A ideologia na escola
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
Relacionar os tipos de recursos culturais e símbolos que as escolas
utilizam com os tipos de consciência normativa e conceitual “exigidos”
por uma sociedade estratificada.
Reconhecer os mecanismos de dominação que funcionam nos bas-
tidores da vida cotidiana da escola.
Identificar as complexas maneiras pelas quais as tensões e contradições
sociais, econômicas e políticas são “mediadas” nas práticas concretas
dos educadores, quando realizam as suas ações pedagógicas nas
escolas.
Introdução
A escola ministra um ensino essencialmente prático e está centrada na
qualificação do indivíduo para o mercado de trabalho, isto é, para atende
aos interesses e às necessidades das classes dominantes. Nesse contexto,
é importante entender o que é ideologia de modo geral e como ela está
presente, tanto macro como microssocialmente. Isso nos leva a uma
compreensão de como a escola pode ser reprodutora de ideologias
dominantes e causadora de conflitos e violências, tanto simbólicas, quanto
táteis. Nesse sentido, faz-se necessário que todos no ambiente de ensino
se envolvam, para uma mudança de cultura e atitudes, que envolve todos
os que têm laços com a escola.
Neste capítulo, você vai estudar o conceito de ideologia e entenderá
como, historicamente, a escola tornou-se um instrumento que viabiliza
a reprodução das estruturas econômicas, culturais e sociais.
2 A ideologia na escola
Ideologia na escola: conceitos, hierarquias e
contradições
Podemos dizer que, desde a primeira referência ao termo, pelo filósofo Antoine
Destutt de Tracy, até Georg Lukács, Chauí e Apple, nos dias de hoje, a utiliza-
ção do termo ideologia mostrou estreita relação com um conjunto diverso de
representações sociais e de valores quaisquer de grupos ou sociedade. Logo,
devemos ter em mente que esse termo pode abranger inúmeros sentidos e
intenções diferenciadas (sistemas de crenças), incluindo a possibilidade de
colaborar em ações que levem à obtenção de poderes estruturantes, tanto de
um grupo, como de uma sociedade (EAGLETON, 1997).
O termo ideologia possui inúmeras conceituações, tanto complementares, quanto
contraditórias, por conta das tantas épocas e dos fatos históricos e políticos sobre os
quais foi baseado e reorganizado:
o processo de produção de significados, signos e valores na vida social;
corpo de ideias característico de determinado grupo ou classe social;
ideias que ajudam a legitimar um poder político dominante;
ideias falsas que ajudam a legitimar um poder político dominante;
comunicação sistematicamente distorcida;
aquilo que confere certa posição a um sujeito;
formas de pensamento motivadas por interesses sociais;
pensamento de identidade;
ilusão socialmente necessária;
a conjuntura de discurso e poder;
o veículo pelo qual atores sociais conscientes entendem o seu mundo;
conjunto de crenças orientadas para a ação;
a confusão entre realidade linguística e realidade fenomenal;
oclusão semiótica;
o meio pelo qual os indivíduos vivenciam as suas relações com uma estrutura social;
o processo pelo qual a vida social é convertida em uma realidade natural (EAGLE-
TON, 1997).
Já para Apple (2006, p. 53), existe uma delimitação que permite o agru-
pamento dos conceitos de ideologia:
A ideologia na escola 3
(1) racionalizações ou justificações bastante especificas das atividades de
grupos ocupacionais particulares e identificáveis (ou seja, ideologias profis-
sionais); (2) programas políticos e movimentos sociais mais amplos; (3) visões
de mundo e perspectivas abrangentes, ou o que Berger, Luckmann (1966) e
outros chamaram de universos simbólicos.
Antes de prosseguirmos, é importante compreender que, enquanto indi-
víduos, possuímos dois sistemas de valores: um que nos é particular (mas
que pode vir a ser compartilhado com um grupo) e outro que é público. Esse
“público” é o que aprendemos tanto na escola, como na convivência cotidiana.
Essa “consciência coletiva” é um conjunto de valores e moral que exprimimos
quando estamos num agrupamento social, a fim de que haja certa ordem (direi-
tos, deveres, compromissos, liberdades), e não um caos social. Logo, podemos
dizer de modo muito simplificado que uma ideologia é um conjunto de ideias
comuns e valores compartilhados por uma sociedade ou um grupo social.
Já pensou em como a “consciência coletiva” está presente no seu cotidiano? Imagine
que, em um ônibus cheio, alguém decide, sem motivo algum, ouvir música sem
fones de ouvido. A sua primeira reação é imaginar por que ela está fazendo aquilo?
Provavelmente sim. Mas que tipo de “código social” impede você de “revidar” e fazer
o mesmo?
O projeto dominante de ideologia na escola
“Uma sociedade é feita de indivíduos que ‘conseguem viver’ juntos porque têm
em comum valores e regras, parcialmente transmitidos pela escola” (FILLOUX,
2010, p. 17). Hoje um dos maiores debates sobre o que produz os sucessos
e insucessos nas escolas está relacionado efetivamente com a compreensão
de que esse espaço é uma microssociedade na qual se refletem os conflitos,
os encontros e os confrontos (resistências) advindos dela (XIMENEZ, 1994
apud ANDRADE, 2014).
É nesse ponto que retornamos no tempo e revemos o propósito inicial da
escola: o de produzir cidadãos para a sociedade e para o mercado de trabalho.
Esses indivíduos devem ser capacitados com certos conhecimentos, capazes
de realizar tarefas, cumprir regras e estar socialmente inseridos. No entanto,
4 A ideologia na escola
a democratização (mito da escola libertadora) e a massificação do ensino,
bem como os seus resultados insatisfatórios em médio prazo, inclusive para
a realização de atividades laborais, foram registrados em pesquisas, especial-
mente na segunda metade do século XX (Relatório Coleman, 1966). Esses
resultados expuseram abertamente a fragilidade dos sistemas educacionais
de modo geral, mostrando também ao indivíduo trabalhador que há um con-
junto inominado de ideias e crenças que regulam e mantêm as desigualdades
e diferenças sociais entre os membros da sociedade. Nesse momento, ficou
explícito que o desempenho escolar é diretamente afetado por três fatores
(EAGLETON, 1997):
Deslegitimação da origem dos alunos (poder aquisitivo, etnia, sexo,
moradia) diante de um sistema de ensino com valores autoritários e
hierárquicos de uma classe dominante, ou seja, a sua instrução para
alçar posições sociais ao fim do período não será suficiente para uma
mudança de status social.
A instabilidade de propiciar um conjunto de recursos (capital) que
devem ser considerados para a efetiva mobilidade social “positiva”
dos indivíduos.
Um sistema de ensino pensado para ser incapaz de produzir igualdade
e permitir equidade em nível de instrução a alunos com menos recursos
(capital).
A esses recursos (capitais), damos os nomes e definições abordados no
Quadro 1.
Quadro 1. Definições dos tipos de capital.
Capital social Capital econômico Capital cultural
Tem relação com Conjunto de Em três estados:
uma rede estável bens econômicos incorporado,
de relações sociais, (dinheiro, patrimônio objetivado e
que traz benefícios e bens materiais). institucionalizado.
positivos para si e Capaz de permitir a Sua acumulação inicial
outros membros obtenção de certos “[...] começa desde a
(família, comunidade, bens e serviços origem, sem atraso,
amigos, diversão e culturais (passeios, sem perda de tempo,
lazer em grupo). cursos, lazer). pelos membros das
(Continua)
A ideologia na escola 5
(Continuação)
Quadro 1. Definições dos tipos de capital.
Capital social Capital econômico Capital cultural
No caso da família, Colaborador na famílias dotadas
também tem manutenção de de um forte capital
importância o relações sociais cultural” (BOURDIEU,
capital próprio de (passeios coletivos). 1989, p. 76).
cada indivíduo e Por exemplo,
como o contato saberes, valores
pode beneficiar o e conhecimentos
seu crescimento transmitidos, formais
intelectual. e não formais.
Fonte: Bonamino et al. (2010).
O que foi o Relatório Coleman (1966)?
James Coleman foi um importante sociólogo que coordenou um estudo do governo
dos Estados Unidos sobre a importância da escola na vida do aluno. Porém, esse
relatório — que ficou conhecido mundialmente como Relatório Coleman — foi além e
demonstrou que as desigualdades perduravam na vida escolar, pois eram reproduzidas
em seu âmbito, independentemente dos recursos disponíveis, mostrando ainda que as
diferenças socioeconômicas (familiar e escolar) colaboravam nos resultados desiguais.
O funcionamento do domínio na vida cotidiana
da escola
A dominação social exercida pela classe dominante na escola é, ao mesmo
tempo, uma situação subjetiva, por não ter classificação aberta, e também direta,
uma vez que a escola se apresenta como um espaço de regras, valores e cultura
próprios. Nesse espaço, os sujeitos inseridos, em período de formação do seu
“ser social”, são expostos a um conjunto de valores e crenças oficializados
como “superiores”, não somente necessários para a convivência social, mas
indispensáveis para o alcance de uma ascensão social. Isso é extensamente
6 A ideologia na escola
conhecido pelo termo violência simbólica (Figura 1): fica explícita ao indi-
víduo a existência de uma cultura superior e uma cultura inferior, presente
não somente na escola, mas na sociedade como um todo. Tal relação forja
a diferença entre o ser e o não ser “sociável”, indo e vindo “de” e “para” o
espaço escolar, por meio daqueles que fazem parte de sua estrutura (alunos,
professores, profissionais, etc.).
Violência suave que ocorre onde se apresentam encobertas as relações de
poder que regem os agentes e a ordem da sociedade global. Nesse sentido,
o reconhecimento da legitimidade dos valores produzidos e administrados
pela classe dominante implica o “desconhecimento” social do espaço, onde
se trava, simbolicamente, a luta de classes (BOURDIEU, 1989 apud TIRA-
DENTES, 2015, p. 36).
Figura 1. Os mecanismos da violência simbólica.
Fonte: Sinart Creative/Shutterstock.com.
A violência simbólica no cotidiano escolar é notoriamente fluida e di-
retamente ligada ao controle social, corporal e temporal do indivíduo na
escola, por meio de “sistemas simbólicos” como arte, religião, língua, mú-
sica, cultura a ser apreciada, etc. De modo conciso, todas essas atividades
são formas de poder estruturantes e estruturadas, por já se apresentarem
no mundo como oficiais, relevantes e indispensáveis à desenvoltura social
(BOURDIEU, 1989).
A ideologia na escola 7
Esse tipo de violência manifestada subjetivamente tem em sua essência uma
legitimação histórica, política e representativa no mundo, que dificilmente pode
ser negada como protagonista, já que é ela quem domina os meios de comunicação
e difusão de conhecimento. Assim, para manter o controle e a aceitação sobre
aqueles que ainda não estão totalmente absorvidos pela sua oficialidade, permite
brechas, sob o rótulo da “importância das multiculturas”, que se apresentam
de forma simbólica em dias festivos ou como uma contribuição menor, quase
irrelevante — apenas o suficiente para normalizar e fazer acreditar que esse
sujeito é parte da sociedade como um igual (TIRADENTES, 2015).
Leia o artigo Pierre Bourdieu, o investigador da desigualdade (Revista Nova Escola), dis-
ponível no link a seguir.
https://goo.gl/sWlBNe
Definido o sentido de violência simbólica, fica muito mais fácil entender
como o controle social se dá na escola, por meio de mecanismos e ferramentas
comuns no cotidiano escolar, como o espaço da sala, os horários fixos de
atividades e lanche, os cartazes culturais, o aprendizado dado de forma única
e sem reconhecer o tempo de cada aluno, as provas, o currículo. De forma
consciente ou não, tudo é alinhado para apresentar a história e os conhecimentos
das culturas dominantes, normalizadas historicamente.
Esse fator nos leva a perceber que a formação educacional, ao longo da
vida dos alunos, é uma preparação para que estes assumam o seu lugar social,
conforme apreendido entre dominantes e dominados. Realimentam-se assim
as relações de poder social, político e cultural, instituídos e reprodutores das
desigualdades sociais (BOURDIEU, 1989; VALLE, 2013).
A fim de exemplificar o poder do controle social, tomemos como elementos
de investigação dois itens de extrema importância na produção da violência
simbólica: o currículo oculto e o currículo visível.
Currículo oculto é aquele que não está prescrito; tem relação com as
práticas subjetivas do espaço escolar, como comportamentos, normas,
tratamento, ou seja, com a cultura escolar e como esta afeta o aluno.
8 A ideologia na escola
Geralmente, ela se alterna entre positiva e negativa, dependendo dos
fatores e das pessoas no cotidiano escolar; todavia, quando se apresenta
como negativa, efetivamente produz resultados como constrangimento,
insucesso escolar e, em último caso, evasão escolar. A sua presença pode
ser “sentida” em práticas cotidianas, como o mesmo tempo que é dado
para fazer uma atividade entre crianças em tempos de fortalecimento
da escrita diferentes, a ajuda solicitada que não acontece, o privilégio
dado a alguns alunos que já são “fruto” da cultura superior presente
na escola, o professor que não se ocupa em compreender por que parte
da turma não acompanha o conteúdo — seja por dificuldade ou des-
conhecimento total do assunto — e, ainda, a normalização do estigma
sobre alunos, permitindo que sejam excluídos dentro da escola, sem a
tomada de qualquer atitude (BOURDIEU, 1989; TIRADENTES, 2015).
No cotidiano escolar, é bastante comum alunos como alvos de estigmatização
por aqueles que se consideram perfeitos, sejam professores ou seus próprios
pares. Qualquer traço que fuja dos padrões “normais” pode levar um grupo
ao preconceito e à discriminação provocando a exclusão do “diferente” e
este, muitas vezes, passa a assumir a condição de incapaz, de desacreditado.
É possível afirmar, portanto, que a violência simbólica também se dá, nos
julgamentos interpessoais que são, frequentemente, influenciados por este-
reótipos, que rotulam e estigmatizam os alunos (BORBA; RUSSO, 2011 apud
TIRADENTES, 2015, p. 45).
Currículo visível, ou real, é aquele que funciona num outro contexto
de controle; é físico, amplo, nacional e falsamente intitulado como
“neutro”, pois, se existe um propósito em sua produção, então não há
neutralidade em sua formulação. Nele são estabelecidas várias relações
de poder teóricas e ideológicas sobre o que é relevante, segundo as
forças e os grupos que o formulam, como o Estado, que necessita que
ele seja uma ferramenta para transmitir os conhecimentos necessários
de uma vida profissional. Os educadores, por outro lado, precisam que
esse currículo seja uma pauta para a organização social e para a trans-
missão de conhecimentos superiores de modo instrumental (conteúdo) e
cognitivo (valores) — uma retroalimentação do sistema (SILVA, 2001).
Frente aos fatos, faz-se importante reconhecer que mudanças profundas,
não só em teoria, mas também na prática, precisam ser concebidas, à luz de
uma emergência de ação, não apenas em direção à escola, mas ao sistema de
ensino, com o objetivo de impedir o desmantelamento social dos alunos diante
de uma existência constantemente deslegitimada.
A ideologia na escola 9
Estratégias pedagógicas: possibilidades para
mediar os conflitos na escola
O cotidiano escolar, com todas as suas regras, medidas e invisibilidades
culturais (intencionalmente ou não), nunca conseguiu alcançar um resul-
tado massivo ou controlador, ora porque os seus sujeitos se rebelavam ime-
diatamente contra as amarras da instituição, ora porque alguns resolviam
silenciar e perder a batalha naquele momento, para sobreviver aos anos de
estudo e retornar depois, como agentes de transformação ou mediadores das
mudanças. A tirinha da Figura 2 ilustra com humor os questionamentos no
contexto escolar.
Figura 2. Questionamentos no contexto escolar.
Fonte: Rossi (2015).
É importante frisar que conflito escolar não é sinônimo de violência direta
ou física: ele se apresenta principalmente de modo simbólico (subjetivo),
mostrando que há uma desavença no ar, um descompasso entre os sujeitos
sociais que demonstram uma “incivilidade”, consciente ou não. Logo, não
estamos falando de bárbaros e civilizados, o que seria reproduzir a ideia de
superiores e inferiores — exatamente o que vem causando parte dos confli-
tos. A questão é mais profunda, estando relacionada com um “conflito de
civilidades” que vai desde ruídos na comunicação entre os sujeitos, até uma
reação direta ou indireta de desrespeito, tanto dentro, quanto no entorno da
escola (DEBARBIEUX, 2001 apud PEÇANHA, [2010]).
Porém, há um problema na delimitação do conceito de conflito que
está diretamente ligado com a leitura feita pelos pesquisadores/educadores
sobre os dados obtidos, os quais diferem em descrição e tipologia, conforme
exposto.
10 A ideologia na escola
Os conflitos podem ser classificados em estruturais, de valor, de rela-
cionamento de interesse e de dados (MOORE, 1998 apud CHRISPINO,
2007).
Os conflitos podem ser classificados em seis tipos: verídicos (conflitos
que existem objetivamente), contingentes (situações que dependem de
circunstâncias que mudam facilmente), descentralizados (conflitos
que ocorrem fora do conflito central), mal atribuídos (apresentam-se
entre partes que não mantêm contatos entre si), latentes (conflitos cuja
origem não se exterioriza) e falsos (baseiam-se em má interpretação
ou percepção equivocada) (DEUTSCH, apud MARTINEZ ZAMPA,
2004, p. 27).
Os conflitos também podem se dar por recursos, poder, autoestima,
valores, estrutura, identidade, interesses, expectativas, inadaptação,
informação, interesses, atribuição, legitimação, inibição (REDORTA,
2004 apud CHRISPINO, 2007).
Os conflitos no nível da violência nas escolas podem ter fatores ex-
ternos e internos: agressão ao patrimônio, agressão física e verbal,
tráfico, roubo, uso de álcool, assédio sexual, bullying e cyberbullying
(MARTINS; MACHADO; FURLANETTO, 2016).
De qualquer modo, o atual cenário é bem preocupante, pois, apesar das
mudanças políticas e do fortalecimento de outras vozes sociais, é evidente que
a escola ainda não consegue conversar com os seus sujeitos, impedindo que
novos contextos adentrem as suas paredes e cadeiras. Com o fracasso estatal
em prover melhores práticas educativas, recursos e menos burocracia, cada
vez mais há a retroalimentação da violência, não somente no espaço público,
mas também no privado, que demonstra a mesma capacidade de diálogo e
gestão deficiente (MARTINS; MACHADO; FURLANETTO, 2016):
[...] o ato de violência pode ser caracterizado pela imposição de força física
que envolve dominação entre indivíduos e/ou grupos, configurando as situ-
ações mais evidentes — assaltos, roubos, agressões físicas e sexuais — com
exposição cada vez mais midiática. Entretanto, a violência também pode ser
simbólica e psicológica, assumindo diferentes roupagens por meio de práticas
de poder que induzem os outros a se sentirem marginalizados e menosprezados
em situações privadas ou públicas (MARTINS; MACHADO; FURLANETTO,
2016, documento on-line).
A ideologia na escola 11
Com o intuito de colaborar com formas de avaliar o alcance da violência na escola,
o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), em conjunto com educadores e
promotores, lançou a campanha “Conte até 10” e a cartilha Diálogos e Mediação de
Conflito nas Escolas: Guia Prático para Educadores.
O material tem planos de ação (Plano de convivência, Mapa da comunidade, Cons-
truindo um ambiente de paz, etc.) com andamentos e fichas de pesquisa (O termômetro
da violência, Autoavaliação dos profissionais da escola, Práticas restaurativas, Perguntas
colaborativas, etc.) a serem feitas na escola e na comunidade, a fim de descobrir quais
problemas estão provocando os conflitos na escola e se eles estão relacionados
também à vida dos alunos e professores.
Apesar de todas as definições e identificações dos conflitos e seus níveis, o
problema num contexto amplo é um só, e não há uma formula única, uma vez
que os atores sociais envolvidos são diversos, assim como as complexidades
que rodeiam esses conflitos. Porém, é importante considerar que mudanças só
podem ser feitas quando todos estão dispostos a mudar o que for necessário
e ser sinceros quanto às questões a solucionar.
Assim, é preciso adotar outro tipo de postura para a obtenção de um am-
biente seguro e psicologicamente saudável para todos: a culpabilização deve
ser substituída pela responsabilidade de ser vigilante sobre os seus atos e
aberto ao diálogo. Isso nos leva efetivamente a algumas ações básicas, que
permitirão um diálogo positivo, visando a mudanças na cultura da escola e
nas práticas cotidianas de todos aqueles ligados ao ambiente escolar — e
também nos currículos real e oculto, que são espelhos, em algum nível, do
desconforto no ambiente (CHRISPINO, 2007; MARTINS; MACHADO;
FURLANETTO, 2016).
Eis alguns apontamentos:
organizar uma pesquisa para cada grupo (corpo docente, discente,
familiares), com o objetivo de pontuar os problemas citados por cada um;
incentivar a participação dos familiares e da comunidade em ações
de prevenção, com um projeto pedagógico específico para esse fim;
organizar um Conselho de Mediação, que envolva pessoas da escola, da
família e/ou da comunidade, preparadas em termos de conhecimentos e
leis, a fim de conseguir conversar com as partes envolvidas no conflito;
12 A ideologia na escola
contatar órgãos externos para a mediação de situações mais complexas
(Conselho Tutelar, Vara da Infância, entre outros);
levantar a possibilidade de encaminhamento para um profissional psi-
cólogo/terapeuta, para avaliação e acompanhamento;
não deixar de apontar e notificar a responsabilidade estatal por alguns
dos conflitos ocorridos no ambiente escolar.
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