mão dentro do
bolso da calça social e destravar o carro. Nem consigo abrir a boca para
protestar, pois logo o homem está abrindo a porta traseira e me enfiando para
dentro do veículo.
Nicholas se acomoda ao meu lado, fechando a porta logo em seguida.
Num solavanco, ele inclina os bancos da frente, abrindo espaço para nós.
Rápido, a sua boca sedutora encontra meu maxilar, mordicando, me
provocando e me deixando louca.
A mão grande desliza sobre a minha coxa até encontrar a parte interna.
Solto um suspiro pesado e jogo a cabeça para trás, ansiando ser tocada por ele
daquele jeito que vai fazer minhas pernas tremerem e me mandar lá paro o
inferno, onde queima de um jeito delicioso.
Com a ponta dos dedos, ele faz caminho até a minha virilha, olhando
dentro dos meus olhos, estudando minhas expressões. Mordo o lábio inferior,
tentando controlar meu corpo estremecido. Nicholas leva dois dedos até a
minha abertura e o azul dos seus olhos incendeia quando percebe que estou
enxarcada.
— Tão molhada — sussurra, tocando os dentes de leve no lóbulo da
minha orelha. — Pronta pra mim.
Arqueio o quadril quando o sinto acariciar o meu clitóris. Como em
modo automático, abro um pouco as pernas para ele e minha mão direita roça
o volume contra a sua calça. Nicholas está duro como pedra e eu gosto de
saber que o corpo dele reage desse jeito por causa de mim.
— Goza gostoso pra mim, Lexie.
Gemo e fecho os olhos, sentindo meu corpo em lavas e a respiração
pesada. Os dedos massageiam meu sexo e me levam por um caminho
inebriante, sem volta. Ergo-me na direção da mão de Nicholas, querendo
mais dele. Querendo tudo que ele estiver disposto a me dar.
— Nicholas — murmuro, arfante, sem conseguir controlar a comichão
dominando meu corpo.
— Isso, Lexie — fala com os lábios colados no meu pescoço. — Quero
ver você gozar bem gostoso.
As palavras de Nicholas ecoam como ondas na minha pele. É
impossível resistir à medida que os dedos dele ficam mais precisos, certeiros.
Sinto o clitóris derreter na sua mão e a minha pele queima.
E então quando as pernas começam a tremer, não tenho controle.
Entrego-me ao orgasmo, sentindo o arrepio no couro cabeludo percorrendo
todo o meu corpo até chegar no dedão do pé.
E com um gemido alto, fecho os olhos e explodo, sentindo um mundo
de emoções contra a pele em chamas.
Ainda me recuperando, pisco devagar. Respiro fundo e vejo Nicholas
lamber os dedos, como se estivesse saboreando algo delicioso. As bochechas
formigam e a excitação aumenta.
Sem pensar duas vezes, passo uma perna em volta dele e sento em cima
da sua ereção. Surpreendo-me ao ver as mãos dele rasgarem meu vestindo,
forçando outra fenda que não era para existir ali.
— Ei, ainda nem terminei de pagar esse vestido — resmungo e o
cretino estica os lábios em meio sorriso maroto, e sem dizer nada, alisa
minhas coxas expostas. — Você tem um sério problema com roupas
femininas.
— Eu tenho um sério problema em vê-la vestida — corrige e envolve a
mão no meu rosto, os dedos na nuca, entre os cabelos e o polegar roçando
minha bochecha. — Prefiro você nua — emenda, me fazendo suspirar.
Ele me abocanha com um beijo cheio de vontade, entrelaçando nossas
línguas e fazendo meu corpo reagir. As mãos sobem até a bunda, onde ele
aperta e eu gemo, em seguida vão até a cintura e se encaixam de uma forma
tão perfeita, como se eu fosse feita para ele.
Nicholas afasta a boca da minha para mordiscar meu maxilar. Jogo a
cabeça para trás, aproveitando o rastro quente dos lábios possessivos,
necessitados e exigentes. Logo ele está na curvatura do meu pescoço e não
demora até lamber meu decote, procurando meus seios.
Com uma das mãos, sem dificuldade, ele puxa o tecido para baixo e
abocanha meus seios, me roubando gemidos e me fazendo rebolar contra a
ereção entre as minhas pernas enquanto agarro seus cabelos, pedindo por
mais.
— Tão linda — sussurra. — Eu preciso afundar meu pau em você,
Lexie. E quero que goze nele — diz, os olhos inflamados de um desejo
selvagem, arrebatador, que parece ser capaz de me consumir a alma.
Minhas mãos famintas passam o terno pelos braços fortes de Nicholas e
os dedos se concentram na missão de desabotoar a camisa social. Me perco
um pouco ali, tocando seu abdômen trincado e duro antes de encontrar o
cinto e desafivelá-lo.
Levanto um pouco, apenas o suficiente para Nicholas descer as calças e
cueca boxer, revelando o membro duro pronto para mim. Sem pensar muito,
sento num solavanco, encaixando nossos corpos enquanto gememos ao
mesmo tempo com o contato, e eu me sinto preenchida.
Ele levanta o vestido até fazer um amontoado no quadril, passa as mãos
por debaixo do tecido, e segura minha cintura, ditando o ritmo, que começa
devagar, mas de um jeito intenso, poderoso e gostoso pra caramba. Ele é
grande, mas parece que foi feito para o meu corpo pequeno.
Contorno seu pescoço com os braços e prendo os olhos azuis e
dilatados aos meus, rebolando em cima dele, sentindo a extensão e o corpo
todo arrepiar. Nicholas me ajuda com o sobe e desce, e eu me inclino contra o
seu rosto, enfiando minha língua contra a sua boca e o beijando como se
dependesse disso para sobreviver.
Arqueio o quadril e de olhos fechados, lanço a cabeça para trás,
aproveitando o ritmo prazeroso, mas ele não me deixa ficar assim por muito
tempo, pois logo segura meu queixo com os dedos e me faz olhá-lo nos
olhos.
— Olhando pra mim... — um gemido rouco escapa da garganta. —
Quero gozar olhando pra você — murmura, me fazendo perder a estribeiras.
Rebolo com vontade em cima do pau e as investidas de Nicholas ficam
cada vez mais intensas, mais fortes, do jeito que eu gosto. Gemo, fincando as
unhas em seus ombros e sentindo o corpo querendo explodir.
Nicholas se inclina para frente, mordendo a curvatura do meu pescoço
por um segundo e subindo com a língua até o queixo, que rápido encontra
minha boca e me envolve num beijo sedento e irresistível. E em seguida,
arreda um pouco e volta a fitar meus olhos.
O nosso sobe e desce cada vez mais tórrido e sedento. Ainda
comandando o ritmo, Nicholas tira uma mão da minha cintura e desgruda do
meu pescoço suado algumas mexas de cabelo loiros e de uma forma animal
se lança mais para dentro de mim.
— Nicholas... eu — nem consigo terminar a frase e o corpo vai logo
estremecendo com os pequenos choques que me percorrem, me fazendo
contorcer e esticar todos os músculos. Faço um tremendo esforço para
continuar olhando para ele quando o orgasmo explode em mim.
Não demora muito para ele chegar lá. Mais uma estocas firmes e
deliciosas até Nicholas encontrar o próprio prazer, deixando um grunhindo
rouco e feroz ressoar da garganta enquanto goza dentro de mim.
As mãos seguram meu rosto e de forma carinhosa, ele prende algumas
mexas atrás da orelha e em seguida, me puxa para si e me prende em um
beijo lento e cheios de sentimentos que nunca foram ditos em voz alta, mas
que conseguem aquecer o meu coração.
Nicholas tem toda razão, não adianta fugir, porque eu já sou dele.
Envolvo as mãos no seu rosto, os dedos roçando de leve a nuca,
conectando meus olhos aos dele mesmo com a pouca luz dentro do carro. O
polegar traça uma linha invisível no lábio inferior e eu fico assim por um
tempo até ter coragem de falar alguma coisa.
— O que eu faço? — murmuro.
— Como assim? — rebate, me puxando ainda mais para si. Nicholas
ainda nem saiu de dentro de mim, e para ser sincera, não sei se quero que ele
faça isso. Aqui é tão bom e parece a coisa certa no momento.
— Minhas expectativas em relação a você... — Meus olhos dançam
pelo rosto, acompanho os movimentos dos polegares, que agora roçam o
queixo com pouca barba. — Cresceram demais, Nicholas.
As mãos em volta de mim e me apertam e fazem carinho.
— Eu ainda acho que você não é garota pra mim — fala e meu coração
acelera de um jeito doloroso. — Minhas mãos estão tão sujas, Lexie, que
quando te toco, eu sinto que estou mudando quem você é. Mas... você já é
minha e talvez, um dia, queira não ser.
— Como isso pode ser possível? — retruco, respirando fundo.
— Porque eu não vou deixar você fugir de mim — diz, como se fosse
simples e volta a me beijar, destruindo qualquer barreira que um dia pensei
em construir para proteger meu coração.
Nicholas é como aquela chama que vive dentro de mim, me fazendo
querer mais da vida. É loucura, mas acho que estou apaixonada por um
homem que é errado dos pés à cabeça. E talvez, ele esteja me corrompendo
mesmo, mas para falar a verdade, eu não me importo com isso.
Dias depois...
Lexie desce do jatinho com o rosto pálido. Me odeio por não ter sido
firme o suficiente e negar sua ajuda. Não que fosse adiantar de alguma coisa.
Sinto que Lexie daria um jeito de surgir em Toronto para me surpreender.
Mas a olhando agora, eu sei que deixá-la trancafiada no meu
apartamento com a minha irmã era a melhor opção. Manter as duas em
segurança é o meu trabalho, e com ela aqui, eu não sei se consigo pensar
direito.
— Relaxe, é só uma reunião — Thomas fala, batendo de leve nas
minhas costas. — Uma reunião com um ex-agente da KGB. Não pode ser tão
ruim, não é?
Julian viajou para Los Angeles com Lina, então, Thomas está comigo,
porque Noah não confia em mim o suficiente para me deixar resolver um
problema desses sozinho. Ele acha que posso causar um estrago grande na
cidade em que nasci e fui criado, e o pior, fazer com que nossa família entre
em guerra.
Eu ficaria ofendido se ele não tivesse razão. Essa reunião tem que sair
do jeito que eu quero ou posso deixar a raiva me dominar e fazer um belo de
estrago até conseguir colocar minhas mãos no pescoço de Schavier e fazer
justiça pela morte da minha mãe.
Em frente ao galpão, uma limusine nos espera. Abro a porta para Lexie,
que entra, segurando a bolsa com força e eu me acomodo ao lado, enquanto
Thomas dá a volta e entra no veículo também.
— Você não devia ter vindo — resmungo, me odiando um pouco mais.
— Eu devia ter mandado te sequestrar por um dia inteiro.
Ela revira os olhos.
— Foi você quem disse que não entraria naquele prédio desarmado.
Você precisa de mim, das minhas habilidades — retruca, erguendo a
sobrancelha e sorrindo logo em seguida.
Respiro fundo, contrariado. Eu preciso da ajuda de Lexie, mas isso não
significa que esteja feliz de tê-la aqui, correndo perigo comigo. Se algo
acontecer com ela por causa de mim, eu explodo Toronto.
Meia hora mais tarde, o motorista estaciona no centro de Toronto, em
frente ao prédio do nosso destino e os dedos de Lexie já começam a trabalhar
no notebook que tirou de dentro da bolsa. Thomas desce primeiro, levando
com ele o envelope com as nossas informações importantes e ajeitando o
terno antes de fechar a porta do carro.
— Vou conseguir interferir no sinal das portas com detectores por trinta
segundos. Dê um jeito de passar por elas em vinte, ok? Preciso de um aviso
quando você estiver voltando.
— Certo. E não saia do carro — ordeno, fazendo-a suspirar, mas move
a cabeça para dizer que entendeu. — Tranque as portas quando eu descer —
aviso ao motorista.
— Se for por minha causa, não se esqueça que os carros modernos já
têm computadores, então, eu consigo sair daqui sem dificuldades — a voz
dela soa travessa e ela até ri, mas eu fico sério. — Tô brincando, não vou
aprontar. Vá, vá.
Dito isso, ela volta com os dedos sobre as teclas do notebook e saio do
carro. Thomas ocupa meu lado, trocando um olhar antes de começarmos a
caminhar na direção das portas giratórias do prédio à nossa frente.
— Deu certo — Thomas diz, animado. — Aquela garota sabe fazer
mágica com as mãos — emenda, me fazendo viajar em lembranças onde as
mãos pequenas de Lexie deslizam sobre o meu membro enrijecido.
Concordo com um aceno de cabeça, expulsando as imagens eróticas de
Lexie da cabeça.
Depois de passarmos pela recepção do saguão, nos dirigimos até os
elevadores e entramos no primeiro que encontramos aberto. A viagem até o
trigésimo andar parece uma eternidade e eu já começo a fazer planos se tudo
der errado hoje.
— Eles não vão querer entrar em uma guerra aberta, Nicholas. É
burrice e isso sempre bagunça os negócios — fala, confiante e eu assinto,
mesmo sem acreditar cem por cento nas palavras dele.
No nosso andar, nos identificamos na recepção e a moça com muita
maquiagem atrás do balcão pede um minuto. Ela faz uma ligação interna
antes de finalmente nos conduzir à sala principal do andar.
O velho atrás da mesa moderna parece mais em forma do que eu
esperava. Ele é bem calvo e os cabelos que tem em cima da cabeça são
brancos. Mesmo beirando os setenta anos, não me parece alguém indefeso.
— Nicholas Farley — fala com um sotaque forte ao ficar de pé e vir até
mim. — Já ouvi falar muito sobre você.
Estende a mão em cumprimento para mim e depois para Thomas.
— Em que posso ajudá-lo? — pergunta ao gesticular com a mão
enrugada para sentarmos nas cadeiras de frente à mesa, mas eu decido ficar
em pé e o conselheiro da máfia Carbone também. — Sentem, não vou repetir
— é o que diz, a voz soando cheio de autoridade.
Contraio o maxilar e sento. Thomas só se acomoda na cadeira depois de
se inclinar para frente e entregar o envelope para Alexander. Sem pressa, o
homem o abre e lê as informações sobre alguns dos membros mais
importantes para a sua organização, que Lexie reuniu para nós.
Tira os olhos dos papéis e nos encara com frieza.
— Andaram pesquisando. O que pretendem com isso?
— Eu só quero a cabeça de Schavier Farley, meu tio. — Respiro fundo
e olho o velho. — Não me importo com os seus negócios ou o que faz nessa
cidade, mas eu me importo com o meu tio.
Ele ri, coçando o queixo e me deixando irritado.
— Você devia ter morrido naquele acidente de carro há sete anos —
diz, me fazendo fechar a mão em punho. — Garotos como você sempre dão
dor de cabeça.
— Não pense que eu não começaria uma guerra. Salve os seus negócios
e me dê o meu tio — digo entre os dentes, fazendo o velho me olhar com
expressão de desgosto.
Alexander encosta a cabeça da cadeira e alterna os olhos de Thomas
para mim, mas fica em silêncio. Talvez esteja pensando em formas de acabar
com a ameaça à sua frente ou decidindo se entrega Schavier ou não.
— Tenho que dar um pouco de crédito a vocês. Durante anos aqui,
nunca fui confrontado desse jeito. Isso me lembra um pouco a minha
juventude — comenta e respira fundo, e por uma segundo, encara o centro de
Toronto através da janela de vidro que vai do chão ao teto.
Ele fica pensativo por um tempo, me deixando ansioso e com vontade
de acertar um soco nele.
— Por que quer o seu tio?
— Não devo explicações a você — retruco.
— Por causa da sua mãe? — dispara, me deixando em alerta. Ele abre
um sorriso doentio. — Não fique surpreso, eu sei sobre todas as ações do seu
tio. Inclusive, eu sei também sobre a loira que andou tentando hacker meu
computador. Ela é talentosa, uma peça rara.
— Fique longe dela — rosno.
— Se ela fica longe de mim, não existe motivo para tocar nela.
Respiro fundo, na tentativa de não explodir e estragar as coisas.
— É incrível como a família Farley se odeia. Anos atrás, Schavier
estava sentado bem aí, no seu lugar, fazendo um acordo comigo sobre você e
o seu pai.
Franzo o cenho.
— O quê?
— Se você não sabe, não serei eu a contar.
— Não queremos começar uma guerra com vocês, mas Schavier fez
algumas coisas contra a nossa família e nós somos olho por olho e dente por
dente — é Thomas quem fala, fazendo Alexander virar devagar o rosto na
direção dele.
— Schavier sempre foi impulsivo e já me causou alguns problemas.
Não sentirei falta, ele nunca foi importante pra mim. No entanto...
— No entanto, o quê? — rebato.
— Eu gosto da Corporação. Então, acho que temos um problema.
— É o negócio da minha família.
— É o meu negócio também. Você pode não gostar de saber disso, mas
eu investi muito dinheiro nela depois da morte do seu pai, garoto. Sou tão
dono quanto você. Schavier é apenas o rosto que eu uso — diz e é por um triz
que não perco a paciência e acerto um soco na cara enrugada.
— Podemos chegar em um acordo, eventualmente. Com Schavier fora
de circulação, podemos encontrar uma forma de conseguirmos conviver sem
grandes problemas — Thomas fala, me fazendo olhá-lo de sobrancelhas
unidas.
— Nicholas não parece concordar com isso — Alexander fala, um
sorriso vitorioso estampado na cara velha. — Qual é o mais importante?
Schavier ou a empresa da sua família? Não demore em responder, você pode
acabar ficando sem os dois.
Respiro fundo, tentando controlar a raiva que cresce dentro do peito.
Quero tanto tirar a arma escondida no terno e enfiar uma bala bem no meio
da sua testa e acabar de uma vez por todas com isso. Com essa merda.
— Nicholas — Thomas chama e eu o olho. — O que você quer? —
pergunta, me fazendo retesar os ombros.
— Quero transferir o escritório central pra Montreal — aviso,
encarando o velho com raiva e odiando Schavier por ter entregado metade da
Corporação para esse maldito russo. — Não abro mão disso.
— Não vejo problema. Lá ou cá, a Corporação continua sendo minha
também — retruca, um sorriso irritante desenhando a boca rugada.
— Ok — resmungo.
— Nicholas Farley, eu acho que agora você está pronto para conversar
comigo. Talvez, nós possamos chegar em algum acordo — é o que diz, me
fazendo ficar com nojo.
Certo, talvez agora eu esteja começando a pensar na possibilidade de
começar uma guerra e destruir toda essa organização. No entanto, mesmo
com raiva, sei que vender minha alma ao diabo é a melhor solução.
A última vez que estive na mansão Farley, eu fui do hall de entrada
para o escritório e mesmo assim, já tinha achado o lugar imenso. Agora,
depois de ter subido um interminável lance de escadas e caminhando num
corredor extenso rumo ao quarto de Nicholas, eu posso afirmar: imenso é
apelido.
Essa casa acomodaria sem problema nenhum um batalhão inteiro. Ou a
família Carbone. E quando me refiro à família Carbone, eu quero dizer ela
todinha, com seus mafiosos, esposas, filhos, netos, avós e agregados.
— Eu nunca entendi o motivo de gente rica gostar de casas tão grandes
— comento ao entrar no cômodo que costumava ser o quarto de Nicholas. —
Esse lugar é maior do que o meu apartamento — comento, mais para mim do
que para ele.
— Adorava dar festas aqui — fala, me fazendo estreitar os olhos na
direção dele. — O que foi? Eu era jovem.
— Aqui no seu quarto? Ou aqui nessa mansão?
— Os dois? — responde como se estivesse testando as palavras.
Reviro os olhos e de supetão, me jogo na cama dossel de estrutura
exagerada demais para o meu gosto. No entanto, preciso admitir, é tão
confortável. Eu passaria o dia inteiro aqui, deitada, vendo tevê ou fazendo
sexo. Fazendo sexo é melhor.
— Sabe? — começo a falar, olhando Nicholas remexer a bolsa que
trouxe com ele. — Eu pensei que tinha namorado um cara rico, nada
comparado a você, é claro. Mas agora eu acho que ele era apenas um homem
comum.
Nicholas abre meio sorriso e para de vasculhar a bolsa que trouxe para
me observar, parece com alguém que está gostando das palavras que estão
saindo da minha boca. Então, continuo com a tagarelice.
— Um homem comum com um fundo de dinheiro gordinho, que
perdeu tudo por ter me dado um par de chifres. Não esqueça disso, tá bem?
Sua herança pode ou não pode estar correndo perigo — zombo.
Decidido, Nicholas vem até mim, subindo na cama, cobrindo o meu
corpo com o seu. Tudo bem, eu estou presa e gostando disso. Gostando
muito. Estico as mãos para tocá-lo, mas ele não deixa, pois leva meus braços
até em cima da minha cabeça e me segura pelos pulsos.
— Minha herança corre perigo?
Rio.
— Um pouco.
— Você é uma malandrinha, Lexie Rogen — murmura. E nunca ter
sido chamada de malandra soou de uma forma tão sexy, sedutora ou deixou
um pulsar entre as minhas pernas. — Mas eu gosto.
Ele se inclina sobre mim, tocando a curvatura do meu pescoço com os
lábios quentes, me provocando e me fazendo suspirar.
— Gosta? — questiono, apertando uma perna contra a outra, mas
quando percebe meus movimentos, a sua coxa me abre para ele e eu prendo a
respiração por alguns instantes.
Sem dizer nada e ainda mantendo meus pulsos presos em cima da
cabeça, ele desliza a mão livre sobre o contorno do meu corpo, e de maneira
involuntária, meu corpo todos se arqueia para Nicholas.
A mão desce mais um pouco, tocando a lateral da minha coxa até
deslizar para a parte interna das minhas pernas. Sorrio e mordo o lábio
inferior, ansiando pelo o pote de ouro no final do arco-íris.
— O que você quer? — pergunta, a voz soando de um jeito tão sexy,
que me deixa sem palavras. — Me diga, Lexie.
— Eu quero... isso — murmuro, engolindo o coração na garganta. —
Não me faça falar — peço, as bochechas queimando de tesão, vergonha.
— Por que não?
— Nicholas — resmungo e tento me soltar dele, mas o homem não
deixa. Me dá uma crise de risos e ele parece gostar de ver tão vulnerável. —
Por que preciso dizer? Você sabe o que fazer.
— Quero ouvir da sua boca. Você quer que eu te toque aqui? —
pergunta, levando a mão safada para o meio das minhas pernas, me roubando
um gemido. — Eu quero muito isso também, mas me diga que quer isso.
O coração dá um salto alto dentro do peito e me pergunto se ele é capaz
de ouvir. Respiro fundo e o olho nos olhos antes de abrir a boca e começar a
falar.
— Me toque, Nicholas — murmuro com urgência, o corpo inteiro
formigando.
Ele fixa os olhos nos meus e noto o azul queimando de desejo. Sinto a
ereção contra a minha perna e devagar, as mãos grandes começam a deslizar
sobre o meu corpo de novo, deixando uma onda quente sobre a pele.
Nicholas se inclina para frente, os lábios procurando minha boca
enquanto os seus dedos procuram meu sexo úmido. Como em modo
automático, meu corpo inteiro se curva na direção dele e eu solto gemidinhos
entrecortados.
Ele é minha pequena parcela de insanidade.
— Onde está? Não tenho o dia todo — Nicholas fala, revirando meu
guarda-roupa com certa pressa.
Tento segurar o riso e decido me fingir de desentendida.
— Do que está falando?
Ele paralisa com as portas escancaradas e vira para mim ao respirar
fundo. Tem uma sobrancelha erguida e maxilar cerrado. Hum, sexy pra
caramba.
— A fantasia de couro.
Cruzo os braços na altura dos seios.
— Eu já disse que não é fantasia.
— Não brinque comigo — rosna, todo exigente e rabugento.
Acomodo-me ao lado dele e o empurro com o quadril, rindo. Vasculho
o guarda-roupa e sem dificuldades encontro a roupa de couro, que vesti
quando fiz cosplay da Canário Negro.
Entrego-a Nicholas e noto os olhos azuis brilhando de um jeito
perverso.
— Satisfeito?
— Muito — é o que responde, pegando a roupa e colocando dentro de
uma bolsa que trouxe hoje cedo. — É prioridade levar isso pra Montreal.
Rio.
— Ainda não disse se vou usar ou não.
Ele me lança um olhar sério e muito sexy, com uma sobrancelha loira
erguida. Droga. Se ele me olhar assim outra vez, vou colocar a roupa de
couro agora e deixá-lo fazer a festa.
— Conversaremos sobre isso depois.
Aperto os lábios e assinto.
Segurando a bolsa, Nicholas caminha até a porta do meu apartamento e
eu o sigo. Nosso momento de minutos atrás me fez esquecer o que está
prestes a acontecer. Mas agora que a realidade caiu como um banho de água
fria, estou nervosa.
Encaro Nicholas na soleira e engulo o caroço na garganta, sentindo o
coração acelerar que nem uma batedeira descontrolada. Eu não quero deixá-
lo ir. Parte mim quer agarrá-lo pelo pulso e fazê-lo ficar aqui, comigo, onde é
seguro. Mas sei que isso é impossível.
Ele não vai sossegar até acabar com Schavier. E eu entendo e mesmo
assim, tenho uma vontade enorme de fazê-lo ficar. Ou ir com ele. Duas coisas
impossíveis. Nicholas me fez prometer que ficarei trancada aqui até tudo se
resolver.
Bom, não era bem no meu apartamento que ele queria que eu ficasse,
mas a mansão Farley é grande e solitária demais para uma pessoa. E
sinceramente, zero vontade de me assustar com qualquer barulho de vento
ecoando pelos corredores. O espaço pequeno do meu apartamento me parece
mais seguro do que qualquer outro lugar.
E claro, tem um homem de quase dois metros na porta. Ele será o meu
segurança pelas próximas horas. Vou ficar bem, eu acho. Não tenho certeza,
porque parece que vou ter um ataque cardíaco antes de Nicholas ir.
— Não saia por nada — ele ordena e eu assinto. — Eu volto. —
Envolve uma mão no meu rosto e faz carinho com o polegar na bochecha
antes de encostar os lábios quentes aos meus.
— Volte... vivo — murmuro, fazendo-o sorrir. — Se não voltar vivo,
eu acabo com você — resmungo e o sorriso no rosto carrancudo aumenta.
Thomas que está no corredor faz um movimento quase imperceptível
com a cabeça na minha direção e depois que Nicholas se afasta de mim, os
dois dão as costas e somem corredor afora.
Olho o homem no corredor. Eu não o conheço, mas Nicholas e Thomas
confiam nele. E para ser sincera, são tantos homens na família Carbone, que é
impossível decorar o rosto de todos.
— Estarei aqui fora... para o que precisar — fala em um tom sério.
Um arrepio passa pela minha espinha ao perceber que provavelmente
as ordens que recebeu é de me proteger com a própria vida. Tranco a porta e
encosto a cabeça no material de madeira, respirando fundo e me esforçando
para controlar os batimentos cardíacos.
Arrasto os pés até os computadores e meus dedos estão ansiosos para
começaram a trabalhar no que tinha combinado com Nicholas e Thomas
ontem à noite. Invadir as câmeras da casa de Schavier e burlar o sistema de
segurança, dando acesso livre aos dois.
Eu devia estar pirando com o simples fato de que serei cúmplice de um
assassinato. Mas Schavier não hesitou em tirar a vida de Liam. Não foi ele
quem puxou o gatilho, mas o garoto está morto por causa desse monstro. E
ele ameaçou minha família, Durant, matou a mãe de Nicholas e fez tantas
outras atrocidades.
Não vou me culpar pelo o que acontecer com ele.
Quando recebo a mensagem de Nicholas, faço o que sei fazer de
melhor: cometer crimes digitais. Seria engraçado, se não fosse tão sério.
Envio uma resposta depois de alguns minutos e levanto da cadeira, o coração
disparado e as mãos suando frio.
Feito.
Ah, merda. Está feito. As câmeras e o sistema de segurança da casa de
Schavier foram desligados.
Caminho até o sofá e sento, abraçando meus joelhos com força e
olhando os monitores dos computadores, como se eles fossem capazes de me
avisar quando tudo finalmente acabasse.
Tomo um susto grande ao ouvir batidas na porta. Levo a mão até o
peito, massageando meu coração e fico de pé. Estou segurando a maçaneta
quando por instinto, decido olhar no olho mágico e prendo a respiração ao
não reconhecer o homem do outro lado.
Sem fazer movimentos bruscos, dou alguns passos para trás e noto a
maçaneta mexer de forma urgente. Olho para os lados, procurando algo para
me defender. E nunca fiquei tão aliviada e feliz ao ver o taco de hóquei que
ganhei de Danny anos atrás.
Por alguns meses, ele namorou um jogador de hóquei. Quando não deu
certo, Danny se viu com dois tacos de madeira inútil e decidiu que eu ficaria
com um, que agora, não parece tão ruim assim.
A porta é escancarada e eu tomo um susto ao ver o homem careca jogar
o corpo sem vida do meu segurança no meio da sala, como se fosse um
pedaço de nada.
— Você vem comigo, loira — diz em um tom ameaçador.
— Não, obrigada — retruco, preparada para atacar.
Ele solta uma risada seca e eu sinto um arrepio tenebroso passar pelo
meu corpo ao vê-lo se aproximar. Reúno toda coragem e força que existem
dentro de mim, e tento acertar sua cabeça com o taco.
Infelizmente, não dá em nada. Ele segura a madeira com uma mão e de
repente, sinto algo cutucar minha barriga. Quando meus olhos descem, eu
vejo a arma e congelo. Acho que não reagir é a coisa mais sensata a se fazer
no momento.
O desgraçado arranca o taco de hóquei da minha mão e joga contra um
dos meus computadores.
— Só existe uma maneira de você sair daqui, loira — é o que diz, um
sorriso doentio tomando conta dos lábios. — E você sabe qual é, então,
vamos.
De repente, ele pega meu braço com força, gira meu corpo na direção
da porta e encosta a arma na minha lombar. Arrasta-me para fora do
apartamento, mas antes, meus olhos curiosos passam pelo corpo no meio da
sala e eu sinto um embrulho no estômago.
Droga, droga, droga. Tem um homem morto no meu apartamento.
Onde foi que eu fui me meter? Quando a minha vida deixou de ser simples?
Quando tudo ficou tão repleto de tragédia?
— Ele vai matar você — rosno, entre os dentes.
— Quem? Seu namorado? É o que vamos ver.
Aperta o cano da arma contra meu dorso, me obrigando a andar, mas
cravo os pés no chão, sem vontade de continuar. E decidindo se é uma boa
hora para usar tudo o que aprendi na aula de defesa pessoal agora e derrubar
esse cara no chão.
Uma mulher com uma criança de colo sai do elevador e o garotinho
olha para mim, abrindo um sorriso banguela e gentil.
— Não tente nada, loira. Não vou hesitar em matar qualquer que more
nesse muquifo — murmura no pé do meu ouvido. — Quer que uma criança
morra por sua causa? — indaga, me arrepiando a nuca.
— Vai se foder.
Em resposta, ele aperta meu braço, me machucando e me deixando
irritada.
— Anda, não tenho a noite toda — fala, autoritário. — A ordem é pra
levar você... viva ou morta. Você escolhe, loira.
Cerro os dentes. Volto a caminhar quando vejo a mãe e o garotinho
entrarem no apartamento. Saímos do prédio e infelizmente, ninguém na rua
lotada nota que tem um cretino com uma arma apontada para mim.
Meus pés paralisam em frente a van preta.
— Ninguém vai te salvar. Talvez você não saiba, mas noite e multidões
criam invisibilidade — sussurra contra o meu ouvido, fazendo minha espinha
arrepiar de um jeito tenebroso.
Sem delicadeza nenhuma, ele me enfia para dentro da van com mais
dois homens armados. Meu invasor senta perto de mim e ele nem precisa dar
alguma ordem explicita, de repente malditas armas são apontadas na minha
direção.
— Não esqueça, loira. Viva ou morta, não me importa como — fala, a
voz transparecendo sem pudor a ameaça.
Uma risada seca e estrondosa escapa da sua garganta, e eu sei que ele
fala a verdade. Esse cretino não vai hesitar em me matar e eu não posso fazer
nada a não ser ficar quieta e esperar.
Esperar uma oportunidade para me defender.
Talvez eu morra hoje, mas não vou morrer sem lutar.
A casa do meu tio é uma fortaleza, mas com o sistema de alarme e as
câmeras desligados não foi difícil derrubar os seguranças pelo meio do
caminho e entrar pela porta da frente.
No hall de entrada, troco um olhar com o Thomas e o saldado que nos
acompanhou.
— Ele é meu — aviso, e eles assentem, se espalhando pela mansão.
Antes de me dirigir até o escritório para procurá-lo, passo pela cômoda
no corredor e olho os porta-retratos com as fotos em família. Isso me dá um
gosto amargo na boca. Lawanda gosta dele e tirá-lo da vida dela vai acabar
com a minha irmã, mas não posso deixar nosso tio viver.
Com a 9mm em punho, entro no escritório de porta entreaberta. Para
minha surpresa e desgosto, ele parece estar me esperando. Sentado à mesa da
madeira envelhecida, Schavier toma uísque, olhando parte do jardim através
da porta de vidro da varanda, como se estivesse aguardando uma visita.
— Oi, Nicholas. Você demorou — fala ao colocar o copo de cristal em
cima da mesa e erguer as vistas para mim.
Aproximo-me dele, estou pronto para puxar o gatilho e acabar de uma
vez com essa merda, mas antes, preciso de algumas respostas. Algo que
Alexander disse ontem não sai da minha cabeça.
Schavier faz um gesto com a garrafa de uísque, me oferecendo a
bebida. Fico irritado. Eu estou a ponto de matá-lo e ele agindo como se nada
fosse acontecer.
— Não tem como sair vivo daqui hoje — digo, contraindo o músculo
da mandíbula. — Alexander me deu sua cabeça.
Schavier fica de pé ao assentir.
— Aquele velho desgraçado — resmunga. — Depois de eu ter feito
tantas coisas por ele, não hesitou em me descartar. — Schavier balança o
líquido no copo de cristal e abre um sorriso cínico. — O que você fez? Abriu
mão da corporação? Sua irmã sabe disso?
— Cala a boca seu filho da puta.
— Você não vai me matar, Nicholas — diz, voltando para de trás da
mesa e mexendo no computador. — Não hoje e talvez, nunca.
— Você tem muita certeza, Schavier, mas eu já matei por muito
menos... — falo e a voz silencia ao ver um homem trazer minha irmã para
dentro do escritório. Ela tem a maquiagem toda borrada e a merda de uma
arma apontada na cabeça dela.
Ela chora, sem entender nada.
— Nick... — choraminga. — O que tá acontecendo? — pergunta, me
fazendo inflar as narinas. — Tio... o que é isso?
Schavier respira fundo e está prestes a se aproximar da minha irmã,
quando eu acerto o vidro da varanda com um tiro, o impedindo de dar um
passo para frente. Devagar, ele vira o rosto para mim, sorrindo.
— Eu nunca erro, isso foi apenas um aviso. Não chegue perto dela.
— Que merda é essa? — Lawanda pergunta de novo, entre as lágrimas.
— O que é isso? — emenda, encarando o nosso tio, a família que deveria
protegê-la, mas que não é nada mais do que um monstro ambicioso.
— Você não vai me matar, Nicholas. Porque se fizer isso, sua preciosa
irmã morre também. Está preparado para viver sem ninguém? Mesmo que
agora tenha outra família, ela ainda é sangue do seu sangue — Schavier fala.
Mesmo depois de ouvir as palavras dele, não consigo abaixar a arma.
— Você não...
— Não sou capaz de matar Lawanda? — me interrompe e lança uma
olhadela para minha irmã. — Eu nunca gostei dela de verdade. Tinha muita
necessidade de atenção.
Lawa chora, me deixando inquieto e nervoso.
— Tio... — ela sussurra, fungando. — Não faça isso, por favor —
pede, mas eu sei que é em vão.
— Ele matou a mamãe — falo, mesmo que tenha feito uma promessa
silenciosa de nunca contar isso à Lawanda. A merda já foi jogada no
ventilador, não tem motivo para esconder.
Ela arregala os olhos, atônita. Ainda está chorando, mas parece incapaz
de dizer alguma coisa em voz alta.
— E o pai de vocês também — admite, fazendo meu peito apertar.
E algo estala dentro de mim. É sobre isso que Alexander falou quando
disse que meu tio fez um acordo com ele. Schavier vendeu a própria alma ao
diabo para tirar a vida do irmão mais velho.
— Na verdade, fiquei muito decepcionado quando recebi a notícia de
que você tinha sobrevivido — diz, olhando para mim.
— Seu filho da puta miserável — rosno ao me aproximar, mas sou
impedido quando o homem com a arma apontada para cabeça de Lawanda
coloca minha irmã de joelhos, fazendo-a chorar mais ainda.
— Por que fez isso? — quero saber, mesmo que não vá adiantar de
nada no momento.
— Alexander nos procurou com uma proposta incrível, mas seu pai era
honesto demais para fazer qualquer coisa ilegal. Eu tomei a decisão de tirá-lo
de cena. Minha vida melhorou muito sem o meu irmão de qualquer forma.
— Filho da puta.
A única coisa que se passa pela minha cabeça agora é que eu preciso
fazer Schavier sofrer muito antes de morrer. Quero fazê-lo implorar para que
eu acabe de uma vez com a sua vida de merda.
— Por que matou a mamãe? — Lawanda choraminga.
— Infelizmente, ela sabia demais e eu precisava manter meus segredos
bem guardados. Não queria ter feito isso, mas não podia me arriscar — é o
que diz, como se não fosse tão importante.
Contraio o maxilar.
— Por que isso? Por que destruiu a nossa família? — minha irmã
esbraveja.
— Porque essa nunca foi minha família! — ele grita, fazendo-a se
encolher. — Não importa se carrego o sobrenome Farley, eu nunca passei de
um bastardo e eu cansei de aceitar as migalhas dessa família. O pai de vocês
era o pior de todos, agindo como se fossemos iguais e a verdade é que não
erámos. Nunca fomos. Ele sempre foi o preferido, a joia rara de toda a família
Farley e eu... apenas o filho da amante.
— Eu vou matar você — digo e Schavier ri.
— Não, não vai — retruca.
Thomas entra sorrateiro no escritório pela porta estilhaçada da varanda
e derruba com um tiro o homem com a arma apontada para cabeça da minha
irmã. Lawanda grita ao vê-lo cair e tenta se afastar de Thomas, mas ele a
segura pelo braço e a olha nos olhos enquanto diz alguma coisa, que a faz
assentir.
— Você acha que eu viria sozinho?
Lanço-me para cima dele e lhe acerto uma coronhada, mas a única
coisa que ele faz é rir.
— Você acha que a sua irmã é minha única moeda de troca? — retruca,
alterado. — Ainda é tão ingênuo, Nicholas.
Estou prestes a lhe acertar um soco quando vejo Lexie entrar pela porta
da frente, as mãos levantadas em rendição.
Droga. A vida só pode estar de brincadeira comigo.
Em um movimento rápido, Thomas passa Lawanda para trás e já está
com a arma em punho. O homem que entrou com Lexie, a puxa de supetão e
encosta a merda do cano na têmpora dela, que para minha surpresa não está
tão assustada como Lawanda.
— Minha querida traidora — Schavier murmura e Lexie aperta o
maxilar. — Achei que você fosse ser inteligente como a sua mãe. Na
verdade, Emily não era tão inteligente assim. Me trocou pelo Martin. Péssima
escolha.
— Não fale da minha mãe.
— Por que não? Não quer sentar e dividir lembranças.... — Ele se cala
quando acerto um soco no seu rosto. — Não seja ciumento, sobrinho. Só
estou batendo um papo amigável com a garota — volta a falar, limpando a
boca suja de sangue.
— Vai se ferrar, porco nojento. Agora entendo o porquê minha mãe
abandonou você — Lexie retruca.
— Se eu fosse você teria cuidado com as palavras. O homem atrás de
você não é tão delicado como os outros e a qualquer momento seus miolos
podem sair voando pelas paredes do escritório — ele diz, o tom soando
ameaçador.
Troco um olhar com Thomas e ele assente de maneira quase
imperceptível, se preparando para atirar no filho da puta ao meu lado na
primeira oportunidade.
— Engraçado, eu também não sou delicada — Lexie fala.
E antes que eu possa fazer alguma coisa, ela dá uma cotovelada no
abdômen do homem e de maneira hábil, puxa o revólver e aponta para o seu
agressor.
— Aulas de defesa pessoal no ensino médio. Estava apenas esperando
uma oportunidade — comenta, como se lesse meus pensamentos
questionando-a.
— Não acho que você tenha convicção de puxar o gatilho e me matar
— o homem de quem Lexie conseguiu tirar a arma fala. — Vadia —
acrescenta, sorrindo.
Ela atira na perna esquerda dele, deixando-o de joelhos no chão.
— Vadia... eu odeio essa palavra — resmunga, se aproximando dele e
observando. — E talvez eu não tenha convicção para matá-lo, mas posso
fazer alguns buracos em você — fala, atirando na outra perna e quando o
homem deita no chão, Lexie se aproxima para lhe dar um chute no saco.
Eu teria dito o quanto estou orgulhoso se não fosse pela situação em
que nos encontramos.
— Feche os olhos, Lawa — ordeno.
Parte de mim quer dar uma morte lenta ao meu tio, fazê-lo sofrer e
implorar para que eu meta uma bala no meio da testa. Mas não posso fazer
isso na frente de Lawanda ou Lexie. E Shavier já viveu por tempo demais. É
hora de acabar com isso.
— Nick... — minha irmã sussurra.
— Feche os olhos — ordeno de novo.
E antes que mais alguma merda aconteça ou Schavier resolva abrir a
boca, eu atiro bem no centro da testa dele, fazendo-o cair sobre os seus papéis
em cima da mesa e um estrondo ecoar pelo escritório.
Foi uma morte rápida demais, mas no fundo, ainda me sinto um pouco
aliviado por ter me livrado dele.
Para minha surpresa, Lawanda se aproxima de mim, encarando o nosso
tio sem vida deitado na mesa. Sem dizer nada, ela pega a 9mm da minha mão
e aponta para ele, chorando.
— Lawa... — murmuro, mas ela nega com a cabeça. — Acabou —
digo, mas minha irmã pisca devagar, cerrando os dentes.
— Eu o amava. Eu o amava, Nick e ele me usou. Ele matou a mãe, o
pai. Ele é um monstro — fala, entre as lágrimas que não pararam de cair
desde que entrou no escritório.
— Acabou.
Lawanda nega com a cabeça e dispara um tiro no peito de Schavier. O
corpo pequeno dela treme e cambaleia um pouco para trás, sem jeito, mas não
para, aperta o gatilho até não ter mais balas, e em seguida, se enrosca no meu
peito aos prantos.
Aperto-a contra mim e beijo o topo da sua cabeça.
— Vai ficar tudo bem, Lawanda. Vai ficar tudo bem.
— Ela tá bem? — Lexie pergunta assim que me vê entrar no quarto.
Ela que está com um porta-retratos na mão, coloca de volta a fotografia em
cima da cômoda ao lado da cama e vem até mim.
— Vai ficar — é o que digo, tirando o terno e desabotoando as mangas
da camisa social. — Mas acho que foi muito pra ela. Não queria que
Lawanda ficasse sabendo o que Schavier fez com a nossa família — digo,
lembrando que além de assassinar nossa mãe, ele acabou com a vida do nosso
pai também.
Lexie pega minha mão, que estava fechada em punho e eu nem tinha
percebido. Devagar, os seus lábios carnudos se esticam em um sorriso doce e
eu ainda não sei o porquê ela não está fugindo de mim.
Matei um homem na frente dela e mesmo assim, Lexie continua aqui...
ao meu lado.
— Os segredos machucam mais que a verdade. Lawanda vai superar e
ficar bem. O que aconteceu vai deixá-la forte — fala baixinho, encarando
minha mão ao respirar fundo.
— Por que não está fugindo de mim? — me ouço perguntar. — Eu
matei um cara na sua frente.
— Eu acho que tenho um tipo.
Enrugo a testa.
— Como assim?
— Bad boy... é o meu tipo — retruca. — E talvez, eu esteja me
tornando uma garota má — acrescenta, passando as pontas dos dedos no
contorno do meu rosto.
— Desde quando sabe atirar? — questiono, lembrando de Lexie sendo
incrível e forte mais cedo. — Você foi muito corajosa hoje.
Ao ouvir minhas palavras, o rosto dela se ilumina com outro sorriso.
— Por causa de Danny, eu pratiquei tiro ao alvo por quase dois anos. E
as aulas de defesa pessoal serviram de alguma coisa.
Com delicadeza, prendo uma mecha de cabelo roxa desbotada detrás da
sua orelha com piercings e em seguida, seguro seu rosto entre as mãos e
encosto nossos lábios por um longo segundo.
— Por que fez aula de defesa pessoal?
Ela mexe os ombros e faz beicinho.
— Tente ser uma garota muito míope e com astigmatismo e usar óculos
enormes, com aparelho dentário e de brinde, gostar de estudar no ensino
médio. Eu praticamente andava com uma placa pendurada no pescoço...
pedindo pra me zoarem.
Imaginá-la sofrendo bullying na escola faz o meu coração apertar.
Envolvo meus braços em volta de Lexie a puxo contra o peito, apertando-a
em mim, incapaz de soltá-la.
— Você é uma garota forte, Lexie — digo e ela contorna meu corpo
com os próprios braços e me aperta também, suspirando. — Outras pessoas
não teriam feito isso, mas você encontrou uma forma de superar os
obstáculos.
— Sim, mais ou menos — comenta, dando de ombros. — Melhorou
um pouco depois da cirurgia dos olhos. — Afasta-se de mim e com indicador
aponta para o próprio rosto, na direção dos olhos verdes.
Sorrio, e de repente, Lexie cai em si e se afasta de mim com a boca
escancarada.
— Ai meu Deus! Tem um homem morto no meu apartamento. Eu vou
ser presa — fala, levando as mãos até a boca e tampando-a. — Já não basta
Liam ter morrido por minha causa, agora tem aquele homem também.
— Relaxe, alguém já resolveu isso — digo, puxando-a de volta para
mim. A expressão de Lexie é como um ponto de interrogação. — Mandei
alguém ir lá antes de sairmos da casa de Schavier. Aquele soldado tinha
ordens pra te proteger a todo custo.
— Uau — murmura e engole em seco, o verde dos olhos ficando um
tom mais escuro.
— Pare com isso, Lexie.
— Parar com o quê? — retruca, a testa cheia de vincos.
— De se culpar pelo que aconteceu. Ele morreu, não é culpa sua —
falo num tom sério e ela assente de lábios prensados. E eu sei que é a hora
certa para contar sobre Liam. — Tem algo sobre Liam que preciso contar.
— O quê?
Solto uma lufada de ar antes de falar.
— Ele não morreu. Liam está vivo, se recuperando, mas vai ficar bem.
Eu não quis contar, porque estava tentando protegê-lo do meu tio. Não podia
arriscar a vida daquele garoto.
— Como é? — ela rebate, alterada.
Lexie começa a desenfrear alguns socos no meu abdômen, mas para
logo em seguida, o rosto inteiro torcido por causa de uma careta. Não demora
muito para a expressão mal-humorada dar lugar para uma melancólica e até
meio feliz.
— Ele está vivo? — murmura e eu assinto, fazendo-a chorar em
silêncio. — Não devia ter escondido isso de mim, mas droga, estou tão
aliviada.
Sorrio e tomo seu rosto entre as mãos, limpando as lágrimas com os
polegares.
— Liam vai ficar bem.
Ela respira fundo e sorri.
— Graças a Deus.
— Quero voltar pra Montreal o quanto antes — mudo de assunto, de
repente. Analiso suas expressões.
Lexie estava em Montreal, porque eu estava a protegendo do meu tio.
Agora que a ameaça foi eliminada, ela não corre mais perigo. E para ser
sincero, eu quero que ela volte e fique comigo, mas não sei se a garota vai
querer voltar.
E se ela não quiser, não sei como será, porque quando olho para frente,
não consigo imaginar Lexie fazendo diferente.
— Precisamos conversar sobre isso, né? — diz, e eu assinto. Ela respira
fundo e dá alguns passos para trás, pensativa. — Nós nunca nem rotulamos o
nosso relacionamento.
— Você é minha — falo, rápido.
Lexie deixa os ombros caírem e até ri de leve.
— Isso não quer dizer nada.
— Pra mim isso quer dizer muito — devolvo. — Na verdade, quer
dizer tudo — emendo, curvando o canto esquerdo da boca em um sorriso
maroto.
— Não é tão fácil. Eu preciso de um emprego.
— Quando o escritório for transferido pra Montreal, você pode
trabalhar lá — falo, mas ela nega com a cabeça. — Não vou me intrometer —
minto.
— Você mente mal e eu não quero morar com o meu pai — retruca,
revirando os olhos e depois, suspira.
— Quem disse que você moraria com o seu pai? — questiono, cortando
a nossa distância. — Eu estava pensando em você morar comigo.
Lexie aperta os olhos e torce a boca.
— Isso vai dar certo? Eu e você? — Lexie respira fundo, os olhos
verdes me encarando numa ansiedade absurda. — Você vai proteger meu
coração?
— Vou proteger você inteira — falo, roubando meio sorriso dela.
— Preciso me organizar primeiro. Não posso simplesmente ir, minha
vida está aqui. E tem Danny, não posso abandoná-lo de qualquer jeito. Assim
como a máfia é sua família, ele é a minha.
Concordo mesmo a contragosto. Claro que minha vontade é fazê-la
voltar comigo o mais rápido possível. Eu sempre fui paciente, mas admito
que ter paciência em relação a isso, ter paciência em relação a ela, é a última
coisa que quero no momento. Mas por mais difícil que seja, serei um cara
legal e vou esperar Lexie resolver a vida aqui antes de embarcar com tudo na
minha.
— E as minhas calcinhas?
— O que tem elas? — rebato, franzindo a testa.
— Vai continuar rasgando todas? — resmunga, prensando os lábios
para não começar a rir.
Envolvo as mãos na sua cintura e a puxo contra mim, colando nossos
corpos. Inclino meu rosto sobre a curvatura do seu pescoço e roço os lábios
de leve na pele, roubando gemidos arfantes dela.
— É claro que sim.
Quando me afasto, a boca de Lexie procura a minha, me envolvendo
em um beijo cheio de necessidades e as mãos ansiosas desabotoam a minha
camisa e passam o tecido pelos braços.
Num pulo certeiro, ela entrelaça as pernas na minha cintura e eu a levo
para o banheiro ao mesmo tempo em que minha boca continua devorando a
sua em um beijo selvagem.
Depois de um dia intenso e cheio de merda como o de hoje, é a sétima
maravilha do mundo poder deslizar as mãos e a boca sobre a pele macia de
Lexie. E claro, me afundar no corpo pequeno e delicioso da minha garota.
Ela é minha e acabei de tomar minha decisão. Nunca deixarei Lexie
fugir de mim.
Mesmo depois de ter concordado em deixar Lexie resolver a vida em
Toronto antes de voltar para Montreal, não gosto de deixá-la aqui. Ainda
mais depois de tudo que aconteceu e por ela ter passado mal hoje de manhã.
— Eu estou melhor — fala, como se lesse meus pensamentos. — Não
devia ter pedido aquele hamburguer ontem à noite. — Abre a porta do seu
apartamento e entra, e sem pestanejar, faço o mesmo.
— Você precisa se cuidar mais, Lexie.
A garota respira fundo e assente.
— Mas não espere que eu fique sarada como você, isso é muito por
mim. E há anos tento perder isso — diz em um tom divertido e passa a mão
na barriga, me fazendo revirar os olhos. — Mas ela já faz parte de mim.
— Você é perfeita, não precisa perder nada — resmungo, começando a
ficar de mau humor. Estou falando sério e a garota fazendo graça. — Mas
precisa se alimentar melhor.
— Isso é uma ordem?
— Sim — retruco, encarando-a com afinco. — Obedeça — acrescento
e ela esquadrinha meu rosto antes de mover a cabeça em concordância. —
Deixarei dois homens cuidando da sua segurança.
— Não precisa.
Em resposta, nego com a cabeça. Isso nunca esteve em discussão.
— Ah, é mesmo. — Ela para no meio da sala, os olhos curiosos
dançando pelo chão limpo. — Parece que nada aconteceu aqui.
Noto um certo medo ultrapassar suas feições.
— Ei, você vai ficar bem aqui?
Lexie levanta as vistas para mim e prensa os lábios.
— Sim, acho que sim — murmura. — Mas talvez eu vá dormir na casa
do meu melhor amigo — admite.
Agora que sei que Daniel não é mais um perigo, eu só consigo enxergar
a situação de uma forma: ele vai protegê-la de tudo e qualquer coisa, então
fico aliviado em saber que Lexie estará ainda mais segura.
— Se precisar de alguma coisa, me ligue.
Sorrindo, Lexie se aproxima, pousando as mãos no meu peito coberto
de terno e focalizando as duas esmeraldas verdes em mim. Envolvo uma das
mãos em seu rosto, os dedos roçando o cabelo da nuca e os polegares, as
bochechas.
— Eu vou ficar bem — diz ela, sem deixar meus olhos. — Não se
preocupe comigo. Só comerei salada a partir de hoje — zomba.
Bufo e ela solta uma risada contagiante.
Lexie envolve os braços na minha cintura e descansa a cabeça no meu
peito, respirando fundo e eu percebo que desde que ela entrou na minha vida,
eu venho mudando aos poucos. Mas sinto também, que ela aceitou minha
escuridão. Aceitou quem eu sou de verdade.
E mesmo depois de tudo, não parece que ela vai fugir da minha vida.
Eu disse tantas vezes que Lexie não era garota para mim, mas a
verdade é que eu só estava arrumando formas de mantê-la longe. Não queria
alguém com tanta importância assim na minha vida. Esse tipo de
relacionamento deixa as pessoas fracas, eu sei, foi o que aprendi. Mas por
algum motivo, eu me sinto forte com ela ao meu lado, como se essa garota
insana fosse capaz de recarregar minhas energias.
E tê-la comigo, dominando meu coração, acolhendo minha escuridão é
mais do que um dia eu cheguei a pensar em ter. Nunca vi futuro com uma
mulher estando na máfia, eu nunca nem consegui conciliar a família Carbone
e a família que deixei aqui em Toronto, mas Lexie faz parecer que é fácil
fazer isso.
Lexie é meu caminho de calvário, mas é minha redenção também.
Seguro seu rosto entre as duas mãos e a envolvo num beijo antes de sair
porta afora. Dou as devidas ordens aos homens fora do apartamento e
caminho na direção no elevador para ir embora.
Do lado de fora do prédio, abro a porta do carro e me acomodo ao lado
de Lawanda, que não disse muito desde o café da manhã. E parte de mim
sabe que ela está revivendo as cenas do acontecimento de ontem.
— Vou recuperar a corporação, Nick — fala, me surpreendendo.
Thomas que está sentado no banco da frente, observa minha irmã através do
retrovisor. — Não importa o que aconteça, eu vou fazer isso.
Respiro fundo, segurando uma de suas mãos.
— Não pense nisso agora, Lawa.
Minha irmã balança a cabeça de um lado para o outro.
— Não consigo pensar em outra coisa — admite.
— Vamos pensar em algo e resolver esse problema juntos.
— Schavier só me manteve por perto, porque ele me achava fraca —
ela conclui em voz alta. — Mesmo que ele esteja morto agora, vou provar
que não sou fraca e vou recuperar a empresa da nossa família, Nick. É a
minha missão de vida.
Abro a boca para contra-argumentar, mas sei que nada do que diga
agora vai fazê-la mudar de ideia, então aperto a mão entrelaçada na minha,
fazendo uma promessa silenciosa protegê-la de qualquer coisa.
Nunca mais deixarei alguém machucar minha irmã ou usá-la de novo.
Posso ter perdido muitos anos da sua vida, mas agora, serei o irmão mais
velho outra vez. E isso significa fazer qualquer coisa para mantê-la segura e
bem.
— Eu te protejo no meio do caminho — digo, levando a mão livre até o
topo da sua cabeça loira e fazendo carinho.
Os olhos dela brilham quando encontram os meus, mas minha irmã
sorri.
— Obrigada, Nick — sussurra, encostando a cabeça no meu peito e
chorando em silêncio por alguns minutos. — Não vou mais chorar por isso,
chega! Chorar não vai adiantar de nada — diz, se afastando de mim para
limpar as lágrimas.
Eu sei que a vida da minha irmã nunca mais será a mesma.
Ela perdeu os pais, e o tio por quem tinha muito apreço, foi alguém que
quebrou o seu coração sem remorso nenhum. Mas Lexie tem razão, os
segredos machucam mais que a verdade e a verdade que foi jogada em
Lawanda, servirá para deixá-la forte.
Dias depois...
— Ah, merda — sussurro, sem acreditar.
Eu me ferrei legal agora e a culpa é inteiramente minha. Não, só parte
dela é minha. A outra parte é do Nicholas. Droga. O que vou fazer? Não
estava esperando minha vida ter uma reviravolta dessas.
Danny bate na porta do banheiro, me assustando. Penso em ignorá-lo,
mas não tenho escapatória. Foi por causa da insistência dele que decidi fazer
o teste de gravidez. Meu melhor amigo desconfiou dos meus enjoos e tudo
bem que minha menstruação está atrasada, mas eu pensei que não fosse um
problema e que tinha apenas comido algo estrago.
Não esperava que um bebê estivesse crescendo dentro da minha
barriga.
— Ah, merda — sussurro de novo.
— E aí? Não me mata de curiosidade — ele fala ao bater na porta de
novo. Com o coração a mil por hora, abro a porta para encará-lo. Assim que
nossos olhos se encontram, ele fica pasmo. — Positivo? — questiona, alto.
— Por que tá surpreso? Você que insistiu nisso — resmungo ao
gesticular com o teste. — Você comprou o teste.
— Eu sei, mas não achei que estivesse grávida de verdade. Achei que
fosse... eu não sei.
— Ai, merda. Como não? — rebato, histérica. — Tá reclamando dos
meus enjoos faz dias — emendo, ainda gritando.
— Você tem certeza?
— Claro que sim — resmungo de mau humor.
— Respire fundo e não deixe os hormônios de grávida falarem mais
alto — pede, me fazendo choramingar.
Caminho até a sala e me jogo no sofá, abraçando meus joelhos e
atirando o teste de gravidez com resultado positivo na televisão, que está
ligada em um programa idiota de culinária. Danny se acomoda ao meu lado,
envolvendo um braço no meu corpo e tentando me reconfortar.
— Não é o fim do mundo.
Viro o rosto e o olho nos olhos.
— Como não? Tem um bebê mafioso crescendo dentro de mim —
choramingo de novo. — Minha vida acabou. Como vou criar o filho de um
mafioso? Como isso funciona, Danny? — Balanço a cabeça de um lado para
o outro, as lágrimas escapando dos meus olhos como se eu fosse um
encanamento com problema.
— Ainda não fizeram manual pra isso? — brinca, me fazendo encostar
a cabeça contra o seu peito e choramingar de novo.
Choramingar... acho que é a única coisa que farei nos próximos dias.
— O que vou fazer, Danny? Um bebê. Um bebê. Eu não tô pronta pra
ser mãe. Ai meu Deus, eu não tô pronta pra ser mãe de um projeto de
mafioso.
Meu melhor amigo alisa minhas costas, na tentativa de me reconfortar,
mas não adianta. Sinto a cabeça um turbilhão e existem tantas perguntas
assolando a mente, que não vai demorar muito para meu cérebro pifar de vez.
— Não fale assim, Lexie. Não é como se o seu bebê já fosse nascer
com uma arma na mão — fala, e eu fungo, sem ter vontade de concordar com
ele. — E você não está sozinha.
Afasto-me e ele limpa meu choro com os polegares, mas é em vão. As
lágrimas continuam caindo sem parar e eu me sinto tão idiota, que chega a ser
ridículo. Por que isso aconteceu comigo? Um bebê? Um bebê de um
mafioso? Crianças não combinam com a máfia.
Droga.
Minha vida é uma droga.
— Você precisa conversar com Nicholas — Danny diz o óbvio, mas eu
nego com a cabeça. — Não pode esconder isso. Mesmo que não queira
continuar assim... grávida, você precisa conversar com ele.
Ouvir as palavras dele mexem comigo. É claro que não estou pronta
para ser mãe. Meu Deus, eu acabei de retocar as mexas do meu cabelo e às
vezes, eu me visto como uma adolescente e ano passado eu fiz cosplay para ir
na comicon. Mas mesmo assim, pensar em não continuar grávida, aperta meu
coração.
Ainda é apenas uma sementinha dentro de mim, mas é a minha
sementinha, que não pediu para estar aqui, apenas aconteceu porque Nicholas
e eu fomos imprudentes. A solução de não continuar grávida está fora de
cogitação.
— É tão complicado.
— Isso é você ou os hormônios da gravidez falando?
Remexo-me no sofá, enrugando o nariz ao fazer cara feia. Hormônio da
gravidez, isso é uma expressão? Porque se for, acabei de descobrir que odeio.
Odeio muito. Quem inventou isso?
Enrolo uma mecha roxa de cabelo no dedo indicador e penso no que
fazer. É claro que preciso conversar com Nicholas, é responsabilidade dele
também. Mas e se ele não quiser essa responsabilidade? Será que dou conta
de ser uma mãe solo?
— Eu sei o que tá pensando — Danny começa a falar, chamando minha
atenção. — Mas não se preocupe, você sempre terá a mim.
Em meio a minha tristeza e preocupação, abro um meio sorriso para
ele.
— Obrigada.
Danny volta a deslizar as mãos nas minhas costas de forma carinhosa e
protetora, e eu até consigo me sentir um pouco melhor. Só um pouquinho,
porque ainda estou desesperada com a situação em que me encontro.
— Sem querer colocar pressão, mas eu preciso te contar uma coisa —
diz e meu coração dá um salto alto dentro do peito.
— Cuidado com as próximas palavras, eu estou grávida — aviso,
fazendo Danny rir.
— Eu conversei com a agência e não vai ser problema se eu quiser me
transferir para sede de Montreal e morar lá, então... você precisa decidir sua
vida, porque tenho que dar uma resposta em no máximo duas semanas.
— Danny...
Meu amigo nega com a cabeça.
— Antes de você ser minha vizinha da frente, eu me sentia descolado
aqui. E agora, você se tornou uma das coisas mais importantes pra mim. Não
vou ficar em Toronto, porque não existe nada que me prenda a este lugar. E
agora você tá grávida, não existe a possibilidade dessa criança crescer longe
de mim, Lexie.
Choro em silêncio e jogo os braços em volta do seu pescoço,
agradecendo a Deus por ter alguém como Danny na minha vida. Meu melhor
amigo, meu irmão de mãe diferente e minha outra metade.
— Eu te amo tanto — murmuro.
— Se eu fosse você também me amaria, eu sou perfeito — zomba,
recuando um pouco para passar a mão em cima da minha cabeça. — Eu te
amo.
Sorrio.
Talvez tudo fique bem...
Ah, merda. Claro que não, eu fiquei grávida de um mafioso.
— Estou perdida, né? Danny, eu estou grávida. Eu nunca me imaginei
sendo mãe aos vinte e cinco anos. Como eu me preparo pra isso? É uma coisa
grande. Criar uma criança já é muita responsabilidade, agora imagina criar
uma criança que é filha de um mafioso?
A única coisa que ele faz de imediato é ri.
— Ah, que bom que minha desgraça te diverte — resmungo.
— Esse medo e insegurança vai passar quando você conversar com
Nicholas. Os dois vão usar a cabeça e agir da forma correta em relação a isso.
— Aponta com o indicador para minha barriga. — Não se preocupe.
— Passei um ano sem transar, me aliviando com vibradores. E eu sei
que não era tão bom, mas não era ruim. Justo quando conheço um homem
gostoso e resolvo me divertir, acontece o quê? Eu ganho um bebê mafioso de
brinde.
— Pare de falar bebê mafioso — retruca, me olhando com a expressão
séria, depois cai na gargalhada, me fazendo rir também.
— O que eu faço?
— Você sabe, Lexie, só não quer ter que encarar a verdade ainda.
Tudo para fugir do meu apartamento que está uma verdadeira bagunça
de caixas lacradas e caixas vazias, e as insistentes ligações/mensagens de
Nicholas, vou encontrar Danny na nossa cafeteria prefira no centro de
Toronto.
Sim, eu sei, fugir do problema não vai resolvê-lo, mas agora, parece
perfeito esquecer que estou grávida. O que dura bem pouco, pois Danny
acaba de sair do balcão com um copo bem grande de água com gelo e um
cappuccino para ele.
— É melhor evitar cafeína nos primeiros meses de gestação — se
explica quando enrugo o nariz cheia de desgosto. — Uma deliciosa água com
gás e gelo pra você.
— Se fosse pra beber água, eu teria ficado em casa.
— Apenas beba — é o que ele diz.
— Não tinha suco? Outra coisa, sei lá.
— Aqui? — pergunta depois de tomar um gole do seu cappuccino, que
parece delicioso e me dá água na boca. Isso não é justo. — Não natural. Não
reclame e beba água. Vamos começar a cuidar direitinho do que você coloca
pra dentro desse corpo.
Suspirando, pego o meu copo gigante de água com gás e um monte de
gelo e tomo um gole generoso. Nada emocionante, é água. Jogo um cubo de
gelo para dentro da boca e mastigo, contrariada.
— Procurei algumas obstetras em Montreal — fala, tirando o celular de
dentro do bolso da calça jeans. — Selecionei as melhores — acrescenta ao
passar o dedo na tela e girar o aparelho para mim, mostrando o bloco de
anotações.
— Não quero falar sobre isso.
Danny suspira e me olha de jeito sério.
— Só porque você está evitando o assunto, não quer dizer que não
esteja grávida — retruca, olhando para os lados, se certificando que o homem
que veio comigo não ouviu o que ele disse.
Fiz Danny prometer que não contaria sobre minha gravidez para
ninguém e nem conversar sobre isso quando os meus seguranças estão por
perto. Não quero eles sabendo da novidade quando eu ainda nem me
acostumei com ela.
Ou contei para o pai.
Venho ignorando Nicholas há dias. Quatro dias e meio, e
milagrosamente, o homem ainda não veio atrás de mim, mas sei que anda
fazendo perguntas aos meus seguranças, porque ontem, um deles bateu na
minha porta só para se certificar que eu estava bem e depois o ouvi fazendo
uma ligação.
— Não temos certeza ainda... — murmuro, retomando o assunto. — Os
testes podem errar também.
— Sim, mas você fez dez e todos deram positivos.
— Como vou contar pro meu pai? Ele vai pirar.
Danny bufa.
— O senhor Rogen está feliz demais por você ter aceitado que ele
entrasse na sua vida de novo. Acha mesmo que ela vai pirar quando souber
sobre a gravidez? Eu só consigo imaginá-lo feliz ao receber a notícia. Então,
pare de arrumar desculpas.
Franzo o nariz e testa, fazendo uma cara bem feia para meu melhor
amigo. A fim de ignorá-lo também, volto com a minha água com gás, alterno
entre beber goles generosos e mastigar pedaços de gelo.
Até que não é ruim.
— Faz quantos dias que não toma banho? — pergunta com
desaprovação, pegando uma mecha de cabelo que escapou do meu rabo de
cavalo. — Você está horrível, amiga. Seu cabelo precisa de um shampoo.
Precisa urgente.
Afasto a mão dele de mim e decido ignorá-lo.
Ok, venho sendo uma porquinha de novo, mas o assunto de estar
grávida está fritando os meus neurônios. Eu só consigo pensar no bebê que
está crescendo dentro de mim e nas possíveis complicações.
E se o Nicholas não quiser o bebê?
E se ele quiser o bebê?
E se ele me quiser sem o bebê?
E se ele quiser apenas o bebê?
O que vamos fazer?
— Todas essas perguntas... — Danny fala, estalando o dedo polegar e
médio perto do meu rosto, como se estivesse lendo meus pensamentos. —
Serão respondidas se você conversar com ele.
— O quê? Do que tá falando?
— Eu te conheço, Lexie e sei que tá com medo. Colocar uma criança
no mundo não é brincadeira, mas não depende só de você. Então, encontre
coragem e vá conversar com o seu namorado. Converse com ele o quanto
antes.
— Ele não é meu namorado — retruco, ranzinza.
— Ah, então prefere que eu o chame de pai do seu filho? — rebate, me
fazendo pensar por alguns segundos, mas não tenho respostas. —
Namorado... pai... ele é os dois — emenda, dando de ombros e eu respiro
fundo.
Ele tem razão, preciso conversar com Nicholas.
Depois de meia hora e alguns sermões que recebi do meu melhor
amigo, volto para o meu apartamento e ele para agência de modelos, mas
antes promete que vai fazer um jantar super nutritivo e colorido para nós as
vinte horas.
Ensaiando várias maneiras de contar a novidade ao Nicholas, entro no
meu prédio. Nenhuma das frases que formei dentro da cabeça parecem certas,
porque eu sinto que é tão cedo, que estamos indo rápido demais. Isso me
assusta.
Eu tenho medo de que tudo dê errado a partir do momento em que eu
contar a grande novidade a ele.
Com o homem que me acompanhou até o café na minha cola, saio do
elevador. Tento ignorá-lo e caminho até a porta do meu apartamento, quando
entro, o susto que eu tomo ao ver Nicholas sentado no sofá, me esperando é
tão grande, que pode ou não ter me feito perder o bebê.
— O que tá fazendo aqui? Você não bate?
— Não tinha ninguém em casa, mas isso te faz sentir melhor — ele diz,
e de maneira zombeteira, leva os nós dos dedos até a mesinha de centro e
bate, como se isso fosse resolver alguma coisa.
— Ah, bem melhor agora.
O mafioso abre a boca para falar e eu fico apavorada ao lembrar do
meu cabelo sujo. Levo a bolsa até em cima da cabeça e com a mão
espalmada, faço um gesto para que ele mantenha distância de mim.
— Por que isso? — Nicolas questiona, a voz soando séria e cheia de
desconfiança palpável.
— Preciso de alguns minutos — é o que digo, passando por ele e
correndo para o banheiro e trancando a porta.
Arranco as roupas do meu corpo e me jogo para debaixo do chuveiro,
lavando o cabelo e ficando cheirosa. Preciso parar com esse mau hábito de
não tomar banho quando estou muito focada em algo.
É um péssimo hábito.
No chuveiro, tento ensaiar algumas formas para dizer a novidade, mas
nenhuma parece ser o suficiente ou certa para o momento.
Vinte minutos mais tarde, cheirosa e de cabelo limpo e molhado,
usando um vestido florido de botões, eu volto para a sala e tenho a impressão
que Nicholas nem saiu do lugar. Ainda está sentado, me esperando, a
expressão séria e de poucos amigos ali, estampada e me deixando nervosa.
— O que aconteceu? — ele pergunta, focalizando meus olhos. — Você
vem me ignorando por dias e me deixando louco, Lexie. Muito louco.
— Ah, sim — murmuro e respiro fundo, quero desviar dos olhos
intensos e severos, mas não consigo.
— Eu não podia vir antes, por causa de alguns problemas, mas vim
assim que eu pude. O que aconteceu? Por que está me ignorando?
— Eu... — nem consigo terminar a frase.
Nicholas levanta do sofá, abotoando o terno caro e feito sob medida,
corta a nossa distância com alguns passos, mantendo os olhos presos aos
meus e eu engulo em seco. Quando ele desliza a mão sobre o meu braço com
delicadeza, eu percebo o quanto estou com saudade dele.
— Eu senti sua falta — as palavras saem antes que o cérebro tenha
tempo de processá-las.
Os lábios dele se esticam em um sorriso lascivo e ao mesmo tempo
meigo, derretendo meu coração por inteiro.
— Eu também. — Ele respira fundo e ergue uma sobrancelha para mim
antes de perguntar: — Por que estava me evitando?
Abro a boca para falar, mas fecho no mesmo segundo e mordo o lábio
inferior, tentando encontrar as palavras certas. Mas na verdade, não sei se
existe um jeito certo de falar “Oi, então, parabéns, você vai ser pai!”. Ou
talvez exista, mas estou tão assustada que não consigo pensar direito.
— Nicholas... — sussurro e ele assente, os olhos fixos em mim. — É
que... — a frase morre de novo.
Droga. Sou tão fraca.
— O que aconteceu? Não me deixa preocupado.
— Aconteceu algo.
— Você está bem? — pergunta.
E de repente, ele começa a conferir meu corpo, como se fosse encontrar
algum machucado ou sei lá o quê. Depois de alguns minutos me analisando,
ele dispara:
— O que foi?
Respiro fundo e fecho os olhos por uma fração de segundos antes de
falar de uma vez.
— Eu estou grávida.
A única coisa que Nicholas faz é PARALISAR.
Eu já enfrentei várias situações em que minha vida esteve em risco,
mas nunca, nunca, fiquei tão sem reação como agora. Porra. Nem consigo
mover algum músculo do corpo. Acho que estou assustado e eu nem sei a
última vez que me senti assim...
Fico paralisado, encarando Lexie que não parece estar brincando.
Droga. Ela está falando sério, muito sério. É de verdade, vou ser pai. Por isso,
Lexie vem me ignorando tanto nos últimos dias. Eu engravidei a garota.
Quero muito ter uma reação diferente, mas não consigo fazer nada além
de ficar parado, observando-a.
Grávida? Vou ser pai? Eu?
— Por favor, diga alguma coisa — Lexie pede, mas continuo quieto,
processando a informação, uma, duas, três, quatro, cinco... grávida.
Porra, Lexie está grávida.
— Ah, meu Deus! — exclama, chamando minha atenção e se afastando
de mim. — Você não quer ser pai, não é? Ai meu Deus! Merda! Merda. O
que vou fazer agora? O que eu faço?
E ela começa a chorar e eu me sinto um cretino ao mesmo tempo em
que algo estala dentro de mim.
Intercepto-a no corredor, impedindo que vá para longe ou se esconda.
Seguro seu rosto entre as duas mãos e beijo sua testa antes de envolvê-la em
meus braços. Lexie me aperta contra o corpo e funga no meu peito.
Confesso que não estava esperando por isso. Ter um filho. Para falar a
verdade, eu nunca pensei em ser pai. A vida que levo não me permitia pensar
nessas coisas ou fazer esse tipo de plano, no entanto, aconteceu e não vou
deixá-la desamparada.
Lexie se tornou minha, então, é meu dever cuidar e protegê-la.
Proteger os dois.
E eu vou protegê-los com a minha vida.
— Vai ficar tudo bem — digo ao afastá-la um pouco, apenas para olhar
em seus olhos.
Ela nega com a cabeça, fungando.
— Estou com medo, Nicholas — admite, chorando. — Eu acho que um
bebê não combina com a máfia. Não combina.
— Talvez não, mas não importa. Nunca deixarei que algo de ruim
aconteça com você ou com ele — falo e ela morde o lábio inferior, tremendo
todo o queixo de uma forma adorável.
Se ela não estivesse tão triste e assustada, eu teria sorrido.
— Eu não sei ser mãe — murmura, desviando a atenção dos meus
olhos. — Não sei como fazer isso e eu me sinto um lixo, porque ainda não
consigo ficar feliz com a notícia de estar grávida. É assustador, na verdade.
Respiro fundo, virando o rosto delicado para mim e focalizando os
olhos verdes brilhantes e vermelhos por causa das lágrimas que os enchem.
Prendo uma mecha de cabelo molhado atrás da orelha e tento ser o mais
gentil possível.
Lexie precisa de carinho agora.
— Eu nunca me imaginei sendo pai — começo a falar e as lágrimas
continuam a escapar dos olhos dela. — Também não sei como fazer isso,
Lexie. Pra ser sincero, parece mais fácil enfrentar uma gangue armada do que
cuidar de uma criança.
Em meio ao véu de tristeza e lágrimas, ela solta uma risada, que ecoa
na sala, e como em modo automático, meus lábios se esticam em um meio
sorriso.
— É assustador...
— Eu não sei como fazer isso, mas Lexie, eu prometo que cuidarei de
vocês dois. Protegerei vocês com a minha vida.
— Então... você quer isso? — pergunta, os olhos ansiosos pela
resposta. — Nós? — emenda com um sussurro.
Faço carinho nas bochechas salientes e admiro os lábios carnudos e
rosados. Sem aviso prévio, aproximo meu rosto do seu e a envolvo em um
beijo lento e intenso na mesma medida.
Roço meus lábios nos dela e sussurro para que as palavras vibrem
contra eles.
— Sim, eu quero.
Ela respira fundo e volta a se afundar nos meus braços. Contorno o seu
corpo pequeno e aperto-a contra mim. Uma sensação estranha no peito faz
meus batimentos cardíacos acelerarem. Acho que além de assustado, estou...
feliz também.
É isso.
Feliz.
Não lembro da última vez que me senti assim.
Quando me tornei um membro da família Carbone, eu aprendi a
controlar a raiva que eu sentia da vida e a tristeza por ter perdido meu pai,
que foi meu melhor amigo. Mas em sete anos, eu não tenho lembranças de
me sentir assim.
Vivo.
Feliz.
— O que vamos fazer agora? — ela pergunta, inclinando o queixo para
me encarar.
Lexie é tão pequena e cabe de um jeito tão perfeito nos meus braços.
Antes dela, eu não curtia mulheres loiras ou pequenas, mas agora, eu sei que
ela foi feita para mim. Lexie foi feita para permanecer em meus braços.
Permanecer na minha vida.
— Um bebê vai mudar nossas vidas pra sempre — ela diz, parecendo
refletir.
— Lexie...
— Huh? — responde ao erguer os olhos e me encarar por cima dos
cílios.
— Você já mudou minha vida.
Nicholas estaciona o carro em frente a um prédio no centro de
Montreal. Observando da janela de vidro, eu noto que o lugar é alto padrão e
parece custar uma fortuna. Ele decidiu que precisávamos de um lugar maior e
cá estamos nós, prestes a entrar no novo lar.
E eu ainda nem contei ao meu pai sobre a gravidez.
Ele desce e vai direto no porta-malas e eu o sigo, tento ajudar ao pegar
a bolsa grande, mas Nicholas não deixa. Desde que contei sobre a gravidez,
ele age como se eu fosse muito frágil e pudesse desmontar a qualquer hora.
— Não sei se percebeu, mas meu corpo ainda não tá carregando uma
melancia. E eu posso levar uma bolsa.
E ele? Me ignora, é claro.
Arrastando uma mala e uma bolsa grande no ombro, Nicholas trava o
carro e entrelaça a mão na minha, me puxando de forma delicada para dentro
do prédio. Enquanto ele chama o elevador, eu observo de perfil.
Ele é tão intenso e lindo, e agora, é o pai do meu filho ou filha. Eu
nunca pensei que fosse me envolver com alguém como Nicholas. Sendo
sincera, eu me imaginava casada com um nerd com o mesmo gosto para
filmes e livros, músicas e comida.
Mas eu me apaixonei por um homem completamente diferente de mim,
mas que superou todas as minhas expectativas e transbordou minha vida.
— O que foi? — Nicholas pergunta ao entrarmos no elevador e notar
que não parei de observá-lo.
— Nada — murmuro e volto a entrelaçar nossas mãos, me sentindo
segura. — É que você é lindo demais — zombo, fazendo-o revirar os olhos.
As portas de metal se abrem no décimo quinto andar e sem dificuldade
nenhuma, ele me arrasta junto da mala até em frente a porta do nosso novo
lar. Antes de girar a maçaneta para entrarmos, Nicholas me dá um sorriso
maroto.
Ao dar o primeiro passo para dentro, fico maravilhada.
É gigante, tem dois andares e já está todo mobiliado com sofás grandes,
televisão e móveis de requinte O lugar tem um conceito todo aberto e janelas
de vidros enormes, deixando a luz do sol entrar e iluminar o ambiente. O
chão é de uma espécie de cimento queimado e as paredes de tijolos
vermelhos.
É lindo e tem cara de lar.
— É lindo — digo, me aproximando das janelas e observando o centro
da cidade e os outros prédios. — Mas...
— Mas o quê?
Viro-me para encará-lo. Nicholas deixou a mala e a bolsa perto do sofá
e tem a atenção fixa em mim, investigando minhas expressões. Corto a nossa
distância com alguns passos longos e pouso as mãos na sua cintura.
— Você e a sua irmã... é que passaram tanto tempo longe um do outro,
e agora, ela vai morar sozinha. Não parece certo.
Ele suspira, a expressão séria e carrancuda que já é capaz de amaciar
meu coração, ali, estampada na cara bonita e de barba ralinha.
— Foi uma decisão dela, não existe nada que eu possa fazer. E mesmo
assim, não é tão longe daqui.
Quando Nicholas disse para irmã sobre a gravidez, ela ficou feliz e
decidiu morar sozinha. E sei lá, me sinto uma megera com essa situação para
falar a verdade. Talvez sejam os hormônios da gravidez, intensificando tudo.
Ou não.
— Tem certeza?
Em vez de responder com palavras, Nicholas toma meu rosto entre as
mãos e me dá um selinho demorado e depois me abraça forte, me fazendo
suspirar. Em seguida, ele me arrasta até a janela de vidro e aponta para um
prédio longe.
— Reconhece? — pergunta, e eu estreito os olhos, buscando alguma
coisa relevante na memória, mas movo a cabeça em negativa. — Meu antigo
apartamento fica naquele prédio.
— Hum, não é tão longe.
— Não. — Sem aviso prévio, ele vira meu rosto para outra direção e
aponta para outro prédio. — Não conte a Jolina, mas Julian está pensando em
comprar um apartamento pra eles ali.
Encosto a cabeça no material de vidro e semicerro os olhos para ele.
— Por isso comprou esse apartamento? — pergunto ao fazer um
movimento com o dedo indicador, me referindo ao lugar. — Pra morar perto
da sua alma gêmea?
Uma linha nasce entre as duas sobrancelhas e quando entende o que eu
quis dizer, noto o maxilar contrair e ele faz aquela expressão de cachorro
bravo, que me faz querer provocá-lo quase sempre.
— Pare de dizer isso — ordena.
— Por quê? É verdade — insisto, segurando o riso. — Julian é a sua
alma gêmea. Lina concorda comigo — minto.
Nós duas nunca tivemos essa conversa, mas eu sei que no dia em que
colocar as cartas na mesa e mostrar meu ponto de vista, a garota vai
concordar comigo. Ela é esperta demais para discordar de um fato desses.
Nicholas e Julian são almas gêmeas.
— Você não tem jeito, Lexie. É uma diabinha irritante de cabelos loiros
— murmura, a cara carrancuda ainda desenhando o rosto.
Sem conseguir me segurar, começo a rir.
Inclino-me para frente e passo um braço por vez em volta do seu
pescoço. Fico na ponta dos pés, nivelando nossos rostos antes de lhe
mordiscar o lábio inferior de leve, e sem pressa, lanço minha língua para
dentro da sua boca e devoro Nicholas com um beijo quente e molhado.
As mãos salientes pousam na minha cintura e ele me puxa para mais
perto, colocando nossos corpos e deixando a tensão entre nós mais tórrida.
— Eu já disse que gosto dessa saia? Faz você parecer uma professora
sexy — fala, a voz soando com um sussurro. Provocante. Sinto os dedos
habilidosos de Nicholas descerem o zíper que fica na lateral e de mansinho, o
tecido de algodão cair sobre os meus pés. — Você combina com vermelho —
diz, contemplando minha calcinha de tecido macio.
— Não rasgue.
Ele me ignora e me faz recuar, um passo de cada vez, até minhas
pernas encontrarem o sofá e ele me deitar sobre o material macio. Nicholas
desfaz o laço das minhas sandálias e em seguida, fica por cima de mim, o
corpo quente dele contra o meu, me dando sensações maravilhas entre as
pernas.
As mãos tocam a barra da minha camisa de leve e aos poucos, ele vai
subindo o tecido e o passa pelos meus braços. Depois, os dedos encontram a
lateral da calcinha e ele puxa de uma vez, rasgando.
Um sorriso cínico impresso no rosto.
— Eu disse pra não fazer isso — resmungo, mas nem tenho tempo de
dar algum sermão ou ficar chateada, porque logo a mão dele começa a
deslizar na parte interna da minha coxa e meu corpo arqueia ao mesmo tempo
em que deixo escapar um gemido involuntário.
— Vou compensar — sussurra, a voz ecoando no meu corpo em ondas
quentes.
Mordo o lábio inferior e assinto, sem vontade de dizer nada. Apenas
aproveitar as sensações.
Ele se inclina para frente e a boca roça na parte interna do meu pescoço
e sinto que vou derreter quando ele mordisca o lóbulo da minha orelha.
Devagar, vai descendo, deixando um rastro quente e molhado pela minha
pele, que sinto arder em chamas.
— Seu gosto é tão bom, Lexie e olha como você me deixa — fala e
com a mão livre, pega a minha e coloca bem em cima da ereção bem nítida e
convidativa contra a calça jeans. — Duro.
— Ah — é o único som que sai da minha boca.
Não consigo tirar a mão dele, então, levo a outra para o mesmo lugar,
sentindo a rigidez e desejando tê-lo dentro de mim. Desafivelo o cinto e puxo
o zíper para baixo. Nicholas sai de cima de mim para passar a blusa pela
cabeça e tirar o jeans e sapatos, faz isso sem desconectar os olhos de mim. E
depois, volta a me prender com as coxas musculosas.
Sem pressa, aliso com as pontas dos meus dedos o abdômen trincado,
passeando entre e sobre o relevo das cicatrizes em seu peito. Mesmo que o
corpo esteja marcado, ainda é tão lindo. É perfeito. E é meu.
Nicholas traz o rosto para perto, encostando os nossos lábios e
enroscando a língua na minha enquanto uma das mãos começa a traçar o
contorno do meu corpo, descendo pelos ombros até chegar no quadril, onde
desliza até encontrar a virilha.
Meu corpo se contorce e solto um gemido baixinho, que ele engole com
um beijo. Abro mais as pernas, desejando que toque nas partes sensíveis e me
faça tremer de prazer. Mas em vez disso, ele primeiro afastar a boca da minha
para morder meu maxilar e em seguida, pescoço e vai fazendo uma trilha de
mordidinhas até o colo, enquanto meu corpo inteiro arqueia.
Nicholas escorrega um dedo até a minha abertura úmida e enfia de
mansinho, observando minhas expressões. Mordo o lábio inferior e arqueio o
quadril contra a mão dele quando sinto outro dedo, me provocando.
— Bem molhadinha — sussurra e tira os dedos de dentro de mim e leva
até a boca, sentindo meu gosto e esquentando as maçãs do meu rosto. — E
tem um gosto bom. — Volta com os dedos na parte sensível e me penetra
com carinho, uma, duas, três e então, começa a fazer movimentos circulares
no meu clitóris.
Gemo e flexiono o corpo contra sua mão, reagindo ao toque prazeroso.
Minha pele queima e eu me sinto estremecer. Choramingo quando ele tira a
mão de mim, mas fico ansiosa quando o vejo descer com o rosto na direção
do meu sexo.
Antes de me chupar, ele olha para mim, por cima dos cílios, respirando
contra meu clitóris e intensificando o latejar entre as pernas. De maneira
firme, ele levanta uma perna de cada vez e coloca em cima dos ombros. E
depois, começa a lamber e mordiscar a parte interna da coxa, me deixando
louca de tesão e querendo mais dele. Faz um carinho com a língua na virilha
e então, me lambe debaixo para cima.
Um gemido alto escapa da minha boca.
E mesmo que eu queira fechar os olhos e aproveitar o momento, quero
contemplá-lo ali com a boca me chupando, provocando e me fazendo
estremecer. Apoio os cotovelos no sofá e o observo. É bom ver um homem
desse tamanho concentrando, investindo toda sua atenção no meu sexo, se
empenhando em me dar prazer.
Os lábios precisos e a ponta da língua de Nicholas vão bem de
mansinho, explorando toda a pele quente entre minhas pernas, alcançando o
meu clitóris e me fazendo arquear o corpo contra o rosto dele.
Isso é tão bom, eu poderia ficar o dia inteiro assim.
— Nicholas — gemo, arfante. A respiração pesada, o coração acelerado
e a pele pegando fogo. — Eu acho que...
Ele se fastar um pouco para sussurrar olhando para mim:
— Isso, goza bem gostoso na minha boca.
Ele volta a lamber minhas partes sensíveis, sem pudor nenhum. Minhas
pernas tremem contra seus ombros e eu sei que estou prestes a perder as
estribeiras, e Nicholas sabe também, a língua ganha mais força ao mesmo
tempo em que continua macia contra meu clitóris.
E é o bastante para que eu perca o controle sobre meu corpo e
pensamentos. Levo a mão até os seus cabelos e jogo a minha cabeça para
trás, fechando os olhos e deixando que a sensação deliciosa me invada por
inteira.
E então, eu gozo na boca de Nicholas.
Depois de passar mais um tempinho lá em baixo, me lambendo,
Nicholas sobe sobre o meu corpo ainda estremecido pelo orgasmo. Roça de
leve a ereção contra minha perna e envolve os nossos lábios, e eu sinto meu
gosto na sua boca.
Deus, é excitante pra caramba.
Corro com as mãos sobre o seu abdômen cheio de gominhos e deslizo
até as costas musculosas, cravando as unhas devagar e o fazendo soltar um
gemido rouco. E aos poucos, vou me erguendo para levantar, e quando estou
sentada de novo, subo em cima dele, que encosta o dorso nas costas do sofá.
Separo nossas bocas ávidas e sem pressa, passo a língua na curvatura
do seu pescoço. O corpo dele arrepia com o meu toque e sinto uma onda de
satisfação por isso. Com a boca, vou descendo com a lambida sobre o
abdômen até chegar na barriga.
Enfio as pontas dos dedos no elástico da cueca boxer, mas antes que
possa arrastar para baixo, sinto as mãos dele nas minhas costas, bem no fecho
do meu sutiã. Ele tira a peça e joga no chão e se inclina um pouco para sugar
um mamilo enrijecido.
Afasto-o um pouco, colocando o seu tronco no sofá de novo e volto
com os dedos na barra da cueca, dessa vez, o puxo para baixo e ele me ajuda
ao arquear o corpo para descer com o tecido, exibindo a ereção que parece
apontar para mim.
Devagar e com delicadeza, pego o seu pau com as duas mãos e o aliso,
observando as expressões no rosto de Nicholas, que está em êxtase e não
desvia a atenção das minhas mãos.
Lambo os lábios antes de sair de cima dele e ficar de joelhos em cima
do sofá ao seu lado. Assim que me inclino na direção do seu pau, as mãos
dele vão direto no meu cabelo, juntando tudo como se fosse um rabo de
cavalo.
Meus lábios mergulham no seu pau e eu o molho bem antes de começar
a sugá-lo devagar e com precisão. O corpo de Nicholas estremece e noto a
respiração pesada. Admiro-o por cima dos cílios e um sorriso maroto brota no
rosto dele.
Tiro o pênis da boca por um segundo e me concentro em lamber e
sugar a glande, fazendo movimentos suaves, que vão se intensificando
conforme ouço gemidos roucos escaparem da garganta dele.
Ele observa tudo com uma expressão satisfeita e safada no rosto,
segurando meu amontoado de cabelo de leve e me deixando comandar o
ritmo.
E eu continuo, primeiro passando a língua por todo o membro,
investindo uma atenção na cabeça e voltando a cobri-lo todo com a boca,
lambendo, sugando em movimentos rápidos e precisos, fazendo Nicholas
tensionar todo o corpo.
— Porra — sussurra, a respiração acelerada. — Lexie, eu acho que não
consigo aguentar — fala, os olhos azuis nublados com a intensidade do
prazer que está sentindo. — Vem aqui vem.
É claro que eu não obedeço. Se ele está perto de gozar e eu tenho
controle sobre isso, sobre o prazer dele, eu vou até o fim.
Nicholas solta o meu cabelo, vencido pelas sensações. Fecha os olhos e
joga a cabeça para trás, e eu sei que o que está prestes a acontecer. Então, eu
continuo lambendo e sugando mais rápido.
Ele volta com a mão até o meu cabelo e agora, comanda o ritmo, que
não é difícil de acompanhar. E então, depois de alguns investidas com a
minha boca, subindo e descendo, deixando o pau bem molhado, Nicholas
deixa um uivo escapar da garganta enquanto goza.
Sorrio, satisfeita.
As mãos grandes tomam meu rosto e ele me puxa para cima e me beija
na boca, com vontade e força. Em seguida, em movimento hábil, me coloca
de quatro do sofá.
Uma mão na minha cintura, apertando firme, e a outra segurando o
pênis, que roça de leve na minha entrada úmida. Gemo em antecipação,
querendo senti-lo dentro de mim. Viro o rosto para olhá-lo por cima do
ombro, focalizando seus olhos azuis e quando mordo o lábio inferior, em uma
estocada certeira, Nicholas me penetra.
Iniciando um vai e vem gostoso, ele se inclina sobre mim e morde o
meu pescoço enquanto as duas mãos encontram os meus seios e apertam.
Arqueio bem a coluna e ele parece gostar, pois segura minha bunda, me
abrindo mais e me penetrando com certa urgência.
Gemo e viro o rosto, procurando seus olhos, querendo a sua boca na
minha. Nicholas se inclina sobre o meu corpo, entendendo minhas vontades
sem que eu tenha dito uma palavra. Segura meu rosto e me beija no mesmo
instante em que continua a fazer movimentos deliciosos e intenso de dentro e
fora.
De repente, ele sai de dentro de mim e antes que possa protestar, as
mãos agarram minha cintura e ele me senta no encosto do sofá ao mesmo
tempo em que sai de cima dele, e dá a volta. Segurando minhas coxas, ele
gira meu corpo sem dificuldade e me abre bem, em seguida se lança para
dentro de novo.
Jogo as mãos em torno do seu pescoço e me agarro toda a ele,
deixando-o me penetrar como se não existisse amanhã. Ele sai e entra várias
vezes, acompanhado o ritmo dos meus batimentos cardíacos e me dando
sensações deliciosas.
Empurro meu corpo contra ele, querendo mais e isso é o suficiente para
Nicholas aumentar o nosso ritmo. Cravo as unhas nas suas costas largas,
amando a intensidade das estocadas em mim.
Sinto os lábios quentes dele na curvatura do meu pescoço, depois, na
linha do maxilar, onde ele morde de leve antes de encontrar minha boca e me
envolver em um beijo arrebatador.
— Mais... — é a única palavra que consigo gemer contra os seus lábios.
Ele entende minha suplica e coloca mais forma no compasso de estar
dentro e fora. Um grunhido escapa da boca e eu aperto mais seus ombros,
mexendo meus quadris, seguindo o nosso ritmo sedento.
Nossos olhos se encontram através do véu de prazer e então, sinto uma
mãos entre nós, os dedos certeiros procurando as partes sensíveis do meu
corpo. Quando ele começa a me tocar, jogo a cabeça para trás, gemendo.
Não consigo mais aguentar.
— Nicholas... — choramingo.
— Eu vou gozar, Lexie — murmura, a voz soando rouca e enviando
ondas quentes para o meu corpo.
Entrelaço as pernas na sua cintura e o aperto ainda mais contra mim, e
ele não diminui o nosso ritmo. A mão entre nós sobe até o meu pescoço, os
dedos roçando na nuca e me puxando para um beijo selvagem.
E sem conseguir mais, gemo contra a boca dele ao alcançar outro
orgasmo maravilho. Mais algumas investidas em um ritmo impressionante,
ele se afunda mais em mim e encontra o próprio prazer e goza também.
Sem sair de dentro de mim, ele encosta a cabeça no meu ombro,
respirando devagar.
Tomo seu rosto entre as mãos e prendo os olhos aos meus. Sentindo
meu coração acelerado e um sentimento estranho e acolhedor no peito. Meus
polegares roçam devagar na barba ralinha e depois nos lábios.
— Eu amo você, Nicholas — sussurro.
Os lindos olhos azuis de Nicholas me encaram de maneira intensa e
parecem ganhar tanta vida, que é instigador. Quase como se estivessem
envolvidos em um semblante de felicidade plena.
E então, eu percebo que não preciso salvar Nicholas da escuridão, só
preciso fazer com que ele deixe a luz entrar na sua vida de vez em quando. E
fazê-lo perceber que não é um monstro e merece ser feliz como qualquer
outra pessoa.
— Eu amo todos os seus lados — sussurro de novo, e dessa vez, abro
um sorriso para ele. — Nunca pensei que amaria alguém como você, tão
diferente, mas agora, eu sei que você foi feito pra mim. E eu acho que não
posso viver sem você.
De mansinho, os lábios dele se esticam em um sorriso lascivo e ao
mesmo tempo apaixonado. Uma das mãos sobe até meu rosto e prende uma
mexa de cabelo atrás da orelha e noto os olhos dançando pelos detalhes da
minha face. Depois, vai depositando beijos delicados sobre a testa,
bochechas, nariz, olhos e por fim, nos lábios.
Com um sorriso que é capaz de aquecer meu coração, ele diz:
— Minha malandrinha... eu te amo também.
Volto a sorrir para Nicholas.
Meu mafioso.
Nosso amor é a minha pequena parcela de insanidade.
A primeira coisa que meus olhos veem ao entrar no apartamento é
Lexie. Mesmo depois de quatro meses, às vezes, é difícil de acreditar que vou
ser pai. Ou que ela é minha e continua comigo apesar de quem eu sou.
Apesar da escuridão que vive dentro de mim.
Ela é tão diferente, cheia de vida, colorida e bagunçou toda a minha
vida, mas eu sinto que é a melhor coisa que aconteceu comigo em anos.
Lexie ter se tornado minha é mais do que eu mereço e mesmo sem saber, é
tudo que eu sempre quis.
Lexie, que resolveu abandonar as mechas roxas e deixar o cabelo
crescer, levanta do sofá e vem até mim. A barriga ainda é pequena, mas está
começando a ficar visível e é incrível e estranho pensar que eu amo tanto
alguém que eu ainda nem vi. Que ainda nem nasceu.
Ela joga os braços em cima do meu pescoço e me puxa para um abraço.
— Nunca mais me deixe sozinha, esse lugar é grande demais pra uma
pessoa — resmunga, me roubando um sorriso.
— Fiquei longe só por uma semana — digo, segurando seu rosto com
as mãos e prendendo seus olhos aos meus. — Daniel ficou com você?
— Uhum. Mas mesmo assim, senti saudade — murmura de um jeito
meigo. — Como foi a viagem? Aproveitou muito a Itália?
— Não fui a passeio e não vamos falar de negócios.
— Então, vamos falar de nós — diz de uma vez, me puxando para o
meio da sala e depois me faz sentar no sofá. Lexie se acomoda ao meu lado e
pega um envelope branco e lacrado em cima da mesinha de centro. — Não
tive coragem de abrir sem você. Claro que Danny, Lawanda e Lina insistiram
pra dar uma espiadinha, mas fui forte.
Franzo o cenho e pego o envelope das suas mãos pequenas.
— O que é isso?
— Nosso bebê... o sexo dele. Ou dela. Resultado do exame de sexagem
fetal — balbucia e morde o lábio inferior. — Pronto pra descobrir se é
menina ou menino?
— Não — sou sincero.
Lexie solta uma risada gostosa que ecoa pelo espaço, e me faz perceber
que senti saudade daqui, do nosso lar, de estar com ela. Ah, merda. Quem
diria que um dia eu estaria me sentindo assim por alguém?
— Também não, mas quero tanto saber.
Assinto ao mesmo tempo em que rasgo a lateral do envelope e tiro a
folha dobrada de dentro. Os olhos esmeraldas que estão dilatados, me
observam inquietos, cheio de ansiedade enquanto ela prensa os lábios e
vincos se desenham na testa.
Lexie se inclina sobre mim e eu sinto o coração acelerar ao desdobrar o
papel para saber qual é o sexo do bebê. E nada na vida teria me ajudado a me
preparar para esse momento. Estou feliz e aterrorizado na mesma medida.
— Ai, meu Deus! — Lexie exclama.
— Droga — xingo.
— O que foi? — ela questiona, segurando meu maxilar e virando meu
rosto na direção dela. — Esperava outra coisa?
Balanço a cabeça de um lado para o outro, negando.
— É uma menina — digo, o óbvio. — Não estou pronto para ser pai de
uma menina, de criá-la para o mundo. Existem garotos e essas coisas, que eu
definitivamente, quero que ela passe bem longe. O que vamos fazer? É uma
menina.
Lexie suspira e gira os olhos antes de sorrir.
— Pare com isso.
— Não consigo — assumo. — Precisamos decidir sobre a vida dela
agora — falo, convicto. — Uma escola de freiras será perfeita pra ela, vai
mantê-la segura. O que acha?
— A menina ainda nem nasceu e você já está tentando condená-la?
— Tentando protegê-la — corrijo-a.
— Vai ficar tudo bem. Ela será uma garota incrível e com certeza, vai
te dar muita dor de cabeça, ainda mais se ela se parecer comigo, mas você vai
se sair bem. Eu confio em você.
— Estou perdido.
— Não é pra tanto — é o que diz, envolvendo um braço no meu
pescoço e depositando um beijo no meu rosto. — E eu sei que você espantará
qualquer garoto na vida dela, então acho que vai demorar um pouco até ela
perder a virgindade e essas coisas — zomba.
Olho-a de esguelha e noto o quanto Lexie está se divertindo com toda a
situação. Essa malandrinha, parece que está sempre disposta a me tirar do
sério ou me dar cabelos brancos.
Pensar na minha filha, que ainda nem conheço, perdendo a virgindade
com algum moleque magricela e sem noção, me deixa puto e aterrorizado.
Ser pai de uma garota, com certeza vai ser o maior desafio da minha vida.
— Não se preocupe, ela sempre será a garotinha do papai — sussurra e
ouvi-la não me deixa menos tenso.
Eu tenho uma irmã mais nova e eu convive tempo demais com Romie
para saber que irmãs mais novas são sempre um problema. Agora, ser pai de
uma garota está em outro patamar. Dever ser muito pior. E a minha cabeça
não para de pensar em formas de protegê-la de garotos.
De caras como eu.
— Relaxe — Lexie pede ao ficar de joelhos no sofá e ir se acomodando
atrás de mim para começar a fazer massagem nos meus ombros. — Você será
um ótimo pai — murmura, me fazendo respirar fundo. — Talvez, um pouco
assustador, mas mesmo assim, um ótimo pai.
Pego um de seus braços, interrompendo a massagem e trago a mão para
perto do meu rosto, e deposito um beijo. Ela se inclina sobre mim e me
abraça por trás, parece feliz e calma. A notícia de sermos pais de uma menina
não a assustou tanto quanto a mim.
Com cuidado, deito no sofá e a puxo para mim. Lexie apoia as mãos
espalmadas, uma em cima da outra sobre o meu peito e em seguida, o queixo.
E então, me analisa por uma fração de segundos, mas logo sorri.
–– Eu te amo –– digo.
Os lábios carnudos e convidativos dela se transforam em um sorriso
contagiante.
–– Nós também te amamos –– murmura e eu me pego sorrindo
também. Ela leva a ponta dos dedos para tocar minha testa e começa a traçar
linhas invisíveis. –– Vai dar tudo certo, mas sem colégio de freias.
Suspiro.
Eu estava mesmo contando com isso.
Envolvo os braços na sua cintura e segurando Lexie, volto a sentar,
ficamos de frente um para o outro e minha atenção vai direto para sua
barriga. Ainda é tão pequena e já está me deixando louco e muito
preocupado.
–– Parece um melão, não é? –– ela questiona, me fazendo erguer uma
sobrancelha. –– Não acredito que aqui dentro tem um bebê. Nosso bebê.
Sorrio.
–– Nosso bebê –– murmuro. E eu gosto de como isso soa aos meus
ouvidos. Nosso bebê, é estranho, mas parece ter tantos significados, como se
minha vida só fizesse sentindo agora. –– Nossa menina –– falo, testando as
palavras.
Sem aviso prévio, ela pega minha mão e leva de encontro com a barriga
e sorri, focalizando meus olhos.
–– Ainda não chuta, mas é gostoso ficar com a mão assim –– admite
com a voz baixa, e meus lábios se esticam em um sorriso. –– Nossa menina.
Aliso a barriga pequena, fazendo carinho e imaginando se ela sabe o
quanto já é amada por nós. E é claro que ela vai me dar tanta dor de cabeça e
talvez, eu tenha fios brancos mais rápido do que o normal, mas mesmo assim,
assustado por ser pai de uma menina, eu estou feliz também.
Vou proteger as duas com a minha vida.
–– Sabe de uma coisa? –– Lexie pergunta e eu cruzo meu olhar com o
seu. –– Julian pode ser sua alma gêmea, mas eu sou o amor da sua vida.
Suspiro impaciente e reviro os olhos, roubando um sorriso travesso
dela.
Eu realmente odeio muito quando ela diz que Julian é minha alma
gêmea. Não tem lógica nisso e essa garota parece gostar de me irritar com
esse assunto. No entanto, eu preciso concordar com uma coisa que ela disse.
Lexie é o amor da minha vida.
Meu caminho de calvário e minha redenção.
O próximo livro da série Família Carbone será o do Noah. Tem
previsão para lançar em dezembro de 2021. E eu sei que parece longe, mas o
tempo passa muito rápido e logo ele estará aqui disponível na Amazon
hahaha!
E se você ainda não leu O Homem da Máfia, o primeiro livro da série,
deixarei um bônus nas próximas páginas.
Aproveite e boa leitura!!
LINA
Demoro uns vinte minutos para conseguir cobrir os machucados do
meu rosto com base e pó. Resmungando palavrões, prendo os cabelos em um
rabo de cavalo. Foi a primeira e única vez que Tristan encostou a mão em
mim.
Aquele canalha desgraçado vai comer o pão que o diabo amassou se
resolver me tocar de novo.
Pego os livros em cima da estante e coloco dentro da mochila. Caminho
até o hall de entrada do miniapartamento e calço os tênis. Antes que possa me
levantar, a campainha toca. Abro a porta sem olhar no olho mágico e me
arrependo no segundo em que encontro o diabo do outro lado.
Ele sorri e ergue o cachorro pequeno que está segurando. É um Lulu da
Pomerânia de cor caramelo. Acho que é uma menina, pois tem um lacinho
rosa na orelha e coleira vermelha.
— Trouxe pra você — ele fala como se não fosse um grande absurdo
aparecer na minha porta com um filhote de cachorro depois de ter me batido
na noite passada. — Meu pedido de desculpa. — Tristan tenta me entregar o
cachorro, mas eu não aceito.
Quando comecei a namorá-lo, ele era um cara legal. Atencioso, sempre
disposto a me fazer sorrir ou cuidar de mim. Um sonho, que logo se tornou
pesadelo. A máscara de menino bom durou apenas oito meses, depois disso,
Tristan começou a ficar com ciúmes e desconfiado até da minha sombra.
O sentimento logo se estendeu aos meus amigos da faculdade e aos
poucos, foi se tornando agressivo com as palavras. Me xingava e levantava a
mão para mim, mas nunca ousou me bater de verdade.
Mas ontem, Tristan me agrediu quando eu disse que não aguentava
mais manter um relacionamento com ele e por isso, estava dando um fim a
nós. O cara ficou enfurecido com a minha audácia de querer romper o nosso
namoro e me acertou vários tapas no rosto, e apertou meu braço tão forte, que
estou com as marcas dos dedos imundos dele na pele.
— Enfia essa desculpa no rabo — retruco, me sentindo mal. O
cachorrinho é fofo e não merece ser tratado assim, mas não vou voltar com
esse cara nem por um milhão de dólares canadenses.
— Lina, me escuta — fala quando nota que estou prestes a fechar a
porta na cara dele. Que droga, vou me atrasar para minha aula por causa
desse imbecil. — Ontem, eu extrapolei. Não vai acontecer de novo.
Sorrio e fecho os olhos com força por uma fração de segundos. Vai
acontecer sim e se aceitá-lo de novo na minha vida, vai ser mil vezes pior. E
eu não vim estudar em Montreal para ter uma vida como a da minha mãe.
Isso não vai acontecer comigo.
— Vai embora, não quero olhar pra sua cara — digo, encarando
aqueles olhos azuis, frios e sem vida. Ele está a um triz de explodir comigo e
embora esteja com um pouco de medo, me mantenho firme. Não vou baixar a
guarda.
— Porra — Tristan xinga e contrai o maxilar. — Eu tô arrependido.
Você não consegue ver isso? — pergunta, quase gritando.
— Uma bela forma de se mostrar arrependimento... gritando comigo —
murmuro, mais para mim do que para ele. — Tenho aula e não quero me
atrasar. E nós não temos mais nada o que conversar.
— Eu te amo — retruca ao colocar a mão na porta, me impedindo de
fechá-la. — Te amo tanto, acho que não consigo viver sem você.
— Vai ter que aprender — resmungo.
Noto as narinas de Tristan inflarem e a mandíbula contrair mais uma
vez. E eu me pergunto como gostei de alguém como ele. A pessoa com quem
eu comecei a namorar e o homem à minha frente são completamente
diferentes.
— Você não sente mais nada por mim? — quer saber.
Engulo o nó na garganta.
Claro que no começo eu amei Tristan. Não fazia nem dez meses que
tinha saído das Filipinas para vir para cá por causa da bolsa de estudos. Eu
ainda morava no dormitório dentro do campus, não tinha muitos amigos e um
cara de olhos azuis com sorriso fácil me fez sentir bem, segura. Meu coração
abriu as portas para ele e eu me apaixonei.
E infelizmente, mesmo depois de perceber a verdadeira face de Tristan,
eu ainda fiquei com ele, aguentando, indo contra todos os meus instintos que
diziam para deixá-lo. E foi assim que o amor que eu sentia foi mudando e se
tornando outra coisa, raiva e medo. No entanto, ele ter me batido ontem,
estalou algo dentro de mim.
A relação dos meus pais está bem longe de ser perfeita. Pelo que sei,
meu pai bateu pelo menos três vezes na minha mãe, e só de pensar nisso, eu
fico furiosa. Mas a mamãe nunca fez nada. Ela o ama e não tem coragem de
deixá-lo. Então, aceita as migalhas do amor sujo que ele dá.
O relacionamento deles foi o pivô por eu ter saído de casa quando
fiquei maior de idade. Nenhum dos dois concordou com a minha decisão e
meu pai, bem, ele prometeu me deserdar e acho que talvez faça isso mesmo.
Mas eu estou aqui, tão longe de casa, tentando me estabelecer, ser bem-
sucedida financeiramente para poder tirar minha mãe das garras do meu pai.
Vou fazer isso nem que seja preciso sequestrá-la.
Por isso, não posso aceitar o que Tristan tem a me oferecer. Eu não
mereço viver num relacionamento tão tóxico. Eu não preciso suportar o
ciúme dele e perdoá-lo todas as vezes que se exaltar comigo.
Não é assim que um relacionamento funciona.
— Tchau, Tristan — é o que digo ao fechar a porta na cara dele. Tranco
e encosto a cabeça no material de madeira frio. O coração dá um salto no
peito quando ele começa a dar chutes e gritar para que eu abra e o deixe
entrar.
Até ele desistir e ir embora, fico nessa tortura por mais de dez minutos.
Destranco e abro a porta, apenas um pouco e tomo um susto quando a cadela
começa a latir para mim. Rápido, fecho de novo, mas nada acontece. Decido
abrir tudo e encaro a bola de pelo do lado de fora do meu apartamento. Com
passinhos pequenos, ela vem até a soleira e late para mim.
Sorrio. Ela é fofa.
Agacho-me e assobio, chamado por ela. Sem resistência, vem até mim
e eu faço carinho em cima da cabeça cheia de pelos sedosos. Quando estou
confiante para pegar a cachorra nos braços, confiro se é mesmo menina.
— O que vou fazer com você, garota? — pergunto e ela late, em
resposta.
Coloco-a dentro do apartamento e tranco a porta de novo. Sem saber
muito bem o que fazer, pego um prato de dentro do armário e o frango cozido
da geladeira. Coloco o prato no chão e ela come tudo. Acho que estava
morrendo de fome.
Não vou voltar com Tristan, mas não posso deixar a cachorrinha
desamparada.
O que aquele idiota tinha na cabeça para aparecer na minha porta com
uma cachorra de raça?
— Preciso ir — falo, e ela só olha para mim depois de comer. — Você
quer água? — Sem esperar por respostas, procuro um pote e encho de água
da torneira. A bola de pelo parece estar morrendo de sede também. — Garota,
preciso ir. Já estou atrasada pra minha primeira aula e hoje eu trabalho. Só
vou voltar no começo da noite, tudo bem? Não faça xixi no sofá, por favor.
Inclino-me um pouco para alisar a cabeça da minha nova companheira,
e antes de sair, acabo colocando mais frango no prato. Não faço a mínima
ideia de como vou viver com uma cachorra, mas talvez não seja ruim ter
companhia.
JULIAN
Entro na mansão onde cresci e guardo as melhores lembranças da
infância. Nada mudou, a decoração ultrassofisticada com acabamentos
opulentos são as mesmas desde que sou criança.
Caminho até o piano aberto no imenso hall de entrada e passo os dedos
de leve sobre os teclados, buscando na memória a última vez que toquei o
instrumento.
— Você costumava tocar tanto, bambino[19] — vovó fala ao descer as
escadas. Em passos lentos, ela se aproxima de mim. Abaixo-me um pouco
para que ela segure meu rosto e deposite um beijo na bochecha esquerda,
depois na direita.
— Não sou mais uma criança, nonna[20] — digo, e é minha vez de
segurar seu rosto enrugado e sem maquiagem entre as duas mãos. Ela está tão
velhinha, os cabelos brancos são macios como algodão e tem um cheiro tão
bom. Tem cheiro de lar.
É claro que ela me ignora e se entrelaça no meu braço, me conduzindo
até a estufa nos fundos da casa. Chegando lá, dou de cara com a mamãe
cuidando das hortaliças. Faz um frio de menos dez graus e a mulher está
usando apenas calças jeans, cardigã, chapéu extravagante e luvas.
Com cuidado, me afasto da vovó e vou na direção dela, que ainda nem
notou a minha presença.
— Mamma[21], a senhora vai pegar um resfriado — digo e depois lanço
uma olhadela para a moça que estava ajudando a cuidar das plantas, faço um
gesto com a cabeça, que ela entende no mesmo segundo. A mulher entra em
passos rápidos e vai buscar um casaco. — Ainda brava com seu filho? —
pergunto, sugestivo.
De cara fechada, ela deixa o regador de lado, retira as luvas, colocando-
as em cima da mesa de madeira próxima. Segura meu rosto com as duas
mãos quando estou próximo o suficiente, em seguida, deposita um beijo
caloroso em cada bochecha.
— Como posso não estar brava com você? — resmunga, me roubando
um quase sorriso.
Ela ainda não se conforma com o fato de eu ter saído de casa. Eu
sempre prezei pela minha privacidade e mamãe sempre gostou de me ter
debaixo das asas, colocando juízo na minha cabeça e me dizendo o que não
fazer. E claro, o que fazer.
Por sorte, a vovó não ficou tão ressentida com a minha decisão, mas às
vezes, as duas dão uma bela dupla quando o assunto é família.
Antes que possa conduzi-la até dentro de casa, a moça surge com um
casaco grande e acolchoado, que passo pelos braços da mamãe e fecho o
zíper na frente, protegendo-a do frio cortante. Mesmo que ainda esteja brava
comigo, ela me dá um sorriso doce.
— Vem jantar em casa hoje ou tem compromisso com as suas...
— Mamma — interrompo em um tom de repreensão antes que ela vá
longe demais.
A mulher é ciumenta e não gosta do fato de eu estar aproveitando
minha solteirice. Para mamãe e a matriarca, é claro, eu já devia estar bem-
casado como o meu irmão e pensando em pequenos herdeiros.
Se elas soubessem que depois de três meses de casados, Noah ainda
nem tocou na esposa...
— Eu ia dizer amigas — fala na defensiva.
Vovó e eu rimos. Assinto, fingindo acreditar nas palavras dela.
— É claro. — Ofereço meu braço e mamãe se enrosca em mim. —
Venho jantar com a família, não se preocupe.
Quando estamos próximos da porta que dá na direção da cozinha, vovó
se envolve no meu outro braço e eu entro acompanhado das duas mulheres
mais importantes da minha vida. Bem, existe Romie, mas às vezes, eu a amo
com a mesma intensidade que a quero longe de mim. Minha irmã mais nova é
muito difícil de lidar.
Depois de amansar a fera, que chamo de mãe, deixo-a na sala, junto da
vovó. Só vim fazer uma visita rápida antes dos meus compromissos. Papai
tinha me dito que ela ainda estava brava por eu ter me mudado e eu precisava
resolver as coisas para ele ter um pouco de paz no matrimônio.
Antes de me deixar sair, mamãe começa a dizer que se eu não aparecer
no jantar, ela tornará a casa uma prisão italiana e me obrigará a morar sob o
mesmo teto até os meus últimos dias em vida.
Oi, tudo bem?
Espero que você tenha gostado de acompanhar a história da Lexie e do
Nicholas. Já estou com saudades desses dois. Amei demais escrever a história
deles, foi um processo muito gostoso e confesso que dei muitas gargalhadas.
Em breve vou lançar o próximo livro da série, mas ainda não posso
falar muito. Estou trabalho bastante para que você se apaixone pelo meu
próximo casal Noah + quem será? Vocês estão especulando muito se ele
continuará casado ou não, por isso, esse casal aí será uma surpresa rsrs.
Se você ainda não leu outras histórias minhas, dá uma passadinha na
minha página da Amazon ou no Insta. E se quiser acompanhar mais sobre os
meus lançamentos e tudo que rola nos bastidores da minha escrita, venha
interagir comigo em:

FACEBOOK: https://www.facebook.com/autorabrendaripardo
INSTAGRAM: @brenda.ripardo /
https://www.instagram.com/brenda.ripardo/

Beijossssss!!!
O HOMEM DA MÁIA: https://amz.run/4rIw
IMPOSTORA: https://www.amazon.com.br/dp/B095XD3ZWD
DOCE RENDIÇÃO: https://www.amazon.com.br/dp/B07VRMXJQ5
AMOR FORA DA LEI (LIVRO 1):
https://www.amazon.com.br/dp/B091DC843S
AMOR EM REDENÇÃO (LIVRO 2):
https://www.amazon.com.br/dp/B092DQKQ9W

[1]
O chefe dos chefes. Título máximo na hierarquia da máfia italiana.
[2]
Protagonista de O Homem da Máfia
[3]
Máfia que se estabilizou em Montreal nos anos 50.
[4]
É uma junção de hack e activismo, é normalmente entendido como escrever código fonte, ou até
mesmo manipular bits, para promover ideologia política - promovendo expressão política, liberdade de
expressão, direitos humanos, ou informação ética. Atos de hacktivismo são carregados da crença de que
o uso de código terá efeitos similares aos do ativismo comum ou manifestações civis.
[5]
É o posto básico da hierarquia. São membros efetivos da organização, conhecidos como homens
feitos. São eles os responsáveis por conduzir as operações nas ruas.

[6]
Counter-Strike: Global Offensive, mais famoso como CS:GO, é um jogo competitivo de tiro em
primeira pessoa.
[7]
Canadian Security Intelligence Service ou Serviço Canadense de Inteligência de Segurança é o
serviço de inteligência do governo do Canadá equivalente à CIA americana. É responsável por coletar,
analisar e reportar inteligência (informações) que ameacem a segurança nacional do Canadá, e conduzir
operações no Canadá ou fora dele.
[8]
Cosplay é a arte de se transformar em um personagem utilizando de maquiagem, interpretação,
vestuário e demais técnicas exigidas pelo alter ego do artista ou do personagem que está interpretando.
[9]
É uma convenção anual de quadrinhos e cultura pop realizada em Toronto, Ontário, Canadá, no
Metro Toronto Convention Centre desde 2001. Ela pertence e é operada pela Informa's Fan Expo HQ.
[10]
Milton é uma cidade secundária da província canadense de Ontário, e parte da Municipalidade
Regional de Halton e da região metropolitana de Toronto.
[11]
É o nome dado para a parte obscura da Deep Web. Por não ser um lugar controlado, é onde
normalmente são encontrados conteúdos ilícitos, como bens roubados, armas, drogas, tráfico humano e
etc.
[12]
O chefe dos chefes. Título máximo na hierarquia da máfia italiana.

[13]
Caporegime ou Capo, também conhecido como capitão está abaixo do Don/Chefe, Subchefe e
Conselheiro no nível hierárquico da Máfia Italiana. O capo, dirige um grupo grande de soldados. Em
algumas ocasiões pode atuar como sicário segundo as ordens do Don.

[14]
Francesco era o antigo Don da família Carbone, marido de Carlota e pai de Julian, Noah e Romie.
[15]
Mãe ou mamãe em italiano.
[16]
Meu filho em italiano.
[17]
O KGB era a principal organização de serviços secretos da ex-União Soviética, que esteve em
funcionamento entre 13 de março de 1954 e 6 de novembro de 1991. Surgiu no período da Guerra Fria
(período de conflitos de ordem política entre Estados Unidos e União Soviética) e sua extinção
coincidiu com o fim da Guerra Fria e desintegração da União Soviética.
[18]
Criança ou bebê em italiano.
[19]
Criança ou bebê em italiano.
[20]
Avó ou vovó em italiano.
[21]
Mãe ou Mamãe em italiano.

Você também pode gostar