Quando a vida tomou um rumo inesperado, decidi sair de Nova
York por um tempo.
Que lugar melhor para ir do que a pequena cidade idílica da
qual meu pai falava com tanto carinho quando eu era criança?
Laurel Lake manteve o título de A Cidade Mais Amigável da
América por dezessete anos consecutivos, e amigável era
exatamente o que eu precisava agora.
Infelizmente, amigável não foi a recepção que recebi quando
cheguei.
Em vez disso, recebi Fox Cassidy.
Meu vizinho alto, moreno e corpulento, que grunhiu para mim
em vez de dizer olá.
Ok, então talvez eu estivesse com a caixa de correio dele nas
mãos na primeira vez que nos encontramos.
E parecia ter ficado um pouco amassada depois de removê-la
de debaixo do pneu.
E talvez eu precisasse da ajuda dele para invadir a casa onde
estaria hospedada depois que a chave quebrou na fechadura.
Mas ainda assim... ele não precisava ser tão mal-humorado.
Com o passar do tempo, comecei a notar outras coisas sobre
Fox além de seus olhares.
Por exemplo, como ele me observava quando pensava que eu
não estava olhando, ou como o fogo acendia em seus olhos sempre
que brigávamos.
Embora eu estivesse em Laurel Lake para escapar dos meus
problemas, não para conseguir novos. E me envolver com um
homem como Fox era sinônimo de problemas, mesmo que ele fosse
lindo e diferente de qualquer homem que já conheci.
Mas, infelizmente, problema parecia ser meu nome do meio este
ano.
Então, por que não me divertir enquanto estivesse aqui durante
o verão?
Parecia um bom plano.
Pelo menos até a hora de voltar para casa...
Dizem que o que acontece no lago, fica no lago.
Mas não era tão fácil ir embora quando o que ficava para trás...
era o seu coração.
Josie
Ah. Merda.
Estacionei meu carro alugado e saí para caminhar até a
traseira do Ford Explorer. Franzindo a testa ao ver o pequeno
amassado no para-choque, fiquei pelo menos feliz por o agente
insistente ter me convencido a fazer o seguro extra. Por que havia
um poste aleatório espetado aqui? Suspirei.
Não interessa. Eu lidaria com tudo isso amanhã. Já tinha sido
um dia bastante longo. O que deveria ser uma viagem de onze
horas de Nova York até aqui, levou quinze por causa de um pneu
furado e trânsito parado em alguns estados, tudo isso enquanto
gerenciava mensagens de texto e ligações constantes do meu ex,
Noah. Virei para voltar ao carro, mas parei quando notei algo
vermelho saindo debaixo do pneu traseiro.
Aquilo era... uma caixa de correio?
Que merda. Acho que afinal não era um poste aleatório. Olhei
para a casa a que pertencia e pensei em não bater à porta até
amanhã. Mas eu ia ficar aqui por um tempo e não queria começar
com o pé esquerdo com o vizinho. Então tirei a caixa de metal
amassada de debaixo do carro, carreguei-a pela entrada e bati na
porta da frente.
Quando a porta se abriu, esqueci momentaneamente por que
estava ali.
Uau. Gostoso não era uma palavra forte o suficiente. Olhos
verdes com um toque de cinza, queixo quadrado com a quantidade
certa de barba e um nariz perfeitamente reto. Sem mencionar que
ele era bem alto. Um metro e noventa? Dois metros? Seus ombros
largos preenchiam toda a porta. Ele pode ter sido o maior homem
de quem já estive tão perto. Perguntei-me brevemente se ele
poderia comprar camisas em uma loja normal. Noah usava as
extragrandes, e esse homem parecia capaz de esmagar meu ex
como um inseto. Esse pensamento me fez sorrir.
Contudo, isso não fez Paul Bunyan 1 sorrir. Ele cruzou os
braços sobre o peito e olhou para a caixa de correio surrada em
minhas mãos. — Quer dizer alguma coisa? — Ele ergueu uma
sobrancelha.
— Ummm... — Eu levantei a caixa. Por quê? Eu não tenho a
mínima ideia. Mas senti necessidade de fazer algo com os braços.
— Acho que acertei a sua caixa de correio.
— Você acha?
— Não, não... — Balancei a cabeça. — Eu definitivamente
acertei. Eu quis dizer que não tinha certeza se era sua.
1
Paul Bunyan é um lendário lenhador gigantesco que aparece em alguns relatos tradicionais do folclore
dos Estados Unidos.
— Onde estava a caixa de correio quando você bateu nela?
Virei e apontei para a área gramada no final da entrada, a
mesma entrada pela qual acabei de subir para chegar à porta. O
poste solitário permaneceu. — Estava ali.
— E ainda assim você está confusa a qual casa ela pertencia?
— Eu, uh... — Oh, esse cara era um idiota. Ele não precisava
zombar de mim. Coisas acontecem. Como acidentes de carro. Não
era como se fosse grande coisa. Eu a substituiria. — Sim, eu bati
na sua caixa de correio. Peço desculpas. Foi um longo dia, não sou
uma boa condutora e está escuro. Eu estava tentando dar ré na
minha garagem e, bem... dirigir para trás não é tão fácil quanto
para frente.
Os olhos do homem se estreitaram. — Sua entrada?
Apontei para a casa à direita. — Aquela.
Ele deu uma olhada. — Você vai ficar naquela cabana
degradada?
— Degradada? — Olhei para a porta ao lado, mas ao contrário
desta casa, a luz da varanda não estava acesa, então não consegui
ver muito bem. — O corretor de imóveis disse que precisa de
alguns reparos.
O lábio do cara curvou-se. — Qualquer coisa que você diga...
Ótimo. Mal posso esperar para ver como o lugar está agora. Eu
balancei minha cabeça. — De qualquer forma, vou substituir sua
caixa de correio. Você comprou por aqui?
Ele ergueu o queixo. — Clifton, a madeireira aqui perto.
— Vou comprar uma substituta logo pela manhã. Você se
importa se eu guardar até então, para ter certeza de que comprarei
a certa?
Paul Bunyan encolheu os ombros. — Faça como quiser.
— Tudo bem, bem... — Levantei a mão e acenei sem jeito. —
Vejo você amanhã então.
Desci a calçada, sentindo seus olhos em mim, mas recusei-me
a voltar. Embora assim que cheguei ao meu carro, que ainda
precisava dar ré na garagem ao lado, tive que encarar a casa
novamente, então espiei pela porta. Com certeza, o gigante mal-
humorado permaneceu ali, observando. Acenei sem jeito pela
segunda vez, depois entrei no carro e coloquei a caixa de correio
destruída no banco do passageiro.
Olhei para a casa mais uma vez depois de ligar o motor. Sim.
Continue assistindo.
Ótimo. Ele provavelmente estava esperando para divertir-se
enquanto eu tentava voltar para a garagem, já que confessei que
não era a melhor motorista. Eu não precisava desse tipo de
pressão, então decidi avançar, virar e estacionar de frente. Eu só
teria que carregar minhas malas um pouco mais longe. Exceto...
agora eu estava confusa. Entre bater na caixa de correio e esse
cara observando-me, eu acidentalmente coloquei o carro em
marcha à ré em vez da marcha inicial e imediatamente bati no
poste da caixa de correio novamente. Dessa vez eu o derrubei.
Pisando no freio, fechei os olhos. A porra da minha vida. Essa
coisa de confiar no meu instinto que comecei a fazer recentemente
não estava funcionando exatamente como planejado.
Minha garganta apertou e as pontas dos dedos começaram a
formigar – sinais reveladores de um ataque de ansiedade total
chegando. Essa era a última coisa que eu precisava, então fiz o
que meu novo terapeuta me ensinou a fazer. Apertei os olhos e
contei até dez enquanto concentrava-me na minha respiração. Não
me senti melhor quando meus olhos se abriram, especialmente
quando vi o Sr. Bunyan ainda parado ali. Mas me senti compelida
a dizer alguma coisa. Então apertei o botão para abrir a janela do
passageiro e acenei.
— Desculpe! Vou substituir isso também!
Meu novo vizinho não tão amigável não disse nada. Eu tinha
certeza de que não seríamos melhores amigos, então não adiantava
tentar acalmar as coisas. Coloquei o carro na marcha, verifiquei
novamente se estava realmente em marcha antes de tirar o pé do
freio e consegui dar meia-volta e entrar na garagem ao lado sem
quaisquer outras catástrofes.
Porém, quando os faróis me deram a primeira boa visão de
minha nova casa longe de casa, perguntei-me se teria outra
catástrofe em mãos.
Oh, não.
Duas janelas estavam tapadas com madeira compensada, a
porta da garagem estava torta e metade das venezianas estava
faltando na casa, enquanto a outra metade estava pendurada.
Nenhuma quantidade de respirações profundas iria melhorar isso.
Se o exterior era assim, estava com medo do que poderia encontrar
lá dentro. Havia uma luz quebrada na varanda pendurada sobre a
porta da frente, então deixei os faróis acesos quando saí para poder
ver.
A fechadura enferrujada onde enfiei a chave combinava com as
condições do resto da casa, então não sei por que fiquei tão
chocada quando a chave não girou. Balancei a maçaneta para
frente e para trás algumas vezes. A fechadura parecia querer girar,
mas precisava de um pouco de convencimento. Então coloquei um
pouco de peso nela e... ela moveu-se. Oh, ela moveu-se bem.
Estalo!
Fechei os olhos. Por favor, por favor, não podia estar quebrada.
Mas era claro que estava.
Merda.
Merda.
Merda dupla!!!
O que diabos eu iria fazer agora?
Olhei ao redor da casa. Talvez as janelas não estivessem
trancadas no primeiro andar? Ou eu poderia arrancar a madeira
que cobria o que presumi ser uma janela. Passei os próximos dez
minutos andando pelo perímetro da propriedade, tentando todas
as janelas que pude alcançar. Escusado será dizer que a única
sorte que tive hoje foi uma péssima sorte, então nenhuma estava
aberta. De volta ao carro, liguei os faróis altos para inspecionar o
resto da casa. A terceira janela à esquerda no segundo andar
parecia estar aberta alguns centímetros. Pensei em dirigir o carro
até o gramado para poder ficar em pé no teto, mas parecia que
ainda não conseguiria alcançá-la. Talvez eu deva chamar um
serralheiro? Embora a última vez que fiz isso tenha demorado mais
de três horas para o cara chegar, e isso foi na movimentada cidade
de Nova York, não nesta pequena cidade. Eu estava morrendo de
vontade de dormir.
Olhei para a casa de Paul Bunyan e mordi o lábio. Ele não era
muito amigável, mas eu só precisava de uma escada. Meu instinto
dizia que essa era a solução mais fácil, e como meu instinto
colocou-me nessa confusão, imaginei que era sua função tirar-me
de lá. Então engoli todo o orgulho que me restava, voltei até a casa
do vizinho e respirei fundo antes de bater.
O homem-árvore abriu novamente e, não surpreendentemente,
não se preocupou em dizer olá.
— Oi de novo! — falei um pouco alegremente. — Será que eu
poderia incomodá-lo por causa de uma escada?
Suas sobrancelhas franziram. — Para quê?
Apontei para a porta ao lado. — Parece que estou me metendo
em apuros. A chave quebrou na fechadura. — Levantei a prova
quebrada no meio do meu chaveiro. — Vê? E eu só tenho essa.
Nenhuma das janelas está aberta no primeiro andar, mas parece
que há uma aberta no segundo. Se você tiver uma escada, tenho
certeza de que não levarei mais de cinco minutos para trazê-la de
volta.
O cara encarou por dez segundos. Então ele passou por mim
sem dizer uma palavra. Eu não tinha ideia se isso significava que
eu deveria seguir, mas foi o que fiz. Paul digitou um código na
parede ao lado de sua garagem e a porta começou a abrir. Ele
entrou e pegou uma escada.
— Na frente ou atrás? — ele grunhiu.
— Uh... na frente.
Ele colocou a escada no ombro e marchou pelo gramado em
direção à minha casa. Eu segui. — Você não precisa carregá-la. Eu
posso fazer isso.
O homem de poucas palavras olhou para mim e continuou
andando.
— Ah... ok, então. Acho que você vai carregá-la — murmurei.
Ao lado, ele examinou a frente da casa. Ao avistar a janela
aberta, apoiou a escada nas telhas de madeira e começou a subir.
Aparentemente ele também estava fazendo isso por mim...
Observei de baixo, apreciando silenciosamente a visão do jeans
abraçando um belo traseiro. Talvez eu estivesse delirando depois
da longa viagem, mas não pude deixar de pensar que uma moeda
iria ricochetear naquela coisa firme, e tive um desejo repentino por
um pêssego maduro e suculento.
Afastei os pensamentos ridículos da minha cabeça enquanto
Paul – o Pêssego – Bunyan abria a janela do segundo andar e
entrava. Dois minutos depois, ele abriu a porta da frente.
Dei um suspiro de alívio. — Muito obrigada.
O homem imponente cruzou os braços sobre o peito enquanto
estava parado na porta – aparentemente a posição favorita dele –
e olhou para mim com desprezo. — Como posso saber se você
realmente tem permissão para ficar aqui? — ele perguntou.
— Bem, eu sou a dona da casa, então...
Ele semicerrou os olhos. — Quando você comprou isso? Não vi
nenhuma placa de venda.
— Eu não comprei. Herdei isso. Quinze anos atrás. Do meu pai
quando ele faleceu.
— Quem era a velha que morava aqui então?
— Ela era inquilina. Minha mãe alugou para ela depois que
meu pai morreu. Eu tinha apenas treze anos na época.
— O que aconteceu com ela?
— Sra. Wollman? Ela mudou-se para uma casa de repouso no
mês passado. Tornou-se demais para ela morar sozinha e cuidar
de uma casa.
— E... — Ele olhou por cima do ombro. — Quando foi a última
vez que você viu o lugar?
— Isso seria nunca. Esta é a primeira vez que visito Laurel
Lake.
Paul olhou por cima do ombro novamente e de volta para mim.
— Quem é seu empreiteiro?
Eu fiz uma careta. — Empreiteiro? Ninguém. Pensei em
consertar o lugar sozinha enquanto fico aqui.
Seu lábio se contraiu. — Isso deve ser interessante.
Eu poderia ter demolido a caixa de correio dele, e ele poderia
ter carregado uma escada e subido na minha casa para que eu
pudesse entrar, mas não ia deixar o idiota sexy me ridicularizar.
Agarrei meus quadris e meus olhos estreitaram-se. — O que há de
tão interessante em eu mesma fazer o trabalho na casa?
Seu sorriso confuso se aprofundou. — É preciso um pouco mais
do que tinta e almofadas.
Agora ele estava me irritando. — Para que você saiba, sou muito
útil. Sou formada em engenharia. — Deixei de lado o fato de que
se tratava de engenharia científica farmacêutica.
— Qualquer coisa que você diga...
— Que tal se eu agradecer a ajuda esta noite e você me deixar
entrar em minha casa?
O idiota virou o corpo para abrir espaço para eu passar, embora
ele não tenha realmente saído da porta. Reunindo o máximo de
autoconfiança possível, endireitei as costas, levantei o queixo e
tentei ignorar os arrepios no meu corpo enquanto passava por ele
e entrava na casa.
Paul Bunyan acendeu as luzes. Eu já tinha decidido que não
importava como fosse o interior da casa, não daria a esse homem
a satisfação de me ver reagir. Mas nem todo o bom senso do mundo
poderia ter mascarado o que me atingiu quando dei uma olhada
no lugar. Eu engasguei em voz alta.
Oh.
Meu.
Deus.
Pisquei algumas vezes, esperando estar imaginando coisas.
Talvez isso tenha sido um sonho ruim? Tinha sido um dia longo e
eu estava cansada, então talvez tenha entrado naquela casinha
fofa com interior brilhante e tirado uma soneca..., mas não, eu não
estava sonhando. Os jornais estavam empilhados do chão ao teto
em metade da cozinha. E a cozinha não era pequena. As pilhas
tinham meia dúzia de fileiras de profundidade, provavelmente com
quatro metros e meio de comprimento e dois metros e meio de
altura. Fiquei tão chocada com a coleção perturbadora que levei
um momento para notar a outra metade da cozinha. As portas dos
armários – pintadas de verde espuma do mar – pendiam das
dobradiças. Faltava metade dos azulejos no painel e faltava a
torneira na pia. E isso foi exatamente o que pude perceber à
primeira vista.
Minha boca estava aberta. Uma pequena reforma? Foi o que o
corretor de imóveis disse. Uma porta em arco levava à sala de
estar. Cometi o erro de espiar e a casa começou a girar um pouco.
Lá dentro parecia tão ruim, se não pior, que a cozinha. Não havia
teto ou paredes! Nada de gesso! Apenas tábuas de madeira com
fios pendurados por toda parte. Pior ainda, as coisas também
estavam empilhadas naquela parte da casa. A princípio pensei que
fossem mais jornais, mas quando me inclinei para olhar mais de
perto, percebi que estava errada.
— Essas são fitas VHS?
Acho que não esperava que alguém realmente respondesse. Em
meu estado de estupefação, eu tinha esquecido completamente de
Paul Bunyan, então dei um pulo quando sua voz explodiu.
— Sim.
Uma palavra. Uma maldita sílaba. No entanto, ouvi a diversão.
Foi o que aconteceu. O dia inteiro ferveu. E a tampa estava prestes
a saltar da panela enquanto eu marchava em direção ao idiota do
meu vizinho.
Fiquei cara a cara com ele e enfiei o dedo em seu peito. — Você
acha que isso é engraçado? Você acha? — Irritou-me que, no meio
da minha raiva, percebi o quão duro o peito estava debaixo do meu
dedo. A maldita coisa parecia uma parede de tijolos. Mas não...
simplesmente não. Eu me forcei a ignorar e continuar. — Dirigi
quinze horas no trânsito, com meu celular zumbindo como um
mosquito insistente no ouvido, tive um pneu furado, o ar-
condicionado do carro de aluguel quebrou, bati na sua caixa de
correio idiota e a chave quebrou na porta. Tive que ir até o vizinho
mal-humorado para pegar uma escada emprestada só para poder
entrar. E quando finalmente consigo entrar, a casa está uma
bagunça e claramente foi ocupada por alguém com problemas de
acumulação. E como se tudo isso não bastasse, não fosse um dia
de merda suficiente para matar o espírito de uma pessoa, então
você aproveita esse momento e leva-me ao limite. — Tirei meu dedo
do carvalho humano e o enfiei de volta com cada palavra pausada.
— Eu.
Cutucada.
— Estou.
Cutucada.
— Feita.
Cutucada.
— Com.
Cutucada.
— Você.
Cutucada.
— Foda-se.
Pelo menos consegui tirar o sorriso do rosto do cara. Embora
ele não tivesse dito uma palavra. Ele apenas ficou ali olhando para
mim. Depois de um minuto inteiro, ele finalmente falou.
— Você vai ficar aqui esta noite?
Meus olhos se arregalaram. — Claro que vou ficar aqui! — gritei
como uma lunática. — Para onde mais eu iria?
Ele olhou para mim por alguns segundos, depois virou-se e
saiu. Achei que era o fim das coisas até ouvir a porta de um carro
abrindo-se. Dez segundos depois, Paul Bunyan apareceu
novamente na minha porta com minhas malas.
Fiquei tão sem palavras quanto quando entrei em casa. O
homem colocou as malas na cozinha e desapareceu novamente.
Um minuto depois ele voltou, desta vez com a cama inflável que eu
havia arrumado e uma caixa. Ele os adicionou à minha pilha de
malas e desapareceu novamente. Depois de mais duas viagens, ele
chamou minha atenção e fez um breve aceno de cabeça. — Tenha
uma boa noite.
Então ele se foi, a porta fechada atrás dele e tudo.
Balancei a cabeça enquanto olhava ao redor da casa. O que
diabos aconteceu nos últimos quinze minutos?
Josie
— Oi. Vocês entregam?
O homem de cabelos grisalhos usando um crachá de Sam
sorriu. — Claro que sim. Para onde isso vai?
— Cerca de um quilômetro e meio de distância, na Rosewood
Lane.
— Não há problema nenhum. Talvez eu consiga colocar você na
agenda para esta tarde, se quiser.
— Ah, isso seria ótimo. Muito obrigada.
— Você sabe o que deseja que seja entregue?
— Eu tenho uma lista, a maior parte tábuas e ferragens, mas
pensei em dar uma volta para ver se há algo que eu possa ter
esquecido.
Ele assentiu. — Você não precisa ter pressa. O meu nome é
Sam. Entro no intervalo em cerca de meia hora, mas vou procurar
você antes de ir para ver se posso ajudar.
Bem, esse era o tipo de hospitalidade que eu esperava quando
cheguei em Laurel Lake, não a recepção que recebi do cara mal-
humorado da casa ao lado. Pelo menos eu não o via há dois dias.
Eu fui até lá ontem para dizer a ele que havia encomendado sua
caixa de correio substituta, mas não havia ninguém em casa. À luz
do dia, pude dar uma olhada na casa dele. Floreiras, lindas
cortinas, uma guirlanda na porta da frente – isso me fez pensar se
havia uma Sra. Bunyan. Eu não poderia imaginá-lo decorando tão
bem.
Enquanto eu subia e descia pelos corredores da loja de
materiais de construção, meu celular tocou no bolso. Ao pegá-lo,
fiquei tensa, esperando ver o nome de Noah na tela mais uma vez.
Para minha alegria, era Nilda – a mulher que eu desejava que fosse
minha mãe. Meus ombros relaxaram enquanto deslizava para
responder.
— Ei, Nilda!
— Olá, querida. Como vai você?
— Estou bem.
— Como é viver na Cidade Mais Amigável da América?
— Bem, tem sido interessante até agora. O lago é lindo, tão
sereno e tranquilo. Só existem casas do meu lado. O outro lado é
uma terra estadual protegida, então quando você se afasta, parece
que está no deserto. Tudo o que você vê é um lago gigante e árvores
grandes e antigas.
— Isso soa como o paraíso.
— E é. O exterior de qualquer maneira. O interior... nem tanto.
A casa do papai estava aparentemente ocupada por uma
colecionadora e o lugar está praticamente desmoronando. Passei
ontem enchendo uma lixeira e ainda não me livrei de todos os
jornais e fitas VHS.
— Oh, não. Você vai ficar em outro lugar?
Eu provavelmente deveria ter me mudado devido às condições
em que a casa estava, mas não queria que Nilda se preocupasse.
— É habitável. Só um pouco mais de trabalho do que eu esperava.
— É uma coisa boa que minha garota seja a trabalhadora mais
esforçada que conheço.
Eu sorri. — Como você está se sentindo? Você foi ao médico por
causa daquela dor nas costas?
— Eu estou trabalhando nisso.
— Você disse a mesma coisa sobre a dor na lateral do corpo há
alguns anos, mas a única vez que realmente foi consultar um
médico foi quando eles a levaram para fora de casa em uma maca,
porque seu apêndice havia estourado. Preciso ligar para minha
mãe sobre você? — Não havia muitas coisas pelas quais a estimada
Dra. Melanie Preston se interessasse, mas ela adorava intimidar
as pessoas para que procurassem cuidados de saúde adequados.
Nilda suspirou. — Vou marcar uma consulta em breve.
Prometo. Mas falando na Dra. Preston... você conversou com sua
mãe desde que recebeu alta?
— Ela me deixou uma mensagem de voz, mas ainda não liguei
de volta.
— Tenho certeza que ela está preocupada.
Eu zombei. — Se ela estivesse preocupada com meu estado, ela
poderia ter vindo me visitar.
Nilda não disse nada. Nos vinte e cinco anos que a conheço, ela
nunca tinha falado mal da minha mãe, mesmo quando ela
claramente merecia. E não foi só porque minha mãe era sua
empregadora, e ela era. Duvidava que Nilda alguma vez tivesse
falado merda de alguém. Ela era a humana mais gentil e calorosa
do planeta. Eu devia muito a ela.
— Conte-me sobre o povo de Laurel Lake — disse Nilda. — Eles
são dignos do status de mais amigáveis da América?
Eu poderia pensar em uma pessoa que não representava o
título que Laurel Lake carregava nos últimos dezessete anos
consecutivos. Então, novamente, pensei nele com muita
frequência últimas quarenta e oito horas. Já era hora de esquecer
completamente o Sr. Mal-humorado. Eu não deixaria um ovo
estragado arruinar a pequena cidade com a qual fantasiei durante
a maior parte da minha vida.
— Ainda não conheci muita gente — disse a Nilda. — Mas o
cara da loja de materiais de construção é muito gentil, e a senhora
da cafeteria me deu uma xícara de graça ontem, quando contei a
ela que era nova na cidade.
Nilda e eu conversamos durante os quinze minutos seguintes,
enquanto eu vagava pelas seções de fornecimento elétrico e
aquecimento, pegando vários itens nos quais não havia pensado
quando fiz minha lista de compras. Acabei contando a ela sobre
meu vizinho, embora tivesse dito a mim mesma que iria tirá-lo da
cabeça. Antes de desligarmos, lembrei-a de marcar uma consulta
médica, mas tinha certeza de que teria que ligar para minha mãe
e envolvê-la em alguns dias. Na verdade, não duvidaria que Nilda
não ligaria para o médico só para ser forçada a ligar para Melanie.
Nunca entendi por que ela queria tanto que eu tivesse um
relacionamento com minha mãe, mas sabia que ela tinha boas
intenções. Depois que desligamos, fui procurar Sam.
— Estou pronta para agendar a entrega — falei, estendendo
minha lista.
Sam leu atentamente. — Nossos caras só estão autorizados a
entregar na sua garagem. A menos que você esteja planejando usar
gesso e madeira imediatamente, você pode querer algumas lonas.
Eles estão prevendo um pouco de chuva na previsão para os
próximos dias.
— Ah, é bom saber. Você pode adicionar isso à minha entrega,
por favor?
Sam piscou. — É para já. E vou arranjar para você George como
motorista de entrega. Se você precisar de alguma coisa
transportada, ele é bom nisso. Alguns caras são preguiçosos e se
escondem atrás das regras.
— Obrigada.
Ele pegou uma prancheta e examinou alguns papéis. — Posso
entregar isso para você entre uma e quatro horas de hoje. Se por
algum motivo você não estiver em casa, eles empilharão tudo no
meio da garagem.
— Ok. Mas com certeza estarei em casa. Eu também tenho uma
cama chegando. — Balancei minha cabeça. — Pensei que poderia
sobreviver em um colchão inflável. Mas aparentemente minhas
costas perceberam que não sou mais uma adolescente.
Sam sorriu. — Você e eu.
Horas depois, coloquei meus AirPods enquanto assistia a um
vídeo no YouTube sobre como pendurar gesso quando a mesa da
cozinha começou a tremer. Tirei um fone de ouvido e olhei em
volta. Mas não consegui descobrir o que causou isso. Até que fez
bang. Bang. Bang. Eu pulei. Jesus. Deveria ser o entregador, mas
a batida foi um pouco agressiva.
Contudo, a hostilidade fez sentido quando abri a porta da frente
e encontrei Paul Bunyan do outro lado. Seus lábios formavam uma
linha sombria. Decidi responder com uma saudação igualmente
exagerada, mas a minha foi feliz.
Sorri de orelha a orelha, colocando todos os meus dentes
brancos perolados à mostra. — Olá, vizinho. É maravilhoso ver
você.
Ele grunhiu uma palavra que não consegui entender.
— O que é isso? — Coloquei minha mão em concha na orelha.
— Eu não entendi o que você disse.
Ele fez uma careta. — Você está esperando uma entrega?
— Estou. Por quê?
— Porque eles jogaram suas coisas na minha garagem.
— O quê? — Minha boca abriu. — Eles não poderiam ter feito
isso. — Eu me espremi ao redor do homem do tamanho de um
carvalho que parecia gostar de ficar parado nas portas e espiei a
entrada de sua garagem. Com certeza, minha entrega estava lá. E
o caminhão não estava em lugar nenhum.
— Não sei por que eles fizeram isso. Esperei a tarde toda que
essas coisas chegassem.
O Sr. Bunyan mostrou uma fatura amarela em cópia carbono.
— Eu tenho uma ideia.
— O que você está falando? — Peguei o papel e procurei o
endereço. — Quarenta e quatro, Rosewood Lane. Eles têm o
endereço certo.
— Eles têm, hein?
— Sim.
Ele ergueu o queixo, apontando para trás de mim, para o outro
lado da cozinha. Fiquei confusa com o que ele poderia estar
mostrando em minha casa para provar seu ponto de vista. Embora
meus olhos se arregalaram quando percebi.
Sua caixa de correio amassada.
Sua caixa de correio amassada com o número pintado na lateral:
quarenta e quatro.
Ah, merda.
— Eu... — Meus ombros caíram. — Estraguei tudo.
— Você acha?
— Passei por aquela caixa de correio tantas vezes nos últimos
dois dias que acho que o número ficou inconscientemente gravado
em meu cérebro. — Balancei a cabeça. — Eu cuidarei disso.
— Como?
— Só não se preocupe com isso. Tudo desaparecerá em uma
hora. Ok?
Sua resposta foi um aceno de cabeça. O Sr. Happy2 virou-se e
começou a caminhar pela minha garagem. Mas então pensei em
algo.
— Ei, Paul?
Ele parou, mas não se virou. — Era para ser eu?
Fechei os olhos. Merda. — Desculpe. Eu, hum... esse não é o
seu nome?
— Não, não é.
— Qual é o seu nome?
— Fox.
— Fox? Seu nome completo é Foxton ou Foxwell ou algo assim?
— Apenas Fox.
— Ok, bem, Apenas Fox... Por acaso você deu uma gorjeta ao
motorista? Porque não foi culpa dele eu ter dado o número da casa
errada e não quero enganá-lo.
Paul – ou melhor, Fox – ainda estava de costas para mim. Só
agora ele se virou e balançou a cabeça. — Se eu os tivesse visto
descarregando na minha garagem, não teria dito que estavam na
casa errada?
— Oh. — Meu rosto caiu. — Desculpe, eu não estava pensando.
— Chocante...
Meus olhos se arregalaram. — Você não precisa ser tão rude!
Cometi um erro inocente.
2
Feliz.
Fox continuou andando. Então eu fiz a coisa madura e mostrei
a língua nas costas dele.
— Eu vi isso — disse ele, já a meio caminho de volta para sua
propriedade.
Sério? Que diabos? O idiota tinha olhos na nuca? Aposto que
eram verde-jade e delineados com cílios pretos escuros também,
como aqueles acima de sua carranca perpétua. Mesmo assim,
peguei meus tênis e os calcei antes de ir para a porta ao lado
arrastar minha entrega para onde ela pertencia.
Eu não tinha percebido o quanto havia pedido até olhar de
perto. Havia muita porcaria empilhada em cima de um grande
palete de madeira.
— Ótimo — murmurei enquanto curvava-me para levantar o
primeiro pedaço de gesso. Infelizmente, não só julguei mal a
quantidade do que pedi, como também julguei mal o peso. Um
único pedaço de gesso devia pesar cerca de vinte quilos, sem
mencionar que era muito mais alto do que eu. Minha débil
tentativa de carregá-lo foi uma piada, então rapidamente recorri a
segurar uma das pontas e arrastá-lo pelo gramado. Eu tinha
percorrido cerca de três metros quando minha carga de repente
ficou leve. O Sr. Amigável ergueu o gesso no ar, acima da cabeça,
e começou a levá-lo para a casa ao lado como se estivesse
carregando cinco quilos. Tive que correr para acompanhar seus
passos gigantescos.
— Eu posso fazer isso — falei.
— Onde você quer isso?
— Umm... acho que na entrada. A garagem está cheia de coisas
que o inquilino deixou para trás.
— Eles estão dizendo que vai chover.
— Eu tenho uma lona.
— Você precisa de um palete ou a água vai bater no fundo.
— Oh. Há um no final do material que eles entregaram.
— E isso vai me ajudar agora... como?
Bom ponto. Franzi a testa e olhei em volta, como se um palete
de madeira fosse aparecer magicamente no meu gramado.
— Minha caminhonete deve estar destrancada — Fox
resmungou. — O controle remoto para abrir minha garagem está
no visor. Há alguns paletes de madeira encostados na parede do
lado esquerdo.
— Ok. — Corri até a casa ao lado enquanto meu vizinho mal-
humorado esperava com o gesso. Não era de surpreender que sua
garagem fosse imaculada e os paletes estivessem exatamente onde
ele havia dito. Corri de volta e coloquei o palete no meio da entrada.
Fox colocou o gesso em cima e voltou para a pilha em sua
garagem.
— Pelo menos deixe-me ajudá-lo. — Eu corri atrás dele. — Será
mais fácil se carregarmos o gesso juntos.
Ele balançou a cabeça sem olhar em minha direção. — Não,
não será.
Desta vez, quando se abaixou para pegar um pedaço de gesso,
pegou duas chapas. Recusei-me a deixá-lo fazer todo o trabalho,
então peguei a próxima e comecei a arrastá-la pela grama. Quando
cheguei à minha garagem, Fox já havia feito duas viagens
carregando dois pedaços de gesso de uma só vez. O homem gigante
nem sequer suou.
Quinze minutos depois, a grande pilha foi realocada para o seu
devido lugar. Fox apontou para a casa.
— Você já contratou um empreiteiro? — ele perguntou.
— Não. Eu vou fazer isso sozinha.
— Você tem muita experiência em pendurar gesso?
— Não, mas estou assistindo vídeos no YouTube para aprender.
Não parece tão difícil.
— Certo. YouTube. — Ele sorriu. — Isso parece um plano
sólido.
Meus olhos se estreitaram. — Qual é o seu maldito problema?
— Além de uma caixa de correio quebrada e um monte de
merda que eu não mandei colocar na minha garagem quando
estacionei?
Revirei os olhos. — Você é sempre tão negativo Sweet3?
— Realista, não negativo.
— Você não me conhece. No entanto, você tem certeza de que
não sou capaz de fazer os reparos sozinha?
— Para pendurar gesso cartonado, você precisa ser capaz de
segurar o gesso cartonado.
3
Docinho.
Eu estreitei meus olhos. — Você sabe, as pessoas nesta cidade
deveriam ser amigáveis.
— E bons vizinhos devem ser vistos, não ouvidos. Nem todos
conseguimos o que queremos.
— Esse ditado é sobre crianças, não sobre vizinhos. — Limpei
uma gota de suor da minha testa, notando que ainda não havia
uma pequena gota na testa estúpida de Fox. — E por que diabos
você não está suando depois de carregar tudo isso?
— Eu me exercito.
Meus braços se agitaram no ar. — Você está insinuando que
eu não me exercito?
Os olhos de Fox percorreram meu corpo antes de se fixarem
nos meus. — Não disse isso.
A maneira como meu corpo reagiu me tirou do jogo. — Tanto
faz — eu bufei. — Obrigada por me ajudar a carregar tudo.
— De nada. — Ele fez uma pausa. — De novo.
Isso novamente arruinou minha tentativa de uma troca cortês.
Claramente este homem não era capaz de sutilezas. Abri um
sorriso obviamente falso. — Tenha um bom dia.
Como parecia ser seu movimento característico, Fox virou-se e
foi embora sem dizer uma palavra. Quem faz isso? Se vira sem
levantar o queixo ou acenar? Alguém que não preciso na minha
vida, ele.
Olhando para meu vizinho caminhando de volta pela grama,
balancei a cabeça. O cara realmente era um idiota. Meus olhos
caíram para seu jeans justo. Mas caramba... um idiota com uma
bunda linda.
Fox
— Jesus Cristo — murmurei para mim mesmo. — O que diabos
ela está fazendo agora?
Eu nunca deveria ter olhado para a esquerda enquanto
passava, nunca deveria ter deixado a curiosidade tomar conta de
mim. Mas eu deixei. E parei a maldita caminhonete também,
observando pela grande janela saliente na frente da casa da minha
nova vizinha maluca. A loirinha fogosa estava equilibrando-se em
uma cadeira, que estava em cima de outra cadeira, enquanto fazia
alguma coisa com a luz da cozinha. Eu deveria ter tirado meu
celular do bolso e discado 911, só para estar pronto para o que
estava a cerca de cinco segundos de acontecer.
Ela cambaleou enquanto se espreguiçava, e meu coração fez o
mesmo. Abri a porta da minha caminhonete, prestes a correr,
entrar na casa dela e a remover fisicamente da configuração
instável. Mas então a luz com a qual ela estava se atrapalhando
acendeu e ela ergueu o punho no ar. Ela desceu e eu soltei um
suspiro, fechei a porta e acelerei antes que pudesse testemunhar
qualquer outra merda estúpida acontecendo ali.
No caminho para o canteiro de obras, fiz minha parada habitual
no Rita Coffee Beanery. Costumava ser chamado apenas de Rita,
mas ela adicionou o Beanery, que soava yuppie, quando fez uma
reforma no lugar alguns anos atrás. Os jovens do Airbnb que
vieram em busca de algo que não existia por causa do estúpido
nome de A Cidade Mais Amigável da América estavam mais do que
dispostos a pagar cinquenta dólares extras para comprar café caro
em uma cafeteria.
— Bom dia. — Eu balancei a cabeça.
— Como você está, querido? — Rita disse. — Você quer o seu
normal?
— Sim.
— Um café preto e uma torrada integral chata, chegando. —
Ela apertou alguns botões na caixa registradora. — Quando
poderei convencê-lo a mudar as coisas? Meus power shakes são
deliciosos. Eu sou como uma mágica. Você nem vai sentir o gosto
da couve no meu smoothie energético de pepino e maçã.
— Não gosto de mudanças.
Ela desapareceu e voltou com a minha habitual torrada
embrulhada em papel alumínio e café grande. — Ouvi dizer que
você tem um novo vizinho. Talvez você possa fazer um amigo.
Esta cidade deveria ter sido nomeada a mais intrometida da
América, não a mais amigável. Balancei a cabeça. — Estou tão
interessado em novos amigos quanto eu estou em seu smoothie
poderoso. — Estendi minha mão. — Agora posso tomar meu café
da manhã?
Rita grunhiu. — Você tem sorte de sua mãe ser tão doce e você
ser tão bonito, ou ninguém seria legal com você, Fox Cassidy.
Ofereci um breve aceno de cabeça e coloquei uma nota de cinco
no balcão. — Você também tenha um bom dia, Rita.
No canteiro de obras, encontrei minha equipe heterogênea
dentro do trailer com ar-condicionado. Apontei para meu capataz,
Porter, que estava sentado no canto da mesa do meu assistente, e
fiz uma careta. — Por que você está aqui em vez de fazer seu
trabalho lá fora?
Ele deu um sorriso arrogante que lhe rendia muita atenção,
mas não fazia nada para mim. — Ainda não são oito horas. Estou
contando à Opal sobre a futura Sra. Tobey. Saí para um encontro
ontem à noite. Estou apaixonado, digo a você.
Passei por ele e sentei-me à minha mesa. — Ainda estamos
saindo com enfermeiras?
Porter Tobey trabalhava para mim há três anos. No primeiro
ano ele estava namorando as professoras, namorando apenas
professoras do ensino fundamental, disse que elas eram maternais
e amorosas. No segundo ano ele passou para comissárias de bordo,
o que não era uma coisa fácil de fazer, considerando que nossa
pequena cidade ficava a quarenta e cinco minutos do aeroporto
mais próximo. Mas ele era dedicado e passava muito tempo nos
bares do aeroporto, com a mala vazia para parecer um viajante e
tudo. Ele gostava das comissárias de bordo porque elas não eram
amorosas – disse que achava a independência delas revigorante.
Agora eram enfermeiras. Havia mais do que um punhado delas em
Laurel Lake, e perguntei-me se a mudança tinha algo a ver com a
longa viagem até o aeroporto e com a disparada dos preços da
gasolina.
— As enfermeiras são tão calorosas e atenciosas. — Ele
suspirou.
— E as senhoras do escritório de empregos? Como elas são?
Porque é lá que você vai passar seu tempo... — apontei para a porta
com dois dedos — ... se você não sair do meu escritório.
Porter levantou-se. — Sabe, minha enfermeira tem muitas
amigas. Talvez eu possa pedir a ela para apresentar uma para você
e possamos sair juntos. Pode ajudar a livrar-se do mau humor que
você tem sentido ultimamente, você sabe, nos últimos três anos.
— Fora!
Porter saiu correndo do trailer, deixando-me apenas com Opal.
Ela balançou a cabeça. — Você deveria ser mais gentil com aquele
garoto. Ele admira você.
— Ele tem vinte e sete anos, apenas seis anos mais novo que
eu. Então ele não é um menino. E ele me admira porque tenho
vinte centímetros a mais que ele.
— Ele perdeu o pai ainda muito jovem. Você é um modelo.
— Então estou ajudando ensinando-lhe uma sólida ética de
trabalho. — Apontei para a impressora. — Falando em trabalho,
acha que pode imprimir as especificações para o trabalho de
Franklin?
Ela olhou para o seu relógio. — Depois que eu ligar para minha
mãe. Você pode intimidar Porter para começar antes de seu turno,
mas você não me assusta.
Tive o prazer de ouvir Opal discutir os joanetes da mãe durante
os dez minutos seguintes. Às oito horas em ponto, ela desligou,
digitou algumas teclas no computador e o papel começou a cuspir
da impressora. Nossas mesas estavam a uns três metros de
distância, no máximo. Opal trouxe a pilha até aqui. — Bom dia,
chefe. Aqui estão as especificações do Franklin.
— Obrigado — eu resmunguei.
Li o que ela me entregou, mas Opal não se mexeu. Em vez disso,
ela esperou que eu olhasse para cima novamente.
Suspirei e baixei os papéis. — Sim?
Ela sorriu. — Ouvi dizer que você tem uma nova vizinha. Seu
nome é Josie.
— Jesus Cristo. Existe alguém que não sabe?
— Reuben no posto de gasolina disse que ela é muito bonita.
Cabelo loiro, olhos azuis claros e uma pele que me fez pensar
se era tão macia quanto parecia. Mas eu não ia dar mais nada para
a fofoca da cidade compartilhando minhas opiniões. Dei de
ombros. — Não percebi.
— Ela é uma cientista, você sabe.
— Tem certeza de que conheceu a vizinha certa?
— Mora na casa da Sra. Wollman, a velha acumuladora.
Minhas sobrancelhas se apertaram. — Como você sabia que a
Sra. Wollman era uma acumuladora?
— Todo mundo na cidade sabia disso. — Os olhos de Opal
percorreram meu rosto. — Exceto você, aparentemente. De
qualquer forma, a garota bonita é médica – não do tipo que você
procura quando não está se sentindo bem ou quebra um osso, mas
uma daquelas do tipo pesquisadora. Ela tem um grande emprego,
desenvolve novos medicamentos para alguma empresa
farmacêutica.
Bem, eu esperava que ela fosse melhor fazendo pílulas do que
gerenciando um projeto de construção. — Bom para ela.
— E Frannie, do correio, disse que sua correspondência será
encaminhada por sessenta dias, não permanentemente.
— O governo não tem regras de privacidade que Frannie deveria
seguir? Ou ela abre contas e cartas das pessoas e espalha fofocas
sobre isso também?
— Ela também recebe cartões de Natal de Josie – Frannie, não
o correio. Embora obviamente deva passar por esse canal para
chegar até Frannie.
Minhas sobrancelhas juntaram-se. — Elas se conhecem?
— Não. A primeira vez que Frannie a encontrou foi quando ela
foi pegar a correspondência encaminhada há alguns dias.
— Mesmo assim ela recebe cartões de Natal dela?
— Não apenas de Natal, mas de Páscoa e do Dia de Ação de
Graças também. Elas trocam cartões em todos os feriados.
— O que estou perdendo aqui? Elas não se conhecem, mas
trocam cartões de Natal?
— Sim.
— Como isso funciona?
— Eu mesmo não entendo muito bem. Mas Frannie disse que
elas começaram a trocar cartões há uma década. Aparentemente,
algumas centenas passam pelos correios com o mesmo endereço
do remetente algumas vezes por ano. A Dra. Josie envia muitos
cartões para o povo de Laurel Lake.
Achei que Opal devia estar omitindo uma ou duas peças do
quebra-cabeça. A rede de fofocas tinha uma fissura em algum
lugar. De todo modo, eu tinha coisas para fazer de qualquer
maneira. — A que horas chega a entrega dos ladrilhos hoje?
Como sempre, Opal ignorou-me. — Rachael, no supermercado,
disse que Josie estocou muita comida. Aparentemente, ela não é
isenta de glúten e come muitos carboidratos.
Joguei os papéis em minhas mãos para o alto. — Sério? Que
porra é essa? Vocês todos se reúnem para uma reunião secreta
para discutir as idas e vindas nesta cidade? Você escondeu alguma
câmera em algum lugar para avisar quando alguém entra?
— Ao contrário de você, alguns de nós somos amigáveis e
gostamos de conhecer um pouco sobre as novas pessoas que
aparecem.
— Acho que é mais como se todos vocês estivessem discutindo
a vida de outras pessoas porque não têm a sua própria. — Movi
meus dedos para simular uma caminhada. — Agora, descubra a
que horas o ladrilho chegará.
Eram quase sete e meia quando parei a caminho de casa para
comprar algo para jantar. O Laurel Lake Inn era um restaurante
chique para os padrões desta cidade; você não comia lá vestido
com jeans empoeirados e botas de trabalho sujas como eu. Mas
eles faziam um lombo de porco com pesto embrulhado em bacon
que deixava-me salivando só de pensar nisso, então eu parava
para comprar comida uma vez por semana. Geralmente ligava para
fazer meu pedido, mas tinha esquecido meu celular no escritório e
vim direto do canteiro de obras.
— Ei, Syl. Posso pedir carne de porco com purê de batata, por
favor?
— É pra já, Fox. Estamos um pouco ocupados esta noite. Mas
verei se mais alguém pediu carne de porco recentemente e retirarei
o pedido para você. Eles podem esperar mais alguns minutos. —
Ela piscou.
— Obrigado. Aprecio isso.
Sylvia desapareceu na cozinha, então resolvi entrar no bar e
tomar uma cerveja gelada. Dei três passos para dentro antes de
olhar para uma certa loira. Josie era uma motorista de merda e
não conseguia carregar mais de cinco quilos, mas, caramba, era
difícil desviar o olhar dela. Ela franziu a testa quando me viu, o
que me fez sorrir.
O restaurante podia estar lotado, mas havia apenas duas
outras pessoas no bar além de mim e Josie. Ela tinha um prato de
comida à sua frente e o que parecia ser uma taça de vinho. Eu me
aproximei e pedi uma cerveja, tentando o meu melhor para não
olhar, mas isso não durou muito. Meus olhos fixaram-se na mão
dela na taça, no dedo anelar esquerdo, em particular. Estava vazio.
Eu notei isso outro dia também.
Josie falou sem erguer os olhos. — Ouvi um boato de que você
costumava jogar na NHL. Isso é verdade?
— De quem você ouviu isso?
— A simpática senhora do correio.
Fazia sentido. Era assim que Frannie funcionava. Ela faria você
falar, oferecendo informações e, em seguida, você revelaria
pedaços de sua vida sem nem perceber. Eu aprendi isso há muito
tempo.
— A simpática senhora do correio é uma intrometida que se
mete na vida de todo mundo.
— Então isso significa que você não jogou hóquei?
— Eu joguei.
Ela olhou e sorriu. — Eu sei. Pesquisei você no Google depois
que ela mencionou isso.
— Por que você me perguntou se já sabia a resposta?
Ela encolheu os ombros. — Você era bom?
— O Google não contou isso?
— O artigo que li dizia que você estava na equipe olímpica.
— Você conhece muitos atletas profissionais de merda que
fazem parte de uma equipe olímpica?
— Não conheço nenhum atleta profissional de merda.
Eu tive que abrir um sorriso com isso. Ela era uma esperta. E
bonita. Mas ela também parecia dar muito trabalho. E essa era a
combinação perfeita que me mantinha longe atualmente. Então
tomei um gole de cerveja e fiquei quieto.
— Você está pedindo comida ou veio apenas tomar aquela
cerveja? — ela perguntou alguns minutos depois.
— Eu vim buscar comida para viagem.
— A comida é muito boa aqui.
Eu balancei a cabeça. — O melhor que Laurel Lake tem a
oferecer. Acredite em mim, eu como muita comida para viagem.
— Você não gosta de cozinhar?
— Odeio limpar quando a comida está pronta. É mais fácil
pegar algo no caminho para casa.
— Adoro cozinhar. Acho isso relaxante. Mas o forno da minha
casa está quebrado. Estava cheio de jornais de oito anos atrás,
então não creio que a Sra. Wollman também cozinhasse muito
bem. Vou receber um novo amanhã.
Sylvia entrou e colocou a mão no meu ombro. — A comida está
pronta, Fox.
— Obrigado. Estou indo.
Eu teria gostado de ficar por aqui, descobrir o que mais a boa
médica gostava de fazer, mas isso significava que definitivamente
era hora de ir. Tirando uma nota de dez do bolso, joguei-a no
balcão e acenei para o barman.
— Boa refeição — disse Josie.
— Você também. A que horas devo esperar o entregador
amanhã?
Seu narizinho fofo enrugou-se. — Entregador?
— O novo fogão. A menos que você tenha conseguido fornecer
o endereço correto desta vez.
Ela semicerrou os olhos para mim. — Engraçado. Mas acho que
você será poupado de ter que carregar um eletrodoméstico.
Dei mais uma olhada em seus olhos amendoados e sua boca
rosada e carnuda e pensei comigo mesmo: Que vergonha. Eu
balancei a cabeça. — Tenha uma boa noite, doutora.
— Você também. Espere. Como você sabia que eu sou médica?
Eu pisquei. — O trem dos boatos circula em duas direções.
Josie
Eu me tornei frequentadora assídua da Lowell, a pequena, mas
bem-abastecida loja de materiais de construção da cidade. Sam
sempre se lembrava do meu nome e perguntava como estava a
construção, e o caixa me deu um cupom de desconto de vinte por
cento ontem. Hoje era sábado, então estava mais movimentado do
que o normal, embora estivesse chovendo, e as pessoas que faziam
compras pareciam mais proprietários de casas do que os
empreiteiros que estiveram por perto durante toda a semana.
Esperei na fila, navegando no meu telefone, até que alguém me
deu um tapinha no ombro.
— Com licença. Por acaso você não estaria hospedada na
Rosewood Lane, não é?
Eu me virei e encontrei uma mulher que provavelmente tinha
sessenta e poucos anos, com maquiagem brilhante e um conjunto
curto rosa choque ainda mais brilhante.
— Sim. Como você sabia disso?
A mulher sorriu. — Palpite de sorte. Minha amiga descreveu
você e, bem, é uma cidade pequena, então não é muito difícil
identificar as novas pessoas. — Ela estendeu a mão. — Eu sou
Opal Rumsey. Acredito que meu chefe é seu vizinho?
— Fox?
Ela assentiu. — Mas não use isso contra mim. Nem todo mundo
que trabalha na Cassidy Construction é tão mal-humorado quanto
o chefe.
Eu ri. — Prazer em conhecê-la, Opal. Eu sou Josie.
— Há rumores de que você é a dona do lugar onde está
hospedada.
— Eu sou. Herdei a casa do meu pai quando ele faleceu.
— Sinto muito pela sua perda.
— Obrigada. Foi há muito tempo.
Opal assentiu. — A maioria de nós pensava que a Sra. Wollman
era a proprietária, ela estava lá há muito tempo.
— Na verdade, meus pais cresceram em Laurel Lake.
— Sério? Quais são os nomes deles?
— Henry e Melanie Preston. Na verdade, o nome de solteira da
minha mãe era Melanie Langone. Meu pai faria setenta anos este
ano. Minha mãe tem sessenta e oito anos. Meus pais tiveram-me
mais tarde na vida.
— Não posso dizer que o nome seja familiar. — Ela enrolou uma
mecha de cabelo e piscou. — Então, novamente, sou muito mais
jovem que seus pais. Eles estudaram aqui na cidade?
— Meu pai nasceu e foi criado em Laurel Lake. A família da
minha mãe mudou-se para cá depois que ela se formou no ensino
médio. Mas ela tinha um irmão mais novo.
— Então você sabe quem provavelmente o conhece?
— Quem?
— Bernadette e Bettina Macon. Irmãs gêmeas. Nascidas e
criadas aqui em Laurel Lake. Elas completaram sessenta e nove
anos na semana passada. Bernadette era professora na cidade
antes de se aposentar, então ela conhece ainda mais gente do que
eu.
— Ah, conheço Bettina Macon. — Eu balancei minha cabeça.
— Bem, não a conheço, conheço, mas trocamos cartões de Natal.
— Ela também? Estou começando a me sentir excluída. Minha
amiga Frannie disse que vocês trocam cartões. Elas eram amigas
da sua família ou algo assim?
Eu sorri. — Não. É uma longa história, mas envio muitos
cartões de Natal.
— Posso ajudar a próxima pessoa da fila? — o caixa gritou.
Eu estava conversando e nem percebi que era a minha vez. Fui
até o balcão e Opal seguiu-me logo atrás.
— Bem, vamos acabar aqui em dois tempos — disse Opal. —
Mas eu gostaria de ouvir sua longa história. O que você acha de
almoçarmos? A irmã mais nova de Bernadette e Bettina, Rita, é
dona da cafeteria da cidade, e Bernadette trabalha no balcão aos
sábados para que Rita possa passar um tempo com seus bebês à
tarde. A loja vende esses sanduíches que são feitos na hora
algumas vezes ao dia. Absolutamente deliciosos. Gosto deles
porque são pequenos, então não preciso escolher apenas um. De
qualquer forma, posso apresentá-la a Bernadette, podemos ver se
ela se lembra do seu pai e você pode me contar a história do seu
cartão de Natal.
— Hum... claro. — Dei de ombros. — Por que não? Isso parece
divertido.
Minha nova amiga Opal dirigia um Volkswagen amarelo
brilhante. Uma chuva fraca começou a cair quando fomos para o
estacionamento. Pegamos carros separados, mas segui atrás dela
até o local de Rita. No caminho, não pude deixar de pensar que
isso era algo que eu nunca faria em Nova York: concordar em
almoçar com um estranho. Estar aqui me fez baixar a guarda,
aceitando uma pessoa amigável apenas como sendo amigável, sem
segundas intenções. A vibração era tão diferente.
Quando chegamos na loja da Rita, a moça do balcão disse que
Bernadette estava fazendo um intervalo e voltaria em breve. Opal
e eu pedimos cafés gelados e quatro tipos diferentes de
sanduíches. Sentamo-nos no fundo da loja em um confortável sofá
de couro e uma cadeira enorme combinando. O lugar lembrou-me
algo saído de Friends. Quente e aconchegante. Um lugar onde você
encontraria sua turma para contar as histórias.
— Sou toda ouvidos. — Opal tomou um gole de café e pegou
um dos sanduíches. — Conte-me a história do seu cartão de Natal,
e se a sua história for boa e tivermos tempo antes que Bernadette
volte, contarei a você sobre a vez em que ela bebeu demais, caiu e
ficou com o salto alto preso na sua calcinha quando se levantou.
Eu ri. — Talvez eu precise reforçar um pouco minha história
para ter certeza de ouvir a sua.
Os olhos de Opal brilharam. — Algo me diz que sua história
será mais que suficiente. Vá em frente, agora. Vamos ouvir por que
todos nesta cidade, exceto eu, recebem um cartão de Natal seu.
— Bem, eu cresci nos subúrbios de Nova Jersey. Quando era
pequena, meu pai costumava contar-me histórias incríveis sobre
sua infância em Laurel Lake. Dois anos antes de sua morte foi a
primeira vez que foi eleita A Cidade Mais Amigável da América pela
revista People. Ele estava tão orgulhoso que contou a todos que
quisessem ouvir. Laurel Lake tornou-se um lugar mítico e mágico
para mim. Ele sempre prometeu que iríamos visitá-la, mas minha
mãe é uma neurocirurgiã muito bem-sucedida e trabalha muito.
Tínhamos planejado vir algumas vezes, mas sempre aparecia
alguma coisa para ela e tínhamos que cancelar. Meu pai morreu
inesperadamente quando eu tinha treze anos – uma parada
cardíaca durante o sono. Nunca havíamos pensado que isso
aconteceria.
Opal cobriu o coração com a mão. — Ah, isso é terrível. Uma
idade tão jovem para perder seu pai.
— Foi definitivamente difícil. Meu pai era meu melhor amigo.
Nunca fui muito próxima da minha mãe. Meus pais formavam um
casal muito estranho – meu pai ria muito, contava histórias
fantásticas e tinha um jeito afetuoso e amoroso. Minha mãe, por
outro lado, é um pouco fria – meio desapegada e muito
profissional, até comigo. Sua carreira sempre vinha em primeiro
lugar e ela não ficava muito em casa. Para ser honesta, nunca
entendi realmente a relação deles. Mas por alguma razão, meu pai
estava maravilhado com minha mãe. Ele adorava o chão em que
ela pisava. — Fiz uma pausa e tomei um gole de meu café gelado.
— De qualquer forma, de volta às cartas. Depois que meu pai
morreu, comecei a passar muito tempo na casa da minha melhor
amiga Chloe. Chloe era uma de sete filhos, e eles não tinham muito
dinheiro, mas todos adoravam o Natal. Todos os anos, no final de
novembro, eles decoravam suas casas com cartões de Natal do ano
anterior pendurados em barbantes. Eles os penduravam em todas
as paredes da cozinha e da sala. Minha casa era decorada para as
festas por uma equipe profissional de decoração que chegava e
deixava tudo perfeito. Certa vez perguntei para minha mãe se eu
poderia colocar alguns enfeites caseiros na árvore, e ela disse para
colocar na arvorezinha do quarto da Nilda. Nilda era nossa
governanta e também ficava de olho em mim, porque minha mãe
raramente estava em casa.
Mordi um sanduíche antes de continuar. — Cinco anos mais
tarde, quando fiz dezoito anos, fui para a faculdade e consegui meu
próprio estúdio em Nova York. Mal podia esperar para decorar para
o Natal daquele primeiro ano – do meu jeito, não do jeito da minha
mãe. Então peguei cinco caixas de cartões de Natal, cinquenta no
total, e os enviei para todos os meus amigos. Acho que recebi um
de volta. Em retrospectiva, a maioria dos jovens de dezoito anos
está falida demais para enviar cartões ou muito envolvida com a
vida para perder tempo fazendo isso. Mas isso me deixou triste,
porque eu queria pendurar os cartões em um barbante como a
família de Chloe fazia. No ano seguinte, tive a ideia de enviar
cartões para estranhos e pedir que devolvessem. Na manhã
seguinte ao Dia de Ação de Graças, tirei uma foto minha sorrindo
em frente à minha árvore de Natal. Escrevi à mão uma mensagem
em cada cartão dizendo que queria colecionar cartões para decorar
minha casa e esperava que me enviassem um. Eu tinha a lista
telefônica de Laurel Lake em uma caixa com as coisas do meu pai,
então decidi enviar os cartões para as pessoas que moravam aqui.
Achei que se eles fossem as pessoas mais amigáveis da América,
eu teria mais chances de receber um cartão em troca. Naquele ano,
enviei cinquenta cartões e recebi quarenta e um de volta. Ganhei
um de meus amigos no ano anterior, mas quarenta e um de
completos estranhos. Pendurei-os com barbantes em todas as
paredes do meu pequeno apartamento.
— Eu amo isso! — Opal disse. — O pessoal do seu pai cuidou
de você depois que ele não pôde mais.
— Nunca pensei nisso dessa forma, mas sim, acho que sim. —
Bebi um pouco. — Eu ainda estava com os cartões pendurados em
março, então resolvi enviar cartões de Páscoa para as quarenta e
uma pessoas que me enviaram cartões de Natal. Nas festas de fim
de ano seguinte, enviei cinquenta novos cartões para pessoas
aleatórias daquela lista telefônica e quase o mesmo número
retribuiu. Ao longo dos anos, continuei enviando para os antigos e
acrescentando novos. Acho que recebo cerca de novecentos cartões
de Natal agora, e um pouco menos nos feriados menores, como o
Quatro de Julho. Vou em ordem alfabética na lista telefônica de
Laurel Lake. Estou com os da letra N agora. Alguns são devolvidos
porque a lista que estou usando está desatualizada, mas gosto de
enviá-los.
— Faz sentido porque não tive o prazer de receber um de você,
então. Meu sobrenome é Rumsey.
Sorri. — Eu meio que me tornei amiga por correspondência de
alguns moradores de Laurel Lake. Já troquei cartas nos cartões
com alguns. Eles contam-me o que está acontecendo em suas
vidas e eu faço o mesmo. Nunca conheci nenhum deles, mas sinto
que são velhos amigos.
— Isso é maravilhoso. Estou surpresa que você tenha
demorado tanto para visitá-los.
Suspirei. — Sim. Não deveria. Infelizmente, segui os passos da
minha mãe e passei muitos anos na escola e trabalhando demais.
— Ouvi dizer que é a Doutora Preston.
Eu balancei minha cabeça. — Dra. Preston é minha mãe. Eu
sou apenas Josie.
— Nós apenas nos conhecemos e já posso dizer que você está
longe de ser apenas Josie, querida.
— É gentil da sua parte dizer isso.
Opal terminou um dos sanduíches. — Então, o que finalmente
trouxe você a Laurel Lake agora?
Eu olhei para baixo. — Eu... tive uma crise de saúde mental e
pensei que seria melhor sair da cidade por um tempo.
— Perdoe minha ignorância, mas não tenho certeza do que isso
significa. Uma crise de saúde mental?
— Basicamente, tive um colapso nervoso. Tudo tem um termo
novo hoje em dia, não é?
Opal estendeu a mão e cobriu minha mão com a dela. — Sinto
muito. Você está se sentindo bem agora?
Sorri tristemente. — Eu estou. Passei um mês em uma unidade
de internação recebendo tratamento. Quando saí, fui para casa e
encontrei uma pilha de correspondência esperando por mim no
meu apartamento. Uma delas era uma carta do corretor de imóveis
que cobrava o aluguel da mulher que alugava a antiga casa do meu
pai. Dizia que a Sra. Wollman havia se mudado. Eu ainda não me
sentia pronta para voltar ao trabalho, então parecia a
oportunidade perfeita para sair da cidade e finalmente conhecer a
cidade que meu pai tanto amava.
Opal apertou minha mão. — Bem, você veio ao lugar certo.
Nosso lago tem poderes curativos.
— É realmente lindo. Há uma serenidade aqui que você não
encontra na cidade de Nova York.
Opal assentiu. — Posso fazer uma pergunta pessoal, Josie?
Eu ri. — Mais pessoal do que eu contar que recentemente
passei um tempo em uma ala psiquiátrica?
Ela sorriu. — Você é solteira?
Meus olhos caíram para minha mão esquerda. Estava muito
mais leve hoje em dia sem a pedra gigante que usei por quase um
ano. — Eu sou.
Ela inclinou-se mais perto, como se estivesse contando-me um
segredo. — Assim como seu vizinho, Fox Cassidy. Vocês dois
formariam um casal muito fofo.
— Ah, meu Deus. — Eu ri. — Fox e eu nos conhecemos. Não
acho que ele seja meu maior fã.
Ela me ignorou. — Eh. O que quer que ele tenha feito para lhe
dar essa ideia foi apenas Fox sendo Fox. O homem é um coco.
Casca dura por fora, mas macio e doce por dentro.
Minhas sobrancelhas se ergueram. — Fox? Suave e doce por
dentro?
Opal sorriu. — Eu sei. Difícil de acreditar, certo? Mas é a
verdade. Acredite em mim, trabalho para ele há muito tempo.
— O que é que Fox faz?
— Ele é um construtor, sobretudo comercial. Mas ele também
treina um time de hóquei – um time para pessoas com deficiência.
Muitas das crianças têm paralisia cerebral ou síndrome de Down.
Alguns competiram nas Olimpíadas Especiais e Paraolimpíadas. E
ele faz todo esse trabalho de graça. Sem contar às pessoas sobre
isso também, devo acrescentar.
— Uau! Sério?
— Sim. Fique por aqui por tempo suficiente e tenho certeza que
você conhecerá alguns deles. Nos finais de semana, às vezes o vejo
almoçando com os caras do time, ou ele sai correndo na rua com
um ou dois para quem está dando treino extra.
Huh. Eu nunca teria imaginado que o Sr. Mal-humorado fosse
tão generoso. Embora fizesse sentido pela forma como ele carregou
minhas malas, mesmo depois de eu ter destruído sua caixa de
correio. E a forma como ele moveu todo o meu gesso quando eu o
entreguei no endereço errado. Havia um cavalheiro enterrado
debaixo daquele exterior rabugento. Isso me lembrou de algo que
meu pai costumava dizer, algo que eu não pensava há muito
tempo. Os meninos falam. Um homem não precisa; ele age.
Poucos minutos depois, uma mulher mais velha vestindo uma
camisa polo preta com Rita’s Beanery bordado veio até a nossa
mesa. Ela amarrou um longo avental na cintura enquanto falava.
— Ei, Opal. Como você está? Katie disse que você estava
procurando por mim.
— Ah, oi, Bernadette. Quero apresentar alguém a você. Esta é
Josie Preston. A mãe e o pai dela moravam aqui em Laurel Lake.
Ele é um ano mais velho que você e ela dois anos mais nova, então
pensei que você talvez os conhecesse.
— Oh? — Bernadette olhou para mim e piscou. — Seu pai
também tem quarenta e nove anos?
Opal zombou. — Você tem varizes com mais de quarenta e nove
anos.
Bernadette dispensou Opal e depois bateu o dedo no lábio. —
Preston. Preston. Seu pai não seria Henry Preston, seria?
Eu sorri. — Ele é. E minha mãe é Melanie Langone.
— Sua mãe eu não me lembro. Mas oh, meu Deus, Henry
Preston. Não ouço esse nome há anos. — Ela olhou como se
estivesse visualizando uma memória. — Lindo Henry. Ele tocava
tambor na banda marcial. Tinha aqueles lindos olhos azuis
brilhantes. Todas as líderes de torcida tinham uma queda por ele,
mas ele estava meio alheio a isso. Ele foi eleito o mais bonito no
anuário da nossa turma.
— Sério? Uau. Ele nunca mencionou isso.
Bernadette olhou nos meus olhos. — Vocês têm os mesmos
olhos.
Sorri. — As pessoas sempre me disseram que eu pareço com
meu pai.
— Como está o seu pai?
— Ele faleceu há muito tempo.
Seu rosto caiu. — Sinto muito. Eu não sabia.
— Obrigada.
— Josie vai ficar na Rosewood Lane — disse Opal. — A casa
onde a velha Sra. Wollman morava.
— A acumuladora? Isso mesmo. Esqueci que os Preston eram
donos daquela casa.
— Meu pai deixou para mim quando morreu.
— Você está na cidade por um tempo?
Eu balancei a cabeça.
— Você sabe quem você deveria conhecer? Tommy Miller. Ele
era o melhor amigo do seu pai. Mora na Rua Lilac, a um quarteirão
da sua casa. Os dois sempre tinham uma vara de pescar nas mãos
e um sorriso no rosto quando éramos crianças.
— Oh, ouvi muitas histórias sobre Tommy.
— Ele ainda mora aqui. Mesma casa. A mesma cabeça grossa
de cabelo ruivo encaracolado. As mesmas piadas que ele conta há
quase meio século. Aposto que ele tem muitas histórias sobre seu
pai naquela época. Talvez ele conheça sua mãe também.
— Eu adoraria conhecê-lo.
— Que tal eu fazer isso acontecer? Digamos no próximo
domingo à tarde, às duas, na minha casa? Daqui a uma semana.
Vou fazer um churrasco. Vou perguntar a Tommy quem mais devo
convidar e que você queira conhecer.
— Oh, eu não quero que você tenha todo esse trabalho...
— Não é nenhum problema. É disso que se trata esta pequena
cidade. Procuramos motivos para nos sentar ao redor do lago,
beber chá fortificado e contar sempre as mesmas boas histórias.
Quando encontramos uma pessoa que nunca ouviu todas elas
antes, isso é motivo suficiente para comemorar.
Eu ri. — Está bem então. Vou fazer algumas sobremesas.
Bernadette acenou com a cabeça em direção à frente. — Preciso
voltar para trás do balcão para que Katie possa fazer uma pausa.
Mas deixe-me seu número de telefone antes de ir, caso Tommy não
possa comparecer ou algo assim.
Levantei meu celular. — Quer que eu mande uma mensagem
para você, então você o terá?
Ela riu. — Eu ainda tenho um daqueles telefones flip. Não faço
ideia de como enviar mensagens de texto. Mas você pode anotá-lo
em um pedaço de papel e eu o adicionarei à minha lista telefônica
para mantê-lo seguro.
Eu sorri. — Ok.
— Vejo você no próximo fim de semana, então.
— Estou ansiosa por isso. Obrigada, Bernadette.
Opal e eu observamos Bernadette afastar-se. Quando ela
chegou ao balcão, a porta da frente abriu-se e ninguém menos que
meu vizinho mal-humorado entrou. Ele sacudiu a chuva do cabelo
e aproximou-se para fazer seu pedido. Eu nem percebi que estava
olhando até Opal falar. — Eu o vi em um casamento há alguns
meses. Seu cabelo estava penteado para trás como uma estrela de
cinema dos velhos tempos. Mesmo eu não conseguia desviar os
olhos. Entendo.
Balancei minha cabeça. — Oh. Eu não estava olhando para Fox
dessa maneira.
— Não? — Opal sorriu.
— Estou surpresa que ele não tenha guarda-chuva. Ele parece
tão organizado.
— Uh-huh.
Tentei ignorar o idiota sexy parado no balcão, mas era quase
impossível não roubar olhares, mesmo depois de Opal ter me
descoberto. Enquanto Fox esperava que Bernadette servisse seu
café, ele examinou a cafeteria. Quando seu olhar me encontrou
com Opal, ele franziu a testa e balançou a cabeça.
— Ei, chefe! — Opal gritou e mexeu os dedos.
Fox assentiu como se fosse doloroso oferecer tanto
reconhecimento e voltou a observar seu café ser feito. Ele saiu pela
porta alguns segundos depois, com um copo de papel na mão.
Opal sorriu de orelha a orelha. — Ele gosta de você.
— Umm... que parte dessa breve interação lhe deu essa ideia?
A carranca quando ele me viu ou a maneira como ele saiu correndo
porta afora, como se houvesse algo contagioso aqui que ele
pudesse pegar?
O sorriso de Opal alargou-se. — Ambos.
Josie
Dei um passo para trás e admirei meu trabalho duro com um
copo de limonada gelada. Eu tinha pendurado dois pedaços de
gesso na sala depois de voltar do almoço com Opal hoje. Não foi
muito, mas me deu uma sensação de realização.
Uma batida interrompeu meu tapinha nas costas. A porta da
frente estava aberta, deixando apenas a velha tela de metal que me
separava do Sr. Mal-humorado.
— Oh, não. Por favor, diga-me que a Amazon não entregou em
sua casa as caixas que esperei o dia todo. Juro que verifiquei o
endereço três vezes.
Fox ergueu algo. Um guarda-chuva? — Você esqueceu isso no
Rita. Opal o deixou na minha casa e pediu-me para entregá-lo a
você.
Fui até a porta e a abri, embora pudesse ter passado o guarda-
chuva pelo buraco gigante na tela. — Ah, obrigada.
Ele o estendeu. — Não sei por que ela não pôde trazer isso para
você quando estava na casa ao lado.
Eu suspeitava que sabia o motivo. Opal tinha grandes planos
para mim e para a Fox.
Ele não o soltou quando peguei o guarda-chuva. — Ela é a
fofoqueira da cidade. Você pode querer ter cuidado com o que diz
a ela se não quiser que cinquenta pessoas conheçam o seu negócio
pela manhã.
— Não sei por que você diria uma coisa dessas — falei, com os
olhos arregalados. — A propósito, é muito gentil que você doe seu
tempo treinando um time de hóquei com necessidades especiais.
Fox revirou os olhos, mas uma sugestão de sorriso apareceu no
canto de sua boca.
Apontei para o rosto dele. — O que é que foi isso?
Ele bateu na bochecha. — O quê?
— Acho que foi quase uma expressão de felicidade, embora não
tenha certeza. Talvez você esteja realmente com dor.
Um sorriso completo espalhou-se pelo belo rosto de Fox. A visão
era espetacular.
— Isso foi tão difícil? — perguntei. — Você deve perceber que é
um homem grande. A carranca que você usa o tempo todo o torna
muito intimidante. Quando você sorri, isso suaviza todo o seu
visual.
— Talvez eu não queira parecer mole.
Revirei os olhos. — Tanto faz, Sr. Rabugento. Obrigada por
devolver meu guarda-chuva. Ah, e vi que minhas latas de lixo
estavam na calçada esta manhã, mas não as coloquei lá. Você as
colocou?
Ele encolheu os ombros. — Precisava ser feito.
— Bem, obrigada novamente.
Fox virou-se e deu alguns passos. Como sempre, sem se
despedir nem nada. Mas antes de sair da varanda, ele se virou. —
Por que você está aqui?
— Você quer dizer em Laurel Lake? Estou arrumando a casa.
— As fofoqueiras da cidade disseram-me que você tem um bom
emprego. Por que não contratar alguém para consertar o lugar?
Você conseguiria recuperar o dinheiro alugando a casa.
— Eu precisava de um projeto para manter-me ocupada.
— Por que não se manter ocupada no trabalho?
— Eu... eu tirei uma licença.
Fox semicerrou os olhos. — Por quê?
Suspirei. — Se você quer saber, tive um pequeno colapso
mental.
Seus olhos percorreram meu rosto, como se ele estivesse
tentando avaliar minha sinceridade. Depois de um momento, ele
suavizou. — Desculpe.
— Tudo bem. Não foi sua culpa.
Fox olhou para dentro da casa. — Você fez algum progresso aí.
Balancei a cabeça, apontando para a sala de estar. — Até
pendurei minhas primeiras peças de gesso hoje.
Fox olhou para trás novamente. — Você mesmo pendurou isso?
— Sim.
Ele entrou na sala, examinando as paredes. — Você quer as
boas ou as más notícias primeiro?
Juntei-me a ele para olhar para a parede. — O que você está
falando?
— Bem, a boa notícia é que você fez um trabalho bastante
decente. Os parafusos estão separados por 20 centímetros nas
bordas e dezesseis no centro. Você não os afundou tão
profundamente na rocha que tornaria a massa demorada. Parece
bom.
Eu fiquei mais ereta. — Obrigada. Aprendi tudo com vídeos do
YouTube.
— Suponho que você só assistiu um sobre paredes, não sobre
tetos?
— Pensei em assistir alguns sobre tetos quando chegasse a esse
ponto. Mas você está me deixando nervosa agora, quais são as más
notícias?
Fox apontou para cima. — O teto é feito antes das paredes.
Meus olhos se arregalaram. — Por favor, diga que você está
brincando.
— As peças de parede são instaladas depois, porque ajudam a
sustentar o teto. — Fox juntou as mãos para formar um T. — Você
também encosta as folhas da parede no teto para que não haja
uma lacuna a preencher antes de colar os cantos.
Meus lábios franziram. — Caramba. Essas duas peças
consumiram a tarde toda.
— Pelo menos você não fez a sala inteira. É muito fácil de tirar.
Suspirei. — Acho que assistirei vídeos do YouTube esta noite,
em vez do último episódio de Love is Blind. Guardei como
recompensa para mim mesma e planejei adicionar um pouco de
vodca à minha limonada para a ocasião.
— O que é Love is Blind?
— É um reality show onde pessoas solteiras se conhecem atrás
das paredes. Eles só se veem depois de terem se apaixonado e do
cara a ter pedido em casamento.
— Isso parece ridículo.
— Não seja tão crítico. O que você assiste?
— As notícias. Esportes.
— Não admira que você tenha uma carranca perpétua no rosto.
Você pode não ter notado, mas o mundo é deprimente.
O lábio de Fox curvou-se. — Eu direi uma coisa. Você assiste
ao seu programa idiota e eu virei amanhã de manhã e mostrarei
como pendurar o teto para que você não precise assistir a vídeos
no YouTube.
Meus olhos se estreitaram. — Qual é o truque?
— O que você quer dizer com truque?
— Quero dizer, por que você está sendo tão gentil agora, se tem
sido um idiota desde o minuto em que cheguei?
— Talvez eu esteja apenas sendo amigável. Afinal, esta é A
Cidade Mais Amigável da América, certo?
Essa última parte foi claramente sarcasmo. — É porque eu
disse que tive um colapso nervoso, não é? Você tem medo de, se
não for legal, chegue em sua casa e me encontre balançando no
gramado ou algo assim.
Seu lábio se contraiu novamente. — O motivo importa?
Pensei sobre isso e depois dei de ombros. — Não propriamente.
Colocar as duas peças que consegui colocar demorou seis horas.
Tenho tentado não pensar em quanto tempo o teto levaria.
Fox assentiu. — Oito horas?
— Terei café esperando.
— Eu também gosto de torradas de trigo integral.
Eu sorri. — Verei o que posso fazer.
Ele caminhou em direção à porta, abriu a tela e continuou
andando – através do gramado e entrando pela porta da frente. O
homem realmente precisava aprender a dizer adeus.
Fox
Ela cheirava ao maldito verão.
E isso me irritou.
Além disso, eu estava cansado de uma péssima noite de sono.
Eu tinha me revirado pensando na Pequena Miss Melhoramentos
Domésticos vestindo nada além de um macacão curto jeans e
botas de trabalho – sem camisa, sem meias, definitivamente sem
sutiã ou calcinha. Eu provavelmente poderia ter acabado com
minha miséria com uma punheta rápida, mas recusei-me a ceder
e fazer isso enquanto pensava na maldita vizinha irritante. Então,
em vez disso, fiquei olhando para o teto, virando-me furiosamente
da esquerda para a direita a cada cinco minutos.
Josie desceu dos dois últimos degraus da escada. — Posso
perguntar uma coisa?
— O quê?
— Você fica sempre tão mal-humorado pela manhã?
— Eu não sou mal-humorado.
— Não? Então é isso? Sua ideia de uma personalidade
brilhante? Perguntei se o seu café estava bom e você grunhiu para
mim.
— Não foi um grunhido. Foi um sim.
Josie fez um barulho curto e profundo que parecia um porco.
Arqueei uma sobrancelha. — Era para ser eu?
Ela fez o som novamente, desta vez adicionando alguns
movimentos de braço como os de um macaco e pulando. — Gronk.
— Bonitinha.
Ela pulou novamente. — Gronk. Gronk.
Tentei não reagir, mas ela era adorável demais.
Josie apontou para meu rosto. — Aí está de novo. O sorriso
indescritível do Sr. Mal-humorado. É meio... ouso dizer... legal. —
Ela fez um som ofegante exagerado e cobriu a boca. — Oh, não.
Espero que não seja muito doloroso.
— Tudo bem, espertinha. Eu entendi o ponto. Que tal você levar
essa bunda para a frente e pegar uma das madeiras pequenas que
deixei na varanda? Vou mostrar como fazer um suporte fácil para
segurar o drywall enquanto ele é parafusado no teto.
Josie desfilou até a porta. A mulher usava uma blusa branca e
uma saia longa, rosa claro e esvoaçante para fazer construção.
Parecia que ela estava indo para um piquenique, em vez de colocar
gesso – embora a regata a abraçasse em todos os lugares certos, e
houvesse algo em sua clavícula que eu não conseguia desviar os
olhos. Porter tinha muita sorte dela não trabalhar para mim, ou
eu poderia fazer do seu traje o uniforme oficial da empresa. Tive a
sensação de que a roupa poderia aparecer em minhas fantasias
noturnas esta noite, em vez do macacão. Ela se abaixou para pegar
a madeira na frente, e a parte superior de sua regata se abriu,
dando-me uma visão clara por baixo dela. Forcei minha cabeça na
outra direção, embora meus olhos conseguissem inclinar-se e
continuar olhando.
— Jesus Cristo — resmunguei para mim mesmo. — Eu preciso
dar o fora daqui.
Ela voltou com um bloco de madeira de trinta centímetros de
comprimento e estendeu-o para mim. — Aqui está.
Eu balancei minha cabeça. — Eu não. Você. Pegue a
parafusadeira e suba aquela escada.
— Ok! — Ela estava um pouco alegre demais tão cedo pela
manhã para o meu gosto. Uma vez que ela estava no topo, ela
olhou para baixo. — E agora?
Eu apontei. — Agora você pega a madeira e parafusa naquele
pino. Cerca de três centímetros da parte inferior daquela viga.
— O que é uma viga?
— É a viga horizontal no topo da parede. Você vai pendurar a
madeira paralela àquela viga para que possa apoiar o gesso sobre
ela enquanto aparafusa no teto.
— Oh! Inteligente. Ok. — Ela fez o que eu instruí e depois
moveu a escada pela sala, colocando as outras duas madeiras.
Quando terminou, ela pulou da escada e bateu palmas. — O que
agora?
— Agora você vai preparar-me outra xícara de café e algumas
torradas de trigo integral, e eu vou colocar o gesso no teto.
— O quê? Não. Eu farei isso.
— Você não será capaz de segurar um pedaço de gesso de 22
quilos sobre a cabeça com uma mão enquanto o parafusa com a
outra.
— Como você sabe?
Eu olhei para ela de cima a baixo. — Porque você tem um metro
e meio de altura e tem unhas chiques.
— O que minhas unhas têm a ver com alguma coisa?
— Se você fizesse qualquer tipo de trabalho físico, elas não
ficariam assim. Inferno, aposto que você nem lava a louça.
Os olhos de Josie se arregalaram. Suas mãos voaram para seus
quadris curvilíneos. — Com licença? Quero que você saiba que lavo
a louça. Tenho até uma torneira de cozinha nova – que eu mesma
instalei outro dia. E posso não ser do tamanho de um carvalho
como você ou não fazer trabalho manual para ganhar a vida, mas
faço Pilates cinco dias por semana e uso halteres de cinco quilos
para fazer o treino de braço de Jennifer Aniston quatro dias por
semana.
— Cinco quilos, hein?
Ela fez uma careta. — Não zombe de mim.
— Apenas sendo realista.
— Não, você está sendo um idiota. Eu deveria ter assistido aos
vídeos do YouTube. Pelo menos lá as pessoas que ensinam não
podem insultar os alunos. Você pode simplesmente dizer-me o que
fazer e eu farei isso?
Dei de ombros. — Ok. Vá até a frente e pegue uma das placas
e suba a escada. Comece no canto. Apoie um lado do gesso na
madeira que você colocou e alinhe a borda para preencher o canto
o máximo que puder. Em seguida, parafuse-o nas vigas do teto.
— Está bem.
Josie marchou até a garagem. Observei de casa enquanto ela
lutava para levantar o gesso da pilha. Foi contra tudo em mim não
ajudar e ficar aqui. Depois de alguns segundos, ela colocou a tábua
de volta na pilha e voltou para a cozinha. Achei que ela fosse
admitir a derrota, mas, em vez disso, ela vasculhou um saco
plástico da Lowell em cima da mesa e tirou uma Gorilla Gripper –
uma ferramenta que se prendia ao gesso e permitia carregá-la com
uma alça. Tornava o transporte de placas muito mais fácil. Muitos
dos meus rapazes usavam dispositivos como esse.
Josie lançou-me um sorriso mal-humorado ao voltar. Desta
vez, ela conseguiu levantar o gesso, mas ainda assim não foi fácil
para ela entrar na casa, apesar de serem apenas vinte passos. Não
havia nenhuma maneira de ela conseguir subir aquela coisa pela
escada e parafusá-la no teto sozinha. Ela chegou ao segundo
degrau antes que a escada começasse a tombar. Se eu não
estivesse aqui para pegá-la, ela estaria no chão usando um
cobertor de gesso.
— Posso fazer isso agora? — falei.
— Eu sou capaz. Só vai demorar um pouco.
Agarrei meus quadris. — Que tal isso... concordamos que você
é capaz, mas também concordamos que levarei muito menos
tempo para terminar o teto e tenho muita coisa para fazer.
Ela mordeu o lábio carnudo. — Tudo bem. Mas só porque você
tem uma restrição de tempo.
Peguei a placa das mãos dela. — Certo.
Durante a meia hora seguinte, coloquei quatro placas de gesso
no teto. Josie assistiu, ansiosa para ajudar sempre que possível. A
certa altura, um celular tocou em cima de uma caixa do outro lado
da sala. Josie ignorou. Mas alguns minutos depois, começou a
tocar novamente. Desta vez ela se aproximou e verificou a tela. —
Você se importa se eu responder isso?
— Faça o que você precisar fazer.
Josie saiu da sala para a cozinha. A casa não era tão grande,
então era impossível não ouvir a conversa. Um lado pelo menos.
— Olá, mãe.
Silêncio.
— Oh, não. Ela está bem?
Adiei a perfuração do último parafuso, para não interromper a
conversa dela. Parecia importante.
— Eles vão mantê-la durante a noite?
Ela suspirou.
— Tudo bem, bem, isso é bom, pelo menos. Eu a tenho
incomodado para ir ao médico. Graças a Deus você estava em casa
quando ela caiu.
Houve alguns minutos de silêncio. Quando Josie falou
novamente, ela levantou a voz. — Eu não estava de férias, mãe. Eu
estava em um centro de saúde mental. E você sabe disso, porque
deixei uma mensagem para você no dia em que entrei.
Silêncio.
— Não, na verdade há uma diferença. As férias são muito
diferentes. Quer saber, eu tenho que ir. Por favor, diga a Nilda que
ligarei para ela hoje à noite, quando ela sair da sala de emergência.
— Ela passou o dedo para desligar sem se despedir.
Depois de trinta segundos balançando a cabeça e olhando para
o telefone, ela pareceu lembrar-se que eu estava aqui. — Desculpe
por isso — disse ela. — Você precisa que eu lhe entregue alguma
coisa?
Balancei a cabeça e pensei em dizer alguma coisa. Mas ela
parecia bastante chateada. — Você está bem?
— Estou bem.
Esperei mais um minuto. — Você quer conversar sobre isso?
— Conversar? Acho que você me disse dez palavras desde que
nos conhecemos. E a maioria delas foram insultos.
— Algumas pessoas dizem que sou melhor ouvinte do que
falador...
— Não. Tudo bem. Mas obrigada.
Um minuto se passou e ela ainda parecia bastante irritada com
a ligação. — Deus me livre que a minha mãe perfeita tenha uma
filha que não seja perfeita. É a primeira vez que falo com a mulher
desde que me internei num centro de saúde mental, e ela
pergunta-me como foram as férias. Férias! Você sabe, como se eu
estivesse tomando uma margarita, deitada na praia, em vez de
tirando os cadarços do tênis como medida de segurança.
— Algumas pessoas fingem que as coisas não estão
acontecendo porque não conseguem lidar com elas.
Josie bufou. — Não minha mãe. Ela é capaz de lidar com
qualquer coisa.
— Talvez seja isso que ela quer que você pense.
Como ela não respondeu imediatamente, perfurei o último
parafuso na tábua e desci da escada. Josie ainda estava fervendo
quando saí, peguei outra placa de gesso e a aparafusei também. A
mulher podia ser uma motorista de merda, perdida com esta casa
dilapidada, e meu pau tinha um interesse muito grande nela para
o meu gosto, mas eu não era um idiota total. Parecia que ela estava
passando por momentos difíceis ultimamente. Então peguei meu
telefone e mandei uma mensagem para Porter, pedindo algo que
não pedia a muitos: um favor. Então comecei a pendurar o resto
do teto.
A caminhonete de Porter parou no meio-fio assim que terminei.
Ele tinha um daqueles sistemas de escape desagradáveis – do tipo
pelo qual você paga a mais para acordar seus vizinhos quando sai
de manhã cedo. Ele bateu na porta de tela enquanto eu ainda
estava na escada.
Levantei meu queixo em direção à porta. — Isso é para mim, se
você puder deixá-lo entrar.
— Ah — disse Josie. — Claro.
A duas divisões de distância, em cima de uma escada, eu ainda
não conseguia deixar de ver a forma como os olhos de Porter
iluminaram-se quando ele viu a mulher atendendo a porta. Merda.
Eu deveria ter previsto isso. Josie era o tipo dele – ela tinha pulso.
Porter deu um sorriso que fazia muitas mulheres abaixarem a
calcinha, mas suas covinhas apenas fizeram o músculo da minha
mandíbula flexionar. Corri para apertar o último parafuso, mas
Porter já tinha a mão de Josie levada aos lábios quando desci e
entrei na cozinha.
— Afaste-se, garoto. Convidei você aqui para trabalhar, não
para agir como se estivesse em um bar para solteiros.
Os olhos de Porter brilharam. — Eu estava apresentando-me à
adorável senhora.
Eu levantei meu queixo. — Josie, este é Porter. Porter – Josie.
Agora comece a trabalhar.
A testa de Josie enrugou-se. — Trabalhar?
— Porter é um idiota que persegue qualquer coisa de saia, mas
ele é um ótimo gesseiro. Ele pode começar a consertar o teto
enquanto eu coloco as placas da parede.
— Ah, você não precisa fazer isso. Eu dou conta disso. O teto
era mais que suficiente.
— Nós fazemos.
— Mas...
Fiz um gesto para meu funcionário. — Há outra escada na
minha garagem. Deve haver alguma madeira que você possa usar
como tábua também.
— É para já, chefe.
Porter desapareceu. Enquanto isso, Josie olhava-me como se
eu tivesse duas cabeças.
— O quê? — perguntei.
— Eu não entendo você. Você age como se eu fosse um pé no
saco só por respirar, mas vai me ajudar.
— Você é um pé no saco.
— Então por que você está me ajudando?
— Foda-se se eu sei. Parece a coisa certa a fazer.
Josie contemplou minha resposta por um minuto, então um
sorriso surgiu em seu rosto.
— O quê? — perguntei.
— Opal está certa. Você é um coco.
— Que diabos isso significa?
— Nada. — Ela sorriu. — Exceto que eu realmente quero uma
piña colada4 agora.
4
Tipo de coquetel.
Fox
— Então, qual é o problema de Josie? — Duas horas depois,
Porter desceu da escada. Ele limpou a massa das mãos na calça
jeans.
Olhei e voltei a medir o último pedaço de gesso que precisava
ser pendurado nas paredes. — Não há problema.
— Você não está interessado nela?
Minha mandíbula flexionou. — Não.
— Então por que estamos aqui num domingo de manhã
trabalhando na sala de estar dela quando o trabalho do ensino
médio está atrasado uma semana? Se fôssemos fazer horas extras,
faria mais sentido colocar o piso de carvalho do ginásio.
— Deixe-me administrar meu negócio e você gerencia o seu.
Porter enfiou as mãos nos bolsos. — Não tenho nenhum
negócio para administrar. Opal disse que Josie bateu na sua caixa
de correio.
Olhei para o teto e balancei a cabeça. A cidade inteira precisava
fofocar? — Por que diabos Opal está falando com você sobre minha
caixa de correio?
— Lembra daquela vez que acidentalmente bati na placa de
endereço do escritório? A carroceria da minha picape estava cheia
de armários para o trabalho de Woodward, então eu não conseguia
ver direito.
— E daí?
— Você quase me demitiu, você ficou tão chateado.
— Então?
— Então seu melhor funcionário quase foi demitido por bater
em uma placa, e uma mulher que você acabou de conhecer tem a
sala de estar arrumada no domingo?
— Cale a boca e termine de colocar o gesso.
— Terminei, pelo menos até Josie voltar da loja com a fita
adesiva que preciso para fazer aquele canto.
Olhei para o teto. Com certeza, tudo estava terminado, exceto
aquela borda. Apontei para a lata gigante de massa corrida no
chão. — Comece as paredes.
— Não sobrou mais.
— Há um balde cheio na minha garagem.
— Achei que você só queria que eu fizesse o teto?
— Basta começar as malditas paredes.
Porter demorou a ir até minha casa. Ele voltou com o balde em
uma mão e um Pop-Tart na outra.
— Você nunca come nenhum sabor além de açúcar mascavo e
canela?
— Você nunca pede ao entrar na cozinha de alguém e invadir
os armários?
Ele ignorou-me e continuou a mastigar o Pop-Tart. — Então
você não se importaria se eu convidasse Josie para sair? Ela é
muito gostosa, cara.
Não gostei do nó que senti no estômago só de pensar em Porter
encostando o dedo em Josie, mas nunca ouviria o fim se o
afastasse. — Eu não sou o guardião dela.
— Ótimo.
Como o gesso estava pronto e eu não era tão rápido quanto
Porter quando se tratava de massa corrida, decidi ir até a casa ao
lado e pegar alguns ventiladores para ajudar no processo de
secagem. A umidade do lago em julho mantinha tudo molhado
durante dias. Enquanto estava lá, recebi um telefonema de um
subcontratado com quem tentei entrar em contato durante toda a
semana. Quando voltei para a casa do vizinho, Josie já havia
voltado da loja. E o maldito Porter já estava fazendo movimentos.
Ele ficou atrás de Josie bem perto, a mão cobrindo a dela
enquanto guiava a espátula ao redor da parede. Tive vontade de
dar um soco nele.
— Ei, chefe. — O filho da puta sorriu. — Josie tem um talento
natural. Pintar paisagens também é um de seus hobbies, assim
como meu.
— Oh, sim? — gritei entre dentes cerrados.
— Não sou muito boa — disse Josie. — E não faço isso há anos.
— Isso é uma pena — Porter falou lentamente. — Talvez você
devesse mudar isso. O lago ao pôr do sol é um belo tema.
Ela sorriu. — Tenho certeza que sim.
— Tenho um cavalete a mais. Posso passar por aqui um dia...
— Oh, eu não quero atrapalhar o seu trabalho.
— Não é nenhum problema.
Eu tinha que dar ordem ao Porter para manter os rumores da
cidade quieto, mas eu não precisava ficar aqui e vê-lo tecer sua
teia estúpida. Limpei a garganta. — Eu cuido disso daqui, Porter.
Obrigado pela mão.
Ele franziu a testa. — Ainda preciso terminar três paredes.
— Eu dou conta disso.
— Mas eu sou mais rápido.
— Se você quiser trabalhar hoje, você pode ir para o trabalho
do ensino médio que temos como reserva. Eu estava planejando
esperar até que o sistema de ar-condicionado entrasse em
funcionamento, para que houvesse algum ar quando as
temperaturas atingissem os quarenta graus, como está previsto
para hoje. Mas se você está ansioso para trabalhar...
Porter ergueu as mãos. — Estou bem.
— Tudo bem então. — Eu balancei a cabeça. — Vejo você
amanhã.
Ele demorou a recolher suas coisas e depois foi até Josie. — Foi
muito bom conhecer você.
— Você também, Porter. Muito obrigada por ajudar. Eu
realmente gostei disso.
— A qualquer momento. Quero dizer isso. Se você precisar de
ajuda com qualquer coisa por aqui, basta gritar. Na verdade, deixe-
me dar meu número caso você queira entrar em contato comigo.
— Oh. Ok. — Josie entrou na cozinha, pegou o telefone da mesa
e entregou-o a Porter. Ele sorriu enquanto digitava seu número,
então usou o telefone dela para ligar para o dele. — Agora eu
também tenho o seu número.
— Obrigada novamente.
— Talvez eu passe por aqui com aquele cavalete em breve.
Ela sorriu educadamente, mas não o encorajou. Meu não
funcionário do mês inclinou seu boné de beisebol para mim ao
sair. — Tenha um bom dia, chefe.
— Sim. Até mais tarde.
Depois que ele se foi, comecei a limpar a sala de estar.
— O que posso fazer? — Josie disse.
— Nada. Esta é a última coisa por hoje.
Ela olhou ao redor da sala. — Não posso acreditar que você fez
tudo isso em apenas algumas horas. Isso teria levado semanas,
pelo menos.
— É o que eu faço.
Ela sentou-se na escada. — Como você passou do hóquei a
empreiteiro?
— Estourei meu joelho. Ainda não tinha trinta anos. Precisava
de algo para fazer com o resto da minha vida.
— Ah, isso é terrível. Foi durante um jogo?
Desviei o olhar. — Não.
Josie ficou quieta por um minuto. Eu poderia dizer que ela
estava esperando que eu dissesse mais. — Como você aprendeu a
fazer tudo? — Ela sorriu. — Aposto que foram vídeos do YouTube,
certo?
Eu ri. — Meu pai era empreiteiro. Trabalhei para ele desde os
doze anos. Ele queria que eu tivesse um plano B caso as coisas
não dessem certo no hóquei. Eu estava convencido de que seria
uma estrela, então achei desnecessário. Acontece que ele estava
certo, afinal.
— Eu queria ser bailarina quando era pequena.
— Oh, sim? Você é uma boa dançarina então?
— Não. Eu sou terrível. — Ela riu. — Não tenho ideia de por
que acabei de contar isso.
Uma batida enérgica na velha porta de metal fez Josie dar um
pulo. Eu também não tinha ouvido ninguém vindo pela entrada.
— Aqui é o quarenta e seis da Rosewood?
— Sim?
— Eu tenho uma entrega de uma caçamba de lixo. Você quer
isso na garagem?
— Oh. Sim, desculpe. Deixe-me tirar meu carro para você.
Josie pegou as chaves e saiu. Quando ela voltou, o som de um
alarme de emergência soou quando o caminhão de entrega
posicionou uma pequena caçamba de lixo na entrada da garagem
em marcha ré.
— Para que serve a caçamba? — perguntei.
Ela apontou para as pilhas de jornais na cozinha. — O resto
disso. Há também uma sala cheia de revistas no segundo andar.
Calculei mal a quantidade de lixo que havia aqui quando enchi a
primeira que encomendei na semana passada. As fitas VHS da sala
ocuparam quase três quartos.
Eu olhei para o meu relógio. Eu disse ao subcontratado que
ligou mais cedo que o encontraria no canteiro de obras de Franklin
para mostrar a ele todas as coisas que seus caras tinham feito pela
metade. Mas eu ainda tinha uma hora. — Posso ajudar um pouco.
— Oh, Deus, não. Você já fez muito. Eu posso lidar com isso
sozinha.
— Estou aqui e será mais rápido com os dois. Além disso, ter
este papel espalhado por todo o lugar representa risco de incêndio.
Não quero que minha casa pegue fogo por causa da sua.
Josie sorriu. — Você não me engana, Fox Cassidy. Todas as
desculpas que você inventa não conseguem esconder o fato de que,
no fundo, você é um cara decente.
Se ela soubesse o quanto meus pensamentos sobre ela foram
decentes na noite passada...
Em vez de debater, fui até uma das pilhas de jornais e peguei
dois braços cheios. O entregador estava terminando de
descarregar a lixeira quando saí. Joguei a primeira pilha enquanto
Josie assinava a papelada. Depois disso, entramos em um ritmo
de ida e volta. O sol estava escaldante, então na terceira ou quarta
viagem estávamos ambos muito suados. A regata branca de Josie
grudava nela, e toda vez que ela levantava os braços para pegar
uma pilha de jornais, ela exibia uma pele cremosa que eu
fantasiava em cravar meus dentes.
Ela não era meu tipo, pelo menos não no sentido não-físico. Eu
gostava de mulheres que não questionavam por que eu não estava
com vontade de conversar, mulheres que queriam uma coisa de
mim – e não era me conhecer vestido. Divorciadas na casa dos
quarenta se enquadravam perfeitamente no perfil, de preferência
aquelas que ainda estavam ressentidas com os homens e não
estavam prontas para encontrar outro marido. Elas também
tendiam a saber o que gostavam na cama e se sentiam confortáveis
em garantir que conseguissem. Simples. Eu gostava assim.
O que Josie definitivamente não era. Ela era do tipo que
procurava por algo – um conto de fadas em que ela ainda
acreditava. E não os contos originais dos Grimm também.
Ela estendeu a mão para pegar outra pilha de papéis, e uma
gota de suor deslizou por suas costas enquanto eu andava atrás
dela. Salivei com a ideia de lamber a gota salgada de sua pele. Eu
não conseguia desviar os olhos, pelo menos não até que ela se
virou e me pegou. Balancei a cabeça, tentando fingir que não
estava olhando, e acabei batendo na mesa da cozinha. Uma caixa
oscilou antes de cair no chão. Tentei agarrá-la, mas errei, e a parte
superior soltou-se quando caiu de lado. Parte do conteúdo foi
espalhado pela cozinha.
— Merda. Desculpe. — Abaixei-me e juntei o que havia caído.
Parecia um monte de cartões de Natal. Centenas. — A Sra.
Wollman também acumulava cartões?
Josie ajoelhou-se e pegou um que havia deslizado pela sala. Ela
o adicionou à coleção na caixa. — Estes são meus, na verdade.
Senti minhas sobrancelhas franzirem. — Você trouxe uma
caixa de cartões de Natal usados de Nova York?
— Sim.
Olhei para dentro da caixa novamente. — Quantos anos de
cartões você tem aqui dentro?
— Apenas um.
— As pessoas enviaram tantos cartões para você? Não creio que
tantas pessoas vivam nesta cidade.
Ela sorriu. — Na verdade, elas enviam. Estou apenas na letra
N.
— Huh?
Josie colocou a tampa de volta na caixa e ficou com ela nas
mãos. — Nada.
Dei de ombros. — Se você diz...
Voltei a realocar as pilhas de jornais para a lixeira. Na minha
segunda viagem, notei outro cartão saindo de baixo do fogão.
Estava aberto, então quando o peguei não pude deixar de ver o que
estava escrito lá dentro.
Boas festas!
Tom e Renée Dwyer.
Que porra era essa?
Josie entrou na cozinha depois de sua última ida à caçamba e
encontrou-me olhando para o cartão.
— Onde você conseguiu isso? — perguntei.
— O cartão?
— Sim...
Ela olhou e leu o interior. — Ah, Tom e Renée. Eles são muito
legais. Eles moram aqui em Laurel Lake. Você os conhece?
— Você tende a conhecer as pessoas quando fica noivo da filha
delas.
— Eu não sabia que você estava noivo.
Eu captei a atenção dela. — Eu não estou. Evie está morta.
Fox
Estou vendo coisas?
Ninguém jamais esteve no rinque a essa hora, e definitivamente
ninguém fazia isso. Encostei-me na barreira de plástico para olhar
mais de perto, certificando-me de que não a estava imaginando.
Mas não, definitivamente era uma mulher no gelo. E ela estava
definitivamente... trocando a roupa íntima. Ela usava uma saia de
tênis e um top curto, nem mesmo meia-calça no lugar gelado.
Observei quando um pequeno pedaço de material vermelho caiu
no gelo e ela levantou um joelho e vestiu o que parecia ser uma
calcinha preta, três vezes maior. Ela a subiu pelas pernas, pegou
o tecido vermelho do gelo, patinou até a linha lateral e jogou-a por
cima das tábuas na área de penalidade.
Fiquei quieto, curioso para saber o que ela faria a seguir. A
linda ruiva parecia perdida em seu próprio mundo enquanto
patinava até um canto do rinque. Ela respirou fundo, ficou parada
olhando para frente por um longo tempo e então começou a patinar
para trás com determinação. Quando ela chegou a três quartos do
meu lado do gelo, ela deu uma volta para frente e saltou no ar. Seu
corpo torceu e girou tão rápido que perdi a conta de quantas voltas
ela deu. Enquanto ela descia, trocamos olhares e seu foco foi
interrompido. Ela caiu de bunda com força.
Merda.
Eu corri para o gelo. Felizmente eu já estava equipado. Inclinei-
me para ajudá-la, mas ela afastou minhas mãos.
— O que diabos você estava fazendo, parado aí? — ela exigiu.
— Eu não queria interromper.
Ela tirou o gelo da bunda e ficou de pé. Ela teria um belo
hematoma mais tarde.
— Foi um bom movimento que você fez ali.
— Teria sido, se você não tivesse me assustado pra caralho.
Afinal, como você chegou aqui?
— Eu tenho uma chave.
— Oh. Bem, você pode me dar mais quinze minutos antes de
começar a renovar? Eu realmente preciso acertar esse movimento.
— Renovar?
— Você é o cara da manutenção, certo?
Eu sorri. Já fazia alguns anos que eu não andava perto de um
rinque e alguém não me reconhecia. Especialmente a alguns
quilômetros da minha cidade natal, nada menos. Mas decidi jogar
junto. — Sim, posso dar mais quinze.
— Obrigada.
Ela patinou de volta para o outro lado da pista, inclinou-se com
as mãos nos joelhos e fechou os olhos por um tempo antes de se
posicionar novamente. Então ela fez o mesmo movimento, só que
desta vez não pareceu que ela fez tantas rotações quanto na última
passagem. Embora pelo menos ela tenha parado no patamar.
Fiquei impressionado, mas ela parecia irritada consigo mesma. Eu
já tinha assistido patinação artística na TV antes, e essa mulher
parecia tão boa quanto qualquer uma delas. Ela repetiu o truque
mais uma vez e caiu parecendo infeliz novamente.
Respirando fundo, ela olhou para mim. — Você tem que assistir
assim?
— Você está treinando para uma competição?
— Estou treinando para as eliminatórias olímpicas.
— Você não terá pessoas observando você quando fizer o teste?
— Sim, mas já terei tudo resolvido até lá. Você está me
deixando nervosa.
Eu gostava de observá-la e também já havia passado da hora
em que eu tinha reservado o rinque para fazer meu treino, mas
apreciei sua determinação. — Sem problemas.
Porém, quando entrei no escritório, liguei o monitor de
segurança e apertei o botão para abrir as câmeras internas.
Colocando os pés em cima da mesa, cruzei as mãos atrás da
cabeça e observei a mulher fazer seu truque mais cinco vezes antes
de acertar na sexta. Suas voltas eram tão rápidas que eu nem
sempre conseguia contar, mas o soco e o sorriso em seu rosto
disseram-me que ela tinha conseguido. Aumentei o zoom da
câmera e peguei-me sorrindo para ela, embora ela obviamente não
pudesse me ver. Droga, ela era linda. Ela começou a pular no gelo,
fazendo uma espécie de dança comemorativa peculiar com os
braços agitando-se. Quando ela terminou, ela patinou e entrou na
área de penalidade. Ela olhou ao redor da arena, provavelmente
para ver se eu ainda estava à espreita, então abaixou-se e pegou
alguma coisa. Eu não conseguia ver por trás das tábuas, mas pelo
jeito que ela se mexia, eu tinha certeza de que ela estava trocando
a roupa íntima novamente. Estranho. Mas duvidava que me
mostrasse um atleta que não fazia coisas estranhas.
Poucos minutos depois, ela apareceu na porta do escritório. Eu
ainda não tinha desligado o monitor. Ela inclinou-se e olhou para
a tela.
— Você estava observando?
— Você acertou em cheio. Parabéns.
— Eu disse que você me observar me deixava nervosa.
— Você saber que eu estava observando deixou você nervosa.
Não pode ficar nervosa com algo que você não sabe. — Dei de
ombros. — Além disso, se você patinar um pouco mais rápido,
conseguirá obter mais altura no salto e provavelmente não chegará
tão perto ao descer.
— Eu estava patinando o mais rápido que podia.
— Não, você não estava. Você começa assim, mas depois recua,
porque seus nervos a afetam. Você tem que ir até o fim.
Ela semicerrou os olhos para mim. — O chefe sabe que você
fica sentado observando as pessoas em vez de trabalhar?
Eu sorri. — Acho que ele ficaria bem com isso.
Ela inclinou a cabeça. — Talvez eu deva perguntar a ele?
— Talvez você deva. — Eu segurei seu olhar. — A propósito, o
que há com a troca de roupa íntima?
Seus olhos se arregalaram. — Você me viu fazer isso?
— Não é como se eu estivesse espiando pela janela do seu
quarto. Você fez isso no centro do gelo.
— Achei que estava sozinha.
— A outra era muito restritiva para todas aquelas piruetas ou
algo assim?
— Não. Ela simplesmente não dá sorte.
— Pode repetir?
— A que coloquei dá sorte e eu estava esforçando-me para dar
uma volta extra.
Eu não entrava na pista antes de um jogo sem bater três vezes
no portão, então roupas íntimas da sorte faziam sentido para mim.
Não eram os objetos, mas a crença que tínhamos sobre eles. O que
quer que funcionasse.
Levantei meu queixo para sua bolsa. — A roupa íntima está na
sua bolsa?
— Sim, por quê?
— Posso pegá-la emprestada?
— O que você é, algum tipo de pervertido?
— Não. Só preciso de um pouco mais de sorte.
— Para quê?
— Esperando que uma mulher bonita que conheci diga sim
para sair comigo.
— Você não está se referindo a mim, está?
— Eu estou.
— Você nem sabe meu nome.
Estendi a mão. — Fox. E você é?
— Evie. Mas eu não vou sair com você.
— Por que não?
— Porque eu nem conheço você.
— Tome café comigo então. Aqui, agora. Há uma máquina de
venda automática perto dos vestiários. Então você poderá me
conhecer, ver que sou um cara legal e dizer sim para jantar.
— Eu não sei... — Ela torceu os lábios como se não fosse um
não convicto. — Você não tem que cuidar do gelo?
Eu não menti para ela, apenas deixei que ela tirasse suas
próprias conclusões. Peguei a prancheta que sempre ficava
pendurada na parede e olhei a programação. — Ninguém mais
chega antes das oito.
Ela olhou por cima do ombro para a arena vazia. Seu rosto
mudou e tive a sensação de que a gangorra em que ela estava
montada estava prestes a cair do lado errado. Talvez tivesse
acabado de conhecer a mulher, mas sabia uma coisa sobre os
atletas: eles adoravam competição. Então mudei minha
abordagem. — Vou dizer uma coisa. Que tal fazermos uma
corrida?
— Corrida? Você quer dizer no gelo?
Eu balancei a cabeça. — Se eu vencer, você toma café comigo.
Então cabe a mim seduzir você para jantar.
Ela riu. — Você está falando sério? Você sabe que sou
patinadora de gelo profissional, certo?
— Eu sei. — Estendi minha mão. — Mas você não sabe o quão
bem eu patino.
Ela riu. — Acho que você está oferecendo uma aposta perdida.
— Temos um acordo de qualquer maneira?
— Claro. Por que não?
Eu fiquei de pé. Quando me levantei, Evie quase pareceu
preocupada pela primeira vez. Ela só me viu parado à distância, e
o rinque estava elevado em relação à superfície circundante.
— Você é tão alto.
Eu pisquei. — Pernas mais longas tornam-me um patinador
mais rápido.
Ela sorriu, ainda confiante demais. — Qualquer coisa que você
diga.
Caminhamos lado a lado até a entrada e tiramos nossos
protetores de plástico das lâminas ao mesmo tempo antes de pisar
no gelo. Evie patinou de costas para um dos lados do rinque. —
Você quer dar uma volta de aquecimento?
Eu era muito arrogante para isso. — Não há necessidade.
Ela riu. — Para onde vamos patinar? Até o outro lado ou de um
lado ao outro?
Dei de ombros. — Sua escolha.
— Então vamos lá e voltamos. Vou contar e vamos em três, ok?
— É isso aí.
Nós dois tomamos nossas posições, inclinando-nos com os pés
afastados e os patins cravados no gelo, esperando o empurrão.
— Está pronto? — ela disse.
— Nasci pronto.
Ela balançou a cabeça. — Um. Dois. Três!
Decolamos, voando através do gelo. Eu tive que reconhecer isso
para ela. Para uma coisinha pequena, Evie me deu uma boa
corrida pelo meu dinheiro no caminho. Mas eu conseguia fazer
uma curva melhor do que qualquer outro homem da liga, então dei
uma surra nela no caminho de volta.
Ela inclinou-se com as mãos nos joelhos, ofegante. — Como
você aprendeu a patinar tão rápido?
— Anos de prática.
Eu estava prestes a lembrá-la do nosso acordo e mostrar-lhe o
caminho até a máquina de venda automática de café, quando Neil,
o verdadeiro responsável por recobrir o gelo, gritou na lateral: —
Bom dia, Cassidy!
Acenei. — Bom dia, Neil!
Olhei para Evie. Suas sobrancelhas estavam franzidas. — Achei
que você tivesse dito que seu nome era Fox.
— E é. Cassidy é meu sobrenome.
— Fox... Cassidy? Como o jogador de hóquei?
Eu sorri. — Exatamente como ele.
Josie
Eu poderia me acostumar com isso...
Tons de laranja e roxo refletiam no lago enquanto o sol
mergulhava em direção às árvores. Enquanto eu observava de uma
espreguiçadeira no deck dos fundos, a serenidade do cenário
parecia penetrar em meus poros, ajudando minha respiração a
ficar mais lenta e profunda.
Hoje foi um longo dia. Mas eu tinha feito mais nas últimas doze
horas do que nos últimos três meses. A caçamba de lixo estava
cheia. A cozinha finalmente ficou livre de jornais. A sala tinha
gesso e massa corrida, e três quartos das revistas haviam sumido
do segundo andar. Grande parte do trabalho foi feito com os
cumprimentos do meu vizinho confuso, pelo menos até ele
encontrar um cartão da família da sua falecida noiva e sair daqui
o mais rápido que pôde. Foi uma estranha coincidência: um
punhado de cartões caiu de uma caixa e ele pegou aquele? Por
outro lado, suponho que seria uma coincidência muito mais
estranha numa cidade como Nova Iorque, com oito milhões de
habitantes. Numa cidade tão pequena como Laurel Lake, as
probabilidades não eram assim tão astronômicas.
Mais importante ainda, acabei de falar com Nilda, que estava
de volta em casa depois de uma queda quando sentiu um espasmo
nas costas. Felizmente, ela estava bem. Acabei o último gole de
limonada no meu copo, observei a beleza do céu mais uma vez e
fechei os olhos. Depois de alguns minutos comecei a adormecer,
mas passos à distância deixaram-me alerta. Meus olhos abriram
para encontrar Fox parado na ponta de seu cais. Ele olhava para
o lago e não pude deixar de me perguntar se ele estava pensando
em sua noiva morta. Alguns minutos se passaram e comecei a me
sentir uma intrusa, como se esses momentos fossem privados,
entre ele e o lago. Então me levantei silenciosamente, tentando
entrar furtivamente na casa sem que ele soubesse que o vi. Mas
três passos em direção à porta, a tábua de madeira sob meu pé
cedeu.
— Merda! — gritei enquanto caí.
— Josie? — a voz profunda de Fox gritou. — Você está bem?
Tanto para a minha habilidade furtiva. Agarrei meu tornozelo
dolorido e tentei não parecer machucada. — Estou bem! Acabei de
perder o equilíbrio!
Mas alguns segundos depois, Fox apareceu no meu deck. — O
que aconteceu?
Eu acenei para ele. — Caí. Não é grande coisa.
Ele agachou-se ao meu lado e tocou meu tornozelo. Estremeci.
— Dói ao toque?
— Um pouco.
— Você tem gelo no freezer?
Eu balancei minha cabeça. — Usei tudo para fazer minha
bebida.
Seu lábio se contraiu. — Espere. Eu volto já.
Fox desapareceu em sua casa, voltando um minuto depois com
uma bolsa de gelo e uma toalha. Ele as colocou na espreguiçadeira
onde eu estava sentada, então inclinou-se e puxou um dos meus
braços por cima do seu ombro. Seu outro braço envolveu minha
cintura e levantou-me.
— Não coloque nenhum peso nisso.
— Ok.
Mancamos juntos até a cadeira. Fox orientou-me a sentar,
depois agachou-se e examinou meu pé.
— Isso dói? — ele pressionou no topo.
— Não.
— E isso? — Ele mexeu meus dedos dos pés.
— Não dói.
— Você consegue mover o tornozelo?
Fiz uma careta enquanto tentava rodá-lo para frente e para
trás. — Eu posso, mas dói.
— Espero que esteja apenas torcido. Quer ir para o
atendimento de emergência? Há um na cidade. Acho que fica
aberto até tarde.
Eu balancei minha cabeça. — Não, tenho certeza de que está
tudo bem. Vou simplesmente deixar parado e colocar gelo por um
tempo.
Ele dobrou a bolsa de gelo na toalha e amarrou no meu
tornozelo, como se fizesse isso todos os dias.
— Você é bom nisso.
Ele assentiu. — Uma vida inteira jogando hóquei. Dezenas de
pancadas, entorses e fraturas ao longo dos anos.
— Ah, isso mesmo.
— Vou pegar algo em casa para elevar sua perna.
— Ok.
Ele voltou com uma almofada e colocou debaixo do meu pé. —
Como está?
— Bem. Obrigada.
Terminada a assistência, Fox ajoelhou-se para verificar a área
do deck onde meu pé havia batido. Ele pressionou as tábuas de
madeira ao redor e balançou a cabeça. — Essas tábuas estão todas
apodrecidas. É pinho e mesmo quando tratado não é a melhor
madeira para uso externo. É muito mole. Deveria ter usado
carvalho. A maioria das pessoas usa Trex ou algum outro deck
composto hoje em dia – parece madeira, mas sem apodrecer e
desbotar. — Ele bateu a terra das mãos e levantou-se. — Essa
coisa toda precisa ser substituída.
Suspirei. — Ótimo.
Ele olhou para meu copo de limonada sobre a mesa. — Com o
que está enriquecido?
— Vodca.
— Tem limonada sem álcool?
— Eu tenho. Fiz um jarro inteiro. Está na geladeira. Coloquei
duas doses de vodca diretamente no copo, então a limonada ficou
só limonada. Fique à vontade.
Fox pegou meu copo quase vazio e desapareceu novamente em
casa. Ele voltou com uma recarga para mim e um copo cheio para
ele.
— Duas doses pareciam muito, então adicionei uma à sua.
Revirei os olhos. — Obrigada, pai.
Surpreendeu-me ele vir se sentar na cadeira ao meu lado. Eu
não achei que ele ficaria por aqui depois do jeito que saiu daqui
mais cedo. Mas ficamos sentados lado a lado, olhando
silenciosamente para o lago.
Depois de muito tempo, Fox falou baixinho. — Peço desculpas
pela maneira abrupta como saí esta manhã.
— Não precisa se desculpar. Você fez muito por mim hoje.
Ele assentiu. Então pareceu se perder em sua cabeça. Ele
tomou um gole de limonada e inclinou o copo em minha direção.
— Quantos desses você já teve?
— Este é o meu terceiro. Mas tenho uma tolerância muito alta
ao álcool. É genética. Vem da minha mãe. Ela não bebe muito, mas
quando bebe pode beber três ou quatro dry martinis e ficar bem.
Meu pai, por outro lado, tomava algumas cervejas e ficava tonto e
arrastava as palavras.
— Você prefere vodca?
— Na verdade, sim. Eu gosto mais de martinis fortes. Mas esta
noite eu estava com vontade de algo doce.
Fox tomou um gole. — Eu achei que você seria mais do tipo de
vinho.
— O que isso significa? Qual é exatamente o tipo de vinho?
— O tipo que usa saias esvoaçantes para colocar gesso.
— Era uma das poucas coisas que me restava que estava limpa.
A máquina de lavar está quebrada, assim como tudo por aqui.
Tenho uma nova chegando em alguns dias. — Suspirei. — O
corretor de imóveis disse que o lugar precisava de uma reforma.
Eu estava esperando pintura e carpete novo. Eu não esperava
estar fazendo construção. Desculpe, não trouxe minhas botas de
trabalho com biqueira de aço e macacão.
Fox semicerrou os olhos. — Você tem botas de trabalho com
biqueira de aço e macacão em casa?
— Não. — Eu sorri. — Mas poderia tê-los comprado e embalado
se soubesse.
Fox riu com sua limonada.
O sol já havia quase desaparecido, mas um raio dourado
solitário cortava as árvores e marcava uma trilha nas águas
calmas do lago. — Deve ser incrível viver aqui e ver isso todas as
noites.
Um período de silêncio caiu entre nós. — Já faz um tempo que
não aprecio a vista.
— Sério? Por quê?
— Só muitas lembranças.
Presumi que Fox se referia a memórias com sua noiva. Foi a
segunda vez hoje que desenterrei seu passado. — Não tive a chance
de dizer isso antes, mas sinto muito por sua perda.
Fox olhou para mim, mas não disse nada. Eu não sabia se ele
estava chateado por eu ter tocado no assunto ou simplesmente
não era bom em falar sobre isso. Eu nem tinha certeza de quão
recentemente ele a havia perdido. Ele pegou o copo e bebeu o resto
da limonada. Achei que ele estava fazendo isso para dar o fora
daqui. Enquanto ele engolia, notei como sua garganta funcionava.
O movimento do seu pomo de adão fez meu interior formigar.
Ótimo. O homem estava obviamente lutando com a perda de sua
noiva, e estava olhando para ele enquanto ele fazia isso.
Quando ele terminou, ele ergueu o copo. — Ainda estou com
sede. Acho que preciso de outro. Você se importa?
— De jeito nenhum.
Ele olhou minha bebida ainda cheia e a deixou para trás.
Quando ele voltou, ele tomou outro longo gole.
— Então, como você conhece o pai de Evie? — ele perguntou.
— Evie?
— Evie Dwyer — disse ele. — Tom é o pai dela. Renee é sua
madrasta e cresceu em Laurel Lake.
Oh! Evie. Noiva de Fox.
— É uma longa história.
Ele encolheu os ombros. — Não tenho para onde ir no
momento.
Passei os dez minutos seguintes contando a Fox a história que
compartilhei com Opal outro dia – sobre minha amiga Chloe e sua
família pendurando cartões de Natal em barbantes, e como cartões
das pessoas incríveis de Laurel Lake adornaram minhas paredes
durante a maior parte do ano.
Fox apenas olhou para mim.
— Você acha que sou uma estranha, não é?
— Sim.
Eu ri. — Você deveria dizer: De jeito nenhum. Acho que é uma
história comovente.
— Não sou muito de mentir.
— Lembre-me de não perguntar se parece que ganhei alguns
quilos.
Fox fez uma rápida varredura em meu corpo. Seu olhar
permaneceu por um ou dois segundos em meu decote antes de
subir novamente. — Não se preocupe. Você parece muito bem para
mim.
Estaria o durão do Fox fazendo-me um elogio e, pasmem-se,
flertando?
Não importava, eu nem consegui aproveitar totalmente o
momento antes de ele estragar tudo.
— Então, o que fez você tirar férias com sapatos slip on?
Fiquei confusa até que lembrei que reclamei com ele sobre
minha mãe descrevendo minha estadia em um hospital
psiquiátrico, para onde levaram meus cadarços quando cheguei,
como férias.
Eu provavelmente deveria ter ficado insultada por ele estar
zombando. Mas em vez disso me peguei sorrindo. Foi
estranhamente revigorante que alguém não sentisse a necessidade
de abordar o assunto com leviandade. As pessoas não provocavam
alguém sobre coisas pelas quais se sentiam mal.
— Como você pediu tão gentilmente, eu estava lutando contra
a depressão e a ansiedade. Tudo começou com meu trabalho. Sou
cientista principal da Kolax and Hahm Pharmaceuticals.
Desenvolvo novos medicamentos para tratamentos de câncer. Um
dos medicamentos que desenvolvi entrou na fase três de ensaios
clínicos, que é quando é testado em um grande número de
pessoas. Supunha-se que o AMERL7 produzia regressão tumoral
em pacientes com câncer cerebral. Ele havia se mostrado muito
promissor durante as fases anteriores. Mas quando ampliamos,
descobrimos que havia uma interação com a vacina contra
catapora. Quatorze crianças morreram porque participaram do
meu experimento.
O rosto de Fox caiu. — Merda.
— Sim. Isso me atingiu com força e eu não conseguia superar
isso. Tentei por alguns meses. Na altura em que me internei,
passava vinte e três horas por dia na cama. Eu estava fisicamente
exausta por causa da depressão.
— Sinto muito.
— Havia outros fatores também. Por exemplo, era suposto eu
casar-me em agosto.
— Próximo mês?
Eu balancei a cabeça.
— O que aconteceu?
— Meu ex-noivo, Noah, é residente de cirurgia ortopédica. Ele
trabalha muitas horas. Eu estava me sentindo muito perdida
depois de tudo que aconteceu no julgamento e comecei a ter
problemas para dormir. Uma noite, ele deveria sair à meia-noite,
mas não voltou para casa. Mandei uma mensagem para ele e ele
disse que tinha acabado de sair de uma cirurgia de emergência e
precisava ficar, porque alguém ligou dizendo que estava doente.
Resolvi surpreendê-lo e entregar-lhe o jantar.
— Uh-oh.
— Sim. Quem teve a surpresa fui eu. Quando fui até a recepção
do andar cirúrgico, outro residente me disse que Noah havia saído
há pouco. Imaginei que alguém devia ter aparecido e não queria
me mandar uma mensagem tão tarde, já que eu estava tendo
muitos problemas para dormir. No caminho de volta para o meu
carro, notei um Volvo no estacionamento do hospital que parecia
o de Noah. Quando cheguei mais perto, percebi que ele estava lá.
Ele estava sentado no banco do motorista com a cabeça para trás
e os olhos fechados. Achei que ele estava tão exausto que tinha
adormecido. Só quando cheguei à porta é que vi uma cabeça
balançando para cima e para baixo.
— Jesus. Sinto muito.
— O pior foi que fiquei ali congelada e o idiota gozou. Estou
chateada comigo mesma até hoje por não ter pelo menos arruinado
o momento para ele.
Fox sorriu. — Parece que você teve alguns meses difíceis.
— Nunca pensei que seria alguém que precisasse de ajuda.
— Acho que a maioria das pessoas poderia usar em algum
momento da vida e não tem coragem de pedir. Você é forte.
Sorri tristemente. — Obrigada por dizer isso.
— Você está melhor agora? Ou devo adicionar outra fechadura
na minha porta porque você se torna perigosa quando
desequilibrada?
Amassei meu guardanapo e o joguei nele. — Você é um idiota.
Ele sorriu. — Sério, você está bem?
— Eu penso que sim. Converso com um terapeuta pelo Zoom5
a cada duas semanas. Sofri um trauma que me deixou com
depressão, mas não tenho depressão clínica de longa duração. Eu
nunca tinha experimentado nada parecido, então não sabia como
lidar com isso.
— Brincadeiras à parte, estou aqui ao lado, se você quiser
conversar.
— Uau. Obrigada. Tive a impressão de que você não era muito
falador.
5
O Zoom Meetings é uma plataforma de videoconferências que possui diversas funcionalidades, como
compartilhamento de tela, gravação de webinars, acesso via telefone e upload de reuniões na nuvem.
— Eu não sou. Posso não ouvir ou responder. Mas você pode
conversar.
Eu sorri. — Isso se parece mais com o vizinho que conheço e
não gosto.
Fox sorriu de volta e olhou para o meu pé. — Como está o
tornozelo?
— Muito melhor.
— Devemos tirar o gelo um pouco. — Ele inclinou-se para frente
e desamarrou a toalha. Seus dedos roçaram minha perna e parecia
que minha pele pegou fogo. Eu pulei, surpresa com a sensação.
Fox afastou as mãos, segurando-as. — Desculpe. Eu machuquei
você?
— Não. Estou, uhh... só com cócegas. Isso é tudo.
Tive a sensação de que Fox poderia ter percebido minha
desculpa. Mas se ele fez isso, pelo menos ele não me chamou a
atenção. — Como se sente agora? — ele perguntou.
Rolei meu tornozelo. — Melhor. Definitivamente é apenas uma
torção.
— Você teve sorte. Poderia tê-lo quebrado do jeito que aquela
placa cedeu. — Fox olhou ao redor do deck. — Isto tem
provavelmente cerca de quatrocentos metros quadrados. Vou fazer
alguns orçamentos para substituí-lo quando eu estiver na
madeireira esta semana.
— Você não precisa fazer isso.
— Não é grande coisa. Estarei lá de qualquer maneira.
— Tudo bem. Bem, obrigada. — Um mosquito pousou no meu
braço. Eu bati nele, mas um segundo já havia caído na minha
perna. — Besteira! — Eu bati nele.
— Fica cheio de mosquitos aqui depois que o sol se põe. Dura
cerca de uma hora e depois desaparece. Por que não ajudo você a
ir para dentro?
Sentei-me e coloquei os pés no chão. — Eu posso fazer isso.
Fox levantou-se e a tábua sob seus pés fez um rangido. —
Merda. Essa coisa é perigosa.
Ele deu um passo à frente e inclinou-se. Achei que ele iria me
ajudar como fez antes. Mas em vez disso, ele me pegou em seus
braços.
Eu gritei. — Isso é pior! Agora você está colocando nosso peso
na madeira ao mesmo tempo. Definitivamente vamos cair.
Ele caminhou em direção à casa. — Melhor eu do que você.
— Como assim? Por que é melhor você se machucar do que eu?
— Porque posso viver com um tornozelo quebrado. Não seria
capaz de viver deixando uma senhora quebrar o dela se eu puder
impedir.
Eu nunca fui do tipo que brinca de donzela em perigo, mas
tinha que admitir, foi muito bom ser carregada por Paul Bunyan.
Olhei para baixo enquanto ele mexia na porta de vidro deslizante
para abri-la. — É bem alto aqui. Você obtém uma perspectiva
diferente dessa visão. Estou sempre olhando de baixo para as
pessoas.
— Se você diz...
Fox me colocou em uma cadeira na cozinha. Assim que minha
bunda bateu na madeira, meu telefone começou a tocar. Eu fiz
uma careta ao ver o nome piscando. Noah. Meus olhos saltaram
para o rosto de Fox. Infelizmente, não fui a única que leu o nome.
— O meu ex. Ele está chateado por eu estar aqui. — Apertei
Ignorar e o telefone silenciou.
Os olhos de Fox estreitaram-se. — Por que diabos ele se
importa onde você está?
— Ele quer que eu o perdoe. Dê a ele outra chance.
— É isso que você quer?
— Não, definitivamente NÃO. Não estou feliz com a forma como
as coisas terminaram, mas tive muito tempo para pensar no
relacionamento que tivemos. Percebi que estava me adaptando a
uma vida que pensei que deveria ter e não era realmente a que eu
queria, se isso faz algum sentido.
Fox assentiu. — Sim. — Meu celular começou a zumbir
novamente. Fox e eu lemos o nome piscando ao mesmo tempo. —
Por que você simplesmente não diz a ele para parar de ligar?
— Eu disse. Mas ele é persistente.
Fox sustentou meus olhos, mas não disse nada. Mais uma vez,
pressionei para ignorar. Mas dez segundos depois, o maldito
telefone começou a tocar. O músculo da mandíbula de Fox
flexionou.
— Você realmente quer que esse cara pare de ligar?
— Faz uma semana que não respondo, mas ele continua
enchendo meu correio de voz. No começo me senti mal, mas agora
ficou chato.
Antes que eu percebesse o que ele estava fazendo, Fox pegou o
telefone da mesa e apertou para atender no viva-voz.
— Você é o Noah?
Meus olhos se arregalaram.
— Quem é? — meu ex perguntou.
— Este é o homem dizendo para você parar de assediar Josie.
Você precisa parar de ligar para o telefone dela.
— Que diabos é você?
— Você está ouvindo? Josie não quer falar com você. Você fez
merda. Acabou. É simples assim.
— Coloque Josie no maldito telefone!
— Não vai acontecer. Agora, Josie está tentando ser legal,
porque ela é uma pessoa legal. Eu não sou tão legal. Então vou
contar direitinho a situação. Se você ligar para o telefone dela
novamente, ela entrará em contato com o departamento de polícia
e dirá que está sendo assediada. Se você continuar a assediá-la
depois disso, eu mesmo irei visitá-lo. Posso ter um metro e noventa
e pesar mais noventa quilos, mas confie em mim quando digo que
você não me verá chegando. Um dia você estará andando até o seu
carro no estacionamento do hospital no escuro e de repente nos
encontraremos.
— Isso é uma loucura. Quem diabos é você?
— Chega de ligações, Noah. Você não quer me irritar.
Com isso, Fox encerrou a ligação calmamente. Ele colocou o
telefone de volta na mesa. Meus olhos ainda estavam arregalados
de choque, mas quando o efeito passou, sorri. — Isso foi fantástico.
— Sim? Pensei que você ficaria chateada.
— Eu gostaria de ter visto a expressão em seu rosto.
Fox sorriu e ergueu o queixo na direção do meu pé. — Eu vou
embora. Mas coloque gelo nesse tornozelo uma vez por hora até
você ir para a cama.
— Ok. — Eu me levantei, mas ele ergueu a mão.
— Vou trancá-la atrás de mim.
— O bloqueio inferior não funciona. Somente o de cima. Então
vou trancá-la atrás de você.
Fox não parecia feliz, mas continuou em direção à porta. Ele
parou antes de abri-la e olhou para mim.
— A propósito, você estava certa...
— Sobre o quê?
Seu olhar desceu do meu rosto. Ele acenou para meu decote.
— A vista daqui de cima é muito boa.
Josie
— Olá?
— Oi, Josie?
A voz era familiar, mas eu não conseguia identificá-la. — Sim?
— É Opal.
— Oh. Olá, Opal.
— Espero que você não se importe, mas eu convenci Sam na
loja de materiais de construção a me dar seu número.
Mais uma vez, ficou evidente como a vida nas cidades pequenas
era diferente da vida na cidade. Eu não conseguia imaginar o cara
da Home Depot na rua 23 sabendo meu nome, muito menos dando
meu número de telefone para alguém. Se isso acontecesse em
casa, provavelmente conseguiria uma ordem de restrição. No
entanto, aqui, parecia perfeitamente normal.
— Sem problemas. O que está acontecendo, Opal?
— Eu esperava que você estivesse interessada em almoçar hoje.
Tenho um presentinho para você.
— Um presente? Para mim?
— Não se preocupe, não é caro nem nada. Mas suponho que
você seja o tipo de pessoa que não julga o valor pela etiqueta de
preço. Se eu estiver certa, meu presente não tem preço.
— Você me deixou intrigada agora...
— Isso é o que eu esperava. Pode ser à uma hora?
— Claro. Por que não.
— Woodwards na rua principal. É o pequeno café do mesmo
lado do Beanery.
— Eu sei onde é. Perfeito. Até mais, Opal.
Meu tornozelo ainda estava bastante dolorido, então saí um
pouco mais cedo para o almoço e parei na pequena farmácia da
cidade para comprar uma atadura. A mulher atrás do balcão
sorriu para mim. — Você deve ser Josie.
Eu já deveria estar acostumada com isso, mas ainda assim me
pegava desprevenida quando um estranho sabia meu nome. —
Sim. Como você sabia disso?
— Minha tia Frannie mencionou que você estava na cidade.
Além disso, reconheço você pela foto que enviou anos atrás. Eu
sou Lily Dunn. Trocamos cartões algumas vezes por ano.
Eu não me lembrava de todos os nomes da minha lista de
cartões ultimamente, mas o de Lily eu lembrava. Principalmente
porque ela me enviou um primeiro. Ela e eu tínhamos quase a
mesma idade. A tia dela contou a ela sobre o cartão que enviei e
Lily achou divertido. Ela mesma não recebia muitos cartões, então
enviou-me um pelo correio e eu a adicionei à minha lista.
— Lily, é muito bom conhecer você. Você e sua tia foram as
primeiras pessoas com quem troquei cartões. Significou muito
para mim ao longo dos anos.
— Eu também. Eu estava ansiosa para contar uma história
para você em meu próximo cartão. Você é parte da razão pela qual
meu namorado e eu ficamos juntos.
— Eu sou? Como?
— Mark era amigo do meu irmão mais velho na escola. Sempre
tive uma paixão secreta por ele, mas ele era três anos mais velho
e meu irmão via-me como uma garotinha, então isso nunca iria
acontecer. Ele foi para a faculdade e ficou noivo, e eu também.
Com o passar dos anos, ele e meu irmão perderam contato, mas
sempre fiquei de olho nele no Facebook. No ano passado, meu
noivo e eu nos separamos e, perto do Dia de Ação de Graças,
percebi que Mark havia mudado seu status de relacionamento
para solteiro. Alguns dias depois, seu cartão anual de Natal
apareceu. Não sei por que, mas isso me fez pensar. Os cartões
deixavam você feliz, então você pegou o touro pelos chifres e os
enviou, esperando receber o que deu. Naquela tarde, decidi enviar
um cartão para Mark. Escrevi um bilhete para ele e mencionei que
era solteira e perguntei se ele estaria interessado em encontrar
comigo algum dia. Ele respondeu ao cartão e uma coisa levou à
outra: estamos juntos desde um pouco depois do Ano Novo,
quando nos encontramos para jantar.
— Eu amo isso! Que bom para você, Lily. Nunca pensei que
meus cartões fossem inspiradores de forma alguma, mas estou
feliz por ter sido uma pequena parte da sua oportunidade.
Lily e eu ficamos conversando por mais quinze minutos e,
quando saí, parecia que tinha conversado com uma velha amiga.
Quase esqueci de comprar a atadura que vim buscar. A história
dela era exatamente o que eu precisava hoje, especialmente depois
que saí para olhar o deck à luz do dia e percebi que não só estava
podre, mas também o cais à beira da água.
Opal já estava sentada no café quando entrei. Ela acenou
animadamente, como se fosse possível não ver uma mulher
vestindo uma blusa verde neon. Era a segunda vez que nos
encontrávamos e a segunda roupa brilhante em que a vi vestida.
De alguma forma, as cores ousadas combinavam com sua
personalidade.
Ela levantou-se quando me aproximei e me envolveu em um
abraço caloroso com um sorriso correspondente. — Aqui está ela...
— Oi. Desculpe se estou um ou dois minutos atrasada. Passei
na farmácia e conheci alguém com quem troquei cartões.
Começamos a conversar e perdi a noção do tempo.
— Lily Dunn?
— Sim, ela é tão legal.
Opal assentiu. — Doce menina. Ela é sobrinha da Frannie. Que
bom que ela finalmente fisgou aquele Mark Butler. A garota era
louca por ele desde criança.
Sorri pensando em como Lily tinha acabado de me contar que
tinha uma paixão secreta pelo amigo de seu irmão. Parecia que
não havia muitos segredos em Laurel Lake.
Sacudi o guardanapo de pano sobre a mesa e o coloquei no
colo. Opal pegou uma pequena sacola do chão e a estendeu. —
Para você.
Fiquei curiosa, por isso fui diretamente ao papel de seda. —
Oh, meu Deus. É isso o que penso que é? — A lista telefônica era
um pouco mais grossa do que a esfarrapada que eu tinha, mas
ainda tinha menos de cinquenta páginas no total. Folheei-a com
um sorriso.
— Acabou de sair das impressoras. Ninguém ainda tem isso.
Costumava ser a cidade quem a lançava, mas eles pararam de
fazê-la há sete ou oito anos, quando foram atingidos por alguns
cortes no orçamento e perderam a garota que a atualizava. Em vez
disso, minha amiga Margene começou a fazer uma, a cada dois
anos, para arrecadar fundos. Ela vende em um pequeno espaço
publicitário e cobra dez dólares das pessoas pelo livro. Da última
vez, ela doou mais de dois mil dólares para o abrigo de animais.
Achei que a que você tinha era do seu pai, então já devia estar
desatualizada.
— Definitivamente está. A minha tem mais de vinte anos.
Ela apontou para o livro. — Essa tem endereços residenciais,
números de telefone residenciais e telefones celulares de quase
todos os residentes de Laurel Lake. Achei que isso evitaria que
alguns de seus cartões fossem devolvidos e desperdiçassem
postagem.
— Obrigada, Opal. Isto significa muito para mim.
— Meu número também está aí. Qualquer coisa que você
precisar, não tenha medo de usar.
Quando a coloquei na bolsa, a capa traseira chamou minha
atenção. Havia um anúncio de meia página da Cassidy
Construction, a maior parte com o rosto de Fox.
Opal notou meu olhar. — Ele não vai ficar feliz quando ver isso.
O rabugento se recusa a incluir suas informações no livro. Diz que
qualquer pessoa que queira ter o seu número de telefone já o tem.
Alguns meses atrás, eu disse a ele que queria fazer um anúncio
barato e que o dinheiro era para caridade. Eu não mencionei onde.
Ele resmungou bem, então tomei a liberdade de colocar a cara dele
no anúncio, junto com o número do celular dele. Achei que atrairia
mais atenção do que um logotipo.
— Oh, garota. — Eu ri. — Eu adoraria ser uma mosca na parede
quando ele visse isso.
— Ele vai me despedir. De novo. Mas então ele perceberá que
não conhece nenhuma das senhas do software que usamos e terá
que atender aos telefones e ser amigável com as pessoas. Então ele
vai se superar.
— Parece que você realmente tem o número dele.
— Ele não era muito difícil de decifrar.
— Talvez para você, mas acho o homem muito confuso.
Opal sorriu. — Ele passa muito tempo travando a guerra dentro
dele – aquela entre o bem e o mal. Mas você pode apostar em uma
coisa: Fox Cassidy sempre, no final, fará a coisa certa. Hoje em
dia, isso o irrita.
— Nos dias de hoje? Então ele não foi sempre tão mal-
humorado?
— Não.
— O que o tornou assim?
— O de sempre. Tentar mudar coisas que não poderiam ser
mudadas e, em vez disso, elas acabam mudando você. Acho que
todos nós temos coisas em nossas vidas que nos transformam em
pessoas diferentes. Às vezes é para melhor; às vezes é para pior.
Mas evoluímos e seguimos em frente da melhor maneira que
podemos.
Eu certamente entendi isso. Eu não era a mesma pessoa de
alguns meses atrás. Eu balancei a cabeça. — Isto é uma grande
verdade.
— Mas tenho um palpite de que vem aí outra mudança para
Fox Cassidy. Uma boa, desta vez. — Os olhos de Opal brilharam.
— E para você também.
Fox
— Eu estou nervosa.
Esfreguei os ombros de Evie. — Claro que você está. Você não
seria a atleta que é se considerasse o sucesso garantido.
— E se eu não me qualificar?
— Não há espaço para dúvidas neste momento. Você tem que
deixar essa merda em cima da mesa.
Eu tinha voado para Atlanta ontem à noite depois do meu jogo
para estar aqui para a eliminatória de Evie. Éramos praticamente
inseparáveis nos últimos seis meses, desde o dia em que dei uma
surra nela e ganhei um encontro. Bem, tão inseparáveis quanto
poderiam ser dois atletas profissionais que passavam doze horas
por dia treinando. Minha equipe já havia se classificado, então Evie
carregava uma pressão adicional. Tinha que voltar esta tarde, mas
senti que ela precisava de mim aqui, especialmente porque a mãe
dela também estava aqui. Uma antiga patinadora de gelo não
muito bem-sucedida, a mulher era a mãe de todas as mães de
palco controladoras. Ela também era uma alcoólatra e fanática
religiosa – uma combinação que não era divertida.
Mas por falar no diabo.
Paula Dwyer marchou até a área de espera onde Evie e eu
estávamos. Eu esperava que ela dormisse demais esta manhã,
depois de encontrá-la no bar, três léguas ao vento, quando cheguei
tarde na noite passada. Mas não tive essa sorte.
— Aí está você. Como está a perna esta manhã? Você usou a
pistola de massagem como seu treinador lhe disse para fazer? Você
sabe que não participei da competição estadual anos atrás porque
ignorei o conselho do meu treinador. Você tem vinte e cinco anos,
um dinossauro em anos de patinação artística. Isto é tudo para
você. Você estragou todas as suas outras chances. É agora ou
nunca, então você...
Quem diabos dizia ao filho que eles erraram logo antes da maior
competição de sua vida? Levantei a mão, interrompendo. — Paula.
— O quê?
— Ela está tentando manter a calma.
Sua mãe franziu a testa. — Então agora você é o especialista
em patinação artística, não é? O que você sabe sobre pressão?
Você se classificou com uma equipe.
— Fox está certo, mãe. — Eve suspirou. — Não preciso ser
lembrada de que esta é minha última chance.
— Eu só estava tentando dar-lhe um discurso estimulante. —
Paula enfiou a mão na bolsa e tirou um frasco. Ela tirou a tampa
e tomou um longo gole.
Mantive a boca fechada e sussurrei para Evie: — Por que você
não coloca seus fones de ouvido e entra no clima?
Ela assentiu. Durante os quinze minutos seguintes, observei a
tela grande enquanto Evie se espreguiçava silenciosamente e ouvia
música. O treinador dela estava ocupado lá dentro com uma de
suas outras patinadoras – uma mulher que conheci algumas vezes
nos treinos de Evie. Meu pescoço formou um nó de tensão quando
a mulher tomou seu lugar e começou sua rotina. Tudo parecia
estar indo muito bem, até que não estava mais.
Ela caiu. Não pensei que Evie estivesse prestando atenção, mas
quando olhei, seus olhos estavam grudados na tela. Ela engoliu
em seco. Poucos minutos depois, Brian, seu treinador, apareceu.
Ele reprimiu a expressão de decepção em seu rosto enquanto
caminhava até nós.
— Como você está se sentindo, Evie?
Ela pegou um fone de ouvido. — Ok. Já está na hora?
— Mais dois minutos. Mas deveríamos entrar e esperar lá.
Evie respirou fundo e assentiu, olhando para mim.
Sorri e coloquei minhas mãos em seus ombros. — Você
consegue. Sem hesitações. Deixe tudo no gelo. Com toda a força.
Você me entendeu?
Ela assentiu.
Sua mãe se colocou entre nós. — O Senhor nos abençoou com
esses talentos. Vamos honrá-Lo.
Evie baixou a cabeça enquanto sua mãe fazia uma oração. Eu
acreditava em Deus e já havia dito minha cota de súplicas pré-
competição, mas respirar o hálito do álcool da mulher que recitava
as palavras simplesmente não me agradava.
Os vinte minutos seguintes foram uma tortura enquanto
esperávamos. Felizmente, consegui livrar-me de Paula e me sentar
sozinho. Quando Evie abriu a meia porta para patinar no gelo, eu
me vi batendo três vezes no banco ao meu lado para dar sorte.
A música começou, fazendo meu coração disparar como se
alguém tivesse colocado pás em meu peito e provocado um choque.
A rotina de Evie tinha alguns movimentos iniciais, então não havia
sequer uma chance de me acalmar. Minhas mãos fecharam-se em
punhos e minha perna saltava do assento cada vez que ela saltava.
Ela estava arrasando até agora, mas seu movimento mais difícil foi
na última passagem. Prendi a respiração enquanto ela se
posicionava para a longa caminhada através do gelo. Era isso.
Eram os playoffs e os times estavam empatados, com um chute a
gol antes que a campainha tocasse.
Um chute e…
Evie voou no ar e começou a girar.
E girou.
E girou.
Parecia que ela tinha conseguido, até que ela pousou um pouco
fora.
E caiu no chão com um estrondo alto.
Dois dias depois, finalmente tive vinte e quatro horas de folga.
Parei no meio-fio em frente à casa alugada de Paula Dwyer e
desliguei o carro. Evie ainda morava com a mãe, principalmente
porque raramente estava em casa. Ela treinava desde os oito anos
de idade. Se ela não estivesse no rinque, estaria viajando para uma
das dezenas de competições nas quais se inscrevia para manter
sua classificação nacional e ganhar a vida – uma vida que
sustentasse tanto ela quanto sua mãe.
Paula atendeu a porta e jogou os braços em volta do meu
pescoço. — O atleta olímpico chegou!
Eu podia sentir o cheiro de bebida em seu hálito às dez da
manhã. Mas não era minha função dar sermões a uma mulher
adulta.
— Oi, Paula. Como você está?
— Simplesmente ótima. — Ela tropeçou para trás. — A manca
está na cozinha.
Manca. Eu tinha certeza de que essa palavra ofenderia
qualquer um, principalmente sua filha, que quebrou o tornozelo e
perdeu para sempre a chance de competir nas Olimpíadas. A
simpatia de Paula esgotou-se em tempo real com a garrafa. Passei
por ela sem responder e fui para a cozinha.
Evie estava caída sobre a mesa, ainda vestindo o moletom
vermelho, branco e azul que eu ajudei a vestir depois que o
treinador a tirou do gelo há dois dias. Seu pé engessado estava
apoiado na cadeira ao lado dela.
Eu gentilmente empurrei seu ombro. — Ei. Você está bem?
Sua cabeça se ergueu. Ela semicerrou os olhos e um sorriso
torto espalhou-se por seu rosto. — Achei que você só poderia vir
no sábado.
— É sábado.
— Oh. — Suas sobrancelhas franziram como se ela não tivesse
certeza se eu estava dizendo a verdade. — O que aconteceu com
sexta-feira então?
Peguei o copo vazio ao lado dela e cheirei. Fedia como a mãe
dela. — Suponho que você bebeu.
Ela encolheu os ombros e sua cabeça caiu de volta na mesa. —
Tanto faz.
Suspirei e olhei ao redor da cozinha. A pia estava cheia de
pratos. Havia duas caixas de pizza abertas sobre o balcão, com
algumas fatias do dia anterior dentro. E a lata de lixo estava
transbordando. Movi uma sacola da Wendy amassada em cima e
olhei mais fundo. Embaixo havia uma alça vazia de Tito e uma
garrafa quebrada de Jack Daniel's. Havia também algumas latas
de suco e refrigerante, que imaginei pela aparência das coisas,
tinham sido os misturadores.
Evie já estava roncando, então a peguei da mesa e a levei para
o quarto. Isso não estava melhor. Havia copos e pratos meio vazios
espalhados e roupa suja por toda parte. A mala que ela levara na
competição ainda não havia sido aberta.
Coloquei-a na cama e tirei a louça suja. Eu não estava
julgando. Deus sabe que tive minha cota de farras depois de uma
derrota difícil. Inferno, eu conhecia alguns caras da liga que faziam
isso depois de cada jogo. Eu odiava que ela tivesse dor para
anestesiar. Embora eu não tivesse certeza do que fazer comigo
mesmo enquanto ela dormia. Arrumei o quarto dela, lavei algumas
roupas e acabei limpando a cozinha. Os armários e a geladeira
estavam quase vazios, então depois de um tempo fui ao
supermercado. Eu poderia usar o ar fresco de qualquer maneira.
Quando voltei, a mãe dela estava na cozinha, mas Evie ainda
estava desmaiada. Paula sentou-se à mesa bebendo enquanto eu
guardava os itens que havia comprado. Quando terminei, sentei-
me em frente a ela.
— Ela está levando isso a sério, hein?
Paula acendeu um cigarro e soprou a fumaça na minha cara.
— Claro que ela está. Ela estragou seu futuro. O que ela vai fazer
agora?
Eu balancei minha cabeça. — Ela tem vinte e cinco anos e é
saudável. O tornozelo dela vai sarar. Há muito que ela pode fazer.
— Como o quê? Dar aulas de patinação no gelo por um salário-
mínimo?
— Se é isso que quiser fazer e a deixar feliz.
— Como ela vai colocar comida na nossa mesa fazendo isso?
Nossa. Evie já era o vale-refeição dessa mulher há muito tempo.
Eu estava pedindo para Evie morar comigo. Só nos víamos há
seis meses, mas não era fácil encontrar tempo para ficarmos
juntos quando ela morava em Chicago e eu disputava quarenta e
um jogos fora de casa por temporada. Além disso, pensei que seria
bom para ela estar perto do pai e da esposa dele, em vez de Paula.
— Vou pedir a Evie para ir morar em Laurel Lake comigo.
— Isso só fará mal a ela.
— Como assim?
— Quando você vive a vida em um carrossel e ela para de
repente, você encontra uma maneira de fazê-la girar novamente.
— O que isso significa?
— Você vai ver. Eu e minha garota somos feitas do mesmo
tecido.
Fox
Era a quarta vez que entrava no quarto de hóspedes do segundo
andar esta manhã. Eu duvidava que tivesse vindo tantas vezes no
último ano. Mas o cenário da janela havia mudado recentemente e
era muito agradável aos olhos. Eu tinha uma visão panorâmica do
quintal ao lado, onde Josie estava estirada em um tapete de ioga,
com a bunda para cima, no que pensei que poderia ser chamado
de cachorro descendente.
Tomei um gole de café enquanto observava, sentindo-me um
pouco como um cachorro. No entanto, eu não conseguia me
afastar. Alguns minutos depois, porém, parecia que o show estava
chegando ao fim. Josie enrolou o tapete e desapareceu lá dentro.
Eu tinha um monte de coisas para fazer hoje, e perder tempo
assistindo Miss Calça de Ioga não era uma delas. Então tomei um
banho rápido, peguei minha lista de tarefas na mesa da cozinha e
saí. Mas a caminhonete estacionada no meio-fio me parou depois
de apenas alguns passos.
Maldito Porter. O que diabos ele estava fazendo lá?
E por que de repente senti necessidade de quebrar alguma
coisa?
Adicionei mentalmente outro item à minha lista de tarefas: ir
até o rinque e bater em alguns discos com um taco. Era isso ou
transar, e eu não estava com muito humor para o que acontecia
antes e depois de transar, ou seja, uma conversa educada.
Fiquei na varanda por alguns minutos, lutando para impedir-
me de ir para a porta ao lado. Havia um milhão de razões para não
ir.
Merda para fazer.
Não estava interessado – bem, pelo menos minha cabeça não
estava. Meu pau parecia bastante ansioso.
Socar um funcionário era algo desaprovado. Embora ele não
estivesse no trabalho no momento...
Olhei para minha caminhonete, tentando fazer com que os
meus pés se dirigissem para ela. Mas os filhos da puta não
cederam.
Então ouvi uma risada, uma risada feminina que flutuou no ar
e fez coisas dentro do meu peito que eu não liguei nem um pouco.
Era como se alguém tivesse aumentado o calor do sangue que
corria em minhas veias. O calor penetrou na parte superior do meu
corpo, dando-me a sensação de estar enfiado sob um cobertor de
flanela perto do fogo.
Tirei o pensamento da minha cabeça. Sério. Que porra
aconteceu comigo?
Irritado comigo mesmo, forcei um pé na frente do outro e
consegui subir na minha caminhonete e sair da garagem.
Não olhe. Não olhe.
Eu me dei um discurso estimulante muito necessário enquanto
colocava a caminhonete em movimento. Mas quando passei pela
caixa de correio dela, prestes a passar pela grande janela saliente,
percebi que cometi um erro de novato. Eu deveria ter ido para o
outro lado. Porque não havia nenhuma maneira no inferno que eu
pudesse parar de olhar.
O rosto sorridente de Porter me fez pisar no freio e parar no
meio-fio tão rápido que esqueci completamente a caixa de correio.
Eu a acertei com um estrondo alto.
Foda-se minha vida.
Saí do carro e dei a volta para o lado. Minha caminhonete tinha
um amassado decente no painel traseiro e a caixa de correio estava
no chão. Pior ainda, Josie estava saindo com Porter a reboque.
— Você está bem? — Seu rosto demonstrava preocupação
genuína.
— Sim — eu resmunguei. — Estou bem.
— O que aconteceu?
— Eu, uh, esqueci uma coisa em casa. Fui dar a volta e não vi
a caixa do correio.
Os lábios rosados de Josie curvaram-se em um sorriso
exultante. — Parece que não sou a única capaz de deixar de ver
um receptáculo de correspondência vermelho brilhante.
Eu fiz uma careta. — Você poderia pelo menos fingir que não
está gostando disso.
O sorriso dela alargou-se. — Quem eu? Não estou gostando de
nada.
De alguma forma, consegui esquecer tudo sobre o homem
parado atrás dela. Pensamento positivo, suponho. Mas assim que
notei o sorriso malicioso em seu rosto, foi aí que estabeleci o limite.
Apontei para sua boca. — Você, eu não vou tolerar o sorriso.
O filho da puta riu.
— O que você está fazendo aqui, afinal? — eu rosnei.
— Vim deixar um cavalete para Josie.
— Cadê?
Porter apontou em direção à casa. — Lá dentro.
— Então por que você ainda está no meu quarteirão? Já é ruim
o suficiente ter que ver você a semana toda.
O sorriso do idiota alargou-se. Ele estava realmente gostando
dos meus insultos, porque eu tinha muito o que atirar em sua
direção se ele quisesse...
— Josie me convidou para tomar um café.
Olhei para ela. — É melhor tomar cuidado. Eu o contratei para
um trabalho extra há três anos. Não consigo fazer com que ele
deixe de voltar.
Ela balançou a cabeça com um sorriso. — Você gostaria de
juntar-se a nós para tomar um café também, Fox?
Embora eu odiasse a ideia dos dois sozinhos, odiava ainda mais
a maneira como estava agindo esta manhã. Então recusei a
contragosto. — Tenho merda para fazer.
Virei-me para voltar para o carro, percebendo que ainda estava
com a caixa de correio na mão. Carrancudo, eu a segurei sem olhar
para trás. — Vou comprar uma dessas também.
Passei o resto da manhã cozinhando enquanto fazia algumas
tarefas. Fui trocar o óleo, fui ao viveiro para colher tomates que
demorei a plantar, parei no supermercado e depois fui à loja de
materiais de construção comprar um novo chuveiro para
substituir o que estava vazando. Enquanto estava lá, encomendei
uma nova caixa de correio para Josie e parei na seção de decks
para obter alguns preços para seu deck podre. Fiquei fora por mais
de três horas, então não esperava ver a caminhonete de Porter ao
voltar. Infelizmente para mim, não foi a única coisa que vi.
— Que diabos está fazendo? — Atravessei a grama e encontrei
um Porter sem camisa no final da entrada da garagem de Josie.
Ele jogou uma pilha de madeira no meio-fio e enxugou o suor da
testa.
— O que parece que estou fazendo? Livrando-me daquele deck
podre lá atrás.
— Mas por quê?
Ele encolheu os ombros. — Eu vi a atadura no tornozelo de
Josie e ela contou o que aconteceu na outra noite. Eu me ofereci
para ajudá-la.
Eu não tinha o direito de sentir-me territorial, mas isso não me
impediu de querer empurrar Porter para dentro do carro e terminar
o trabalho eu mesmo.
— Ela não é uma de suas companheiras de foda, Porter. Você
deveria deixá-la em paz.
— Eu pensei que você não gostava dela?
Cruzei os braços sobre o peito. — Eu não gosto. Mas ela já
passou por muita coisa. Ela não precisa de um especial de Porter
Tobey agora.
— Não é desse jeito. Eu gosto dela.
Cerrei a mandíbula com tanta força que fiquei surpreso por não
ter quebrado um dente. — Deixe-me descarregar minha
caminhonete e eu lhe darei uma mão. — Tradução: quanto mais
cedo terminar, mais cedo você sairá daqui.
— Tudo bem. Estou quase na metade.
— Estarei aí em alguns minutos.
Joguei as sacolas do porta-malas dentro de casa e rapidamente
coloquei roupas de trabalho. Ao contrário do amante, eu não seria
estúpido e carregaria tábuas de madeira vestindo short, sem
camisa e um maldito par de chinelos.
Na casa ao lado, parecia que eu era o único que havia mudado
para fazer algum trabalho. Josie ainda estava com o traje de ioga
justo que usava esta manhã. A única coisa que ela mudou foi
adicionar um par de luvas de trabalho. Eu fiz uma careta, não
porque não apreciasse a roupa, mas porque não era o único a
apreciar. Josie abaixou-se para puxar uma tábua e os olhos de
Porter a seguiram. Limpei a garganta para lhe dar a cortesia de
saber que eu estava chegando. Ele teve sorte de ter recebido um
aviso e não meu punho.
Josie recostou-se, segurando-se na tábua, colocando seu peso
atrás dela para tentar puxá-la para cima. Balancei a cabeça e fui
atrás dela.
— O que você acha que vai acontecer quando isso subir ou
quebrar ao meio com você inclinada assim?
— Acho que haverá um pedaço de madeira podre a menos.
Apontei para as cadeiras Adirondack que ficavam à beira do
lago. — Vá sentar-se.
— Você não pode me dizer o que fazer dessa maneira.
— Você machucou o tornozelo há dois dias. Você não deveria
apoiar-se nele e, definitivamente, não deveria carregar madeira
pesada para o meio-fio. — Levantei meu queixo para Porter. —
Vamos terminar.
— Não, Fox. Não é que eu não aprecie toda a sua ajuda, porque
aprecio. Você foi um salva-vidas, para ser honesta. Mas não gosto
do tom com que você acabou de falar comigo. — Ela encolheu o
queixo e aprofundou a voz. — Vá sentar-se! Eu não sou um
cachorro, você sabe.
Suspirei. Aqui iríamos nós outra vez. — Como você gostaria que
eu pedisse, Josie?
— Não sei. Só não me mande fazer nada. É rude.
Respirei fundo. — Está bem. Por que você não vai sentar e nós
terminamos isso para que seu tornozelo não piore?
Ela sorriu. — Isso foi muito bom. Mas acho que estou bem. Eu
não preciso me sentar.
Essa mulher me deixava louco. Pelo canto do olho, peguei
Porter com um sorriso de merda no rosto. Parecia que ele estava
prestes a explodir de tanto rir.
— O que há de tão divertido? — eu gritei.
— Nada, chefe. — Porter riu, mas foi inteligente o suficiente
para voltar ao trabalho, mesmo que tecnicamente não estivesse
trabalhando no momento.
Durante a meia hora seguinte, Porter e eu arrancamos o resto
do deck apodrecido e empilhamos no meio-fio. Bem, tecnicamente,
Josie também puxou algumas tábuas. Quando terminamos,
estávamos todos suando.
Josie tirou as luvas sujas de trabalho e olhou em volta. — Vocês
fazem tudo parecer tão fácil.
— Isso não foi nada. — Porter piscou. — Isso me mantém em
forma.
— Oh, sim? Esta semana temos algum concreto para quebrar
e transportar. Eu ia trazer um trabalhador para ajudar na
execução. Mas se você quer manter a forma...
Josie riu. — Posso pegar uma limonada, uma cerveja ou algo
assim para vocês? Talvez um almoço?
Porter olhou para o relógio. — Eu adoraria ficar, mas na
verdade tenho que correr. Pode ficar par outra hora?
Ela sorriu. — Claro. Obrigada novamente por tudo.
— Mando uma mensagem. Talvez eu possa levar você para
tomar uma cerveja uma noite?
Os olhos de Josie voltaram-se brevemente para mim antes de
forçar um sorriso. — Hum... claro.
Porter sorriu. Enquanto isso, eu me perguntava o que causaria
mais dor: dedos ou dentes quebrados. Embora ele estivesse
completamente alheio. Ele deu um tapinha no meu ombro. — Vejo
você de manhã, chefe.
Boa viagem. Consegui acenar com a cabeça.
Assim que o prodígio sem camisa desapareceu, Josie olhou
para mim. — E você? Você quer uma cerveja ou algo para comer?
Dei de ombros. — Vou querer os dois.
Ela sorriu. — Ok. Vou me lavar e trocar. Então providenciarei
sanduíches e bebidas para nós. Você quer entrar e esperar?
— Acho que vou tomar meu próprio banho.
— Ok. Que tal quinze minutos? Vou levar os sanduíches para
o seu deck, já que você realmente tem um?
— Parece bom.
Tomei um banho rápido e vesti um short e uma camiseta.
Estava quente demais lá fora, e a umidade fazia o ar parecer
melaço nos pulmões. Geralmente o lago oferecia uma brisa, mas
não hoje.
Nos fundos, Josie veio flutuando da porta ao lado usando um
traje rosa pastel. Ela havia acabado de tomar banho, com o cabelo
molhado penteado para trás em um rabo de cavalo, carregando em
uma das mãos duas Coronas com rodelas de limão enfiadas no
gargalo e na outra um prato com sanduíches. O cheiro de baunilha
flutuou no deck alguns metros antes dela, e mais uma vez,
encontrei meus olhos vagando até sua clavícula.
A vista era espetacular e não tentei esconder minha
observação.
Ela sorriu quando pisou no deck. — Alguém parece com fome.
Você não tinha ideia, porra. Peguei o prato e a cerveja com um
agradecimento e percebi, enquanto Josie acomodava-se na cadeira
à minha frente na mesa, que era a primeira vez que uma mulher
vinha até aqui em muito tempo. As mulheres que trouxe para casa
passavam a maior parte do tempo no meu quarto. Eu não gostava
muito do dia seguinte, então geralmente também não fazia festa
do pijama. Mas eu não poderia dizer que não gostava de ter algo
bonito para ver enquanto comia. Para ser honesto, a companhia
dela também não era ruim. O que não me agradava muito era o
fato de me envolver com o tipo de mulher que Josie era.
— Então adivinhe? — Ela levou a cerveja aos lábios.
— O quê?
— Noah não liga há dois dias, desde que você ameaçou pular
de um arbusto e esmagá-lo como um inseto quando ele menos
esperava.
— Isso é bom.
— Eu estava pensando em você enquanto estava no banho.
Arqueei uma sobrancelha. — Oh, sim?
Ela riu. — Não assim, garoto sujo.
Vergonha. Porque vinha pensando em você assim com mais
frequência durante meus banhos ultimamente.
— O que você estava pensando então?
— Você é meio que um enigma. A maioria dos homens é como
Porter. Eles fazem coisas boas para as mulheres porque querem
algo em troca. Mas não você. Você é mais parecido com o Super-
Homem. Você aparece quando preciso de ajuda e depois
desaparece durante dias, voltando a ser o mal-humorado Clark
Kent.
— Confie em mim, não sou um herói. Mas você deve ter cuidado
com caras que só fazem algo porque querem algo em troca.
Ela mordeu seu sanduíche. — Você quer dizer caras como
Porter? Não sei. Acho que se eu descartasse os homens que
querem alguma coisa, sobrariam muito poucos. Porter parece
bastante inofensivo, embora não seja meu tipo.
Não gostei de sentir-me aliviado ao saber que ela não estava
interessada em Porter. Mesmo assim, não consegui evitar de
bisbilhotar.
— Qual é o seu tipo?
Ela encolheu os ombros. — Não tenho mais certeza se sei. Acho
que sou melhor em saber o qual não é. Porter é legal, mas parece
um jogador.
Meu lábio curvou-se. — Boa decisão.
— E você? Você tem um tipo?
— Sim. Simples.
Ela riu. — O que isso significa, simples? Como um simplório?
Alguém que é ingênuo?
— Não, não um simplório. Simples. Tipo, o oposto de
complicado.
— Então, um acordo do tipo sem compromisso? Esse é o seu
tipo?
— Não sou contra compromisso. Só não gosto do tipo que me
dá nós. E para que fique claro, refiro-me a nós figurativos. Não os
literais. Esses eu não me importaria.
Josie sorriu. — Obrigada pelo esclarecimento.
— De nada.
Ela olhou para o lago. Eu observei o rosto dela. Ela estava
gostando da vista, mas depois pareceu pensar em outra coisa, algo
menos agradável.
— O que você quer saber? — perguntei.
Suas sobrancelhas se juntaram. — Como você sabia que eu ia
perguntar uma coisa?
— Você não é propriamente uma pessoa difícil de ler.
— Oh, sério?
Inclinei o gargalo da minha cerveja para ela. — Sério.
Ela apertou os olhos fechados. — No que estou pensando
agora?
— Não disse que eu era um maldito leitor de mentes. Disse que
posso ver em seu rosto quando você está analisando algo demais.
— Eu faço isso. Às vezes, pode ser debilitante. Na verdade, meu
terapeuta me deu alguns truques para tentar parar de fazer isso.
— O que você estava analisando demais agora?
Ela apontou para minha cadeira. — Por que você está sentado
aí.
— Número um: é minha casa. Número dois: acho que a maioria
das pessoas se senta quando está comendo.
— Sim, mas por que você escolheu esse assento específico. Você
estava aqui antes de mim, então poderia ter se sentado nesta ou
naquela cadeira. Esta cadeira tem uma bela vista da água. No
entanto, você não se sentou nela. Eu queria saber se é porque esse
era o seu lugar habitual ou se você foi atencioso e deixou-me o
assento com a melhor vista.
Eu olhei para ela. Ela era linda, especialmente emoldurada pelo
lago. Mas a palavra complicada não era suficiente para descrever
Josie Preston. A mulher analisou por que escolhi essa maldita
cadeira.
— Bem... — ela disse. — Qual é? Essa é a sua cadeira normal
ou você deixou essa para que eu tivesse uma vista melhor?
Havia uma terceira possibilidade que ela não havia
considerado: que não importava onde eu me sentasse, porque
minha visão seria muito boa com ela à minha frente. Mas eu não
compartilharia esse boato.
Eu balancei minha cabeça. — Pare de pensar demais e termine
seu sanduíche.
Comemos o resto em um silêncio feliz, Josie apreciando sua
vista e eu olhando de relance para a minha. Não era de
surpreender que não fui eu quem falou primeiro.
— Você já nadou no lago?
E lá se foi a paz que eu estava sentindo. — Não.
— A água está contaminada?
— A água está boa.
— Você não sabe nadar?
— Eu sei nadar, Josie.
— Caramba. — Sua testa e nariz franziram-se em conjunto. —
Você não precisa ficar tão irritado. Era só uma pergunta.
— E dei uma resposta. O problema com você é que isso nunca
é suficiente.
— Caramba. Não percebi que havia um problema comigo.
Obrigada por avisar.
Ela se levantou e dobrou seu prato de papel agora vazio. — Eu
posso dar uma sugestão. Obrigada novamente por toda a sua
ajuda hoje. E desculpe se sou muito faladora para o seu gosto. —
Ela deu alguns passos para trás e se virou. — Podemos manter
nossa amizade limitada a você arrastar minhas latas de lixo para
o meio-fio quando eu esquecer. Obrigada por fazer isso de novo
ontem. Ah, e acho que você está me observando pela janela
enquanto faço ioga. Você parece gostar mais disso do que de
conversar comigo.
Josie
Entrei no quintal errado?
Havia balões, música, meia dúzia de coolers e um bando de
homens reunidos perto de uma churrasqueira fumegante. Devia
ser uma festa de aniversário. Ou talvez uma festa de formatura.
Não consegui encontrar o número da casa quando parei, mas à
esquerda estava seiscentos e doze e à direita seiscentos e
dezesseis, então parecia lógico que este fosse seiscentos e
quatorze.
Eu me virei para sair de fininho antes que alguém percebesse
que eu tinha acabado de invadir a festa deles, quando ouvi meu
nome.
— Josie! Aí está você! — Bernadette Macon ficou na ponta dos
pés, agitando o braço enquanto acenava do outro lado do quintal.
Oh, senhor. Estava no lugar certo. Mas essa definitivamente não
era uma reunião pequena...
Hesitei antes de ir encontrá-la no meio do quintal. Bernadette
envolveu-me em um abraço como se fôssemos amigas há muito
perdidas, em vez de pessoas que se conheceram na cafeteria na
semana passada.
Eu sorri. — Achei que estava na casa errada. Não sabia que
você estava dando uma festa hoje. Por alguma razão, pensei que
seríamos apenas nós e Tommy Miller, talvez alguns outros amigos.
Ela acenou com a mão para o quintal lotado e riu. — Estes são
alguns outros amigos.
Devia haver cinquenta pessoas circulando. — Não tenho
certeza se conheço tanta gente — falei.
Bernadette enganchou seu braço no meu. — Bem, você
conhece agora. Todas essas pessoas estão aqui para conhecê-la.
Você trocou cartas com muitas delas. Quando se espalhou a
notícia de que você era a convidada de honra hoje, meu telefone
tocou muito. Foi divertido ser popular novamente.
Quando olhei em volta, todos os olhos estavam voltados para
mim. Foi um pouco opressor.
— O que você tem aqui? — Ela apontou para as coisas que eu
estava carregando. — Precisa ir para a geladeira? Se esse for o
caso, poderá ter que ser colocado em cima do gelo em um dos
refrigeradores de cerveja. Minha geladeira está cheia de oito
bandejas gigantescas de salada de macarrão havaiana. É o favorito
de Troy Zimmerman. Sua esposa faleceu há seis meses – que Deus
a tenha – e as mulheres estão todas à caça agora. Não sei por que
elas se preocuparam, ele só terá olhos para Georgina Mumford.
Ela tem um grande gingado.
— Um gingado?
Bernadette apontou para seu pescoço. — Pele flácida. Troy
sempre teve uma queda por uma mulher bamboleante. A esposa
dele parecia um peru nesse aspecto.
Eu não tinha certeza do que dizer sobre isso, então levantei as
caixas. — Uh. Não. Nada precisa ser refrigerado. Fiz cupcakes e
biscoitos arco-íris.
— Bom. Vamos, vamos colocá-los dentro e pegar um pouco de
vinho para ajudar a acalmar seus nervos. Você está com a mesma
aparência que meus alunos sempre tinham quando eu aplicava
um teste surpresa na aula de inglês.
Algumas senhoras preparavam comida na ilha da cozinha.
Assim como no quintal, todas pararam o que estavam fazendo
quando entrei.
— Agora não assustem a pobre garota. — Bernadette acenou
para elas. — Ela não é um chimpanzé no zoológico.
As senhoras prontamente ignoraram Bernadette e
aproximaram-se uma de cada vez para se apresentarem.
— Prazer em conhecê-la — disse a mais jovem das três
mulheres. — Eu sou Lauren Arnold. Já trocamos cartões há muito
tempo. O meu é aquele com quatro cachorros na frente.
Eu apontei. — Você sempre veste os cachorros com fantasias
de temas infantis, mas acrescenta um tema natalino, certo?
A mulher sorriu com orgulho. — Essa sou eu. Eu sou uma
costureira. Faço fantasias personalizadas para crianças no
Halloween. Bem, e agora também para animais de estimação. As
pessoas gostaram do meu cartão de Natal e começaram a
perguntar se eu faria algo para seus animais de estimação. Então
agora meu negócio é quase meio a meio, fantasias humanas e de
animais.
— Eu adorei a cena da festa do chá do Chapeleiro Maluco que
você fez no ano passado.
Depois de Lauren, conheci Wanda e Rena e finalmente uma
senhora chamada Hope. Hope era pequena, tinha cabelos
naturalmente brancos que combinavam com ela e lindos olhos
verdes. Havia algo familiar nela, então pensei que talvez tivéssemos
trocado cartões e o dela tivesse uma foto.
— É um prazer conhecer você, Josie. — Ela deu um tapinha na
minha mão e segurou-a. — Seu pai era um querido amigo meu.
Fiquei muito triste ao saber de sua morte anos atrás.
— Obrigada.
Bernadette Macon entregou-me uma taça de vinho e entrou na
conversa. — Hope está sendo educada, porque, ao contrário de
mim, ela é uma verdadeira dama. Ela e seu pai eram mais que
amigos. Eles costumavam chupar a cara um do outro nas escadas
da escola sempre que podiam.
Hope corou. — Bernadette, fique quieta agora. Josie não quer
ouvir sobre isso. Éramos apenas crianças. O pai dela era um
homem casado e feliz.
— Na verdade, eu adoraria ouvir sobre meu pai quando ele era
mais jovem. Ele morreu quando eu tinha treze anos, então nunca
tive a oportunidade de perguntar sobre sua adolescência, além de
saber o quanto ele adorava morar aqui em Laurel Lake.
— Os dois eram inseparáveis desde a sétima série — disse
Bernadette. — Então, qualquer coisa que você queira saber sobre
seu pai, esta aqui saberá. Caso contrário, pergunte ao seu melhor
amigo, Tommy Miller. Ele estará aqui um pouco mais tarde.
— Sério? Você e meu pai foram um casal por tanto tempo?
Hope sorriu e assentiu. — E quando olho para trás, não tenho
nada além de boas lembranças do tempo que passei com Henry.
Ele tinha uma grande personalidade, mas também era um
cavalheiro, mesmo quando jovem. — Seus olhos perderam o foco
por alguns segundos e seu sorriso alargou-se. — Ele também
contava as piores piadas.
Eu ri. — Absolutamente nada mudou então.
Bernadette conduziu as outras senhoras até a porta. — Vamos
deixar vocês duas sozinhas para conversarem. Venha me
encontrar quando estiver pronta para mais apresentações, Josie.
— Ok, obrigada.
Sozinhas, Hope e eu nos sentamos à mesa da cozinha. Não
pude deixar de notar as diferenças entre ela e a Dra. Melanie
Preston. Mamãe era alta, com cabelos e olhos escuros. Ela tinha
um rosto severo, um sorriso experiente e não seria pega em público
sem batom. Hope era pequena e tinha um comportamento
acolhedor. Ela usava seu cabelo naturalmente branco preso em
um rabo de cavalo e seu lindo rosto estava sem maquiagem.
— Você e meu pai se conheceram na escola?
Ela assentiu. — Nós nos conhecemos. Ele estava na banda e eu
na guarda colorida, e também fazíamos álgebra juntos. Éramos
amigos, mas ambos éramos muito tímidos. Matemática era muito
fácil para mim, mas álgebra era uma aula avançada e algumas
crianças tinham dificuldades. Eu comecei a ajudar algumas das
meninas. Seu pai veio até mim um dia e disse que havia falhado
no último teste e precisava de ajuda. Ele perguntou se eu estaria
disposta a ser sua tutora. Passamos muito tempo juntos na
biblioteca e ele acabou admitindo que nunca havia reprovado em
um teste e que não precisava de ajuda. Ele queria passar algum
tempo comigo.
— Isso é tão engraçado. Você sabe que ele acabou sendo
professor de matemática, certo?
Ela sorriu. — Eu ouvi isso. Diverti-me muito com isso.
— Então vocês dois estavam juntos desde a sétima série?
— Oitava, na verdade. Dia dos Namorados, para ser exata. —
Hope balançou a cabeça. — Seu pai foi para a escola de terno e
levou-me flores, depois perguntou se eu seria namorada dele. Os
outros meninos o repreenderam ferozmente por usar aquele terno,
mas Henry não se importou.
— Isso é tão doce.
— Seu pai era um homem muito doce. Tenho certeza de que
sua mãe também é especial.
Forcei um sorriso. — Oh, minha mãe é mesmo especial.
Hope e eu passamos os próximos vinte minutos conversando.
Ela me contou mais algumas histórias sobre meu pai. Estava claro
que ela e minha mãe tinham mais do que diferenças físicas. As
duas mulheres não poderiam ser mais opostas uma da outra. Hope
parecia o tipo de mulher que se encaixaria perfeitamente com meu
pai. No entanto, por mais que eu sentisse que meus pais eram uma
estaca redonda e um buraco quadrado, não havia como negar que
meu pai era louco por minha mãe. Supunha que os opostos às
vezes se atraíam. O que me fez pensar no meu vizinho mal-
humorado. Não nos falávamos desde ontem, quando ele me ajudou
a arrancar o deck e compartilhamos um bom lanche – apenas para
ele calar-me por falar demais. O homem era tão confuso quanto
bonito.
— Posso fazer uma pergunta pessoal, Hope?
— Claro.
— Por que você e meu pai terminaram?
— Ele entrou em Yale e eu fiquei aqui para fazer faculdade
comunitária. Achei que seria melhor se Henry experimentasse as
coisas, então terminei. Você sabe... se você ama alguém, liberte-o
e tudo mais. — Ela sorriu. — Acontece que foi o melhor. Ele
encontrou o amor de sua vida na faculdade. Alguns anos depois,
conheci o meu. Meu Joseph faleceu há dois anos.
— Sinto muito pela sua perda.
— Obrigada. Nunca vou superar isso, mas estou trabalhando
para me manter ocupada. Dou aulas de tricô e faço algum trabalho
voluntário agora. — Ela sorriu. — Tenho certeza de que sua mãe
teve que se ajustar depois que seu pai faleceu. Não é uma tarefa
fácil.
Balancei a cabeça, mantendo para mim mesma que minha mãe
definitivamente não estava tricotando nem sendo voluntária.
Minha mãe enlutada nem tinha tirado folga no dia do velório do
meu pai. Ela havia feito duas cirurgias antes do início do horário
de atendimento da tarde.
— Quanto tempo você ficará na cidade? — Hope perguntou.
— Eu não tenho certeza. Provavelmente um mês ou mais. Meu
pai herdou uma casa aqui em Laurel Lake há muitos anos. Era da
minha tia. Quando ele faleceu, eu a herdei. Estava alugada há
muito tempo, mas a locatária mudou-se recentemente. Vim
consertar um pouco o lugar, mas está em pior estado do que eu
pensava. Isso está me mantendo ocupada. Mas eventualmente
terei que voltar ao trabalho.
— A casa era da sua tia Tessa? Acho que essa era a única irmã
do seu pai, certo? Na Rosewood Lane?
Eu balancei a cabeça. — Esse é o lugar.
Hope sorriu. — Um dos meus filhos mora naquele quarteirão.
Você deve entrar em contato se precisar de alguma coisa. Ele é
muito doce. E ele trabalha com construção, então ele também tem
todas as ferramentas disponíveis. — Opal entrou na cozinha vinda
do quintal. Hope sorriu para ela. — Na verdade, ele é o chefe de
Opal agora.
— Você é... — Pisquei algumas vezes. — Você é a mãe do Fox?
— Eu sou. Vocês dois já se conheceram?
— Nós, umm... — Eu não ia dizer a essa simpática senhora que
seu filho alternava entre ser um idiota e assumir a construção da
minha casa. Em vez disso, sorri. — Ele na verdade mora na casa
ao lado.
— Isso não é alguma coisa? Eu sabia que Tessa morava naquele
quarteirão, mas não conseguia lembrar qual era a casa. Bem,
espero que ele esteja sendo um bom vizinho.
Se ser um bom vizinho significava me ver fazendo ioga do
segundo andar... claro. Embora eu estivesse valorizando o positivo.
— Ele já me ajudou bastante.
Ela sorriu com orgulho de mãe. — Maravilhoso. Meu filho pode
parecer um mesquinho no início, mas ele tem um bom coração.
Ele arranja tempo para almoçar comigo todas as quintas-feiras
desde que seu pai faleceu, e ele me deixa ir decorar sua casa duas
vezes por ano – pendurar cortinas novas e outras coisas – mesmo
sabendo que ele não está nem aí para tudo isso.
Eu sorri. — Você disse um de seus filhos. Seus outros filhos
também moram na cidade?
Hope balançou a cabeça. — Agora é só Fox. Meu outro filho,
Ryder, faleceu há anos. Acho que nunca me lembrarei de dizer meu
filho em vez de meus filhos.
— Claro que não. Sinto muito pela sua perda.
— Obrigada.
Opal interrompeu nossa conversa. — Posso roubar um pouco
a nossa convidada de honra? Quero apresentá-la às pessoas.
— Claro — disse Hope. — Foi maravilhoso conhecer você, Josie.
Você é tão adorável quanto seu pai era.
— Obrigada.
As horas seguintes foram um turbilhão. Opal apresentou-me a
dezenas de pessoas, e a maioria tinha uma história para contar
sobre meu pai. Aprendi mais sobre sua infância em uma tarde do
que em toda a vida. Henry Preston adorava pescar, tocar bateria,
e ele e seu amigo Tommy Miller eram aparentemente uma dupla
de brincalhões. Ele adorava pintar, assim como eu – algo que
nunca soube sobre ele. E ele se oferecia como voluntário no abrigo
de animais, passeando com cães e limpando-os. Ginny, disse que
ele a ajudou nas aulas de matemática na escola primária. Ela
adorava cantar e odiava matemática, então papai inventou
canções engraçadas para ajudá-la a lembrar as fórmulas. Ela
acabou tornando-se a professora de música local e ensinava as
músicas dele para seus alunos por diversão.
Foi um ótimo dia, mas quando saí, senti-me um pouco
sobrecarregada – como se precisasse me sentar em um quarto
silencioso e escuro ou fazer algo estúpido e repetitivo, como andar
de bicicleta ergométrica. Meu cérebro precisava ferver por um
tempo com todas as informações que havia absorvido.
Estacionei na minha garagem e olhei para a casa do meu
vizinho. Fox estava lá fora, empurrando um carrinho de mão pelo
gramado, sem camisa. Lambi meus lábios. Sexo também
funcionaria para clarear minha cabeça. Pena que aquele corpo
estava preso a tal idiota.
Eu cutuquei aquele peito com o dedo, e era impossível não
perceber como as costuras de suas camisetas se estendiam até o
limite em torno de seus bíceps enormes, mas ver toda aquela carne
exposta de uma vez era outra coisa. O homem era seriamente
musculoso. Peitorais esculpidos, linhas profundamente gravadas
contornando os picos e vales do abdômen, músculos grossos e
protuberantes em seus braços e pernas. Não havia um pingo de
suavidade nele. Ele não se depilava como Noah, mas os pelos do
peito estavam bem aparados e combinavam com ele. Um peito sem
pelos teria parecido estranho num homem como Fox, um homem
que era tão... primitivo.
Sentei-me no meu carro, aproveitando o show gratuito à
distância. Fox andava de um lado para o outro, jogando a palha de
uma pilha na entrada da garagem no carrinho de mão, depois
rolando-a até os canteiros de flores e espalhando-a. Podia esquecer
andar de bicicleta ergométrica ou ficar sentada em um quarto
silencioso e escuro. Isso permitiu que meu cérebro desligasse. Eu
não tinha certeza de quanto tempo fiquei sentada olhando, mas
quando saí do carro, não havia sobrado muita palha na grande
pilha.
Em vez de ir direto para casa, pensei em compartilhar o que
descobri sobre a namorada do colégio do meu pai. Além disso, uma
visão de perto não faria mal...
— Ei. — Eu sorri. — Adivinha quem eu conheci hoje?
Fox olhou e continuou empurrando o carrinho de mão. — Um
empreiteiro para assumir o conserto daquela merda de casa que
você tem, espero.
— Não é uma casa de merda. Só precisa de um pouco de
concerto.
— Sim — ele zombou. — E um caminhão cheio de dinheiro.
Eu fiz uma careta. — Agora nem estou com vontade de contar
minhas novidades engraçadas.
— Ah, não — ele disse categoricamente.
— Idiota.
Fox tirou uma luva de trabalho e usou as costas da mão para
enxugar o suor da testa. Seus olhos caíram para o meu torso, como
se ele estivesse percebendo que eu tinha um pela primeira vez. Ele
engoliu em seco antes de falar. — Quais são as suas novidades?
— Conheci a namorada do colégio do meu pai hoje.
Ele encolheu os ombros. — Ok. Eu vou morder a isca. Como
foi?
— Foi bom. Ela foi tão doce e não tinha nada além de coisas
gentis a dizer sobre ele. Na verdade, o dia inteiro foi incrível. Mas
essa não é a parte engraçada.
— Parece que você vai explodir se não contar isso, Josie.
Eu sorri. — O nome da namorada do meu pai era Hope.
As sobrancelhas de Fox juntaram-se. — Hope o quê?
— Hope Cassidy! — Bati palmas de entusiasmo. — Isso não é
loucura? Sua mãe e meu pai foram um casal, aparentemente por
muito tempo, durante todo o ensino médio.
— Ela nunca mencionou isso.
— Você já conversou sobre quem ela namorou antes de seu pai?
Nunca falei com meu pai sobre isso, nem com minha mãe.
— Eu acho que não.
— De qualquer forma... consegui não rir quando ela chamou
você de doce. De nada.
Ele estreitou os olhos. — Alguma outra notícia divertida que
você queira compartilhar ou posso voltar ao trabalho?
Fox sendo Fox, ele não esperou que eu respondesse. Apenas
agarrou as alças do carrinho de mão e começou a andar
novamente. Eu o segui.
— Você não acha nem um pouco divertido que nossos pais
namoraram?
— Não. Porque agora vou levar uma puxada de orelha por causa
de você quando for ver minha mãe. Você já é assunto de conversa
no trabalho por causa de Opal.
Fox colocou o carrinho de mão na calçada e pegou uma
vassoura para varrer os restos de palha. Ele colocou uma pá na
pilha e despejou as últimas lascas no canteiro próximo. Achei que
ele tinha terminado, mas então notei caixas de plantas alinhadas
na varanda da frente.
— Você está fazendo uma horta?
— Já tenho uma. — Ele apontou na direção oposta da minha
casa. — Está daquele lado. Melhor exposição solar lá.
— Sempre quis um jardim. Nunca tivemos um enquanto
crescia. Estava pensando em colocar plantas nas janelas do meu
apartamento, mas não tem muito espaço.
Fox balançou a cabeça. — Não sei como você pode morar em
um lugar sem quintal ou grama.
— É engraçado. Acho que não percebi que isso estava faltando
na minha vida nos últimos anos.
— Vergonha.
Olhei em volta e suspirei. — Sim.
Fox pegou dois pés de tomate na varanda.
— Você quer ajuda para plantá-los? — perguntei.
— Essa é a sua maneira de dizer que quer ajudar, mas vamos
fingir que sou eu quem precisa de ajuda e não você quem quer dá-
la?
Eu sorri. — Bastante.
Após uma pausa, ele ergueu o queixo em direção à garagem. —
Há um par extra de luvas na gaveta de cima do armário à direita.
— Ok! Mas acho que vou trocar de roupa primeiro.
— Tanto faz. — Fox encolheu os ombros. Ele claramente não
estava tão animado quanto eu.
Voltei alguns minutos depois vestindo short curto e uma
regata. Desta vez, Fox não demorou muito para perceber que eu
tinha um torso. Toda vez que eu o pegava olhando antes, dava-lhe
um passe livre, sem chamar sua atenção. Bem, exceto quando
mencionei que o vi observando-me da janela. Mas hoje senti-me
ousada. Quando seus olhos voltaram para os meus, arqueei uma
sobrancelha.
Ele ignorou o desafio e caminhou pela lateral da casa. — As
plantas vão quinze centímetros para baixo e dezoito centímetros
de distância. — Ele apontou para algumas ferramentas de jardim.
— Uma pequena pá está lá.
Na hora seguinte, Fox e eu plantamos mais de três dúzias de
tomates. Não conversamos muito, o que foi perfeitamente bom
para mim. Quando terminamos, não me senti mais sobrecarregada
pelo dia. Estranhamente, senti-me muito em paz.
Coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Eu
realmente gostei de fazer isso. Quem diria que cavar na terra
poderia ser tão relaxante mentalmente?
— Trabalhar ao ar livre faz bem ao corpo e à mente.
Tirei a sujeira das mãos e dos joelhos. — Obrigada por me
deixar ajudar. Especialmente porque sei que você teria preferido
fazer isso sozinho.
Fox assentiu.
Revirei os olhos. — Você poderia pelo menos fingir que estou
errada e que gostou da minha companhia.
Seus lábios curvaram-se. — Obrigada por me ajudar a plantar,
doutora.
Fiz uma reverência simulada. — Por nada.
Mesmo que eu não quisesse voltar para casa ainda, parecia que
era a hora. — Bem, acho que devo ir...
Fox assentiu novamente.
Hesitei por mais alguns segundos, pensando que talvez ele diria
que eu não deveria fugir tão cedo. Mas claro, este era a Fox. —
Está bem então. Tenha uma boa noite, eu acho.
Depois que dei alguns passos, ele suspirou. — Você quer uma
cerveja?
Eu me virei com um sorriso. — Você realmente quer que eu me
junte a você ou está sendo gentil porque falei sobre não querer que
eu plantasse com você?
Ele fechou os olhos e balançou a cabeça. — Você quer uma
cerveja ou não?
Dei de ombros. Dane-se. — Claro.
Josie
— Então sua mãe é tão pequena — eu disse. — E você
provavelmente tem que se abaixar e virar de lado para entrar em
alguns cômodos. Você era um bebê grande?
— Oito quilos e meio. Meu irmão tinha dez anos.
— Uau. Oito quilos e meio. Ele é maior que você agora?
— Ele faleceu há anos.
Fechei os olhos. — Desculpe. Sua mãe mencionou que havia
perdido um filho. Eu não estava pensando.
— Está bem. Foi há muito tempo.
— Eu digo exatamente a mesma coisa quando as pessoas
oferecem condolências pela morte do meu pai – que foi há muito
tempo. Acho que quero que eles se sintam melhor ao mencioná-lo.
Fox olhou nos meus olhos. — Isso também corta a conversa
pela raiz.
Eu sorri. — Entendi. Seguindo em frente... — Tomei um gole de
cerveja. — Sua mãe chamou você de doce mais de uma vez. Não
me leve a mal, mas não é uma palavra que eu usaria para
descrever você.
— As mães são tendenciosas.
— Talvez. Mas não acho que seja isso. Acho que no fundo há
um cara doce aí. Você simplesmente não quer que as pessoas o
conheçam, por algum motivo.
— Ou você está inventando outra fantasia em sua cabeça, como
aquela que você manteve durante todos esses anos sobre esta
cidade ser um lugar mítico onde todos andam sorrindo.
— Hoje fui a uma festa em minha homenagem na casa de uma
mulher que era uma completa estranha há uma semana. Todos
sorriram e se divertiram muito. Acho que é você quem inventa as
coisas na sua cabeça. Por que você não quer que este lugar seja
tão bom quanto é?
Fox levou a cerveja aos lábios. — Altas expectativas geralmente
levam à decepção.
— Caramba. Você é um saco de positividade. Talvez você
pudesse imprimir esse slogan nos crachás que os alunos do jardim
de infância usam no primeiro dia de aula. Isso acabaria com todo
o otimismo desde o início.
Seu lábio se contraiu. — Bonitinha.
— Eu sou, não sou?
Ele riu baixinho. — Então, que personagens interessantes você
conheceu na casa de Bernadette Macon hoje?
— Talvez seja mais rápido perguntar que pessoas chatas eu
conheci. Esta cidade tem um elenco de personagens. Mas vamos
ver... eu conheci Tommy Miller. Ele foi o melhor amigo do meu pai
enquanto crescia. Você o conhece?
— Cabelo ruivo flamejante e uma risada que parece sair de um
megafone? Ele é meio difícil de perder.
— Sim. Depois houve Ronnie Tremmel. Ele e meu pai faziam
parte de uma banda marcial.
— O detalhista. Ele é dono da loja de tintas da cidade. Eu odeio
entrar lá. Peço a ele algumas amostras de tinta verde e ele passa
dez minutos contando-me sobre a cor do musgo.
Eu ri. — Oh, meu Deus. Ele faz isso. Ele passou quinze minutos
descrevendo o uniforme da banda que costumavam usar – as
cores, a lapela e até os sapatos. E então ele contou sobre um prato
que ele faz e descreveu literalmente as bolhas na fervura. E quanto
a Georgina Mumford?
— A bamboleante. Ela vai acabar sendo Georgina Zimmerman.
Eu não conseguia parar de rir. — Deus, esta é realmente uma
cidade pequena.
— E sua mãe? Você conheceu alguns dos amigos dela?
Eu balancei minha cabeça. — Não. Tommy Miller, o melhor
amigo do meu pai, só a encontrou uma vez, quando ela veio passar
um intervalo da faculdade com meu pai. Algumas outras pessoas
disseram que conheciam seu irmão mais novo. Mas não tive a
sensação de que ele era muito popular. Seus rostos meio que
mudaram quando eu disse o nome dele.
— Qual é o nome do seu tio?
— Ray. Ray Langone.
O rosto de Fox fez a mesma coisa que todo mundo fez hoje. Foi
quase um estremecimento, mas as pessoas por aqui foram muito
educadas e encobriram isso. Apontei para seu queixo. — Isso. Foi
isso que eles fizeram.
— Desculpe.
— Minha mãe nunca mencionou a família dela, mas meu pai
deixou escapar uma vez que Ray era um péssimo jogador.
Aparentemente, ele ligou ocasionalmente ao longo dos anos para
pedir dinheiro.
Fox assentiu. — Ele é um jogador, certo. Bebedor e vigarista
também. Foi preso algum tempo por aceitar dinheiro de pessoas
para adiantamentos de apólices de seguro de automóvel.
— Ele não entregou os fundos à seguradora?
— Nem era agente de seguros. Simplesmente foi de porta em
porta e fez com que algumas pessoas mais velhas de algumas
cidades caíssem nas merdas dele.
— Oh.
— Até onde eu sei, ele tem se mantido longe de problemas desde
que saiu. Mora no lado norte.
— Espere... Ray Langone está vivo?
A testa de Fox se enrugou. — Eu o vi há uma semana. Algo
aconteceu?
— Bem, minha mãe disse que ele estava morto. Alguns anos
atrás, eu estava pensando em visitar Laurel Lake. Perguntei para
minha mãe quem morava aqui ainda do lado dela, e ela disse
ninguém, que o irmão dela tinha morrido de alcoolismo.
— Eu o vi saindo cambaleando do Crow Nest no fim de semana
passado.
Suspirei e balancei a cabeça. — Infelizmente, não estou tão
chocada que minha mãe diria algo assim quando não é verdade.
— Quanto tempo sua mãe morou aqui?
— Ela não morou aqui. Sua família mudou-se de Charlotte
durante seu segundo ano de faculdade. Ray é dez anos mais novo.
Eles compartilham a mesma mãe, mas têm pais diferentes. Minha
mãe já morava em Yale, em Connecticut, quando a mãe e o irmão
dela vieram morar em Laurel Lake. Na verdade, meus pais se
conheceram em um avião, voltando da faculdade para casa nas
férias de Natal. Eles perceberam que estudavam na mesma
faculdade e ambos voltavam para casa, na mesma cidade pequena.
O engraçado é que foi a última vez que minha mãe esteve em Laurel
Lake. Ela não gostava daqui. Ela não se dava bem com a mãe e
odiava que eles tivessem se mudado novamente. Aparentemente,
eles tiveram dificuldades financeiras e foram despejados muitas
vezes. Eles viveram em vários lugares ao longo dos anos. É por isso
que nunca voltamos para visitar antes de meu pai morrer, embora
ele sempre quisesse. Sempre acontecia alguma coisa com a minha
mãe.
Fox tomou um gole da cerveja, observando-me por cima da
garrafa enquanto bebia.
— De qualquer forma — eu suspirei. — Foi uma festa linda
hoje. Bernadette foi uma anfitriã tão generosa e sua mãe foi
realmente incrível. Vocês dois têm os mesmos olhos.
Um som vibrante virou nossas cabeças em direção ao lago. Um
pato branco estava sentado na beira da água, batendo as asas. Ele
se levantou e tentou andar, mas mancava e torcia para o lado.
— Ele está ferido?
— Não sei. — Fox largou a cerveja e caminhou em direção à
água. Eu o segui. De perto, a princípio pensei que o coitado só
tinha uma perna, mas depois vi a outra. Estava dobrada em
posição de flamingo, só que parecia que ele estava lutando para
abaixá-la.
— Acho que a perna dele está quebrada — falei.
— Não. Está emaranhada em alguma maldita linha de pesca.
— Fox pegou o pato. Ele surtou e bateu as asas. Seu bico laranja
abriu-se e apertou a mão de Fox. — Caramba! Estou tentando
ajudar você, seu filho da puta. Solte.
Aproximei-me e acariciei as costas do pato aterrorizado. Ele
soltou-se da mão de Fox, deixando uma marca para trás, mas a
pele não estava rasgada.
— Shh... — falei suavemente. — Tudo bem. Tudo vai ficar bem.
Fox apertou a mão e acenou com a cabeça em direção à casa.
— Preciso de um cortador para tirar a linha. Eu tenho um em
algum lugar na garagem.
Caminhamos até a garagem e ele colocou o pato em cima de
uma bancada enquanto vasculhava algumas gavetas.
Encontrando o que procurava, ele cortou a linha de pesca
transparente.
— É um lago de pesca do tipo pesque e solte — disse ele. — Os
malditos garotos cortam a linha e jogam o peixe de volta com o
anzol ainda na boca, porque é mais fácil do que tirar a farpa. Os
peixes ou morrem ou conseguem tirar o anzol, mas a linha pega os
patos quando eles passam nadando.
— Awww... esse pobre rapaz. — Acariciei as penas do animal e
ele apoiou a cabeça em meu ombro e olhou para mim.
— Claro — disse Fox. — Eu ajudo e solto você, mas você me
morde e flerta com ela.
Demorou cerca de dez minutos, mas Fox conseguiu remover
toda a linha de pesca emaranhada no pato. A linha o cortou e
deixou um grande corte em sua perna. Fox colocou o pato no chão
da garagem para ver se ele conseguia andar. Ele mancou alguns
passos em direção à porta aberta, mas depois voltou e aninhou-se
na minha perna.
— Oh, meu Deus. Ela é tão doce. Não podemos deixá-la voltar
ferida para o lago.
— Ele vai ficar bem.
— Como você sabe? — Acariciei o topo da cabeça do pato. —
Margarida pode pegar uma infecção ou sua perna pode não ser
forte o suficiente para nadar.
A testa de Fox enrugou-se. — Quem?
— Pata Margarida.
— Como você sabe que é uma pata?
— Eu posso simplesmente dizer. Ela é tão doce.
— Ele também é muito grande e tem uma pena enrolada na
ponta da cauda, então odeio dizer isso a você, mas sua Margarida
é mais provavelmente um Pato Donald.
— Você está inventando isso.
Fox encolheu os ombros. — Acredite no que você quiser. Mas
ele vai voltar para a água.
Fox foi agarrá-lo, mas Margarida enfiou o bico no meu decote.
Ele puxou as mãos para trás e resmungou. — Definitivamente um
menino.
— Vamos levá-la para o quintal e ver o que ela faz. Talvez ela
esteja com medo na garagem, já que está acostumada a ficar ao ar
livre.
— Está bem.
Levei Margarida para o quintal e a coloquei ao lado do deck. Ela
parecia satisfeita até que me sentei na cadeira Adirondack. Então
ela mancou até mim e parou entre meus pés. — Vê? Ela ainda não
está pronta para voltar para a água.
— O que você vai fazer com isso? Colocá-lo na cama ao seu
lado? Essas coisas carregam todos os tipos de bactérias e merda
por todo lado.
Ele tinha razão. Mas eu não poderia deixar essa patinha fofa
voltar para a natureza se ela não estivesse pronta. — Ela pode ficar
na minha garagem.
Fox balançou a cabeça. — O lugar dos patos não é dentro de
casa.
Peguei minha amiguinha e a coloquei no meu colo. Ela parecia
perfeitamente satisfeita. — Eu não sabia que os patos eram tão
amigáveis.
— Eles geralmente não são.
Passei minhas unhas levemente sobre a cabeça de Margarida.
— Acho que tivemos sorte então.
Fox ficou quieto por alguns segundos. — Acho que foi ele quem
teve sorte.
— Isso foi... um elogio? Porque ainda não me recuperei do
choque do último que você me deu.
Ele semicerrou os olhos. — Quando foi isso?
— Você me disse que eu parecia muito bem. Obviamente a
bajulação não é o seu ponto forte.
Fox levou a cerveja aos lábios, mas seus olhos caíram e se
fixaram no meu decote enquanto ele bebia. Depois de esvaziar a
garrafa, ele se levantou.
— Você quer outra?
— Claro. Por que não?
Ele voltou com duas Heinekens geladas e me passou uma.
— Onde você disse que meu tio morava mesmo?
— Lado norte. Complexo de apartamentos na Barnyard Avenue,
pelo menos pela última vez que soube.
— Talvez eu entre em contato. Não sei muito sobre a família da
minha mãe ou a história da família dela.
— Se você quiser. Embora às vezes seja melhor deixar o
passado onde está.
Não sei por que, mas tive a sensação de que ele não estava
apenas dando-me conselhos, mas falando por experiência própria.
Poucos minutos depois, os sprinklers automáticos do gramado de
Fox foram ligados. Cada vez que um borrifo atingia o arbusto atrás
de mim, a pobre Margarida pulava.
— Acho que deveria colocar o bebê na cama — eu disse. — O
que você acha que eu deveria preparar para ela dormir?
— Que tal grama ou um lago.
— Ha ha. Você sabe o que eu quis dizer.
— Não sei. Feno?
— Eu não tenho nenhum. Você?
— Não.
— Tem um monte de roupa de cama velha na garagem. Eu ia
jogar fora, mas esqueci quando a caçamba de lixo chegou.
— Isso vai funcionar. A menos, é claro, que esteja ruim. Pode
ter sido de uma de suas amigas.
Eu ri e me levantei. — Obrigado novamente por me deixar
plantar com você. E pela cerveja.
Fox se levantou. Não era a primeira vez que ele fazia isso –
ficava de pé quando eu ficava. Ele tinha modos à moda antiga, dos
quais eu gostava. — Boa sorte com Donald.
— É Margarida.
— Não, não é.
Eu estava na metade do caminho até minha casa quando Fox
gritou. — Ei, doutora?
Virei-me. — Sim?
— Você parece mais do que muito bem.
Meu coração disparou como o de uma colegial. — Obrigada.
— Boa noite.
— Bons sonhos, Fox.
Fox
— Você tem visto sua vizinha ultimamente? — Porter
perguntou.
Encostei-me no pilar, mexendo no telefone, esperando a
chegada do inspetor de construção. Meu funcionário deveria estar
lá dentro colocando azulejos no último banheiro do prédio. Eu não
tinha certeza do que me irritava mais, o fato de ele estar relaxando
no trabalho ou de estar farejando Josie.
Eu não levantei os olhos depois de digitar no meu celular. —
Acho que o Sr. Hanson vai visitar a filha por algumas semanas no
verão.
— Eu quis dizer sua vizinha do outro lado.
Claro que eu sabia disso. E eu também tinha visto Josie dois
dias atrás, quando ela passou a tarde testando meu autocontrole
– de quatro, com aquele short jeans curto, ajudando-me a plantar.
Mesmo assim, dei de ombros. — Não sou seu guardião.
Porter ergueu o boné de beisebol e girou-o para trás. — Liguei
para ela e perguntei se ela queria jantar nesta sexta à noite. Ela
disse que retornaria a ligação. Mandei uma mensagem ontem para
verificar, mas não obtive resposta.
— Talvez você devesse aceitar uma dica.
A testa de Porter se enrugou. — Você acha que ela não está
interessada?
O garoto era rejeitado tão raramente que nem tinha certeza de
como era. — Você ligou para ela. Ela dispensou você. Você mandou
uma mensagem, porque não entendeu a dica da primeira vez, e
mais uma vez ela lhe deu o tratamento do silêncio. Que parte disso
parece que ela está interessada?
— Achei que ela estava apenas ocupada ou algo assim.
— Se uma mulher está interessada, ela nunca está ocupada
demais para responder.
— Ai.
Voltei para o meu telefone. — É o que é.
— Talvez eu devesse enviar flores.
Eu balancei minha cabeça. — Droga, ele ainda não entendeu.
— Achei que senti algo entre nós quando conversamos —
refletiu Porter. — Você sabe, como uma faísca.
Essa conversa estava me irritando. Levantei meu queixo em
direção à entrada do prédio. — Você não tem azulejos para colocar?
— Terminei tudo que pude. Não me deram as peças do rodapé,
então terei que ir até Ludsville para pegar algumas.
— Ludsville? Não compramos todos os azulejos da Abbotts na
cidade?
— Sim, mas liguei e a Abbotts não tem os rodapés em estoque.
Eles teriam que fazer o pedido e levaria de uma semana a dez dias.
Tile Emporium os tem agora. Vou levar cerca de uma hora para ir
e voltar, mas ainda poderei terminar o banheiro hoje.
Cocei meu queixo. — Vamos fazer o seguinte. Eu vou até
Ludsville depois que Ernie, do departamento de construção,
chegar e fizer a inspeção. Por que você não começa a instalar as
tampas de aquecimento do rodapé? Elas foram entregues esta
manhã.
Porter encolheu os ombros. — Claro. O que você quiser, chefe.
— Ele enfiou a mão no bolso da calça e tirou um azulejo. — Este é
o rodapé, então você pode ter certeza de que corresponde.
— Obrigado.
Noventa minutos depois, entrei no estacionamento do Tile
Emporium. A loja estava escura. A placa na frente dizia que eles
abriam às dez, então verifiquei meu telefone. Nove quarenta e
cinco. Meu celular também recebeu uma notificação da minha
empresa de alarmes. Noventa por cento das vezes, era uma
encomenda sendo entregue ou algum animal aleatório que o
acionava, mas eu tinha tempo para matar, então deslizei para abrir
e assisti ao replay do vídeo.
Desta vez não foi diferente do habitual, exceto que o animal
aleatório que o sensor de movimento apanhou tinha hoje uma
companheira de brincadeira – e essa companheira parecia a
maldita companheira de brincadeira do mês. Josie usava um
biquíni branco e corria pelo meu quintal perseguindo um pato
manco. Levantei o telefone até o nariz para ver melhor. O que
diabos estava na cabeça do pato? Apertei a tela para aumentar o
zoom. O vídeo ficou borrado à medida que se aproximava, mas não
foi tão ruim a ponto de eu não conseguir distinguir um laço de
bolinhas azuis e brancas preso às penas no topo da cabeça do
pato.
Eu balancei minha cabeça. Eles deixaram aquela mulher sair
das férias cedo demais. Josie perseguiu o pato pelo meu quintal
por um minuto inteiro, correndo para o meu deck, atravessando o
gramado e, eventualmente, entrando no lago antes de mergulhar
de cabeça. Infelizmente, esse foi o fim do vídeo do show de biquíni.
Embora... meu sistema de segurança tivesse um recurso ativo. E
eu tinha a capacidade de controlar a câmera remotamente.
Quando cliquei no botão AO VIVO, meu quintal ainda estava vazio,
então girei a câmera para a direita.
Cada vez que pensei que essa mulher não poderia fazer nada
mais ridículo, ela me surpreendia. Ela montou uma piscina infantil
de plástico azul no meio do quintal, e um pato com uma fita na
cabeça nadava enquanto Josie nadava de costas no lago atrás dele.
Depois de alguns minutos, ela saiu da água e estacionou a bunda
na piscina infantil em frente ao pato, sorrindo. Ela espirrou água
no pato. Ele ficou de pé, bateu as asas e caiu para trás. A cabeça
de Josie inclinou-se para trás em gargalhada.
Por mais idiota que isso fosse, eu não conseguia parar de olhar
para o meu telefone. Dez minutos se passaram enquanto eu estava
sentado no estacionamento do Tile Emporium. Essa maldita
mulher tomou conta da minha manhã inteira. Inferno, não foi só
hoje. Ela estrelou meu sonho na noite passada também.
Eventualmente, uma chamada recebida no meu celular
interrompeu minha espionagem. Era um cliente, então fechei
relutantemente o aplicativo de segurança e voltei ao trabalho, mas
não antes de tirar uma foto rápida.
Depois que terminei a ligação, tive uma forte vontade de abrir
o aplicativo de segurança novamente, ou pelo menos abrir a foto
que salvei, mas tinha coisas para fazer. Então inclinei-me para o
banco do passageiro, abri o porta-luvas e joguei meu celular lá
dentro. Fora da vista. Fora da mente.
Okay, certo.
Embora eu tivesse conseguido manter-me ocupado o suficiente
para verificar a câmera de segurança apenas mais duas vezes pelo
resto do dia. Infelizmente – ou talvez felizmente para minha
produtividade – o quintal estava vazio, o dela e o meu. Josie
provavelmente estava lá dentro assistindo a um vídeo no YouTube
sobre como dominar o canto do pato ou algo assim.
No caminho para casa, parei no Laurel Lake Inn para comer
meu habitual lombo de porco com pesto envolto em bacon nas
terças à noite e, quando estacionei na garagem, o sol já estava
começando a se pôr.
Era uma noite agradável, então, depois que deixei meu laptop
em casa e me troquei, saí para jantar no deck dos fundos. A piscina
infantil de plástico não estava mais no quintal da vizinha, o que foi
decepcionante, mas definitivamente melhor para mim a longo
prazo. Abri a caixa com minha refeição e estava começando a
cortar a carne quando ouvi gritos na porta ao lado.
— Não, não, não! Caramba! — Josie gritou.
Uma porta de metal frágil abriu-se e fechou-se com um
estrondo, e o pato mancou até onde costumava ficar o deck podre
dos fundos de Josie. Ela o seguiu trinta segundos depois.
— Eu não posso acreditar no que você fez. — Ela balançou o
dedo. — Aquilo era como... seu primo.
O pato grasnou e aninhou-se em sua perna. Se eu não
soubesse melhor, poderia ter pensado que a coisa era um pedido
de desculpas.
Josie abaixou-se e coçou sua cabeça. — Ah, está tudo bem.
Desculpe por ter gritado com você.
Balancei a cabeça e voltei a cortar a carne, mas antes que
pudesse colocar a primeira mordida na boca, o pato veio correndo
em direção ao meu deck.
Josie o perseguiu, parando quando me viu sentado aqui. Ela
pegou o pato nos braços.
— Oh. Desculpe. Eu não vi você.
Fiz um gesto em círculo com meu garfo. — Não queria
interromper sua conversa com seu amigo.
Ela franziu a testa. — Margarida roubou meu jantar da mesa.
— Seu nariz torceu. — Era frango.
Eu ri. — Talvez ele esteja chateado porque você come pássaros.
Ela ficou na ponta dos pés para espiar minha bandeja de
comida. — Esse é o porco assado do Laurel Lake Inn?
— Isso é.
Josie passou a língua pelo lábio inferior. — Eu experimentei na
semana passada. É delicioso.
Eu não almocei hoje e provavelmente poderia ter comido duas
porções desta refeição, mas não me importaria com a companhia.
— Você quer um pouco?
Ela me dispensou. — Não, esse é o seu jantar. Você gosta disso.
— Há o suficiente aqui para dois.
Ela mordeu aquele seu lábio inferior carnudo. — Tem certeza?
Eu fiquei de pé. — Vou pegar um prato.
— Na verdade... — Ela apontou por cima do ombro. — O fogão
ainda está ligado e já servi uma segunda taça de vinho. Você
gostaria de comer ao lado? Vou colocar Margarida para dormir na
garagem para que ela não possa atacar novamente.
Dei de ombros. — Tanto faz.
Ela revirou os olhos. — Não pareça tão animado com isso.
Levantei minha comida e balancei a cabeça. — Vamos, antes
que eu mude de ideia e a única coisa que você tenha para comer
no jantar seja esse pato.
O interior da casa de Josie parecia muito melhor do que da
última vez que estive aqui. Os armários da cozinha estavam todos
despojados da horrível pintura verde e as portas tinham sido
recolocadas em posição reta. Ela instalou novos equipamentos, e
os eletrodomésticos de aço inoxidável que foram entregues na
semana passada deram ao ambiente uma sensação de elegância.
Mas foi o outro lado da cozinha que me chamou a atenção. Fileiras
e mais fileiras de cartões de Natal pendurados em barbantes na
parede.
Josie voltou depois de colocar Margarida na cama e percebeu
que eu estava olhando. — Eles me fazem sentir bem.
— Não estava julgando. Apenas olhando por aí. O lugar está
realmente indo bem.
Ela foi até o fogão e girou o botão. — Você não estava julgando?
Quem você está enganando, Fox Cassidy? Você acha que sou
estranha. Eu vejo isso em seu rosto.
— Por que eu acharia você estranha? Porque você pendura
cartões de Natal em casa em julho e nada em uma piscina infantil
com um pato macho que chama de Margarida?
Ela semicerrou os olhos para mim. — Como você sabia que
comprei uma piscina para Margarida?
Uh-oh. Eu não tinha escolha a não ser confessar tudo. —
Recebo notificações do meu sistema de segurança no meu telefone.
Você correu para o meu quintal hoje cedo e isso me enviou um
alerta.
Ela inclinou a cabeça. — E também mostra todo o meu quintal?
Pelo menos fique parcialmente limpo... — A maior parte. Sim. —
Precisando de uma mudança de assunto, apontei para um
armário. — Ali tem pratos? A comida está esfriando.
Ela podia estar suspeitando que eu estava falando merda, mas
pelo menos ela deixou passar. Josie pegou um prato e talheres e
depois tirou uma garrafa de vinho do balcão. — Você gosta de pinot
noir?
— Só vou querer um pouco.
Dividi a comida em dois pratos e Josie e eu nos sentamos frente
a frente. — Se você estiver pronta para pintar a sala — apontei
naquela direção — posso colocar uma segunda camada de massa
corrida e lixar.
— Obrigada. Mas você já fez o suficiente. Vou encontrar alguém
para fazer isso. Eu ia tentar sozinha, mas até o YouTube disse que
não é um trabalho fácil.
— É, uma vez que você já fez isso algumas vezes. A segunda
demão é mais fácil que a primeira. Não vou demorar muito.
— Ainda assim. — Ela balançou a cabeça. — Tudo bem. Além
disso, Porter se ofereceu para fazer isso, então, se eu não conseguir
encontrar alguém, posso ligar para ele.
Abaixei meu garfo. — Porter quer entrar na sua calça.
Seu nariz enrugou. — Ele me convidou para jantar.
— Confie em mim. Ele é como um vira-lata. Você o deixou ficar
por aqui uma vez e ele continua voltando.
Não me passou despercebido que aqui estava eu de novo
também. Dia diferente. Cenário diferente. Mas... minha situação
não era a mesma. Eu morava bem ao lado. Eu não estava tentando
entrar na calça dela. Eu estava apenas sendo amigável. Certo? A
foto no meu maldito telefone podia dizer diferente.
— Encontrei alguém que você conhece hoje. — Josie comeu um
pouco do jantar.
— Você vai ter que ser um pouco mais específica. É uma cidade
pequena. Conheço muita gente.
— O nome dela é Quinn. Ela é dona da loja de brinquedos da
cidade. Foi onde consegui a piscina infantil.
Merda. Há muito tempo, estabeleci como regra não me envolver
com mulheres que viviam em Laurel Lake. Infelizmente, estabeleci
essa regra depois de passar um tempo com Quinn.
— Oh, sim?
O brilho nos olhos de Josie me disse que Quinn havia
compartilhado mais do que conselhos sobre quais brinquedos os
patos mais gostavam. — Ela disse que vocês dois eram um casal
no ensino médio.
— Eu não diria exatamente isso.
— Não? O que você diria?
— Saímos algumas vezes.
— Como é que vocês terminaram?
Dei de ombros. — Sá acabou.
Seu sorriso parecia o de um gato que comeu um canário.
Larguei meu garfo. — O que ela disse?
— Nada.
— Você é uma péssima mentirosa, Josie.
Ela riu. — Está bem, está bem. Ela disse que vocês se
separaram porque você não conseguia mais olhar na cara da mãe
dela.
Fechei os olhos. Por que diabos eu ainda morava nesta cidade?
Essa merda aconteceu há dezesseis anos. Éramos crianças no
ensino médio, pelo amor de Deus. Acho que Quinn ficou sem
moradores locais para contar a história estúpida, então ela teve
que começar a contar aos visitantes.
— Você realmente acenou para a mãe dela no meio do sexo
oral?
— Eu tinha dezessete anos. A mãe dela chegou em casa mais
cedo do trabalho. Eu estava sentado na cama e Quinn estava de
joelhos. Sua mãe entrou no quarto sem qualquer aviso. Acho que
a princípio ela não percebeu o que estava acontecendo, porque
sorriu e acenou para mim. Quinn ainda não tinha ideia, então ela
continuou. Entrei em pânico e não sabia o que fazer, então acenei
de volta. — Balancei minha cabeça. — A expressão no rosto de sua
mãe quando ela percebeu o que estava acontecendo um segundo
depois... ela ficou horrorizada. Eu não poderia olhar para ela
nunca mais.
Josie riu tanto que segurou a barriga.
— Tudo bem, tudo bem — eu disse. — Não é tão engraçado. E
agora você me deve uma história embaraçosa de sexo no colégio.
Vamos ouvir isso.
— Não posso. Eu não fiz sexo no ensino médio.
— Você está brincando comigo?
— Não. Eu estava no último ano da faculdade na primeira vez.
— Por quê?
— Não sei. Acho que não conheci a pessoa certa até então.
— Quando você começou a sair com o idiota?
— Noah?
Eu balancei a cabeça.
Josie mordeu o lábio inferior, de repente tímida. — Meu último
ano na faculdade. Mas Noah não foi meu primeiro. Embora ele
tenha sido meu segundo.
Droga. Eu não tinha ideia de como passamos de um pato
comendo meu jantar para conversar sobre boquetes e a falta de
parceiros sexuais de Josie. Mas isso era definitivamente mais
interessante.
— Então, apenas dois homens... e só?
Ela bebeu o resto do vinho e se levantou. — Acho que preciso
de mais álcool para esta conversa. Você quer outro copo?
Coloquei minha mão sobre a borda. Embora ela pudesse
precisar de um pouco de coragem líquida, preferia ficar sóbrio para
isso. Eu queria lembrar de tudo. — Estou bem.
Josie encheu o copo com a mão pesada e sentou-se com um
suspiro. — Sim, apenas dois homens. Eu queria que minha
primeira vez fosse com um namorado, então isso significaria
alguma coisa. Mas depois que meu pai morreu, não deixei ninguém
se aproximar de mim. Quando eu tinha 21 anos e estava no último
ano da faculdade, eu só queria acabar logo com isso. Então fiz sexo
com um cara com quem saí algumas vezes. O engraçado é que eu
tinha medo de me aproximar de alguém e perder, mas larguei o
cara menos de uma semana depois de termos feito a ação. Conheci
Noah alguns meses depois e, bem, você sabe como isso terminou.
— Ela engoliu o vinho. — Acho que essa é a minha história
embaraçosa.
— Não há nada de constrangedor em não ser promíscua.
Ela encolheu os ombros. — Às vezes, pergunto-me se perdi. Por
outro lado, sou uma pensadora crônica, então pergunto-me sobre
muitas coisas inúteis.
— Não parecia que você estava pensando muito enquanto
estava sentada naquela piscina infantil hoje.
— Eu não estava. — Ela sorriu. — É fácil relaxar aqui. Eu me
sinto tão diferente do que em Nova York.
— Aquela cidade está cheia de gente demais. Não sei como você
vive assim.
— É engraçado. Há milhões de pessoas amontoadas numa faixa
de terra de vinte e dois metros quadrados. Mesmo assim, eu estava
sozinha em uma sala lotada em Manhattan. Aqui, não estou
sozinha.
— Parece que Laurel Lake está fazendo bem a você.
— Eu penso que sim.
Terminamos nosso jantar compartilhado e Josie bebeu outra
taça de vinho. Suas bochechas estavam rosadas e ela ria mais do
que o normal, então pensei que ela poderia estar bêbada. Limpei a
mesa e lavei a louça, e ela ficou ao meu lado, colocando-a na
máquina de lavar. Quando terminamos, ela olhou como se
quisesse dizer alguma coisa.
— O quê? — perguntei.
— Nada.
— Parece que algo está em sua mente...
Ela saiu do balcão e ficou na minha frente, cara a cara. — No
que você estava pensando quando estava me observando hoje?
— Eu não estava observando você. Eu falei, vi você no quintal
por causa de uma notificação de alarme.
Ela se inclinou para mim. — Mentiroso.
A melhor defesa sempre foi um bom ataque. — Acho que você
bebeu demais.
— Eu sei que você me observou.
— Talvez você esteja um pouco cheia de si, doutora.
Josie ficou na ponta dos pés e bem na minha cara. Eu podia
sentir o cheiro do vinho em seu hálito. Seus olhos eram mais azuis
assim de perto, e manchas douradas delineavam suas íris. Meu
olhar permaneceu fixo até que seus lábios começaram a mover-se
novamente.
— A câmera moveu-se e chamou minha atenção. Havia uma luz
azul, Fox.
— Então?
— Minha mãe tem o mesmo sistema de segurança. Quando
alguém ativa a câmera ao vivo, uma pequena luz azul acende na
parte superior.
Ah, merda. — Apertei o botão por acidente, então observei por
um minuto. Pensei em ver o que diabos você estava fazendo
perseguindo aquele pato.
O ouro em seus olhos brilhou. — A luz ficou acesa por pelo
menos dez minutos.
Eu olhei para ela, debatendo como jogar isso. Eu poderia negar,
fingir que não tinha ideia do que ela estava falando, ou poderia
assumir isso – aceitar meus problemas e admitir que era um
cachorro. Meus olhos saltaram para frente e para trás entre os
dela, e inclinei-me tanto quanto ela se esticou. Nossos narizes
estavam praticamente se tocando. — Está bem. Eu observei você.
— E você me viu fazer ioga pela janela também.
— Você não estava exatamente escondendo isso.
Josie estendeu a mão atrás de mim até o balcão e pegou seu
vinho. Batendo de volta em uma contagem de seis segundos, ela
inclinou-se ainda mais perto e seus seios empurraram contra meu
peito.
— O que você estava fazendo enquanto me observava hoje?
Minhas narinas dilataram. Ela queria que eu dissesse a ela que
estava me masturbando. E agora, eu teria dito isso, se fosse
verdade. Eu teria descrito a punheta enquanto olhava para ela
naquele biquíni branco. Mas estava na minha caminhonete, em
um estacionamento movimentado em uma rua principal.
Tirei a taça de vinho vazia da mão dela e a coloquei sobre o
balcão. — Nada. Porque esta é uma cidade pequena com uma boca
grande, e sei que não devo ser pego. Não significa que eu não
quisesse. — Movi minha boca para sussurrar em seu ouvido. —
Mas vou dizer uma coisa. Vou para casa agora, porque sou um
cavalheiro e você tomou algumas taças de vinho. E se amanhã você
ainda quiser saber o que eu estava fazendo enquanto observava,
ligue-me. Porque você pode ter certeza de que assistirei ao replay
assim que estiver sozinho.
Recuei para olhar o rosto de Josie. Sua arrogância desapareceu
e ela parecia um pouco em estado de choque. Eu pisquei. — Bons
sonhos, baby. Eu sei que vou tê-los.
Josie
— Ugh. — Levantei minha mão para bloquear a luz do sol que
entrava pela janela da cozinha enquanto caminhava em direção à
cafeteira e apertava o botão liga/desliga. — Nunca mais vou beber.
Quanto eu bebi?
Vejamos... tomei um enquanto eu preparava o jantar.
Um segundo enquanto eu jantava com Fox.
Um terceiro...
Merda. Meu cérebro voltou para a Fox! Fechei os olhos
enquanto as lembranças da noite passada inundavam-me. Por
que, ah, por que tomei aquela terceira taça de vinho? O que saiu
da minha boca foi exatamente a razão pela qual sempre parei em
duas.
Não só chamei a atenção de Fox por vigiar-me pela câmera de
segurança, como também exigi saber o que ele estava fazendo
enquanto assistia. Esfreguei minhas têmporas com os olhos
fechados. Agora eu sabia o que Fox sentia pela mãe de sua
namorada de colégio, Quinn. Estava mortificada. Fazer as malas e
sair de Laurel Lake hoje podia ser minha única opção viável.
A cafeteira fez um som gargarejante, indicando que havia
terminado de fazer o café. Engoli o café da minha caneca como
uma viciada em heroína. Depois de tomar minha dose, fui até a
torneira da cozinha e joguei água no rosto. Então fiz uma segunda
caneca. Enquanto esperava impacientemente que o gotejamento
começasse, olhei pela janela da frente – ou, mais precisamente,
olhei para a direita, para a casa de Fox. Eu dormi até tarde, então
fiquei surpresa que a caminhonete dele ainda estivesse na
garagem. Inclinando-me para ver mais, notei que o capô estava
levantado. E Fox estava lá fora.
Ele deu a volta pelo lado do motorista, olhando para o motor
enquanto enfiava a mão no cabelo. A situação não parecia muito
promissora. A última coisa que eu queria fazer era vê-lo depois da
noite passada, ou sair sob o sol irritante, aliás, mas Fox me ajudou
muito. Eu realmente não tinha escolha a não ser ir até lá e ver se
poderia retribuir o favor. Então vesti um short e uma camiseta e
atravessei o gramado com minha caneca na mão.
— Ei. Tudo certo?
Fox balançou a cabeça. — A caminhonete não pega. Acho que
é o alternador.
Seus olhos caíram para o meu peito. Eu não tinha me
incomodado em usar sutiã e meus mamilos saudavam sua
liberdade.
Fox desviou os olhos para o motor e pigarreou. — Eu tentei
ligar. Não ligou de jeito nenhum.
— Você precisa trabalhar? Você pode levar meu carro. Ou posso
deixar você lá, se quiser.
— Mandei uma mensagem para Porter e disse que iria me
atrasar. Ele disse que viria me buscar se eu precisasse, mas tenho
uma reunião no departamento de construção em vinte minutos, e
ele está pelo menos nessa distância, em um canteiro de obras.
— Então pegue meu carro. Ou eu levo você.
— Tem certeza que não se importa? Posso pedir ao Porter para
me buscar no departamento de construção. Mas eu poderia usar
uma carona até lá. Os Ubers por aqui não são muito rápidos.
— Só me dê dois minutos para pegar as chaves e calçar os
sapatos.
Ele abaixou o capô. — Obrigado.
Enquanto dirigíamos pela cidade, Fox me disse para onde virar,
mas pouco foi dito além disso. Assim que entramos na rodovia,
porém, era apenas ar morto. Tive vontade de ligar o rádio para
preencher o espaço. Mas em vez disso, decidi vestir minha calcinha
de menina crescida e confessar minha boca grande ontem à noite.
— Então... — eu disse. — Sobre a noite passada.
Os olhos de Fox se abaixaram. — Estou quieto porque estou
pensando em todas as merdas que tenho que fazer hoje. Não
interprete isso. Ontem à noite foi ontem à noite. Hoje é hoje.
Suspirei. — Olá? Pensadora indefesa aqui, lembra? Eu não
consigo me conter.
— Você deveria estar trabalhando nisso. Por que você não
começa agora?
— Bem, meu terapeuta disse que uma das coisas que devo fazer
é confiar em meus instintos. Então é isso que estou fazendo. Meu
instinto me diz que precisamos limpar o ar. Não quero que seja
estranho entre nós. Você é como meu melhor amigo na cidade.
As sobrancelhas de Fox se ergueram. — Eu sou seu melhor
amigo?
— Acho que por essa resposta não sou a sua?
Ele riu. — Estamos bem, Josie. Eu prometo.
— Vou me desculpar de qualquer maneira. Se a situação
estivesse em outro pé, e fosse você quem tivesse bebido um pouco
demais e me pressionado a falar sobre coisas sexuais, ninguém
acharia isso certo. Portanto, não é aceitável que eu tenha feito
comentários indesejados.
— Está bem. Desculpas aceitas.
— Obrigada. Eu faria o cheesecake do meu pai para você, mas
deixei meu livro de receitas em casa.
— Cheesecake?
— Meu pai fazia o seu próprio do zero. Para ele, cheesecake
fresco era a resposta para qualquer problema – se alguém ficasse
bravo com ele, ele preparava um e levava como um pedido de
desculpas.
Fox sorriu e apontou para frente. — Vire à direita na próxima
esquina.
Os minutos restantes da viagem foram uma série de curvas e
então chegamos ao departamento de construção. Parei o carro
próximo ao meio-fio.
— Estou por perto o dia todo — falei. — Se precisar de uma
carona, é só me ligar.
— Obrigado. — Fox abriu a porta do carro. Ele colocou um pé
no concreto, mas parou e voltou. — Só para esclarecer, seus
comentários ontem à noite não foram indesejáveis. E minha oferta
de contar o que fiz quando cheguei em casa enquanto assistia à
reprodução do vídeo de segurança ainda permanece. A bola está
do seu lado, querida. Tenha um bom dia.
— Olá? — Atendi ao telefone mais tarde naquela noite.
— Olá, passarinho. É Opal.
— Ah, oi, Opal. Como vai você?
— Estou bem. Você estará ocupada hoje à noite?
Olhei para minhas oito unhas pintadas. — Não, na verdade
não.
— Posso incomodar você por um favor, então?
— Claro. E aí?
— Eu deveria pegar Fox hoje à noite, mas estou presa como
babá até mais tarde do que o esperado. Minha filha é enfermeira e
eu cuido dos filhos dela nas noites de quarta-feira. Ela geralmente
chega em casa às oito, mas alguém ligou dizendo que estava doente
e ela não pode sair até que encontrem um substituto para ela.
Tentei ligar para Porter, mas ele não atende, e Fox mencionou que
você lhe deu uma carona esta manhã.
Mesmo que eu estivesse obcecada por Fox o dia todo, depois do
que ele disse quando saiu do carro esta manhã, ele era a última
pessoa que eu queria ver. No entanto, não poderia dizer não a
Opal, assim como não pude ignorar a necessidade de ajudar Fox
esta manhã. Ambos foram tão generosos. — Claro. Sem problemas.
Agora?
— Não antes das dez. Espero que não seja tarde demais?
— Não, tudo bem. Não sabia que ele trabalhava até tão tarde.
— Ah, ele não está no trabalho. Ele está no rinque. Ele treina
um time nas noites de quarta-feira. São cerca de vinte minutos de
carro – espero que esteja tudo bem. Tínhamos um rinque em
Laurel Lake, mas o dono do prédio vendeu a propriedade para um
incorporador no ano passado. O rinque é em Hollow Hills.
— Ok, sem problemas. Você tem o endereço? Se não, posso
pesquisar.
— Vou mandar para o seu telefone depois que desligarmos.
— Ótimo, obrigada.
— Você é uma salva-vidas, Josie. Eu devo uma.
— Você não me deve nada. Tenha uma boa noite, Opal.
Depois que desliguei, terminei de pintar os dois últimos dedos
do pé. Torcendo a tampa do frasco, tive uma conversa franca com
Margarida, que estava sentada confortavelmente ao meu lado em
uma cama de cachorro rosa que eu havia comprado para ela esta
tarde.
— Você mora aqui há mais tempo. O que você acha do nosso
vizinho mal-humorado, Paul Bunyan?
A pata inclinou a cabeça. Parecia que ela queria ouvir mais.
— Eu sei. Eu sei. Ele é mal-humorado e rude – sem falar que é
arrogante, cínico, impossível de ler e criterioso. Além disso, ele
pode ter tanta bagagem quanto eu. Na única vez em que a noiva
dele apareceu na conversa, ficou claro que ele tinha muito o que
resolver. — Suspirei e acariciei a cabeça de Margarida. — No
entanto, há algo mais lá também... algo enterrado bem abaixo da
superfície que ele tenta esconder, mas escapa de vez em quando.
As pessoas nunca conseguem esconder quem realmente são por
muito tempo, não quando isso faz parte da essência do seu ser.
Fox é protetor e atencioso, honesto e moral, com uma preocupação
real pelo bem-estar dos outros.
Margarida levantou-se e bateu as asas.
Eu balancei a cabeça. — Ah, sim, tem isso também. Ele é muito
gostoso.
Nunca me senti particularmente atraída por homens
extragrandes e corpulentos. A maioria dos caras com quem
namorei – não que houvesse tantos – pareciam todos iguais: um
metro e oitenta, talvez um metro e setenta e cinco, corte elegante,
constituição bonita e esbelto. Fox era um carvalho gigante, com
ombros semelhantes aos de Atlas 6 e mais testosterona no dedo
mindinho do que qualquer homem de terno que morasse em
6
Na mitologia grega, Atlas é um titã condenado a sustentar os céus por toda eternidade.
Manhattan. Caramba, o cara saía de casa barbeado e exibia uma
barba por fazer ao meio-dia.
Margarida aparentemente decidiu que nossa conversa estava
encerrada. Ela pulou da cama de cachorro, cambaleou até a
cozinha e bicou a porta da frente. Balancei a cabeça e a abri para
ela. Ela caminhou em direção à garagem. — Estou até entediando
um pato com minha análise excessiva.
Depois que Margarida foi colocada em segurança para passar
a noite, eu disse a mim mesma que não iria arrumar meu cabelo
ou fazer nada de especial antes de ir buscar Fox. Mesmo assim, de
qualquer maneira, eu me vi com um pincel de rímel na frente do
espelho. Opal dissera que o rinque ficava a vinte minutos de
distância, mas saí quase quarenta minutos mais cedo, para o caso
de haver trânsito. A estrada estava bastante vazia, porém, e acabei
parando no estacionamento às nove e quarenta. Estacionei bem
em frente ao prédio para poder ver a porta da frente e liguei o rádio,
com a intenção de me sentar aqui e esperar. Mas dez minutos
depois, toda a água que consumi hoje para reidratar-me e livrar-
me da ressaca estava subitamente pressionando minha bexiga.
Eu ainda tinha um pouco de tempo até que Fox terminasse, e
a viagem para casa levaria mais vinte minutos. Então eu precisava
encontrar um banheiro. Tinha que haver um na arena, então
entrei e procurei por um banheiro feminino. Ao sair, vi pessoas
patinando no gelo. Foi fácil encontrar Fox, pois ele era muito maior
que os outros. Ele deslizou pelo rinque como se equilibrar-se em
uma fina lâmina de metal fosse tão fácil quanto caminhar. Quando
chegou ao aparador, fez uma curva fechada e cravou os patins
para parar. Um forte jato de gelo picado voou e atingiu a barreira
de borracha.
Eu não sabia muito sobre hóquei, mas de repente tornei-me
uma grande fã. Aproximei-me do rinque para ver melhor. Se eu
pensei que assistir Fox patinar fez alguma coisa comigo, isso não
foi nada comparado ao que aconteceu quando dei uma olhada no
time que ele treinava. Eu tinha esquecido completamente que Opal
tinha me contado que ele treinava um time de jogadores com
necessidades especiais até que vi os rostos de dois caras com
equipamentos de hóquei que estavam conversando na lateral do
campo – ambos tinham síndrome de Down. Meu coração apertou.
Eu estava dividida entre querer abraçar o treinador e pular nele
pelo quão sexy ele parecia lá.
Todos no rinque continuaram cuidando de seus afazeres, como
se Fox Cassidy não tivesse simplesmente entrado em uma cabine
telefônica e se tornado um super-herói. Mas eu não conseguia tirar
os olhos do homem. Observei fascinada Fox ficar na frente da rede
e, um por um, os membros de sua equipe patinaram até o centro
do gelo e arremessaram. Ele gritou para um jogador afastar as
mãos do corpo – algo como dar mais força à mão de baixo. Outro
ele instruiu a cravar a lâmina no gelo. Eu não tinha ideia do que
isso significava, mas Fox ficava mais sexy a cada minuto. A certa
altura, ele olhou para o lado direito do rinque onde eu estava. Sua
cabeça estava meio voltada para trás antes que ele olhasse duas
vezes. Ele disse algo que não consegui ouvir para o próximo
jogador na fila para arremessar o disco e depois patinou até a porta
na altura da cintura mais próxima de mim.
— O que você está fazendo aqui?
— Opal ligou e perguntou se eu poderia pegar você. A filha dela
teve que trabalhar até tarde no hospital.
— Merda. Ok. — Ele assentiu. — Vou encerrar.
Eu balancei minha cabeça. — Não, tudo bem. Não estou com
pressa. Sem pressa. Só entrei porque precisava usar o banheiro.
— Tem certeza?
De perto, seus olhos verdes eram muito mais verdes quando
contrastavam com suas bochechas vermelhas. — Sim. Estou
gostando de assistir.
Achei que poderia ter percebido um sorriso malicioso, mas não
tive certeza através do capacete. E, claro, Fox sendo Fox, saiu
patinando sem dizer mais nada. Embora desta vez eu não tenha
me importado com a partida abrupta, já que a vista de trás era tão
boa quanto a da frente.
Sentei-me em um banco próximo e observei meu vizinho mal-
humorado fazer suas coisas. Ele parecia um bom instrutor; ou pelo
menos houve muitos acenos de cabeça dos jogadores quando ele
falou. E adorei especialmente que ele não parecia tratar os
membros da equipe de maneira diferente de qualquer outra
pessoa. Ele abordava-os quando faziam algo que ele não gostava e
brincava com eles da forma típica dos homens. No final do treino,
Fox tirou o capacete e as luvas e, um por um, os jogadores bateram
em sua mão ao sair do gelo.
— Só preciso pegar minha bolsa — ele gritou para mim.
— Sem pressa.
Com o rinque vazio e sem Fox para aquecer meu sangue,
percebi como estava frio. Eu estava de short e camiseta, e o ar aqui
era frio o suficiente para evitar que o gelo derretesse. Eu estava
esfregando os braços quando Fox voltou.
— Um dos pais quer falar comigo — disse ele. — Desculpe. Só
vou demorar mais alguns minutos.
— Sem problemas.
Ele tirou um casaco da bolsa e o colocou em volta dos meus
ombros. — Volto já.
— Ok.
O casaco de Fox era pesado – o tipo de peso que você
provavelmente precisa quando passa horas em uma arena de gelo.
Mas não foi isso que me aqueceu. Foi o cheiro. Eu não pude evitar.
Levantei um ombro para aproximá-lo do nariz para cheirar.
Hummm…
Almiscarado, com um toque de couro. Masculino, assim como
tudo no dono. Isso me fez pensar se o perfume era mesmo uma
colônia. Eu sorri para mim mesma. Eu não ficaria surpresa se os
feromônios de Fox cheirassem tão bem.
Claro, foi nesse momento que Fox voltou. Seus olhos se
estreitaram. — Por que você está sorrindo?
— Nada. — Eu pulei do banco. — Está pronto?
— Sim.
No caminho até aqui, fiquei preocupada que a viagem para casa
fosse ainda mais estranha do que a viagem de carro com Fox esta
manhã. Mas minha experiência na arena mudou o clima. Eu mal
tinha colocado o cinto de segurança e ligado o carro quando
minhas perguntas começaram.
— Há quanto tempo você treina o time?
— Acho que cerca de três anos.
— Você patina muito bem. — Meus olhos estavam na estrada
quando saí do estacionamento, mas ouvi o sorriso malicioso na voz
de Fox.
— Isso é uma espécie de pré-requisito quando você joga hóquei
profissional.
— Você tem permissão para patinar com o joelho machucado?
Você disse que estragou tudo e acabou com sua carreira.
— Ele se mantém bem o suficiente para andar de patins para
treinar. Mas não consigo jogar no nível de intensidade que a liga
exige.
Eu balancei a cabeça. — Deve ter sido difícil terminar sua
carreira tão cedo.
Fox ficou quieto por um minuto. — Foi um momento difícil,
sim.
— Parece que acabou bem, no entanto. Opal disse que você está
envolvido em vários trabalhos atualmente.
— Tive sorte. Alguns caras não sabem nada além de hóquei.
Respirei fundo e balancei a cabeça. — Entendo. Tenho pensado
muito em mudar de carreira. Mas não tenho ideia do que faria.
Tudo o que sempre quis fazer foi trabalhar em pesquisa.
— Por que você mudaria de carreira? Você não estudou durante
a maior parte da sua vida para chegar onde chegou?
— Sim. Mas...
Fox olhou para mim. — Às vezes, você não supera o que
acontece, Josie. Você tem que descobrir como contorná-lo. Caso
contrário, você ficará preso no mesmo lugar para sempre.
Suspirei. — Sim.
— É isso que você realmente está fazendo aqui? Escondendo-
se do que aconteceu?
Balancei a cabeça e dei de ombros. — Não sei. Talvez...
Fox olhou pela janela. — Você só pode correr por um certo
tempo. Eventualmente, o que quer que esteja corroendo aí alcança
você.
Forcei um sorriso. — Sim. Além disso, não posso correr para
salvar minha vida. Costumávamos fazer corridas de revezamento
na escola primária durante as aulas de educação física. Eu sempre
era a última escolhida.
Fox riu. Ele ficou quieto por um tempo, mas desta vez não
pareceu estranho ou constrangedor.
— Obrigado mais uma vez por me pegar — ele finalmente disse.
— A qualquer momento.
— Provavelmente será a última vez. Dois dos caras
perguntaram se você estava solteira quando eu estava saindo.
— Os jogadores?
Ele assentiu com uma risada. — Eles são definitivamente o
grupo mais arrogante e confiante que já treinei.
Sorri. — O treinador deles deve estar passando para eles.
De volta a Rosewood Lane, entrei na minha garagem. Qualquer
falta de constrangimento que eu tivesse apreciado na viagem para
casa desapareceu rapidamente quando desliguei o motor. Nenhum
de nós saiu imediatamente. Ficamos sentados no escuro, eu
olhando para frente e Fox olhando – eu não saberia o que, porque
não ousei olhar.
Quando não aguentei mais um segundo de silêncio e pensei
que fosse explodir, virei-me e disse: — Fox — no mesmo momento
em que ele se virou e disse: — Josie.
Ele ergueu o queixo. — Você primeiro.
Eu balancei minha cabeça. — Não, você. Eu não tinha nada
importante a dizer.
Fox assentiu, mas parou por um momento para olhar pela
janela antes de falar novamente. — A última mulher com quem
saí, levei para jantar duas vezes. Fiquei na casa dela na segunda
vez e tive que levá-la ao Starbucks para tomar café na manhã
seguinte porque não conseguia lembrar o nome dela.
Cocei minha cabeça. — E você está me contando isso porque...
— Outra vez, cheguei cedo para um encontro em um bar. Vi
um ex-companheiro de equipe e começamos a conversar. Ele me
perguntou se eu queria comer alguma coisa no restaurante ao
lado. Eu disse claro. Só quando passei pela mulher que estava lá
para encontrar é que me lembrei que estava lá para vê-la.
— Você está tentando me dizer que é esquecido?
— Não, Josie. Estou tentando dizer que sou um namorado de
merda. Meu encontro ideal é foder primeiro, comer macarrão,
depois ir para casa e dormir na minha cama. Sou egoísta e gosto
da minha vida do jeito que vivo minha vida. Simples. Você é tudo
menos simples.
Eu ainda estava tão confusa sobre o rumo da conversa. — Ok...
— Você também mora em Manhattan. Um lugar que para mim,
é um inferno. Eu não sou uma pessoa sociável. Gosto da vida
tranquila.
Eu balancei minha cabeça. — Fox, por que você está me
contando tudo isso?
— Porque eu quero que você saiba no que está se metendo.
— Estou perdida...
Ele fez um gesto entre nós. — Você e eu. Há algo aqui.
Meus olhos se arregalaram. Ele não estava errado. Algo estava
acontecendo desde o início. Eu apenas pensei que era a única que
sentia isso. — Você... tem sentimentos por mim?
Fox sorriu. — Se ter sentimentos inclui querer tocar você, então
sim.
— Oh, meu Deus. — Eu ri. — Você acabou de me dizer que
poderia esquecer meu nome depois que eu dormisse com você,
admitiu que era egoísta, que provavelmente não ficaria por perto
para se aconchegar depois do sexo, chamou-me de complicada e
disse que queria me tocar. Esta é a sua maneira de me convidar
para sair?
— Você vai dormir comigo sem jantar primeiro?
Eu balancei minha cabeça. — Provavelmente não.
— Então acho que estou convidando você para sair.
— É esta a abordagem que você usa com todas as mulheres
com quem sai? Porque se for, fico perguntando-me por que alguém
sairia com você.
— Você já teve um idiota que decepcionou você. Não vou fazer
promessas que não possa cumprir, Josie.
Por mais louco que fosse, havia algo cativante em sua
preocupação. Eu balancei a cabeça. — Obrigada por sua
honestidade.
Ele olhou meu rosto, quieto por alguns segundos. — Então,
sexta à noite?
A ansiedade no fundo da minha barriga transformou-se em
uma vibração. — Que tal se eu fizer o jantar para você? Você disse
que não gosta de cozinhar e tudo que vejo você comer é comida
para viagem. Você provavelmente não come uma refeição caseira
há algum tempo.
Fox balançou a cabeça. — Não é uma boa ideia.
— Por quê? Eu sou uma boa cozinheira.
— Não tem nada a ver com sua comida. Acho que não posso
confiar em você sozinha comigo. Não, a menos que você queira
comer espaguete nua na cama depois.
Espaguete nua parece incrível no momento.
Fox gemeu. — Pare de fazer isso.
— Fazer o quê?
— Pensar que você pode lidar com isso do meu jeito. Você vai
ficar maluca pensando se foi um erro quando tudo acabar. Então
vamos fazer do seu jeito. Além disso, você merece coisa melhor.
Meu coração derreteu um pouco mais. Eu sorri. — Ok.
— Esteja pronta às sete na sexta-feira.
— Tudo bem.
Fox estendeu a mão. Por um segundo, pensei que iríamos
fechar o acordo. Mas quando coloquei minha mão na dele, ele me
puxou para ele. — Agora venha aqui e me beije.
O som áspero de sua voz fez com que aquelas borboletas
ficassem muito mais agitadas do que antes. Assim que cheguei
perto o suficiente, Fox agarrou meu cotovelo e usou-o para
levantar-me e passar por cima do console central. Ele me colocou
em seu colo, montando em seus quadris, e apertou meu pescoço
para trazer meus lábios para encontrar os dele.
Fiquei momentaneamente impressionada com o quão macios
seus lábios eram. Eles contrastavam com a aspereza de seu aperto
e a dureza de seu peito. Foi uma combinação que incendiou meu
corpo. A língua de Fox mergulhou dentro de mim, e ele usou a mão
no meu pescoço para inclinar minha cabeça e aprofundar a
conexão.
Oh, Deus.
Eu poderia perder-me no beijo desse homem. Estava do lado
certo da agressividade, assim como o próprio homem. Sua grande
mão envolveu minhas costas e me puxou contra ele. Quando ele
gemeu através de nossas bocas unidas, senti o gemido viajar das
pontas dos dedos dos pés até o topo da minha cabeça. Eu estava
rapidamente ficando sem fôlego, mas não me importei. Não havia
como eu parar para respirar. Preferia morrer por falta de oxigênio.
A mão de Fox em meu pescoço enroscou-se em meu cabelo,
formando uma bola apertada. Ele puxou minha cabeça para trás,
expondo meu pescoço, e então desceu para sugar minha pulsação.
Meus olhos rolaram para trás da minha cabeça quando senti
uma ereção de aço atravessando sua calça jeans. Tudo entre
minhas pernas inchou e eu não pude evitar; comecei a mover-me
para frente e para trás.
— Porra, Josie — Fox murmurou. — É melhor você ir mais
devagar ou vai comer espaguete em dez minutos.
Sorri. Eu me sentia eufórica – o suficiente para fazer meu
cérebro desligar e esquecer de analisar os milhões de motivos pelos
quais isso provavelmente terminaria em desastre. Depois de mais
alguns minutos tateando e esfregando, foi Fox quem se afastou.
Ele gentilmente empurrou meu corpo do dele.
— Tenho que parar agora, querida. Ou vou me transformar em
um garoto de dezesseis anos e passar vergonha.
Fiz beicinho e Fox inclinou-se e pegou meu lábio inferior
saliente entre os dentes e deu-lhe um puxão firme. — Sexta-feira
— ele murmurou.
Suspirei. — Você é um merda.
Ele riu e segurou minha bochecha. — Vou observar você entrar
daqui. Preciso de um minuto.
Fox
— Bom dia.
Os olhos de Opal brilharam tanto quanto seu sorriso.
— Oh, merda — eu resmunguei.
— Você acabou de entrar — disse ela. — Por que você já está
xingando?
— Existem apenas duas razões pelas quais você sorri assim.
Ou você está prestes a arrancar minha orelha com alguma fofoca
na qual não tenho nenhum interesse, ou você... teve um encontro.
O último significa que você está prestes a ligar para uma de suas
amigas e contar todos os detalhes. A única coisa que odeio mais
do que você falando sobre pessoas nesta cidade para as quais não
dou a mínima é ouvir sobre sua vida sexual.
Opal saiu de trás da mesa. Enquanto eu vasculhava o arquivo
em busca de algumas plantas que precisava, ela empoleirou a
bunda no canto da minha mesa. Respirei fundo enquanto me
virava. — Você está demitida se falar sobre negócios de outras
pessoas ou sobre sua vida sexual. — Eu a olhei diretamente nos
olhos. — Você entendeu?
Ela sorriu como um maldito gato Cheshire. — Não é um
problema, chefe.
Deixei cair a pilha de plantas dobradas na minha mesa e fiz um
movimento com a mão. — Sente-se em outro lugar. Preciso de
espaço para definir as especificações.
Opal se levantou, mas não recuou para sua própria área. Fingi
que ela não estava ali olhando para mim e comecei a desdobrar as
plantas, esperando que ela entendesse a dica. Mas esta era Opal,
então não tive essa sorte. Ela aguentou cerca de trinta segundos
com a armadilha fechada.
— Então... — Ela bateu as mãos de excitação. — Você vai sair
com Josie!
Olhei para o teto e respirei fundo algumas vezes. — Achei que
você tivesse concordado em não falar sobre assuntos de outras
pessoas.
— Eu concordei. — Ela sorriu. — Mas isso não é assunto de
outras pessoas. É seu. Então isso não está incluído no que
concordei.
Jesus enlouquecido Cristo. Como diabos ela sabia, afinal?
Josie e eu só saímos do carro ontem à noite quase dez e meia, e
eram apenas oito da manhã agora. No espaço de nove horas e
meia, Opal já tinha ouvido a notícia. Eu estava prestes a dizer a
ela para cuidar da própria vida quando a porta do escritório se
abriu e Porter entrou. Ele me viu e deu o mesmo sorriso de merda
do pregador da cidade.
Joguei minhas mãos para o alto. — Sério? Vocês dois?
— Se vou perder — disse Porter. — Eu pelo menos quero que
seja para um oponente formidável.
Eu balancei minha cabeça. — Como diabos vocês dois
descobriram, afinal?
— Encontrei Josie esta manhã no Beanery — disse Porter. —
Ela estava indo para a loja de materiais de construção. Decidi
tentar a sorte, já que a oportunidade se apresentou.
Eu cerrei os dentes.
Porter percebeu a expressão em meu rosto e riu. — Não se
preocupe. Ela me rejeitou. Convidei-a para jantar na sexta à noite
e ela disse que já tinha planos. Perguntei quem era o sortudo e ela
relutantemente contou tudo. — Ele veio ao meu lado e colocou a
mão no meu ombro. — Cachorro sortudo.
Apontei um dedo para ele em advertência. — Cuidado.
Porter ergueu as duas mãos, mostrando-me as palmas. — Não
quis dizer nenhum desrespeito.
Voltei a olhar para as plantas e gesticulei em direção à porta.
— Vamos todos voltar ao trabalho.
Os dois recuaram, mas não antes de trocarem outro sorriso
bobo. Porter saiu para começar a colocar o piso de madeira e Opal
tinha a folha de pagamento da semana para cuidar. Calculei
quanto custaria fazer algumas alterações de última hora em um
trabalho futuro. Ao meio-dia, fui para a pequena lanchonete nos
arredores da cidade para meu almoço normal de quinta-feira. Fui
pego em um acidente em uma estrada de mão única, então minha
mãe já estava sentada em nosso estande normal quando cheguei.
Abaixei-me e beijei sua bochecha antes de me sentar no
assento em frente a ela. — Ei, mãe. Desculpe estou atrasado.
— Sem problemas. Eu estava conversando com Tricia Scalia.
— Ela inclinou-se e sussurrou: — Ela está se divorciando.
Até minha mãe não conseguia se conter de vez em quando.
Levantei o cardápio. — Wayne é um idiota de qualquer maneira.
Minha mãe franziu a testa. — Você tem que usar essa palavra?
— Desculpe.
Ela baixou os olhos para o cardápio. — Então, algo de novo?
Eu estreitei meus olhos. — Por que você disse isso dessa
maneira?
Mamãe levantou o cardápio para cobrir a boca. Mas as rugas
ao redor de seus olhos revelaram o sorriso que ela tentava
esconder. — De que maneira?
Meus ombros caíram. — Só pode estar brincando comigo.
Deixe-me adivinhar, você falou com Opal hoje.
Ela abraçou o cardápio contra o peito. — Eu não ia mencionar
isso, porque sei o quanto você odeia que as pessoas se intrometam
no seu negócio. Mas já que você tocou no assunto...
— Uh-huh. — Eu balancei minha cabeça.
Mamãe estendeu a mão e tocou meu braço. — Ah, Fox. Estou
feliz por você. Estou feliz que você esteja voltando a namorar. Josie
é uma garota adorável.
— Eu tive encontros.
— Não me refiro a dançar no colchão. Quero dizer namoro.
Conhecer uma mulher. Mas o mais importante é deixá-la conhecer
você.
— Acho que você está se adiantando um pouco...
— Eu não acho. Este é um grande passo depois de tudo que
você passou.
— Realmente não é grande coisa.
Ela franziu os lábios. — Ela sabe?
Foi a minha vez de franzir a testa agora. — Não estamos tendo
essa conversa.
— Ah, Fox. — Mamãe mordeu o lábio. — É algo que uma
mulher que significa alguma coisa para você precisa saber.
— Como eu disse... — Enterrei meu rosto de volta no cardápio.
— Não estamos tendo essa conversa.
— Ok. Está bem. Mas você poderia pelo menos me dizer para
onde a está levando?
Suspirei. — Eu não sei, mãe. Achei que seria o Laurel Lake Inn.
A expressão no rosto da minha mãe me disse que eu tinha dado
a resposta errada.
— O que há de errado com a pousada? — perguntei. — A
comida é boa.
— Não há nada de errado com a pousada... para levar sua mãe.
— Deixe-me ver se entendi. É bom o suficiente para você, mas
não para um encontro?
— Bem, sim. Não é romântico, Fox.
Revirei os olhos. Estava na ponta da minha língua dizer que o
romance não estava na minha agenda, mas descobrir o que havia
por baixo da calça preta justa de ioga que Josie usava o tempo todo
estava. Mas contive-me e dei uma trégua a minha mãe, porque
sabia que ela tinha boas intenções. — Para onde você sugere que
eu a leve?
— Le Pavillion seria legal.
Minhas sobrancelhas subiram até minha testa. — Sério? O
lugar francês? Fica mais de meia hora daqui. E você tem que usar
terno para ir àquele restaurante.
— Você não acha que Josie estará bem arrumada? Ela é de
Manhattan, querido.
Eu meio que esperava pela calça de ioga. Embora... eu já tivesse
saído bastante em Nova York na minha época de hóquei. As
mulheres nos clubes estavam sempre bem-vestidas – merdas
furtivas, sem costas e tudo. Era noite e dia, pela aparência das
mulheres quando iam ao Inn, o restaurante mais bonito desta
pequena cidade.
— Talvez eu veja se consigo uma mesa na churrascaria em
Chatrun.
Mamãe sorriu. — Isso é um pouco melhor.
Acenei. Felizmente, Tricia veio anotar nossos pedidos,
encerrando a conversa. Ela pegou seu pequeno bloco de notas e
tirou o lápis de trás da orelha.
— Ei, Fox. Você quer o de sempre?
— Eu quero. Obrigado, Trish.
Ela virou-se para mamãe. — Temos a salada grega que você
gosta como uma das especialidades de hoje.
— Ah. Isso soa bem. — Ela estendeu seu cardápio. — Obrigada,
Trish.
Mamãe e eu conversamos por um tempo. Ela contou-me sobre
sua aula de tricô, e eu reclamei dos atrasos na entrega que me
deram dor de cabeça em um dos trabalhos que estava tentando
terminar.
— Tenho um favor a pedir, querido.
Minha mãe nunca pedia nada. — O que você precisa?
— Bem, é para minha amiga Greta. Você se lembra dela, certo?
Eu balancei a cabeça. — Cabelo azul em forma de capacete?
Mamãe sorriu. — O cabelo dela é prateado, não azul. Mas sim,
essa é Greta, e ela vai perder esse cabelo em breve.
— Câncer?
— Temo que sim. Ela começou o tratamento há algumas
semanas. Ela está mantendo tudo em segredo.
— Como posso ajudar?
— Seu primeiro tratamento a deixou fraca. Ela se levantou
rápido demais e caiu, quebrando o tornozelo em dois lugares.
— Jesus. Isso é uma merda.
— Sim. Fui visitá-la ontem. Ela mora naquele grande complexo
de apartamentos na zona norte, na Barnyard Avenue. Ela está no
primeiro andar, mas sua porta ainda está a seis degraus acima. É
uma luta para ela subir e descer por causa do gesso. Ela pediu ao
administrador da propriedade que instalasse uma pequena rampa,
mas eles lhe disseram que demoraria alguns meses. A essa altura,
o gesso já terá sido retirado.
— Provavelmente é por isso que eles disseram isso. Eles têm
que acomodá-la de acordo com as leis de deficiência, mas podem
dedicar seu tempo para fazer isso. Você quer que eu faça uma
rampa para ela?
— Se você tiver tempo. Isso realmente a ajudaria. Eu pagarei
pelos materiais.
— Sem problemas. Eu tenho isso. Farei isso neste fim de
semana.
— Obrigada, querido.
Falar sobre os apartamentos da Barnyard Avenue lembrou-me
de algo. — Você conhece Ray Langone? Ele mora no mesmo
complexo que Greta.
Mamãe franziu a testa. — Eu o conheço. Ele é meio esquivo,
não é?
Sorri. Minha mãe era gentil demais para usar a palavra
obscuro. — Sim, ele é esquivo, certo. Ele também é tio de Josie.
— Oh, meu Deus. Isso mesmo. Ela disse que o nome de solteira
da mãe era Langone. Não pensei em Ray. Josie é próxima dele?
— Ela pensou que ele estava morto até que eu disse a ela que
não estava. Foi o que a mãe dela disse a ela. Ela parece um
verdadeiro pêssego. — Balancei minha cabeça. — Você sabe se Ray
ainda mora lá?
— Ele mora. Eu o vi ontem quando estava chegando para visitar
Greta. Por quê?
— Não é nada. Só quero ficar de olho nele.
Mamãe sorriu. — Você já está cuidando de Josie. Afinal, posso
ter netos!
— Meu Deus, mãe. Acha que está se precipitando um pouco?
— Talvez. Mas algo me diz que ela poderia ser a única.
Fox
— Isso é ridículo — resmunguei para mim mesmo enquanto
puxava o nó da gravata diante do espelho. A última vez que vesti
um terno foi há um ano, para um funeral. Usar terno
definitivamente não era minha praia. Na minha época de jogador,
o time se arrumava para viajar, e muitos caras gostavam disso –
usando roupas chamativas de marca que os designers lhes
enviavam, exibindo-as para a câmera enquanto se pavoneavam até
o ônibus. Mesmo naquela época, eu não gostava disso. Meus
companheiros de equipe irritavam-me porque eu usava os mesmos
dois ternos todas as semanas, um azul-marinho e um cinza. No
momento, eu estava usando o azul marinho e questionando se
minha mãe estava errada e se Le Pavillion era chique demais para
um primeiro encontro. Mas a churrascaria e dois outros lugares
que tentei, que eram melhores do que a pousada, mas que não
exigiam uma fantasia de macaco, estavam todos lotados.
Eu também lavei a caminhonete e aspirei o interior, e até parei
para comprar flores no caminho do trabalho para casa. Eu estava
começando a lembrar-me por que não tinha namorado nos últimos
anos – dava muito trabalho. Certamente mais trabalho do que ir
ao bar de uma cidade próxima com uma camisinha na carteira e
conversar com a primeira mulher bonita que encontrasse.
Às sete, deixei minha caminhonete na garagem e atravessei a
grama. Eu poderia ter dirigido e estacionado na garagem de Josie,
mas esta cidade tinha o suficiente para fofocar, então achei que
ser discreto seria melhor.
Na porta, limpei as palmas das mãos na calça (aparentemente
estava mais quente do que eu imaginava) e bati. Josie respondeu
com um sorriso. Mas quando ela me deu uma olhada, isso
murchou. — Oh, meu Deus. — Ela olhou para baixo e colocou a
mão no peito. — Não estou bem-vestida.
Eu ia matar minha mãe.
Josie estava linda, vestindo uma calça jeans e uma blusa
branca com babados. Ela cheirava muito bem também. Mas eu me
senti um idiota.
Balancei a cabeça e comecei a voltar para a porta ao lado. —
Desculpe. Vou me trocar.
— O quê? Não! — Ela agarrou meu braço. — É minha culpa.
Não sabia que estávamos indo para algum lugar chique. Eu vou
mudar.
— Tudo bem. Isso foi estúpido... — Eu me soltei de Josie e voltei
a caminhar em direção à casa.
— Fox, espere...
Continuei andando. Pelo menos até que sua voz se transformou
em um grito.
— Fox!
Eu congelei, mas não me virei.
— Vou subir para me trocar neste minuto. Então, se você for
até a porta ao lado e voltar com jeans ou algo assim, você vai me
fazer parecer muito vestida. Você pode, por favor, entrar e não
transformar isso em algo?
Eu me senti um idiota, mas respirei fundo e respirei fundo.
Josie sorriu quando voltei para a porta. — Uau. Quem diria?
Ele realmente ouviu...
— Vá trocar de roupa.
Ela olhou para as flores que eu tinha esquecido que estavam
em minhas mãos. — São para mim?
— Sim. — Eu as estendi. — Aqui.
Ela riu. — Entre. Duvido que a Sra. Wollman tenha deixado um
vaso, mas você pode procurar algo para colocá-las enquanto eu me
visto.
— Está bem.
Josie desapareceu escada acima enquanto eu estava no meio
da cozinha, perguntando-me que porra eu estava fazendo.
Enquanto isso, o maldito pato atravessou a sala e me pegou
desprevenido.
— Jesus — eu murmurei. — Você ainda está aqui.
Ele grasnou para mim e continuou andando, acomodando-se...
aquilo era uma cama de cachorro? Havia uma TV que parecia,
digamos, vintage, colocada no chão, exibindo desenhos animados.
O pato se acomodou em frente a ela, em uma cama ortopédica
rosa. Balancei a cabeça e olhei ao redor da cozinha. Três fileiras
de cartões festivos de Natal estavam penduradas na parede.
Embaixo deles, seis quadrados diferentes de amostras de tinta
foram colados com fita adesiva.
Entre usar este terno para um encontro e este lugar começar a
parecer normal, Josie não era a única que precisava de
aconselhamento. Mas eu estava aqui e ainda tinha as flores
estúpidas na mão, então achei melhor fazer o que ela pediu e ver
se conseguia encontrar algo para colocá-las.
Uma busca nos armários não revelou nada, mas encontrei um
regador de plástico verde na garagem e o enchi de água.
Josie desceu enquanto eu não estava tão delicadamente
enfiando os caules dentro. Estendi a mão para a gola da minha
camisa, pois de repente ela pareceu muito apertada em volta do
meu pescoço.
Ela mordeu o lábio. — Esta é a única coisa elegante que eu
trouxe. Nem sei por que o empacotei. E com salto, é um pouco
curto.
Eu teria que ficar perto dela, especialmente se ela deixasse cair
alguma coisa. E não seria fácil controlar a vontade de dar um soco
em todo cara que virasse a cabeça, mas passar as próximas horas
com ela usando isso valeria totalmente a pena o esforço. A mulher
tinha perna suficiente para ter um metro e oitenta de altura,
principalmente naqueles sapatos de salto agulha.
Afinal, eu poderia estar agradecendo a minha mãe em vez de
matá-la... engoli em seco. — Você está linda.
— Obrigada. — Josie alisou a bainha do vestido brilhante com
um sorriso tímido. — Você também está muito bonito. Desculpe-
me, eu não estava muito arrumada. Não há muitos lugares chiques
na cidade, então imaginei...
— Minha culpa.
Ela olhou para as flores. — Elas são realmente bonitas.
Obrigada.
Eu balancei a cabeça.
Josie sorriu. — Tenho que admitir, achei que você estava
errado. Eu nunca teria imaginado que você apareceria no nosso
encontro vestindo um terno com flores.
— Como você achou que eu apareceria?
— Em um par de jeans, talvez uma camisa de botão. Para ser
sincera, eu esperava algo mais como irmos ao restaurante e você
me atacar no carro quando chegássemos lá.
Meu rosto caiu. — Espere. Espere aí, isso é uma opção?
Josie riu. Ela agarrou meu braço e puxou-me em direção à
porta. — Vamos. Não sei para onde estamos indo, mas você está
bonito demais para se atrasar.
Do outro lado da rua, Yvonne Craddox arrastava as latas de
lixo para o meio-fio. Ela parou quando me viu andando com Josie
pela calçada. Eu a ignorei e mantive a cabeça baixa, tentando
minimizar os danos, mas ela ainda estava boquiaberta quando abri
a porta do passageiro para Josie e arrisquei olhar para trás. As
linhas telefônicas desta cidade sem dúvida estariam queimando
em trinta segundos.
— Então, para onde estamos indo, isso é tão chique? — Josie
perguntou enquanto eu saía da garagem.
— Um lugar francês a duas cidades de distância.
Ela assentiu. — Todos os seus primeiros encontros são tão
formais?
Olhei para ela. — Não precisamos ir, se você não quiser.
— Oh, não. Estou animada. Faz muito tempo que não tenho
um motivo para me vestir bem. — Ela encolheu os ombros. — Só
estava curiosa, eu acho.
Ela esperou por uma resposta à sua pergunta. Mas não era
uma coisa fácil de responder.
Mantive meus olhos na estrada. — Já faz um tempo que não
tenho um encontro, então não me lembro para onde fui da última
vez.
Através da minha visão periférica, vi as sobrancelhas de Josie
baixarem. — Quanto tempo é um tempo?
— Não sei. Três anos?
Seus olhos se arregalaram. — Você não faz sexo há três anos?
— Não disse isso. Disse que não tenho um encontro há muito
tempo.
— Oh.
Ela ficou quieta por um tempo.
— O que está acontecendo nessa sua cabeça maluca? —
perguntei.
— Sabe, não é educado chamar minha cabeça de maluca. A
maioria das pessoas fica ofendida quando você menospreza as
dificuldades de saúde mental.
Olhei para ela. — E você?
— Não, mas esse não é o ponto.
— Então não tenho certeza de qual é o objetivo. Porque não
estou falando com a maioria das pessoas. Estou falando com você.
— E daí? Você simplesmente reúne mulheres e faz sexo, então?
Senti minhas sobrancelhas franzirem, confusa com a mudança
repentina de assunto. Acho que estávamos de volta à minha
história de namoro. — Eu normalmente só consigo uma.
Josie mexeu-se no assento para me encarar. — Então é uma
coisa de uma noite?
— O que estamos discutindo aqui? — perguntei. — Minha
história de namoro ou nós?
— Bem, ambos, eu suponho. As mulheres com quem você
esteve foram encontros de uma noite?
Esta era uma conversa arriscada. Na minha experiência,
quando uma mulher falava sobre você fazer sexo com outra
mulher, geralmente não terminava bem.
— Faz diferença se foi uma ou quatro vezes? — perguntei.
— Sim.
— Por quê?
— Porque eu gostaria de saber o que esperar. Você está bem ao
lado. Prefiro que as coisas não fiquem estranhas entre nós.
— Elas não ficarão.
— Como você sabe disso? Nunca foi estranho encontrar uma
mulher com quem você dormiu uma vez?
— Sim.
— Ok, então é isso que estou tentando evitar aqui. Se
definirmos expectativas agora, haverá menos decepções.
— Não é a mesma coisa, Josie.
— Por que não?
Chegamos a um sinal vermelho, então virei-me para olhar para
ela. — Porque eu não quero transar com você apenas uma vez.
— Como você sabe disso? Nós nem fizemos isso ainda.
Meus olhos caíram para seu corpo, para aquele vestidinho
minúsculo e suas pernas bem torneadas. — Confie em mim. Eu
sei.
— Como?
— Porque eu não fui procurar você para me ajudar a resolver
algo do meu sistema. Exatamente o oposto. Tentei ficar longe de
você, manter a maior distância que pude.
— Por que você faria isso?
Meus olhos encontraram os dela e bati no meu peito. — Porque
eu senti você aqui, não no meu pau.
Josie piscou algumas vezes. Quando o que eu disse infiltrou-
se, um sorriso idiota espalhou-se por seu rosto.
— Por que diabos você está sorrindo? — falei.
— Você gosta de mim.
Revirei os olhos. — Ai, Jesus. Não vamos deixar isso subir à
sua cabeça.
— E eu aqui pensando que você só queria fazer sexo comigo.
— Se estamos estabelecendo expectativas, vamos esclarecer
uma coisa, doutora. Eu vou foder você. E espero que isso aconteça
esta noite, talvez como uma recompensa por usar esse terno idiota.
Tudo o que estou dizendo é que isso vai acontecer mais de uma
vez.
— Mais de uma vez esta noite ou mais de uma vez no total?
Meu lábio se contraiu. — Ambos.
Ela sorriu. — Ok.
— Então estamos bem? Chega de perguntas idiotas sobre
merdas idiotas do meu passado?
— Na verdade, tenho mais uma.
Levantei meu queixo em direção ao semáforo. — Isso já está
verde há muito tempo. Então seja rápida.
— Você tem preservativos? Porque eu não tenho nenhum.
— Comprei uma caixa inteira na drogaria ao lado da
floricultura hoje.
Os olhos de Josie brilharam. — Uma caixa inteira? Quantas
vezes em uma noite você consegue...
Inclinei-me para que ficássemos nariz com nariz. — Até você
ficar dolorida, querida. Até você ficar dolorida.
A ideia de vestir um terno e dirigir duas cidades até algum
restaurante pretensioso foi contrabalançada pelo fato de que Josie
provavelmente usaria um vestido. Eu não esperava que fosse tão
curto quanto o que ela estava usando, então pontos extras aí... e
mais, era improvável que eu encontrasse qualquer um dos bocas-
de-lobo de Laurel Lake tão longe da cidade. Aparentemente, eu
estava correndo apenas com cinquenta por cento.
Os olhos de Opal arregalaram-se mais do que os pratos quando
ela me viu com Josie em nossa mesa.
— Oh, merda — eu resmunguei e coloquei meu garfo na mesa.
— O quê? O seu bife não está bem cozido?
Eu balancei minha cabeça. — Quem me dera. Minha vida está
prestes a ir para o inferno no trabalho.
— O que você está falando?
Eu não tive que responder. Opal apareceu para fazer isso por
mim.
— Pensei que fossem vocês dois. — Seus olhos brilharam. —
Ora, ora, ora, olhe para você, chefe. Todo elegante com uma
gravata.
— Vá embora, Opal.
— Fox! — Os olhos de Josie estreitaram-se. — Seja legal...
Opal acenou para ela. — Oh, querida, essa é a versão legal de
Fox. Você não percebeu que ele não usou palavrão? Ele deve estar
de bom humor.
Josie riu. — É um prazer ver você, Opal. Não é, Fox?
Eu fiquei de mau humor. — Não.
— Fox...
— Tanto faz. Sim, ótimo.
Eu quase me distraí enquanto as duas mulheres conversavam
um pouco – algo sobre vestidos e restaurante, achava. Mas minha
atenção ficou presa quando ouvi o nome Frannie.
— Você está aqui com Frannie Newton? — perguntei.
Opal assentiu. — É aniversário dela. Nós presenteamos uma à
outra com nossa refeição favorita todos os anos. Frannie gosta das
lesmas com casca que servem aqui. Eu nunca entendi escargot.
Ótimo, simplesmente ótimo. A única boca maior que a de Opal
era a de Frannie Newton. Ela trabalhava nos correios, mantendo
as pessoas em cativeiro enquanto vendia selos e contava os
negócios de outras pessoas. Sua rede de distribuição era
equivalente à correspondência diária. Eu não tinha dúvidas de
que, às dez da manhã de amanhã, as únicas pessoas que não
saberiam o que eu tinha feito esta noite seriam as pessoas que
estavam de férias. E ela as informaria quando fossem pegar a
correspondência retida.
— Esta é a primeira vez que vocês dois vêm aqui? — Opal
perguntou.
Eu disse não ao mesmo tempo que Josie disse sim.
Opal olhou entre nós, parecendo divertida.
Josie colocou a mão no peito. — É a minha primeira vez aqui.
— Pegue o crème brûlée de sobremesa. É orgástico.
Enquanto eu vomitava um pouco ao ouvir Opal dizer uma
palavra próxima de orgasmo, Josie não parecia nem um pouco
assustada.
Ela sorriu. — Obrigada. Talvez eu faça isso, se não estiver
muito cheia.
Opal inclinou-se e abaixou a voz. — Você ouviu que Sam, da
loja de materiais de construção, colocou a casa dele à venda?
— Oh? Espero que esteja tudo bem? — Josie disse. — Sam é
tão fofo.
— Ele está namorando Rena Arlo. Ela pediu que ele fosse morar
com ela. Eles estão pensando em comprar um apartamento na
Flórida e serem pássaros da neve com o dinheiro que Sam receber
com a venda.
— Bom para eles. Não conheci Rena, mas Sam parece muito
legal.
— Sam terá uma liquidação de garagem no próximo fim de
semana. Sua esposa, que Deus a tenha, colecionava aquelas
estatuetas de Hummel que minha irmã que mora na Geórgia
coleciona. Então vou chegar cedo e pegar um pouco para ela. Posso
buscá-la no caminho. Tenho certeza de que Rena trabalhará na
venda com ele.
— Isso parece ótimo. Adoro vendas de garagem.
— Você também pode ir, Fox — disse Opal.
— Não, obrigado. Não sou fã de procurar merdas usadas que
as pessoas não querem. Já tenho merda suficiente das quais posso
me livrar.
— Então você deveria fazer uma venda de garagem. Posso ir até
lá e ajudá-lo a definir o preço das coisas...
Eu não conseguia pensar em nada que quisesse fazer além de
abrir a porta para a cidade inteira entrar. Levantei a mão. — Estou
bem, obrigado.
Opal ignorou-me como se eu não estivesse aqui, continuando
a tagarelar com Josie. — Ouvi dizer que você encontrou seu tio
Ray?
Josie semicerrou os olhos, mas então uma expressão de
compreensão cruzou seu rosto e ela assentiu. — Eu estava no
Lowell hoje cedo. Sam apontou para ele e nos apresentou. Eu
esperava que meu tio fosse diferente do que é. Na verdade, ele é de
fala mansa e doce.
Opal e eu trocamos olhares. Então nosso garçom apareceu com
a segunda taça de vinho que Josie havia pedido. A maioria das
pessoas interpretaria a interrupção como uma despedida, mas
Opal não. Ela ficou aqui, continuando a falar enquanto minha
comida esfriava. Esperei mais alguns minutos, mas ela ainda não
parou. Frustrado, peguei meu garfo de volta e balancei-o entre
minha acompanhante e minha funcionária.
— Você acha que pode terminar esta conversa enquanto
compra meias usadas na próxima semana? Nossa comida está
esfriando.
Josie franziu a testa. — Você não precisa ser rude.
Opal sorriu e acenou para mim. — Eh. Ele não me incomoda.
Mas eu deveria voltar para Frannie de qualquer maneira. Vocês
dois aproveitem sua noite.
— Você também, Opal — disse Josie.
Eu grunhi e enfiei um pedaço de bife na boca.
Mas Josie não voltou a comer. Ela recostou-se na cadeira e
cruzou os braços sobre o peito. — Por que você está assim?
— Assim como?
— Rude. Age como se todo mundo no mundo irritasse você.
— Não estou atuando.
— Opal está apenas sendo amigável.
— Ela estava aqui espalhando fofoca. E é isso que ela vai fazer
conosco em trinta segundos, quando voltar para sua mesa.
Josie encolheu os ombros. — Então? O que ela poderia dizer?
Que jantamos juntos?
— Gosto que meu negócio se mantenha meu negócio.
Josie balançou a cabeça. — Tem um cara que pega minhas
latas de lixo e veste um terno para um encontro sob essa aparência
mal-humorada. Se você o deixasse sair mais, você poderia ser mais
feliz.
— Quem disse que não sou feliz?
Ela procurou meu rosto como se estivesse procurando por algo.
— Você sempre foi assim?
— Faminto e com aversão a comida fria? Sim.
— Você sabe o que eu quero dizer. Você sempre foi mal-
humorado? Ou mudou depois...
Meus olhos se estreitaram. — Depois do quê?
— Depois que você perdeu sua noiva.
— Ela não está perdida. Ela está morta. E é assim que eu
sempre fui. — As pernas da minha cadeira deslizaram
ruidosamente contra o piso de cerâmica enquanto eu empurrava
a cadeira para trás. De pé, joguei meu guardanapo sobre a mesa.
— Com licença. Preciso usar o banheiro masculino.
No banheiro, joguei um pouco de água no rosto. Talvez essa
fosse uma ideia idiota, afinal. Josie não era uma mulher que
aceitaria o que eu pudesse dar e seria feliz. O restaurante chique
e as flores foram apenas o começo. Logo ela estaria esperando que
eu abrisse meu coração. E ir com ela para vendas de garagem
idiotas. Provavelmente também gostava de passar horas
conversando depois do sexo, em vez de virar e ter uma boa noite
de sono. Olhei no espelho e balancei a cabeça. O que diabos eu
estava pensando?
De volta à mesa, nossos pratos haviam sumido. Josie apontou
para os talheres que ficaram.
— Pedi a eles que esquentassem nossa comida.
Sentei-me em frente a ela. — Escute, Josie, talvez não tenha
sido uma boa ideia.
— O quê? Um encontro?
Eu balancei a cabeça.
— Por quê?
— Porque isso vai criar uma expectativa que não posso
cumprir.
— O que você está falando? Que expectativa você acha que terei
depois de um encontro?
Dei de ombros. — Simplesmente não é uma boa ideia.
— Porque eu mencionei sua noiva?
Minha mandíbula apertou. — Você quer mais do que eu posso
dar.
— Sério? Achei que estaria comendo comida em um
restaurante e sendo fodida, e estava tudo bem com isso.
— Talvez hoje, mas... — Balancei a cabeça. — No futuro você
vai...
Josie levantou a mão. — Vou parar você aí mesmo, mesmo que
interromper alguém enquanto ele está falando seja rude. Você não
pode ter ideia do que vou querer no futuro. Você sabe por quê?
— Por quê?
— Porque eu nem sei o que quero. Há alguns meses, pensei que
queria ser a Sra. Noah Townsend e curar o câncer com drogas
milagrosas. Agora estou feliz em plantar flores com o vizinho mal-
humorado enquanto fico em uma cidade com uma população
menor do que o número de pessoas no meu prédio em Nova York.
Estou pensando em inscrever-me em um curso de tricô, pelo amor
de Deus. A única coisa que tenho certeza sobre o meu futuro é que
tomarei decisões com base no que me faz feliz, em vez de no que é
a coisa certa a fazer e no que os outros esperam de mim.
Eu fiz uma careta. — Desculpe.
O garçom voltou com nossos pratos, mas Josie balançou a
cabeça. — Peço desculpas. Mas você acha que pode embrulhar isso
para levarmos para viagem? Surgiu uma coisa.
— Claro. Só me dê um minuto.
Eu me senti mal por estragar a noite. — Não precisamos sair.
Josie pegou o guardanapo do colo e colocou-o sobre a mesa. —
Sim, nós precisamos. Porque você se sente infeliz usando essa
gravata e, honestamente, também não é isso que eu quero.
Achei que ela queria dizer sair com um idiota mal-humorado
como eu. Não era como se eu pudesse argumentar que ela estava
errada. Então balancei a cabeça. — Ok.
Ela inclinou-se e abaixou a voz. — Vamos comer a comida na
varanda dos fundos com uma cerveja e fazer sexo.
Toda a respiração deixou meu corpo. — Você quer fazer sexo?
Ela sorriu. — Vê? Você realmente não tem ideia do que eu
quero.
Josie
— Eu vou me trocar. — Fox apontou para a porta ao lado com
uma das mãos e levantou o saco de comida para viagem no balcão
da cozinha com a outra. — Você quer que eu aqueça isso?
A viagem para casa foi tranquila. Eu tinha certeza de que meu
acompanhante ainda estava chocado com minha declaração de
que queria fazer sexo. Honestamente, eu também não esperava
dizer isso. Mas agora que estava disponível, senti-me liberada. Por
que não dizer o que eu queria? Eu me sentia atraída pelo grande
rabugento desde o primeiro momento em que coloquei os olhos
nele. E tínhamos química. Eu podia senti-lo pulsando em minhas
veias sempre que ele estava por perto. Sem mencionar que eu o
peguei me observando pela janela e em diversas ocasiões, quando
achava que eu não estava prestando atenção. Então eu sabia que
não estava sozinha em meus desejos.
— Não estou mais com fome. — Mordi meu lábio. — Para
comida, de qualquer maneira.
Os olhos de Fox escureceram. — Não? Diga-me do que você
está com fome.
— Eu acho que você sabe.
Ele caminhou em minha direção. Fui eu quem cutucou o urso,
mas o olhar determinado em seu rosto me fez recuar. Quando bati
na geladeira, Fox diminuiu a distância entre nós.
— Eu quero que você me diga de qualquer maneira.
— Você. Quero você.
Ele deslizou os dedos na parte de trás do meu cabelo e enrolou
um punhado em volta da mão na minha nuca. — Mais específico.
— Sexo — eu respirei. — Eu quero fazer sexo com você. Quero
que você me faça esquecer meu nome.
Ele abaixou a cabeça e subiu da minha clavícula até minha
orelha. — Forte ou suave, querida?
Mal nos tocamos, mas meu corpo estava em chamas e era difícil
falar. Parecia que o ar estava sendo expulso dos meus pulmões e
minha voz saiu toda ofegante. — Forte.
Fox puxou a cabeça para trás. Seus olhos verdes eram tão
escuros que pareciam cinzentos. — Que tal forte e rápido primeiro.
Suave e lento na segunda vez.
Ah, ah. Isso soou ainda melhor. Engoli. — O que você quiser.
Ele usou a mão no meu pescoço para me puxar para ele e sua
boca selou a minha. Assim como nosso primeiro beijo no carro, ele
gemeu através de nossos lábios unidos, e senti uma descarga
elétrica percorrer meu corpo. Eu não esqueci apenas meu nome;
apagou todos os pensamentos, todas as preocupações – tudo
menos esse beijo.
Fox deslizou a mão até minha bunda e a colocou sob meu
vestido, espalmando um punhado de bochecha. Ele me levantou
até que nossos quadris estivessem alinhados e minhas pernas
enroladas em sua cintura. Bem aberta, sua ereção grossa
empurrada contra meu ponto mais sensível, e um miado saiu dos
meus lábios enquanto meus olhos rolavam para trás na minha
cabeça. — Vamos lá para cima.
Fox manteve-me abraçada a ele enquanto atravessava a sala e
subia os degraus de dois em dois. Ele se sentou na beira da cama
e colocou-me de pé.
— Você não tem ideia de há quanto tempo estou morrendo de
vontade de descobrir se você não tem marcas de calcinha com
aquela calça justa de ioga, porque você não usa calcinha ou usa
uma calcinha fio dental.
Eu sorri. — Qual você prefere?
— Agora mesmo, sem calcinha. Porque isso economizará
tempo. Mas estou feliz em arrancar tudo o que estiver no meu
caminho.
Peguei a gravata de Fox e puxei o nó. Ele me parou, sua mão
cobrindo a minha. — Dê um passo para trás e tire o vestido. Eu
cuidarei disso.
Eu tenho sido ousada desde o restaurante, mas quando dei
dois passos para trás, de repente senti-me tímida. Fox mexeu na
gravata, mas seus olhos nunca me deixaram.
— Você precisa tirar isso. Parece um vestido muito bonito para
acabar rasgado se eu o tirar.
Respirei fundo antes de tirar as alças finas dos meus ombros.
Meu vestido acumulou-se em uma pilha de prata ao redor dos
meus tornozelos, deixando-me de pé com uma calcinha de renda,
já que eu não usava sutiã. Fox chegou ao terceiro botão de sua
camisa antes de congelar.
— Jesus Cristo. Você é ainda mais sexy do que eu imaginava
com os olhos fechados, toda vez que tomo banho.
Inclinei a cabeça, sentindo-me menos tímida depois do elogio
dele. — Você está dizendo que se divertiu pensando em mim no
chuveiro, Fox Cassidy?
— Todo maldito dia. E eu me odiei por isso.
Ele passou o braço em volta da minha cintura e me puxou
contra ele. Com ele sentado e eu em pé, meus seios alinharam-se
perfeitamente com seu rosto. Fox não perdeu tempo aproveitando
a posição. Ele juntou meus dois pulsos em uma de suas mãos,
mantendo-os presos nas minhas costas enquanto chupava um
mamilo em sua boca.
— E agora sinto vontade de fazer você pagar pelo que fez comigo
— disse ele. Seus dentes apertaram meu broto inchado. Antes que
a dor fosse totalmente registrada, ele a acalmou com a língua e
colocou a mão entre minhas pernas.
— Abra mais — ele murmurou contra minha pele.
Eu me senti vulnerável praticamente nua, com os braços atrás
das costas. Mesmo assim, estava ofegante e descaradamente fiz o
que ele pediu. Fox empurrou minha calcinha para o lado, separou-
me com os dedos e colocou um em meu calor. Foi tão bom quando
ele bombeou para dentro e para fora; fechei os olhos e cedi ao
momento. Quando minha cabeça caiu para trás, ele puxou
totalmente para fora e empurrou dois dedos para dentro.
Fox não era diferente agora do homem que conheci fora do
quarto. Ele assumiu o comando sem remorso, sabia exatamente o
que estava fazendo e prestava atenção. Em pouco tempo, meus
joelhos começaram a ceder e ele me levantou e jogou de costas na
cama. Noah estava em forma, mas Paul Bunyan jogando-me como
se eu não pesasse nada foi uma experiência totalmente diferente.
Fox levantou-se para terminar de desabotoar a camisa. Ele só
tinha alguns botões para abrir quando perdeu a paciência e a
puxou. Botões zumbiram pelo quarto em diferentes direções.
Eu ri e apoiei-me nos cotovelos. — Eu teria ajudado você.
— Não há tempo. — Ele deslizou os dedos sob o material da
minha calcinha e puxou com força. Minha calcinha rendada e cara
rasgou-se em sua mão.
— Oh, meu Deus. Você é louco.
Fox já estava desafivelando o cinto. — De quatro, querida.
Meus olhos arregalaram. — Você quer dizer mãos e joelhos?
Ele tirou a calça. — Você conhece outra maneira de ficar de
quatro?
— Você nem vai fingir ser romântico? Você sabe, olhar nos
meus olhos enquanto faz amor comigo, pelo menos?
Ele enfiou os polegares no cós da boxer preta. — É difícil ver
seus olhos quando você está de bunda para cima, querida.
— Mas...
Eu congelei quando sua cueca boxer caiu.
Oh.
Meu.
Deus.
Fox olhou para cima, provavelmente para ver por que eu não
tinha terminado a frase, apenas para descobrir que minha boca
estava aberta.
O homem era enorme. Estou falando do tamanho de Paul
Bunyan em todos os lugares. Seu pau ficou em plena atenção,
pressionado contra sua barriga, chegando quase até o umbigo.
Eu apontei para ele. — Porra.
Fox deu um sorriso arrogante.
Sentei-me para ver mais de perto. Mordiscando a unha
enquanto olhava, não havia dúvida de que era o maior que eu já
tinha visto. — Posso tocá-lo?
— Esse é o ponto. — Fox deu um passo à frente.
Não era apenas longo e grosso, mas também tinha uma
aparência estranhamente bonita – macio e de uma cor marrom-
clara quente – não vermelho, roxo ou excessivamente veiado. Até
a coroa era simétrica e linda. Passei a ponta do meu dedo indicador
ao longo dele, e a respiração de Fox sibilou entre seus dentes.
— É tão grande e... lindo.
— Lindo não é uma palavra que um cara queira ouvir para
descrever seu pau, querida.
— O que você gostaria de ouvir?
Ele sorriu. — O som de você gorgolejar. Talvez sufocar um
pouco.
Cobri meu sorriso com a mão. — Acho que teremos que nos
preparar para isso. É muito intimidante.
Passei mais trinta segundos girando meu dedo em torno da
cabeça brilhante. Quando uma grande gota de pré-sêmen vazou e
escorreu pela lateral, Fox rosnou. — Tudo bem. O show de toques
acabou. Dê-me sua boca de volta ou algo mais vai entrar nela.
O momento lúdico rapidamente tornou-se acalorado. Nossas
mãos exploravam enquanto nossas línguas entrelaçavam-se em
um beijo frenético. Eu não conseguia decidir que parte dele era
melhor sob meus dedos – os contornos duros de seu abdômen
esculpido, bíceps esculpidos ou o pau longo e firme que minha mão
lutava para envolver. Quando apertei, Fox gemeu e estendeu a mão
para minha cintura. Ele me virou de uma só vez e depois me
levantou de quatro. Eu não queria pensar por que ele era tão bom
nisso.
Alguns segundos depois, ouvi o barulho distinto da embalagem
de alumínio de uma camisinha. Estiquei o pescoço para olhar por
cima do ombro e engasguei com o que vi. Fox era uma visão de
esplendor. De joelhos, seus músculos contraídos enquanto seu
peito subia e descia. Ele enrolou a camisinha em todo o seu
comprimento e agarrou seu pau na base antes de alinhar-se na
minha abertura.
Nossos olhos encontraram-se quando ele entrou. Ele entrou e
saiu algumas vezes enquanto eu observava, mas quando
mergulhou fundo, perdi forças para manter a cabeça erguida. Fox
enterrou-se até o fim, com a frente encostada na minha bunda,
depois parou. Um de nós estava tremendo, eu simplesmente não
tinha certeza de quem.
— Relaxe um pouco. Você está segurando-se com tanta força
que não poderei durar.
Fechei os olhos e me concentrei em relaxar meus músculos,
mas era mais do tamanho dele do que da minha repressão. —
Estou tentando.
— Está pronta?
— Para quê?
— Para começarmos.
Meus olhos se arregalaram e estiquei o pescoço para olhar para
ele mais uma vez. — Ainda nem começamos?
Fox sorriu. — Você pode querer segurar a cabeceira da cama.
Ele poderia ter sorrido, mas não estava brincando. Fox
começou a mover-se e eu estendi a mão para me segurar. Suas
estocadas eram rápidas e profundas. Minha pele estava em
chamas, escorregadia pelo suor escorrendo pelas minhas costas.
Meu orgasmo formou-se como um furacão, girando e ameaçando
demolir tudo em seu caminho. O som de nossos corpos molhados
– da frente dele contra o meu traseiro – batendo um contra o outro
me deixou em uma névoa pré-orgásmica. Foi a coisa mais erótica
que já ouvi.
Fox amaldiçoou enquanto sua batida intensificava-se. Eu
queria que ele lutasse e se sentisse tão no limite quanto eu. Então
empurrei para trás, enfrentando seus impulsos ferozes, um por
um.
— Porra, Josie! — Parecia que ele estava prestes a perder o
controle e tornou-se meu desafio pessoal fazê-lo gozar antes de
mim. Achei que poderia vencer também, pelo menos até que ele
estendeu a mão e pressionou meu clitóris. Sem aviso, todo o meu
corpo explodiu numa sinfonia de fogos de artifício – pulsando e
tremendo. Não sei quanto tempo durou, mas foi o suficiente para
destruir-me. Atrás de mim, Fox estremeceu com um rugido e
depois parou.
Acho que não ganhei esse desafio.
Desabei na cama sob o peso do meu próprio corpo. Fox teve o
cuidado de não me seguir e me esmagar. Em vez disso, ele deslizou
a boca pelas minhas costas e até meu ombro, encontrando o
caminho até meu pescoço. Foi reconfortante, em contraste direto
com o que acabara de acontecer.
Ele rolou na cama ao meu lado e beijou minha testa. — Você
está bem?
— Minhas pernas ainda estão presas, porque ainda não as
sinto.
Ele sorriu e tirou uma mecha de cabelo do meu rosto. — Vou
tomar isso como um sim.
Eu bocejei. — Estou com tanto sono.
Seu polegar acariciou minha bochecha. — Descanse. Quero
foder você devagar e doce, sem cair no sono a qualquer momento.
— Só vou fechar os olhos por alguns minutos.
Ele sorriu. — Com certeza você vai.
Fox
— Livre-se do sorriso.
Não precisei olhar para Opal para saber que ela estava com um
sorriso de merda quando entrei no escritório na manhã de
segunda-feira. Inferno, ela provavelmente chegou aqui de
madrugada para preparar as perguntas do interrogatório que ela
estava formulando desde que me viu com Josie na sexta à noite.
— Não é crime sorrir — disse ela.
— Está no meu local de trabalho. Você não gosta disso, não
deixe a porta bater na sua bunda na saída.
Implacável, Opal atravessou o escritório e parou no canto da
minha mesa.
— Então... — Ela não conseguiu se conter. Um sorriso
espalhou-se de orelha a orelha. — Como foi o seu final de semana?
Eu não ia deixar transparecer que passei três noites seguidas
na cama de Josie. Eu nem teria vindo tomar ar esta manhã se não
estivéssemos dentro do prazo para este trabalho. — Ótimo. A que
horas o inspetor elétrico chega aqui? E a empresa de alarmes
também.
— Nove e dez. — Ela conferiu o esmalte de suas unhas muito
longas. — Você fez alguma coisa de especial?
Sentei-me à minha mesa e abri a gaveta de cima sem erguer o
olhar. — Você vai ter que levar suas fofocas para outro lugar.
Tenho coisas para fazer e meu negócio é meu negócio.
— O filho de Maryanne Foley tem vinte anos agora, você sabe.
Ele está na faculdade, mas faz entregas no fim de semana.
— E eu preciso saber disso por quê?
Ela sorriu. Aparentemente eu tinha mordido a isca dela. — Se
você realmente deseja que as pessoas não conheçam o seu negócio,
tente alterar os pedidos do restaurante de vez em quando.
— Que diabos você está falando?
— Metade de Laurel Lake sabe que você vai ao Inn para comer
carne de porco e purê de batatas. Então, quando não uma, mas
duas refeições são entregues na casa de Josie, e uma delas é seu
prato exclusivo, a notícia se espalha.
— Você está dizendo que o filho de Maryanne entrega Uber Eats
e foi para casa e relatou o pedido de Josie para sua mãe, que pegou
o telefone e ligou para você?
— Ele mencionou à mãe que a mulher que atendeu a porta da
antiga casa dos Wollman era gostosa. Ontem vi Maryanne na igreja
e ela me perguntou se a Sra. Wollman havia morrido. Começamos
a conversar.
Eu balancei minha cabeça. — Eu tenho que dar o fora desta
cidade.
— Para onde você iria? — Opal sorriu. — Manhattan?
Eu levantei meu dedo no ar, apontando para a mesa dela do
outro lado da sala. — Vá.
Ela nem tinha voltado para sua área quando Porter entrou. Seu
sorriso também era muito grande, muito largo.
— Bom dia, chefe. — Ele enfiou as mãos nos bolsos da calça e
balançou para frente e para trás na ponta dos pés. — Ouvi dizer
que você teve um fim de semana incrível.
Apontei para a porta. — Fora! Dê o fora do meu escritório antes
que eu remova você fisicamente.
— Rapaz, alguém está irritado. Depois de um fim de semana
como o seu, geralmente fico de bom humor. Não é, Opal?
Ela gargalhou. — Não consigo lembrar-me de tão longe.
— Então vocês são um casal agora? — Porter perguntou. Ele
ergueu as mãos, estilo rendição. — Não estou perguntando porque
espero atirar-me na Josie. Mas se vocês são, resolvi avisar que a
vinícola em Woodbridge terá um festival no próximo fim de
semana. Levei Meryl, a enfermeira com quem namorava, no ano
passado. Eles tinham música, degustação de vinhos e todos os
tipos de jogos e produtos. Ficamos em uma pousada no fim da rua.
Foi um bom momento. Romântico. Talvez seja legal levar sua nova
namorada para algum lugar fora de Laurel Lake, especialmente
porque você gosta de privacidade e tudo mais.
Eu respirei fundo. — Vá até ao local de construção da escola e
pegue o guindaste. Você tem que instalar suportes para furacões
em todos os tetos hoje, antes de fecharmos tudo amanhã.
Porter bateu dois dedos na testa em uma saudação. — É para
já, chefe.
Pelo menos ele foi embora. Se ao menos Opal fosse tão simples.
Talvez eu devesse dividir este escritório em dois pequenos para não
ter que lidar com a língua dela diariamente? Enquanto refletia
sobre esse pensamento, cometi o erro de olhar para cima. Os olhos
de Opal ainda estavam em mim, ainda brilhavam de bisbilhotice.
Felizmente, o telefone dela tocou e ela ocupou-se fazendo um
pedido urgente de suprimentos que precisávamos para serem
entregues em um canteiro de obras.
Reuni os planos revisados de que precisava para minha reunião
matinal e saí para fazer algumas tarefas atrasadas. Eu teria que
voltar ao escritório em algum momento mais tarde, mas esperava
que o trem da fofoca já tivesse passado para a próxima estação e o
que fiz no fim de semana fosse esquecido.
Assim que cheguei à escola para encontrar o eletricista, meu
telefone tocou. Fiquei um pouco feliz demais para o meu gosto
quando vi o nome que apareceu.
Josie: Bom dia! Não ouvi você escapar esta manhã. Acordei
há poucos minutos. Não acredito até quão tarde dormi.
Sentindo a necessidade de manter a calma, decidi esperar cinco
minutos para responder. Eu aguentei somente dois.
Fox: Deve ter sido todo o exercício que você fez neste fim
de semana... Como você está se sentindo?
Observei os pontos saltarem, sentindo-me como um maldito
colegial esperando a resposta de sua paixão.
Josie: Um pouco dolorida. Você sabe... lá embaixo. Mas vou
ficar bem.
Eu perdi a conta de quantas vezes estive dentro dela nos
últimos dias. Além de sair ontem de manhã para pegar alguns
suprimentos e construir uma rampa para a amiga da minha mãe,
passamos o fim de semana inteiro na cama. Mas pensei que ela
estremeceu quando entrei ontem à noite. Perguntei se ela estava
bem e ela disse que estava bem. Eu não acreditei nela, então tentei
sair, mas ela não aceitou. Ela subiu em cima e me montou tão
gostoso que quase acreditei ter imaginado o estremecimento.
Embora depois que ela adormeceu, eu procurei saber como tratar
a dor causada por muita foda. Por precaução, esta manhã eu tinha
passado na farmácia e comprado alguns produtos.
Fox: Deixei uma sacola na caixa de correio que pode ajudar.
Eu teria levado, mas não pensei e tranquei a porta ao sair.
Josie: O que é?
Fox: Sal Epsom e uma bolsa de gelo. Jogue os sais em um
banho quente. Em seguida, coloque gelo por dez minutos, dez
minutos por meia hora.
Josie: Ai, meu Deus.
Fox: O quê?
Josie: Este é um presente de despedida normal que você
deixa para seus encontros?
Eu fiz uma careta para o meu telefone. Não gostei que ela
pensasse isso.
Fox: Eu pesquisei depois que você estremeceu ontem à
noite. Mesmo que você tenha negado que doeu.
Josie: Ah.
Bill Merryman, o dono da companhia elétrica que eu estava
reclamando por causa de um trabalho de má qualidade,
estacionou ao meu lado. Ele olhou e acenou. Levantei meu queixo
e voltei para o meu telefone.
Fox: Tenho que correr. Acabei de chegar ao local de
trabalho. Deixe-me saber se você precisar de mais alguma
coisa. Posso ir buscá-la a caminho de casa esta noite.
Josie: Obrigada. Mas eu devo estar bem. Foi gentil da sua
parte comprar essas coisas.
Fox: Não espalhe a notícia de que fiz algo atencioso. Isso
vai arruinar a minha reputação nesta cidade.
Josie: hahaha! Eu não vou. Embora eu pudesse causar
alguns danos bem rápido hoje. Acho que não mencionei isso,
mas vou encontrar-me com meu tio no Rita Beanery. Esse
lugar é uma parada privilegiada na trilha de fofocas.
Fox: Como isso aconteceu?
Josie: Trocamos números quando nos encontramos na loja
de materiais de construção. Ele ligou e disse que quer me
conhecer melhor.
Eu fiz uma careta. Ray Langone era um problema. Eu não
confiava nele nem um segundo. Mas ele era a família dela, e eu já
tinha dado minha opinião sobre o assunto. Então mordi minha
língua.
Fox: Tenha um bom dia.
Josie: Você também.
O dia foi corrido depois disso. Quando voltei ao escritório, já
passava das quatro horas. Opal estava ao telefone com uma de
suas amigas. Pelo que parecia, ela não estava fofocando sobre
mim, pelo menos desta vez. Embora ela provavelmente só tivesse
se calado sobre esse assunto quando me ouviu entrar. Depois de
alguns minutos de conversa alternada com algum — Senhor, tenha
piedade — ela desligou.
— Tentar mudar os veteranos desta cidade é tão útil quanto
tentar dobrar aço com as próprias mãos — disse ela.
Eu tinha coisas para terminar, então não mordi a isca dessa
vez. Sentei-me à minha mesa com a cabeça baixa para trabalhar
no pedido de madeira que precisava fazer antes que o pátio
fechasse às cinco.
Não surpreendentemente, Opal não entendeu a dica. — Eu
nunca entendi o jogo. Trabalho muito para entregar meu dinheiro
e arriscar tudo em um cavalo.
Eu não me envolvi. Ainda não a impediu...
Ela balançou a cabeça, falando para mim em vez de comigo. —
Também não sei como duas pessoas podem ser feitas do mesmo
tecido e serem tão diferentes.
Abri meu laptop e mexi em alguns papéis enquanto ele
inicializava para manter-me ocupado.
— Como Josie se sente em relação ao tio Ray?
Agora ela tinha minha atenção. Eu mentalmente consultei o
que ela já havia dito para tentar recuperar o atraso. — Ray está
jogando de novo?
— Rachael Minton contou a Bridget Hagerty, que contou a
Georgina Mumford que viu Ray no bar Crow Nest hoje. Ele estava
se gabando de que tinha uma aposta certa em alguma corrida de
cães e estava investindo muito dinheiro nisso para poder pagar
todas as suas dívidas e fazer uma ótima viagem neste inverno.
— Onde Ray conseguiria muito dinheiro?
Opal encolheu os ombros. — Quem sabe.
Eu tendia a pensar o pior das pessoas, então esperava estar
errado. Mas procurei meu telefone para falar com Josie de
qualquer maneira.
Fox: Ei. Almoçou bem com seu tio?
Ela respondeu um minuto depois.
Josie: Sim. Ele é muito doce. Mas descobri que ele está
doente. Também não há seguro.
Fechei os olhos e xinguei baixinho. — Opal, você pode fazer um
pedido de madeira que preciso fechar antes das cinco? Vou
mandar uma mensagem para você com o que comprar.
— Claro.
Peguei minhas chaves e caminhei em direção à porta.
Opal me chamou. — Para onde você está correndo com tanta
pressa?
— Para acabar com velhos hábitos.
Eu não estava de olho em Ray Langone como planejei, mas
tinha um palpite de onde encontrá-lo. Minha primeira parada foi
no Crow Nest, mas o lugar estava vazio, exceto pelos dois policiais
locais aposentados que eram seus proprietários. A pista de
corridas de cães, duas cidades depois, foi minha próxima parada.
Eles começavam a corrida às cinco, então pisei no acelerador para
chegar lá antes que a janela de apostas abrisse.
Meu estômago revirou quando entrei. Poderia ter sido o lugar
ou a razão pela qual eu estava procurando por Ray. Eu não tinha
certeza, mas isso piorou ainda mais meu mau humor, o que não
era um bom presságio para o homem se o que eu pensava que
tinha acontecido hoje se revelasse certo.
Dei uma volta na pista. Não havia muitas pessoas, mas todos
pareciam se parecer com Ray – mesma faixa etária, pele enrugada,
nariz de bebedor e olhares de decepção em seus rostos. Ao virar a
última curva, comecei a pensar que tinha perdido meu tempo, mas
então olhei para o campo e vi um cara falando com as mãos e
exibindo um grande sorriso. Sem dúvida, Ray estava vomitando
sobre sua certeza.
Eu sabia meu tamanho. Não costumava usar isso a meu favor
desde meus tempos de hóquei, mas às vezes as ações falavam mais
alto que palavras. Endireitando meus ombros, cheguei por trás de
Ray e olhei para seu corpo de um metro e oitenta. Minha sombra
anunciou minha chegada.
Ray ergueu o queixo ao virar-se, provavelmente pronto para
dizer a quem quer que tivesse entrado em seu espaço pessoal para
recuar. Até que ele me viu.
— Fox Cassidy. — Ele deu um sorriso hesitante. — Faz muito
tempo que não nos vemos, amigo.
— Não sou amigo.
O cara com quem ele estava conversando mal podia esperar
para sair correndo. — Falo com você mais tarde, Ray. Obrigado
pela dica.
Cruzei os braços sobre o peito. — Onde você conseguiu dinheiro
para apostar hoje?
Seu rosto enrugou-se. — Por que isso interessa você?
— Responda à pergunta, Ray.
— Eu tinha isso.
— Besteira. Você perdeu seu emprego trabalhando na
construção com Pat Egmont no mês passado, porque não
conseguia chegar na hora certa. Você teria que dirigir uma hora
para encontrar alguém que não conhecesse alguém que demitiu
você, e você não pode fazer isso quando passa a maior parte de
seus dias sendo carregado no Crow Nest.
— Que porra é essa, cara? Você é minha mãe?
Estendi minha mão. — Dê-me o dinheiro que sua sobrinha lhe
deu hoje.
Eu estava esquivando-me, é claro, mas a expressão no rosto de
Ray me disse que eu havia acertado o alvo. — Como você sabe
disso?
— Eu não sabia. Você acabou de me contar. Agora cuspa. Ou
vou agarrar seus tornozelos, virar você de cabeça para baixo e
sacudir até que tudo caia dos seus bolsos.
Seu rosto ficou vermelho. — Você não pode fazer isso.
— Olhe ao redor, Ray. Quem vai me impedir?
— Desde quando você extorque as pessoas para ganhar a vida?
Achei que você fosse um benfeitor que oferecia seu tempo livre
porque seus bolsos estavam cheios por causa dos dias nas grandes
ligas.
— Não ameaço ninguém. Apenas recupero coisas para pessoas
que foram enganadas.
— O que você está falando? Minha sobrinha me deu o dinheiro.
Somos uma família. Ela está me ajudando.
Aproximei-me, então ele teve que olhar para cima para me
olhar. — Para que ela deu o dinheiro a você?
— Isso é problema meu.
— Não quando você está aproveitando-se de Josie, não é.
Uma expressão de compreensão cruzou o rosto de Ray. —
Ahhhh. Agora faz sentido. Você sempre gostou das bonitas. Como
aquela garota Evie. — Ele sorriu. — Como ela está atualmente?
Talvez você devesse ficar longe da minha sobrinha para que nada
de ruim aconteça com ela como aquele outro pedaço de rabo.
Eu agarrei o idiota pela camisa, e talvez um pouco de pele por
baixo, levantando-o com os pés no ar. — Que porra você acabou de
dizer?
Pelo menos o cara tinha inteligência suficiente para parecer
assustado. — Eu estava brincando. Eu estava brincando.
Ainda balançando-o no ar, usei-o para fazer uma rosca bíceps,
trazendo seu rosto bem perto do meu, e apontei para a pista
abaixo. — Você está devolvendo o dinheiro de Josie ou estou
jogando você por cima desta grade?
— Eu nem tenho tudo! Tive que pagar meu corretor de apostas.
— Vou pegar o que sobrou.
— Mas eu tenho uma aposta certa!
— Acredite em mim, a única aposta certa que você tem é que
eu quebrarei alguns ossos se o dinheiro não estiver em minhas
mãos nos próximos dez segundos. Não estou brincando, Ray. Você
me entendeu?
Esperei até que ele assentisse antes de colocá-lo de pé
novamente. Ele enfiou a mão no bolso sujo da calça e tirou um
maço de dinheiro. Quando ele o entregou, ele bufou e virou-se para
sair, mas coloquei a mão em seu ombro, impedindo-o. — Não tão
rápido. Dê-me o que está no outro bolso.
— Não tenho nada no outro bolso.
— Então vire do avesso e mostre-me fiapos. Caso contrário,
farei isso por você, e chegar tão perto do seu pau só vai me irritar.
Ray murmurou algo que não consegui entender, mas enfiou a
mão no outro bolso e tirou um segundo maço menor de dinheiro.
Eu o peguei e dei um empurrãozinho nele. — Agora vá para
casa. E se eu descobrir que você pediu qualquer coisa à Josie, não
teremos uma conversa de cavalheiros como acabamos de fazer.
Você vai engolir todos os dentes antes mesmo de ver quem deu o
soco.
Josie
Apertei o botão Entrar às 5:59. Talvez tivesse sido a primeira
vez que ansiava pela minha sessão de terapia. Minha cabeça
estava girando o dia todo, depois do fim de semana incrível que
passei com Fox, e achei que seria bom conversar sobre o que
estava sentindo com alguém.
Cynthia entrou na hora certa com um sorriso. — Olá, Josie.
Ajustei a tela do meu laptop para que ela pudesse ver todo o
meu rosto no Zoom. — Oi. Como vai você?
— Estou bem.
— Seu cabelo está bom. Você fez algo diferente?
— Não, eu simplesmente o arrumei para variar.
— Você vai a algum lugar especial esta noite?
Eu não tinha planos, mas um certo vizinho mal-humorado
mandou uma mensagem perguntando se poderia passar por aqui
mais tarde. — Na verdade. Bem, hum... acho que alguém está
vindo.
Mesmo a 2.400 quilômetros de distância e conversando pela
Internet, minha terapeuta conseguia me ler. Ela sorriu. — Você
quer falar sobre quem está chegando?
Soltei um suspiro ansioso. — Na verdade, eu quero.
— Acho que é um convidado do sexo masculino?
Eu balancei a cabeça. — Meu vizinho Fox.
— Oh. Você já o mencionou antes. Quando você chegou aí, eu
acho. Foi ele que criticou você por fazer a reforma sozinha, certo?
Mordi meu lábio inferior. Eu tinha esquecido que havia
mencionado isso durante uma das minhas sessões anteriores. —
Sim. Ele me fez passar um mau bocado. Mas ele também me
ajudou muito. Isso é uma espécie de modus operandi do Fox, uma
contradição gigante. Mas a casa não estaria em tão bom estado
sem tudo o que ele fez.
— Isso é ótimo. Vizinhos prestativos valem seu peso em ouro.
— Ela fez uma pausa. — Há mais alguma coisa que você queira
contar sobre ele?
Minha mente imediatamente disparou muitas coisas...
Ele era ótimo na cama.
Seu pau era assustadoramente enorme.
Não saímos da cama o fim de semana inteiro.
Mas em vez disso optei por algo mais conservador.
— Temos passado um tempo juntos. Tempo íntimo, quero dizer.
Cynthia manteve o rosto neutro. — Ok. E como você se sente
em relação a isso? Você acha que está pronta para um
relacionamento?
Eu balancei minha cabeça. — Ah, não é um relacionamento. É
só... sexo.
— Esse tipo de relacionamento definitivamente tem suas
vantagens. Claro, também tem suas armadilhas.
— Só experimentei as vantagens até agora. — Eu não pude
deixar de abrir um sorriso. — Muitas vantagens, na verdade.
Minha terapeuta sorriu. — Fico feliz em ouvir isso. Mas diga
por que é um acordo apenas sexual e não o começo de algo mais.
Isso é culpa sua?
— Eu nem tenho certeza, para ser honesta. Acho que nós dois
temos muita bagagem e queremos manter as coisas simples. Ele
me levou para um encontro em um restaurante chique, porque
achou que era isso que eu esperava. Então, quando mencionei a
morte de sua noiva durante o jantar, ele desapareceu no banheiro.
Quando ele voltou, tentou dizer que sair era uma má ideia, porque
não podia me dar o que eu precisava. Foi então que sugeri que
levássemos a comida para casa e apenas fizéssemos sexo.
— Oh, meu Deus. A noiva dele morreu?
Eu balancei a cabeça. — Eu nem tenho certeza de como. A
única coisa que sei é que o primeiro nome dela era Evie. Ele
definitivamente desliga ao mencioná-la, mesmo que casualmente.
— E esse arranjo é o que você realmente quer? Às vezes,
relacionamentos como esse podem ficar complicados. Mesmo
quando duas pessoas entram nisso com a mesma mentalidade, as
coisas podem mudar. Apesar da melhor das intenções, um de
vocês poderia desenvolver sentimentos enquanto o outro não.
— Isso não seria uma boa ideia por vários motivos – o maior
deles é que eu moro em Nova York e ele mora aqui.
— Isso é um obstáculo, não uma barreira. As pessoas podem
se mudar.
Eu ri. — Fox não. O homem não gosta de mudanças. Ele é uma
criatura de hábitos. Ele come a mesma coisa no jantar, na mesma
noite, toda semana. Se você procurar a palavra imóvel no
dicionário, tenho quase certeza de que há uma foto de Fox Cassidy.
E, claro, meu trabalho e meu apartamento ficam em Nova York.
— Entendo. — Cynthia fez uma pausa e escreveu algumas
notas. — Tirando esse novo acordo com o vizinho, como você tem
se sentido? Como tem sido seu sono?
Eu dormi melhor do que em anos depois do sexo com Fox. O
homem era como um comprimido para dormir. — Muito bom, na
verdade.
— E quanto ao seu nível de energia? Você tem passado algum
tempo na cama quando não está dormindo?
— Bem, neste fim de semana passei muito tempo na cama sem
dormir.
Cynthia sorriu novamente. — Certo. Acho que entendi. Apetite
está ok?
— Ainda estamos falando sobre o tempo que passei na cama
nos últimos dias?
Ela riu. — Eu estava referindo-me à sua fome por comida. Mas
acho ótimo que seu apetite sexual seja forte.
— Eu também tenho comido muito bem. Honestamente, sinto-
me como era antes do colapso, quero dizer.
Cynthia e eu passamos mais quarenta minutos conversando.
Para variar, quando nossa sessão terminou, eu não tive vontade
de subir na cama e enrolar-me como uma bola.
Esta tarde, quando voltei do almoço com meu tio, fiz
almôndegas com molho enquanto colocava azulejos na cozinha. A
panela esteve cozinhando o dia todo, então abaixei a temperatura
para ferver. Não muito depois, Fox bateu. Minha frequência
cardíaca acelerou, o que causou uma guerra interna.
Isso era apenas sexo, Josie. Não devia ficar animada para ver o
homem.
Por que não podia ficar animada para vê-lo? Talvez estivesse
animada com a perspectiva de fazer sexo com ele novamente e não
com a companhia dele.
Não, você não estava.
Sim, estava!
Limpei as mãos suadas na calça e abri a porta de tela com um
sorriso. — Ei. Entre.
Fox entrou. Alguns segundos estranhos se passaram.
Estávamos namorando há dias, então pareceu estranho não dar
um beijo de cumprimento. Quase antinatural. Seus olhos
imediatamente voltaram-se para minha boca, então pensei que ele
poderia estar sentindo-se da mesma maneira, embora nenhum de
nós tivesse feito nenhum movimento.
Fox pigarreou e desviou o olhar. — Você está cozinhando?
Cheira bem aqui.
— Estou. Fiz almôndegas e molho. Está com fome? Posso fazer
um prato para você. Embora eu deva avisá-lo, as almôndegas são
saudáveis para o coração. Feitas principalmente com peru. Apenas
um pouco de carne para dar sabor. Não tenho certeza se você
aprovaria. Você parece um verdadeiro cara que gosta de comer
carne e batatas, sendo a carne do tipo pouco saudável.
O lábio de Fox se contraiu. — Gosto de comidas saudáveis.
Eu passei o polegar atrás de mim. — Você quer um pouco?
— Não, obrigado. Eu já comi. Preciso ir para o rinque. Tivemos
que mudar o treino para segunda-feira esta semana porque o
rinque estava sendo usado na quarta-feira, e eu disse a um dos
caras que correríamos alguns quilômetros juntos antes. Ele quer
algum treinamento extra.
— Oh. Bem, divirta-se.
Ele assentiu e tirou um envelope do bolso de trás. — Só parei
para dar isso a você.
— O que é?
— Seus dois mil dólares. A parte que Ray ainda não gastou, de
qualquer maneira.
Peguei o envelope e espiei dentro. — Eu não entendo. Por que
você tem isso? Dei ao meu tio para pagar as contas médicas.
— Não há contas médicas, Josie.
— O que você quer dizer?
— Fiquei sabendo que Ray estava falando sobre apostar porque
tinha muito dinheiro. Encontrei-o na pista de corrida antes de a
janela de apostas abrir.
— Então ele mentiu para mim e ia apostar o dinheiro?
Fox colocou as mãos nos quadris. — Eu odeio dizer isso a você,
mas seu tio é um pedaço de merda. Ele mente, trapaceia e rouba.
Eu sei que você procura o que há de bom em todos e quer pensar
que ele mudou. Mas ele não fez isso. Entendo se você quiser
conhecê-lo, embora eu não ache que ele valha seu tempo. Mas, por
favor, não dê mais dinheiro ao idiota. Posso acabar na prisão para
recuperá-lo na próxima vez.
Olhei para o chão, sentindo-me uma idiota. — Ok.
Fox colocou dois dedos sob meu queixo e inclinou minha
cabeça para que nossos olhos se encontrassem. — Isso é culpa
dele. Não sua. Você me entende?
— Eu realmente pensei que ele tinha mudado. Ele foi tão
simpático e confiável.
— Isso é o que faz dele um bom vigarista, querida.
— Mas você sabia disso...
— Isso é porque sou cínico pra caralho. Você é otimista e tudo
bem.
Suspirei. — Obrigada por recuperá-lo.
Ele assentiu. — Sem problemas. Como você se sente? O sal
Epsom ajudou?
— Sim.
— Bom. Tenho uma semana agitada. O trabalho da escola já
deveria ter terminado, mas em vez disso eles ainda estão me dando
páginas de revisões dos planos. E começaremos um novo trabalho
amanhã também. — Ele olhou para o relógio e acenou com a
cabeça em direção à porta. — Eu tenho que ir para a pista.
Provavelmente não estarei por perto esta semana. Mas se precisar
de alguma coisa, ligue.
Fiquei desapontada, mas forcei um sorriso. — Ok. Obrigada,
Fox.
Ele estava no meio da porta quando se virou e voltou. —
Esqueci uma coisa — disse ele.
— O quê?
Ele respondeu passando um braço em volta da minha cintura
e puxando-me para perto. Seus lábios caíram sobre os meus. —
Isso.
Depois que ele terminou de me beijar, afastou-se, com os olhos
escuros. — Você tem planos para o próximo fim de semana?
Eu ainda não tinha encontrado minha voz, então balancei a
cabeça.
— Bom. Há um festival de vinho não muito longe da cidade.
Pensei que talvez pudéssemos passar o fim de semana. Talvez ficar
em uma pousada próxima.
— Oh. — Eu pisquei. — Sim. Isso parece ótimo.
— Tudo bem então. Eu falo com você em breve.
E, sem mais nem menos, o meu garanhão do sexo saiu pela
porta, como se não fosse grande coisa que ele tivesse acabado de
mover o que estava acontecendo entre nós para um novo território.
No dia seguinte, fui até uma loja de pisos a meia hora de
distância para comprar um carpete novo. Também encontrei
alguns ladrilhos que pareciam piso de madeira que pensei em
instalar no andar de baixo. Não era barato, então eu queria fazer
minha lição de casa antes de ter certeza. No caminho para casa,
passei pelo bar Crow Nest. O carro surrado do meu tio estava
estacionado ali fora, então decidi parar.
Lá dentro estava escuro. As luzes estavam acesas, mas com
painéis de madeira sujos e um bar marrom desgastado, não havia
muito onde elas pudessem ricochetear. Havia apenas três pessoas
em todo o lugar, então não foi difícil encontrar o tio Ray. Ele estava
sentado no outro extremo, olhando para um copo com um líquido
âmbar. Ele não olhou para cima até que eu estava ao lado dele.
Então ele franziu a testa.
— Não quero mais problemas — disse ele. — Aquele Cassidy
ameaçou minha vida.
Aceitei essa afirmação com cautela e sentei-me no banquinho
ao lado dele. — Por que você mentiu para mim?
— Você teria me dado o dinheiro se eu lhe contasse para o que
era?
Eu balancei minha cabeça.
Ele encolheu os ombros e levou o copo aos lábios. — Bem, aí
está sua resposta.
Suspirei. — Você sabe que existem grupos e conselheiros para
viciados em jogos de azar, se você tiver algum problema.
— O único problema que tenho é você no momento. Você
sentada aqui olhando para mim com desprezo.
O barman se aproximou e colocou um guardanapo na minha
frente. — O que posso trazer para você?
Acenei com a mão. — Nada para mim. Obrigada.
Ray engoliu o resto do copo e ergueu-o. — Vou querer outro.
— Você tem que pagar adiantado, Ray. Você sabe disso.
Dinheiro antes de servir.
Parecia que Fox não era o único que tinha o número do meu
tio.
— Eu já dei a você meus últimos malditos dez dólares. Dá-me
só um.
O barman balançou a cabeça e apontou para a caixa
registradora. — Há uma lista de pessoas a quem não podemos
conceder crédito ou receber cheques. O proprietário escreveu seu
nome em vermelho e sublinhou duas vezes. Desculpe.
Eu sabia que não deveria fazer isso, mas pensei que ele seria
mais receptivo a conversar se eu cobrisse sua bebida. Peguei uma
nota de vinte e coloquei em cima do bar.
— Eu pagarei pelo dele.
Ray sorriu para o barman. — Meu pedido é duplo então.
O barman balançou a cabeça e olhou para mim, perguntando
se estava tudo bem. Eu balancei a cabeça.
Ficamos sentados lado a lado em silêncio até que um copo meio
cheio de líquido âmbar apareceu novamente na frente do meu tio.
— Posso perguntar uma coisa?
— Contanto que você esteja pagando...
— Por que minha mãe me disse que você estava morto?
Ray zombou. — Já imaginava.
— Vocês dois brigaram ou algo assim?
Ele tomou um grande gole de sua bebida e a largou com um
tinido. — Sua mãe sempre foi muito exigente comigo. Muito difícil
para todos e em todos os lugares, incluindo esta cidade.
— Como era sua mãe?
— Rapaz, ela também não contou sobre sua avó?
— Não muito.
— Se você perguntar mais, eles dirão que ela era uma mulher
legal. Ela era reservada, sem muitos amigos e tal. Rose Langone
preocupava-se com as aparências. Assim, as cortinas ficavam
fechadas enquanto mamãe bebia seus quatro martinis por dia. E
pelo que entendi, o pai da sua mãe foi gentil o suficiente para ter
apenas uma namorada por vez. Eventualmente ele fugiu com
alguém que não tinha duas bocas para alimentar. E meu pai se
mudou um mês depois. Ele gostava de bater na gente e sua avó
fingia que isso não acontecia. — Ele encolheu os ombros. —
Apenas uma família normal e feliz.
Achava que sabia por que minha mãe era daquele jeito. Ela se
importava com o que as pessoas pensavam e tinha um desdém
geral pelos homens. O fato de ela não querer visitar Laurel Lake
também fazia mais sentido agora. Talvez tivesse sido melhor eu ter
crescido sem saber muito.
— Alguma outra pergunta? — meu tio indagou.
Eu balancei minha cabeça.
— Bom. Diga ao seu namorado que ele me deve um chapéu
novo.
Eu fiquei de pé. — Fox não é meu namorado.
Ray pegou seu copo mais uma vez. — Isso é bom. Não gostaria
que minha única sobrinha acabasse como a última namorada
daquele homem.
Fox
— Que diabos? — Se eu não soubesse melhor, teria pensado
que tinha entrado no quintal errado. Havia pessoas circulando por
toda parte e eu não tinha ideia de quem eram.
Uma morena magra vestindo apenas a calcinha de um biquíni
tropeçou em minha direção. Ela jogou os braços em volta do meu
pescoço. — Você é fofo. Quem é você?
Eu tirei seus braços. — Acho que a melhor pergunta é quem
diabos é você e onde está sua blusa?
Ela fez beicinho. — Você não parece muito divertido.
Passei pela mulher e joguei minha bolsa de equipamento no
deck dos fundos, examinando o quintal em busca de Evie.
Encontrei-a no lago com um copo vermelho na mão, então
caminhei até a beira. Acho que meu plano de voltar para casa mais
cedo, enrolar-me no sofá e assistir a um filme com minha garota
estava fora de questão.
— Evie? O que está acontecendo?
Ela semicerrou os olhos. Quando ela percebeu que era eu, ela
sorriu e acenou. — Entre! Está tão quente.
— Por que você está aí com todas as suas roupas?
— Eu senti vontade.
Fiz um gesto para cerca de vinte pessoas no pátio. — Quem são
todas essas pessoas?
— Alguns velhos amigos de Coopsville.
Ultimamente, havia duas Evies – deprimida e na cama
dormindo, ou festejando como se ela não tivesse nenhuma
preocupação no mundo. Era um extremo ou outro. Eu a
encorajava a sair mais, passar mais tempo com seus velhos amigos
ou fazer novos, talvez encontrar algo para ocupar seu tempo. Mas
isso não era exatamente o que eu estava pensando. — Por que você
não sai do lago?
— Por que você não entra?
— Porque estou vestido e acabei de chegar em casa depois de
dois dias de viagem.
— Então? — Ela se recostou e se deitou em cima da água,
flutuando de costas. — Está tão quente.
Olhei ao redor do quintal. À minha esquerda havia uma mulher
montada em um cara enquanto eles se beijavam. Atrás de mim
havia dois caras fumando um baseado. — Que tal dizermos às
pessoas que é hora de ir?
Evie levantou a cabeça para fora da água e ficou de mau humor.
— Desmancha-prazeres.
— Vou tomar um banho e me trocar. Mostrarei às pessoas a
saída se elas ainda estiverem aqui quando eu terminar.
Não esperei por uma resposta antes de me virar e entrar. Havia
algumas mulheres na cozinha jogando um jogo de bebida. Na sala,
um cara estava relaxado no sofá com uma das mãos no cós da
calça e os tênis sujos em cima da minha mesinha de centro. Eu
chutei seus pés. Ele se assustou e deu um pulo como se fosse ter
algum problema com isso, mas depois tropeçou e teve que se
agarrar ao braço do sofá para evitar cair.
Quando ele olhou para mim, ele engoliu em seco. — E aí, cara?
— A festa acabou. Pegue sua merda e saia.
— Quem é você? — Ele inclinou a cabeça. — Você parece
familiar.
— O cara que é dono da casa. — Fui em direção às escadas. —
Eu vou me trocar. Que já tenha ido embora quando eu voltar. E
leve seus amigos com você.
Não esperei que ele respondesse antes de levantar minha bolsa
novamente e subir dois degraus de cada vez. No chuveiro, deixei a
água cair por mais tempo do que o normal, esperando que isso
aliviasse um pouco a tensão no meu pescoço. Mesmo depois de
quinze minutos, eu ainda não estava com disposição para uma
festa cheia de estranhos bêbados. Eu queria que Evie tivesse
amigos e construísse uma vida para si mesma, mas o fato de ela
beber preocupava-me. Depois de me secar e me vestir, olhei para
o quintal pela janela. Evie estava se despedindo das pessoas, então
fiquei aqui em cima até os últimos retardatários desaparecerem.
Acabei encontrando-a sentada nos degraus do deck dos fundos,
sozinha.
Ela olhou para cima quando ouviu a porta de tela abrir e fechar.
— Você está louco?
— Esta é a sua casa também. Então não vou dizer que você não
pode receber amigos. Mas entrar e encontrar caras bêbados
dormindo no meu sofá não é bom, Evie.
Ela fungou. — Não consegui o emprego no rinque.
Sentei-me ao lado dela no degrau. — Por quê? Achei que a
entrevista correu bem.
— Eles contrataram alguém com mais experiência em ensino
de patinação. Quero dizer, ensinar patinação. — Ela balançou a
cabeça. — Não, quero dizer... tanto faz.
— Desculpe.
— Não sei o que fazer comigo mesma pelo resto da minha vida.
— Eu gostaria de ter uma resposta. Só você pode descobrir isso.
Mas eu sei que a resposta é não beber assim.
— Isso me ajuda a esquecer por um tempo. — Ela inclinou-se
e apoiou a cabeça na calça jeans encharcada. — Eu só quero voltar
para quando ainda tinha uma chance. Mesmo que fosse um tiro
no escuro, havia esperança. Agora sinto-me... sem esperança.
— Talvez você devesse conversar com alguém? Ver um médico?
Ela franziu a testa. — Eu só preciso de um plano. Algo a ver
com a minha vida. — Alguns segundos depois, ela levantou-se
abruptamente e tropeçou até o canteiro de flores mais próximo, a
princípio arfante. Fiquei atrás dela e segurei seu cabelo enquanto
ela vomitava. Quando ela terminou, ela limpou a boca com as
costas da mão. — Não acho que a tequila combinou com a água do
lago que engoli.
— Sim, provavelmente não.
Ela começou a chorar. — Desculpe, eu sou uma idiota.
— Você está passando por uma fase difícil. Você vai superar
isso.
— Não quero ser como minha mãe.
— Então vamos cortar isso pela raiz. Pare de beber.
— Eu bebo antes do meio-dia.
Eu suspeitei que fosse esse o caso em mais de uma ocasião.
Mas quando perguntei, ela disse que estava de ressaca. Não que
isso fosse muito melhor.
— Quer que eu leve você a algum lugar? Para uma
desintoxicação ou reabilitação?
— Você acha que eu preciso?
— Acho que quero que você melhore. Então, se você está
disposta a isso, vamos tentar. Não pode doer, certo?
— Eu acho que não.
— Vou fazer algumas ligações.
— Pode esperar até amanhã?
— Claro.
— Vou melhorar para você.
Eu balancei minha cabeça. — Não, Evie. Você precisa melhorar
para você.
Fox
— O que você vai fazer neste fim de semana, chefe?
Eu não precisava que Porter soubesse que eu tinha aceitado
sua sugestão de levar Josie para a vinícola, então olhei
diretamente para a estrada enquanto voltávamos do local de
trabalho em minha caminhonete na tarde de sexta-feira. — Não
muito.
Eu o peguei sorrindo com minha visão periférica. — Uh-huh.
Eu não tinha certeza se isso significava que ele sabia ou
suspeitava de alguma coisa, mas deixei por isso mesmo. Porter
voltou a jogar algum jogo com sons irritantes de desenhos
animados em seu telefone.
Mas alguns quilômetros depois, ele não conseguiu se conter. —
Normalmente não sou um bebedor de vinho, especialmente tintos.
Optei por conta do ambiente e porque deixou feliz a garota que eu
estava vendo. Mas eles fazem este vinho que tem gosto quase de
cereja preta. Acho que se chamava petit verdot.
Meus olhos brilharam para ele e de volta para a estrada. —
Quem contou a você?
Porter riu. — A Sra. Hope ligou para o escritório. Ela disse a
Opal que você sairia da cidade no fim de semana.
Eu balancei minha cabeça. — Minha própria mãe.
— Agora não fique chateado com ela. Ela não derramou o feijão
intencionalmente. Outro dia, você me mandou até uma loja de
materiais de construção para comprar um carretel de fio elétrico.
Enquanto eu estava lá, Sam estava fazendo um orçamento para
um piso. Vi o nome de Josie no topo, então quando ele perguntou
se eu precisava de ajuda, falei para ele terminar o que estava
fazendo. Achei que eu estava trabalhando e você não se importaria.
De qualquer forma, Sam disse que não tinha pressa, porque a
cliente tinha ido ontem para fazer um orçamento, mas ela estava
viajando no fim de semana. Somei dois mais dois depois que Opal
conversou com a Sra. Hope e perguntou se eu sabia que você sairia
da cidade neste fim de semana. Não se preocupe, não mencionei a
Opal a conexão que fiz.
— Bom. Vamos continuar assim.
Porter sorriu. — Que bom que você aceitou minha
recomendação.
Eu esperava fugir sem reconhecer isso. Mas eu me senti um
idiota agora que fui pego. — Obrigado pela ideia.
Ele sorriu mais do que se eu tivesse lhe dado um aumento. —
De nada.
— Tudo bem, agora sei que você provavelmente está tão
nervosa quanto eu com o meu fim de semana. Mas acho que está
na hora.
Saí para o deck dos fundos e encontrei Josie ajoelhada na
grama à beira da água, conversando com o pato. A cena era
divertida demais para ser interrompida.
Ela acariciou suas penas e apontou para trás. — Você tem uma
bela casa nova. Bem, não é nova. Comprei na venda de garagem
que fui com Opal. Mas é limpa e nova para nós. Então, se você
decidir que ainda não está pronta para voltar com seus amigos,
sua cama estará arrumada e esperando.
Jesus Cristo, eu nem tinha notado a nova adição ao quintal. A
mulher comprou uma casinha de cachorro para um pato selvagem.
Imaginava que isso era apropriado, visto que ele dormia numa
cama ortopédica.
Ela inclinou-se para frente e acariciou o pato. Quando ela se
levantou, a coisa bateu as asas e começou a entrar na água. Josie
sorriu e cobriu o coração com a mão. — Volte e visite logo,
Margarida! Deixei comida na sua nova casa caso você fique com
fome!
Encostei o quadril na grade do deck, observando Josie olhar o
pato nadar. Quinze metros dentro do lago, um bando de patos de
aparência semelhante nadou e o amiguinho de Josie juntou-se ao
grupo.
Coloquei as mãos em concha na boca e gritei: — Estou feliz que
você o colocou de volta onde ele pertence. Fiquei preocupado que
você tentasse guardá-lo na sua bolsa para levá-lo neste fim de
semana.
Josie pulou antes de se virar. — Você me assustou pra caralho!
Há quanto tempo você está parado aí?
— Tempo suficiente para saber que você está nervosa com este
fim de semana.
Um toque de rosa corou suas bochechas. — Eu só estava
tentando fazer Margarida se sentir melhor, como se ela não
estivesse sozinha.
— Uh-huh.
Josie revirou os olhos. — Não estou nervosa por passar um
tempo com você.
— Talvez você devesse estar.
— Por quê?
Eu olhei para ela de cima a baixo, percebendo como ela ficava
linda em mais uma calça de ioga – desta vez azul – e um top curto
combinando. — Porque vou fazer coisas muito ruins com você.
Seu queixo caiu. Eu gostava quando ela fazia esse olhar, como
se ela estivesse me visualizando agradando-a. Mesmo assim ela
manteve a farsa, cruzando os braços sobre o peito. — É mesmo?
Eu me afastei do corrimão e me aproximei. Josie ergueu o
queixo e manteve-se firme, o que me excitou ainda mais. Quando
estávamos cara a cara, olhei para ela e puxei uma mecha de seu
cabelo. — Mesmo. Tem algum problema com isso?
— E se eu disser que sim?
— Então você estaria perdendo. Eu estava planejando tocar
você na entrada da garagem antes mesmo de sairmos, para que
você ficasse relaxada durante a viagem. A Sra. Craddox
provavelmente também ficaria desapontada. Tenho certeza de que
ela não consegue se lembrar da última vez que viu um rosto de
orgasmo.
Josie deu um tapa na minha barriga, rindo. — Você é tão
grosseiro.
Eu coloquei minha orelha em concha. — O que é isso? Você
disse que quer na bunda? Isso pode ser arranjado...
Suas bochechas ficaram vermelhas, mas eu poderia dizer que
ela gostou da minha provocação. Bem, eu estava principalmente
brincando. Passando um braço em volta de sua cintura, puxei-a
para mim. — Então é assim que vai ser? Quando vir você, vou ter
que pedir um beijo, porque você não vai me oferecer um?
— Eu deveria fazer isso? Eu não tinha certeza do protocolo.
Nunca estive em um relacionamento apenas sexual.
Essa última declaração deveria ter disparado uma série de
sinais de alerta - havia uma razão pela qual algumas mulheres só
tinham relacionamentos. Elas não conseguiam separar o físico do
emocional. No entanto, em vez de me fazer pensar duas vezes,
fiquei em êxtase ao saber que conexões não eram sua praia. Era
um duplo padrão ridículo, é claro, considerando que essas foram
as únicas coisas que fiz nos últimos dois anos. Mas era o que era.
Abaixei minha cabeça e plantei meus lábios nos dela. Demorou
três segundos até que meu jeans ficasse desconfortável, então
sabia que precisava me controlar. Mas a semana tinha sido longa
e Josie era meu primeiro pensamento quando acordava todos os
dias e meu último pensamento quando adormecia à noite. Então
não foi fácil. Eu queria que ela ficasse nua e chamasse meu nome
do jeito que ela fez, o mais rápido possível.
A contragosto, afastei-me do beijo e esfreguei minhas mãos
para cima e para baixo em seus ombros. — Você está pronta para
ir?
— Bastante. Só preciso colocar um suéter ou moletom na bolsa,
caso fique frio.
— Por que você não faz isso? E vou pegar minhas coisas e parar
na sua garagem.
— Ok. — Ela sorriu.
Uma coisa boa sobre o que quer que estivesse acontecendo
entre nós, eu não precisava mais fingir que não estava olhando
para ela. Quando ela chegou à porta dos fundos, ela se virou. Meus
olhos demoraram a se erguer para encontrar os dela, então ficou
claro o que eu estava fazendo.
— Ainda me verificando, hein? — Ela sorriu presunçosamente.
— Com certeza. A propósito, doutora, talvez você queira
embalar o sal Epsom. E a bolsa de gelo.
— Ouvi dizer que você estava pensando em colocar um novo
piso.
Josie olhou para mim. Estávamos há uma hora no carro e a
cerca de meia hora da pousada que eu havia reservado. — Como
você sabe disso?
— Como é que todo mundo sabe alguma coisa por aqui?
Ela balançou a cabeça. — É realmente bizarro o quão rápido as
coisas viajam. Meu piso nem é escandaloso. Mas sim, estou
pensando em fazer a cozinha e o primeiro andar com revestimento
novo, do tipo que parece madeira. O material existente está tão
desatualizado.
— Bem, avise quando você decidir. Farei o pedido para você.
Recebo um desconto de empreiteiro.
— Ah, uau. Obrigada. Eles ainda instalarão para mim, se você
fizer o pedido?
— Vou instalar para você.
— Não posso pedir que você faça isso.
— Você não pediu.
— Ainda assim... você já fez muito.
Eu mexi minhas sobrancelhas. — Pretendo fazer muito mais.
Apenas espere.
Josie riu. — Talvez você possa me mostrar como instalar o piso
e podemos fazer isso juntos?
— Se você quiser. Mas posso acabar com isso sozinho em
algumas horas.
— Na verdade, descobri que gosto de aprender e de fazer o
trabalho. Quando decidi vir para cá, pensei que arrumar a casa
me manteria ocupada. Mas transformou-se em mais do que isso.
— Ela olhou pela janela por um momento. — Quando eu era
pequena, depois que percebi que não conseguia dançar por merda
nenhuma e que provavelmente não iria ser bailarina, quis ser
pintora. Não do tipo artístico, mas do tipo que usa rolo nas
paredes.
— Sério?
Ela assentiu. — Tínhamos um pintor que minha mãe sempre
usava. Seu nome era Roland e ele sempre tinha um sorriso no
rosto. Ele pintava a sala enquanto cantarolava as músicas que
tocavam em seus fones de ouvido ou cantava junto. Ele me deixava
ajudá-lo a usar rolo sempre que minha mãe não estava em casa.
Minhas sobrancelhas se juntaram. — Só quando sua mãe não
estava por perto?
— Melanie Preston nunca me permitiria ficar com alguém
fazendo trabalhos domésticos. Ela trata as pessoas que trabalham
para ela como se fossem ajudantes contratados, dois degraus
abaixo dela. Além disso, ela não gostaria que eu tivesse ideias
sobre escolhas profissionais. Ela já havia decidido que eu iria para
a faculdade de medicina. Foi bastante decepcionante eu ter feito
meu doutorado e escolhido pesquisas, e não uma faculdade de
medicina de verdade.
— Por que o que você faz seria decepcionante? Não são ambas
médicas que curam pessoas?
— É mais uma questão de prestígio para minha mãe do que de
trabalho em si. Ela queria que eu fosse uma cirurgiã como ela. A
pesquisa também não paga tão bem quanto os médicos, e ela mede
o sucesso por meio de coisas e prêmios. Provavelmente é por isso
que ela e Noah se davam tão bem. — Ela fez uma pausa e sorriu.
— Minha mãe provavelmente odiaria você.
— Porque eu trabalho com construção?
— E porque você era um jogador de hóquei. Meu pai costumava
assistir ao futebol no porão, porque ela achava os esportes de
contato bárbaros.
A ideia de sua mãe não gostar de mim podia ter divertido Josie,
mas fez meu queixo tremer de tensão. Isso não deveria ter
importância. Conhecer os pais não estava na minha agenda, mas,
por algum motivo, tocou num ponto nevrálgico. — Parece que sua
mãe deveria usar suas habilidades cirúrgicas para tirar o pau da
bunda. Espero que você não se importe que eu diga isso.
Josie riu. — Não só não me importo, mas é uma das razões
pelas quais gosto tanto de você.
O fato de ela ter acrescentado tanto na frase acalmou um pouco
meus sentimentos distorcidos. Estendi minha mão e a apoiei em
sua coxa, e nossos olhos se encontraram brevemente para um
sorriso silencioso antes de retornar à estrada.
— Mas meu pai teria gostado de você — disse ela.
— Oh, sim?
Ela assentiu. — Ele gostava de pessoas honestas que não
fingiam.
— Como ele acabou com sua mãe, então?
— Sempre me perguntei a mesma coisa. Mas ele a amava.
Muitas vezes eu o via observando-a à distância com um sorriso no
rosto. Tipo, ela estava na cozinha servindo uma xícara de café ou
algo assim, e eu o encontrava encostado no batente da porta,
observando-a quando ela não estava olhando.
Pensei na maneira como observei Josie hoje, aproveitando o
momento. E como eu a observei no quintal do segundo andar, ou
roubei alguns momentos de seu trabalho na cozinha pela janela
da frente em mais de uma ocasião. Mas isso era diferente, não era?
Pelo menos foi o que eu disse a mim mesmo.
— De qualquer forma... — Josie mexeu-se no banco para me
encarar. — Sinto que estou sempre falando de mim. Conte-me
sobre você.
— O que você quer saber?
— Não sei. Como foi jogar hóquei profissional? As mulheres
usavam suas camisas e pediam seu autógrafo?
— Eu adorava jogar, e as mulheres também.
— Mas você tinha groupies? Como mulheres que queriam estar
com você porque você era jogador?
Esta era uma linha de questionamento com a qual um homem
jogava xadrez. Uma resposta poderia nos levar por um caminho
que ela talvez não quisesse seguir. Então movi uma peça que
impediu que meu rei ficasse em xeque. — Parece que foi há muito
tempo.
Ela sorriu. — Então isso é um sim. Você tinha namorada o
tempo todo que jogou?
Eu balancei minha cabeça. — Não o último ano.
— E na faculdade?
— Saí com alguém durante a maior parte do primeiro ano.
— O que aconteceu com isso?
— Ela era três anos mais velha. Ela formou-se e voltou para
casa, e eu fui convocado para a liga.
— Você entrou no profissional tão cedo?
— Não é cedo para o hóquei. A maioria dos caras chega por
volta dos dezenove anos.
— Eu não percebi isso.
— Você acompanha hóquei?
— Na verdade, nunca assisti a um jogo.
Eu ri. — A idade média de aposentadoria é de vinte e nove anos.
Portanto, se você não chegar cedo, estará reduzindo
significativamente sua chance de ver a hora do gelo. Existem
valores discrepantes. Gordie Howie e Chris Chelios jogaram vinte
e seis temporadas. Mas para cada um deles, há dez caras que não
sobrevivem dois anos.
— Aposentadoria aos vinte e nove anos. Uau. Isso é tão jovem.
— É um jogo fisicamente exigente. Há uma razão pela qual os
jogadores entram e saem a cada minuto ou mais.
— Eles trocam de jogador a cada minuto?
Eu ri. — Você não estava brincando. Você nunca assistiu a um
jogo de hóquei, né?
— Não. Nunca. Um minuto parece tão curto.
— Não quando você está jogando. Acho que a mudança média
é de cerca de quarenta e sete segundos. Os melhores jogadores
podem permanecer por um minuto ou mais; caras de nível inferior
às vezes saem em quarenta segundos. Tudo depende da
resistência.
— Quanto tempo duravam seus turnos?
Eu não era arrogante sobre muitas coisas no hóquei. Nunca fui
o melhor, nunca fui o pior. Mas eu estava orgulhoso do meu tempo
de jogo durante meu apogeu. — Um pouco mais de um minuto.
— Caramba. Não admira que eu precisasse do sal Epsom.
Ela olhou pela janela depois disso. Fiquei me perguntando o
que ela estava pensando, até considerei perguntar – algo que
normalmente nunca faria. Mas ela me venceu.
— Você se divertiu quando nós... você sabe?
Ela não poderia estar questionando se eu gostava de transar
com ela. — Quando nós o quê?
— Quando brincamos. Fizemos sexo.
— Por que diabos você me perguntaria isso?
— Não sei. Acho que porque fizemos isso tantas vezes. Quando
estávamos no momento, pensei que era porque não nos
cansávamos de uma coisa boa. Mas depois... não sei. Acho que
tenho dúvidas por causa de Noah me traindo. Se ele estivesse
satisfeito, por que ele teria trapaceado?
Eu balancei minha cabeça. Aquele ex idiota dela tinha feito um
estrago com ela, ainda mais do que eu imaginava. — Querida,
quando um homem trai, geralmente não tem nada a ver com sua
vida sexual ou com a mulher com quem está. Eles trapaceiam
porque têm problemas pessoais. Eles são egocêntricos e têm baixa
autoestima. Quão difícil teria sido terminar com você antes de
decidir brincar? Não é nada difícil. Mas ele queria pegar seu bolo e
comê-lo também. Não deixe aquele idiota colocar seus problemas
em você. Entendeu?
Ela não parecia convencida. Então liguei a seta e virei na
próxima saída, embora ainda tivéssemos meio caminho pela frente
antes de chegarmos ao lugar onde nos hospedaríamos. Assim que
saímos da rodovia, parei em um estacionamento vazio.
— O que você está fazendo?
Estacionei e certifiquei-me de ter toda a atenção dela. — Foder
você foi fenomenal. Eu perdi minha saída dirigindo para a
madeireira outro dia – um lugar onde eu poderia chegar de olhos
fechados – porque estava imaginando meu pau entrando e saindo
de você, o jeito que você me ordenhava como um punho apertado,
só que melhor. Todos os dias desta semana, acordei pensando em
você debaixo de mim e fui para a cama me masturbando,
lembrando do som que você faz quando goza. Então, qualquer
dúvida boba que aquele idiota com quem você estava plantou em
seu cérebro, livre-se dela. Porque não só me diverti, Josie. Eu me
diverti muito.
Seus olhos lacrimejaram. — Oh, meu Deus. Eu precisava ouvir
isso.
— Não contei porque você precisava ouvir. Eu contei porque é
a verdade.
Ela desafivelou o cinto de segurança e passou pelo console
central até meu colo. Pressionando sua boca na minha, ela
murmurou: — Eu quero você.
— Aqui?
Ela assentiu e estendeu a mão para o botão da minha calça
jeans. — Por favor.
A única coisa melhor do que essa mulher assumir o comando
era ela dizer por favor. Eu queria ouvir essa palavra dos lábios dela
todos os dias. O que era um problema..., mas eu pensaria quando
não estivesse prestes a deixar Josie Preston afundar até as bolas
no meu pau.
Fox
Josie observava a pista de dança enquanto eu a observava.
Aquele comentário que ela fez no carro ontem – como ela sabia o
quanto seu pai amava sua mãe porque muitas vezes o pegava
olhando para ela – veio à minha mente. Mas empurrei-o para trás
e desviei o olhar, engolindo minha última amostra de vinho.
— Sabe, você deveria provar o vinho — comentou Josie. —
Deixe rolar pela sua língua para saborear e descobrir os sabores
que você reconhece. Não beber como se fosse uma dose de tequila.
— Você tem o seu jeito e eu tenho o meu — falei.
Ela sorriu e olhou para a multidão balançando ao som da
música sob a tenda. Eu odiava dançar. Verticalmente de qualquer
maneira, mas ela me deu o que eu queria – e mais um pouco –
ontem à noite e novamente esta manhã, então imaginei que isso
não iria me matar desta vez. Eu me levantei e estendi minha mão.
— Sério? — Josie parecia tão chocada quanto eu por estar
iniciando essa merda. — Eu nem perguntei, porque imaginei que
não havia nenhuma maneira no mundo de Fox Cassidy dançar.
Eu estava começando a perceber que não havia muita coisa que
essa mulher não pudesse convencer-me a fazer. Aqui estava eu,
não em casa ou no trabalho aos sábados, mas em uma vinícola,
entre todos os lugares. E ontem à noite eu dormi em um quarto
com papel de parede floral e cortinas com babados, seguido por
uma manhã em que nos juntamos a estranhos que acharam
divertido conhecer os outros hóspedes no café da manhã. Mas
quando segurei Josie contra mim na pista de dança, esqueci
completamente o que fazia ou deixava de fazer normalmente.
Ela descansou a cabeça no meu peito enquanto
cambaleávamos ao som da música. Depois de dar uma volta na
pista de dança, ela olhou para mim com um sorriso. — Este lugar
é muito legal. Você vem aqui frequentemente?
Eu balancei minha cabeça. — Primeira vez.
— Oh. — Ela pareceu pensar na minha resposta antes de seus
olhos encontrarem os meus novamente. — Existe alguma vinícola
diferente que você costuma frequentar?
— Não.
— Você já esteve na pousada em que estamos hospedados
antes?
— Nunca pisei em uma pousada até ontem à noite – a menos
que você conte o Hilton Garden Inn, já que eles tecnicamente
oferecem uma cama, junto com um café da manhã grátis no
saguão na manhã seguinte.
Mais uma vez, ela considerou minha resposta. — O que fez você
me trazer aqui então?
Dei de ombros. — Parecia algo que você gostaria.
— Isso é. — Ela sorriu. — Obrigada.
Voltamos a deslizar pela pista de dança em silêncio. Mas Josie
tinha o tipo de cérebro que não desligava tão facilmente. Nem com
a ajuda de um pouco de vinho. Ela olhou para mim. — Fox?
— Sim?
— Somos... mais do que apenas sexo agora?
— Não sei, Jos. Precisamos colocar um rótulo nisso?
Ela suspirou. — Não, acho que não. Acho que gosto de
compartimentar as coisas.
Eu odiei a expressão de decepção em seu rosto. — O que vem
depois do sexo? — perguntei.
— Dormir?
Eu ri. — Eu quis dizer em seus compartimentos. Você tem o
sexo e a diversão numa ponta e o casamento na outra, certo? O
que é que fica no meio?
— Oh. Um relacionamento está em algum lugar no meio, eu
acho.
— O que vem antes disso?
— Não sei. Namoro, talvez?
— Que tal chamá-lo assim? Namoro.
— Ok. — Ela sorriu. — Nunca pensei realmente em todas as
diferentes etapas. Mas eu acho que namorar é algo entre ficar e
um relacionamento exclusivo.
Meus olhos se estreitaram. — Então namorar significa que você
pode ver outras pessoas?
— Eu acho que sim. Se estivermos mantendo isso casual.
A ideia dela com outra pessoa me deu vontade de mastigar os
dentes de um cara imaginário e cuspi-los. — Então estamos
adicionando um novo compartimento. Namoro exclusivo.
— Sério? Você não quer ver outras pessoas?
— Você está bem com isso?
Ela assentiu. — De qualquer forma, não sou alguém que
consegue namorar mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Além
disso, talvez possamos abrir mão dos preservativos. Acho que eles
contribuíram para minha dor no fim de semana passado. Se você
concordar com isso, quero dizer. Fiz um check-up depois que
descobri que Noah estava me traindo, então sei que estou limpa.
Eu parei no meio do caminho. — Você está tomando pílula?
— Não, mas eu tenho um DIU.
Abaixei-me e coloquei meu ombro em sua barriga. Quando me
levantei, Josie caiu sobre meu ombro. Ela gritou enquanto ria. —
O que você está fazendo?
— Dando o fora daqui.
— E o meu bilhete de degustação?
Abaixei-me quando passamos pela mesa em que estávamos
sentados e peguei o pequeno porta-copos de madeira junto com
sua bolsa.
Josie mexeu-se em meus braços, mas não a abaixei – nem
mesmo com as pessoas olhando enquanto eu caminhava pela
vinícola, e nem mesmo quando o segurança parado na porta da
frente me disse que eu não poderia sair com os copos na mão.
Continuei me movendo – passos longos e decididos até chegar à
caminhonete e jogá-la dentro. Correndo até o lado do passageiro,
entreguei a ela as amostras de vinho. — É melhor não beber muito,
com as leis de recipientes abertos no carro e tudo.
— Não posso acreditar que você acabou de me tirar da vinícola.
— Você me disse que queria foder sem camisinha. Você tem
sorte de não estarmos no banheiro agora.
Seus olhos brilharam. — Muito ansioso?
— Você não tem ideia, porra.
Dirigi o dobro do limite de velocidade para voltar para a
pousada. Lá dentro, a anfitriã tentou puxar conversa sobre alguns
lanches que serviriam mais tarde. Mas a única coisa que eu
comeria era a mulher que praticamente arrastava escada acima
até o nosso quarto.
Assim que a porta foi fechada, fui repreendido. — Você é tão
rude. Aquela simpática senhora estava procurando alguém para
conversar.
Comecei a desabotoar a blusa dela. — Eu sei. É por isso que
cortei essa merda pela raiz.
Ela balançou a cabeça, mas pude ver que ela não estava
realmente chateada. Terminei o último botão e fui para o jeans
dela. — Diga-me como você quer, querida.
— Você sempre me pergunta isso.
— Isso é porque quero ter certeza de que é isso que você deseja.
— E o que você está com vontade?
— Isso é fácil. Você.
Ela riu. — Não mesmo. Acho que é a sua vez. Diga-me o que
você quer. — Josie colocou as palmas das mãos no meu peito e me
fez andar de costas. — Você se senta e pensa sobre isso. E eu vou
me despir.
Eu tentei – realmente tentei. Mas enquanto eu a observava tirar
a roupa, minha mente passou por um milhão de coisas que eu
queria fazer com ela, e não como ela poderia me dar. Quando ela
tirou a calça jeans, pensei em bater naquela bunda linda. Quando
ela chupou a carne de sua boca carnuda, pensei em deslizar meu
pau entre aqueles lábios deliciosos. Mas quando ela desabotoou o
sutiã rendado rosa e seus seios espalharam-se tão perto do meu
rosto, minha mente concentrou-se em um único caminho.
Josie deu um passo para trás e acariciou seus seios. — Então,
você já decidiu o que está com vontade?
Lambi meus lábios. — Pode ser qualquer coisa?
— Qualquer coisa.
— Mal posso esperar para entrar em você sem camisinha, mas
se eu entrar sem liberar primeiro, não vou durar trinta segundos.
— Ok. Então, o que você gostaria de fazer?
— Você está realmente disposta a qualquer coisa?
— Por que não?
Olhei para seus lindos seios naturais. — Então eu quero foder
você e gozar em todo o seu pescoço.
Ela piscou, mas depois que o choque inicial passou, ela sorriu.
— Como você me quer?
Porra, sim. Eu me senti como uma criança com rédea solta na
loja de doces. — De costas, na cama.
Josie subiu e acomodou-se no meio do colchão. Não tirei os
olhos dela enquanto me despia. Quando ela apertou os seios,
minha meia rasgou do meu pé.
— Você rasga muitas roupas — ela riu.
— Você testa minha paciência. — Levantei um joelho até a
cama. — Tem certeza de que está tudo bem com isso?
— Estou animada com isso.
Minha cabeça caiu para trás para um rápido agradecimento ao
homem lá em cima antes de inclinar-me e lamber uma linha em
seu esterno. Então montei em sua caixa torácica e também lambi
minha mão antes de espalhar o lubrificante por todo meu pau.
Josie observou-me esfregar meu eixo para cima e para baixo.
— Gosto quando você faz isso — disse ela. — Tocar-se, quero dizer.
— Oh, sim? Então você me verá fazendo isso com mais
frequência.
Lambi minha mão mais uma vez e bombeei algumas vezes. Eu
queria estar dentro dela da pior maneira, mas queria que a
primeira vez sem uma barreira entre nós fosse boa para ela.
Apertar meu pau entre seus seios provavelmente me faria gozar
com a mesma rapidez. Mas eu iria excitá-la enquanto o meu corpo
se recarregava, para que ambos pudéssemos aproveitar sem nos
sentirmos frenéticos.
Suficientemente lubrificado, respirei fundo, tentando acalmar-
me antes de começar. O meu pau estava rígido e ereto, por isso
tive que inclinar-me sobre ela e ajudá-la a descer para alcançar o
seu decote. Josie ensanduichou-me no meio, segurando quase tão
apertado quanto sua boceta.
Eu empurrei uma vez e amaldiçoei. — Porra. Cada parte de você
parece o paraíso.
Ela apoiou-se nos cotovelos e foi saudada pela cabeça do meu
pau aparecendo entre seus montes de carne.
— Oh, meu Deus — ela ofegou. — Isso é tão gostoso. Continue.
Feliz em obedecer, balancei meus quadris para frente e para
trás. Esta era apenas a prévia do ato principal – conseguir transar
com ela sem camisinha, e ainda assim era melhor do que qualquer
coisa que senti em muito tempo. Os olhos encapuzados de Josie
fixaram-se no meu pau. Ver como ela estava excitada poderia ter
sido melhor do que a parte física do que eu estava fazendo.
Eu não queria machucar sua pele esfregando com muita força
ou por muito tempo, então quando minha liberação começou a vir,
eu não lutei contra isso. Meus olhos caíram para seu pescoço, para
o delicado buraco no centro de sua clavícula que estava me
deixando louco desde a primeira vez que coloquei os olhos nela.
Essa maldita mulher me fez sentir como um homem das cavernas.
Queria que ela submetesse a parte mais vulnerável do seu corpo
para eu disparar a minha carga por todo lado. Eu nunca tive
vontade de conquistar uma mulher assim antes. Isso deveria ter
me assustado pra caralho. Mas no momento nada mais era
importante. Eu não me importava com nada além de decorar seu
pescoço com algumas pérolas.
Rosnei enquanto jorrava esperma quente em sua garganta
cremosa. Meu coração disparou e me senti um pouco tonto. Não
era típico desmaiar depois de uma liberação. Então, novamente,
todo esse fim de semana não era o meu normal. Então, foda-se a
leitura. Eu também poderia me aconchegar. Embora precisasse
limpá-la primeiro.
Josie ainda respirava fundo quando voltei do banheiro com
uma toalha úmida e limpei suavemente seu pescoço. Seu sorriso
era grande e bobo, como se tivesse sido ela quem tivesse acabado
de atirar um pedaço de seu cérebro através de um buraco de
alfinete.
— Eu não tinha ideia de que isso seria tão excitante — disse
ela.
— Essa foi sua primeira vez?
Ela assentiu.
Esqueça o homem das cavernas, eu me senti como um maldito
astronauta plantando a primeira bandeira na lua.
— O que mais você não fez?
— Eu não tenho certeza. Se você tivesse me feito essa pergunta
há pouco, provavelmente não teria pensado em colocá-lo na lista.
Estou pensando que minha vida sexual pode ter sido um pouco
chata. Noah nunca me perguntou como eu queria isso. Geralmente
fazíamos isso do modo missionário. Ele nem gostava quando eu
estava por cima.
— Você gosta disso por cima?
Ela deu um sorriso tímido. — Eu amo isso.
— Bem, então é isso que você vai conseguir. — Joguei a toalha
por cima do ombro e a tirei da cama. — Depois de você montar na
minha cara.
Acordei com um fino raio de sol brilhando em meus olhos.
Aquelas cortinas femininas não eram apenas feias, elas não faziam
merda nenhuma para impedir a entrada de luz. Mesmo assim, não
me mexi, porque Josie e eu éramos um emaranhado de membros
– outra coisa que normalmente não fazia. Eu gostava do meu
espaço quando dormia. Pelo menos com outras mulheres eu
gostava.
A cabeça de Josie estava no meu peito. Pensei que ela estava
dormindo até sentir cílios fazendo cócegas na minha pele.
— Você está acordada? — sussurrei.
Ela inclinou o pescoço para trás para olhar para mim. — Estou.
Meu telefone me acordou. Meu chefe mandou uma mensagem e
não consegui voltar a dormir. Você acabou de acordar?
— Sim. Há quanto tempo você está acordada?
Ela encolheu os ombros. — Talvez uma hora.
— Que horas são?
— Quase dez. Dormimos até tarde. — Josie passou os dedos
nos pelos do meu peito. — Noah depilava o peito.
Eu tinha opiniões sobre homens que faziam isso, mas não foi
isso que me fez cerrar a mandíbula. — Não sei se gosto de ser
comparado ao seu ex.
Ela me olhou nos olhos. — Seu pau tem o dobro do tamanho.
Um sorriso arrogante subiu pelas minhas bochechas. — Talvez
eu goste de comparações, afinal.
Ela riu e depois suspirou.
— É domingo. Tudo bem no trabalho? Por que seu chefe estava
mandando mensagem para você?
— Sim. Ele quer saber quando voltarei. Quando saí, ficaria por
doze semanas – o máximo que você pode tirar de acordo com a Lei
de Licença Médica da Família. Mas eu disse a ele que poderia voltar
mais cedo, se quisesse.
Eu a estudei. — Você está indo?
Ela balançou a cabeça. — Não imediatamente. Vou dizer a ele
que não voltarei mais cedo.
Senti alívio, pelo menos por alguns segundos. — Quando
terminam suas doze semanas?
— Quatro semanas a partir de amanhã. Mas provavelmente
devo voltar mais cedo para me instalar. Tenho certeza de que tudo
o que deixei na geladeira parece um experimento científico agora.
Sempre soube que Laurel Lake não era a casa de Josie. Mas
estava começando a parecer que ela era minha... Limpei o gosto
matinal da garganta. — Vou ajudá-la a terminar a casa para que
você possa sair quando estiver pronta. Talvez você possa me fazer
uma lista do que mais precisa ser feito.
Ela franziu a testa. — O que acontecerá quando eu sair?
Realisticamente? Ela iria voltar para Nova York e esqueceria
tudo sobre mim. Ela se ocuparia com seu trabalho, provavelmente
encontraria outro médico, ou talvez um professor, ou advogado. E
eu voltaria a enterrar-me no trabalho e, eventualmente, a foder
sem sentido, sem compromisso. Embora eu não pudesse imaginar
voltar a isso depois daqui.
Evitei a pergunta que sabia que ela estava fazendo. — Você
conseguirá outro locatário e tentarei ficar atento para garantir que
jornais e fitas VHS apareçam no lixo de vez em quando.
— Eu quis dizer entre nós.
— É meio difícil namorar a mil e quatrocentos quilômetros de
distância. — Assim que disse isso, eu me senti um merda. Mas o
que eu deveria dizer? Que nos revezaríamos nas visitas e
passaríamos inúmeras horas enviando mensagens de texto? Meus
dedos eram grandes demais para o pequeno teclado de um telefone
celular. Uma longa mensagem minha era uma frase, e eu nem era
bom em relacionamentos locais. Além disso, ela acabou de sair de
um noivado em que o cara a decepcionou. Eu não estava disposto
a fazer o mesmo.
Josie desviou o olhar. — Sim, claro. — Ela puxou as cobertas e
saiu da cama. — Estou indo tomar um banho.
— Você quer companhia?
Ela sorriu tristemente. — Talvez outra hora.
Eu balancei a cabeça. Ela obviamente não ficou feliz com a
minha resposta sobre o que aconteceria entre nós quando ela
partisse. Mas Josie merecia algo melhor do que eu, mesmo que
parte de mim não quisesse deixá-la ir.
Fox
— Fox?
Não reconheci o número, mas sabia que era local.
— Quem é?
— É o tenente Druker.
Congelei. Evie não estava em casa quando cheguei esta noite.
— O que aconteceu?
— Eu levei sua garota para a delegacia, filho. Peguei ela por
causa de uma chamada de bebida e desordem.
— Ela está bem?
— Nós a removemos da pista de gelo. Ela tinha bebido demais.
O guarda do rinque disse que ela precisava sair do gelo porque
estava colocando em risco os outros clientes – principalmente
crianças e pais, durante uma sessão de patinação aberta. Ela
tentou derrubá-lo e então começou a fazer saltos perigosos e
outras coisas enquanto estava embriagada. Caiu pelo menos uma
vez enquanto tentávamos agarrá-la. Eu imagino que ela estará
dolorida amanhã e provavelmente terá uma forte dor de cabeça,
mas ela deve ficar bem.
Passei a mão pelo meu cabelo. Eu tinha acabado de me sentar
para colocar gelo no meu quadril machucado depois de quatro dias
de jogos na estrada. Ir até a delegacia e lidar com uma Evie bêbada
não era o que eu tinha vontade de fazer. Suspirei. — Ela vai ser
liberada?
— Ela terá que comparecer ao tribunal na próxima semana,
mas você pode vir buscá-la quando estiver pronto.
— Obrigado, tenente. Eu estarei aí.
Foram necessárias as duas mãos para me levantar do sofá, eu
estava tão machucado pelo jogo da noite passada. Ultimamente,
estava começando a entender por que o jogador médio se
aposentava antes dos trinta anos neste esporte. Levei meu tempo
dirigindo até a delegacia e manquei até a recepção.
Joe Redmond estava por trás disso. Tínhamos cursado o ensino
médio juntos.
— Ei, Cassidy. — Ele estendeu a mão. — Bom ver você. Perda
difícil na outra noite.
Considerando que meu time havia perdido seis dos últimos sete
jogos, eu não tinha certeza de qual noite ele estava falando. Mas
isso não importava muito. Balancei a cabeça. — Sim.
— Acho que eles deveriam ter expulsado Hartman por aquela
porcaria que ele fez.
— Eu também. Se tivessem, meu quadril não estaria gritando
por causa da luta que aconteceu depois que ele saiu da caixa. —
Levantei o queixo em direção à porta que sabia que levava às celas.
— Estou aqui para pegar Evie Dwyer.
— Dê-me um minuto. Vou pegá-la do tanque de bêbados. — Ele
começou a andar, mas parou. — Devo avisar você, ela vomitou em
cima de si mesma. Talvez você queira jogar um cobertor no carro.
É difícil tirar esse cheiro depois que ele chega aos assentos.
— Ótimo — eu murmurei.
Alguns minutos depois, Evie saiu dos fundos. Manchas de
rímel marcavam suas bochechas e sua camisa ainda estava úmida
com o que presumi ser vômito. Ela olhou para mim e seus grandes
olhos castanhos encheram-se de lágrimas. — Desculpe.
Eu a ignorei e falei com Joe. — Ela precisa preencher a
papelada ou algo assim?
— Não. Ela está pronta para ir. Ela tem a citação com a data
do comparecimento ao tribunal dobrada na bolsa.
— Obrigado, Joe.
— Boa sorte.
Eu não tinha certeza se ele estava se referindo ao resto da
temporada ou a Evie, mas eu poderia usar toda a ajuda que
conseguisse com ambos.
Lá fora, abri a porta da caminhonete e verifiquei se Evie estava
lá dentro antes de fechá-la. Eu ainda não tinha dito uma palavra
a ela. Coloquei minha chave na ignição, mas parei de girá-la. —
Que porra é essa, Evie?
Ela começou a chorar. Normalmente, eu me preocupava com
mulheres e lágrimas, mas estava sem simpatia ultimamente.
— Desculpe. Não sei por que faço o que faço.
Isso era uma desculpa e me irritou ainda mais. — Bem, talvez
eu possa dar-lhe uma pista sobre por que diabos você está agindo
dessa maneira. Porque você saiu da reabilitação depois de cinco
dias, quando eles queriam que você ficasse por trinta.
Seis meses atrás, depois que voltei para casa e encontrei Evie
nadando no lago e vomitando nos canteiros de flores, ela
concordou em ir para a reabilitação. Nenhuma das instalações
decentes tinha camas disponíveis, então ela teve que esperar dois
dias para fazer o check-in, e eu estaria fora para um jogo na tarde
em que ela deveria aparecer. Ela prometeu ir, mas nunca
apareceu. Em vez disso, voltei para casa e encontrei uma Evie
sóbria e uma casa limpa – uma combinação que não via há meses.
Acho que nem percebi o quanto as coisas estavam ruins até aquele
dia, quando voltar para casa e ver o que deveria parecer normal
nem era mais familiar. Desde que ela se mudou, ela entrou em um
ciclo vicioso de compulsão alimentar por três ou quatro dias
enquanto eu estava viajando, e depois dormindo por um ou dois
dias quando eu chegava em casa. Então ou ela estava uma
bagunça ou caía na cama.
Ela ficou sóbria por duas semanas naquele período, e eu
realmente vi de relance a mulher que conheci na pista de gelo
quase um ano antes. Mas então ela cometeu um deslize e as coisas
voltaram ao mesmo velho show de merda bem rápido. Depois de
mais um mês de farra, sentei-a e dei-lhe uma escolha: eu ou a
tequila. No dia seguinte, levei-a para a reabilitação. Mas depois de
uma desintoxicação de cinco dias, ela assinou sua saída contra o
conselho do médico enquanto eu estava na estrada novamente. Ela
disse que sentia que poderia fazer o resto sozinha. Ela odiava estar
lá, porque todas as mulheres mais velhas a lembravam de sua
mãe. Não concordei com a decisão, mas ela ficou boa por quase
dois meses depois disso. Até que ela não estava.
Eu balancei minha cabeça. — Não posso mais viver assim, Evie.
— O que você está dizendo?
Eu queria acabar com as coisas. Tivemos talvez três bons
meses no total desde que ela veio morar comigo. Mas eu estava
com medo do que isso poderia fazer com ela. Ela não tinha
ninguém em sua vida para cuidar dela, e eu não queria ser a causa
de uma crise, porque me importava com ela. Então me senti preso.
Olhei para ela. O medo era palpável em seus olhos.
— Eu farei qualquer coisa. Leve-me para a reabilitação agora
mesmo. Apenas me dê outra chance. Não posso perder você, Fox.
— Você precisa querer melhorar para você para que funcione.
Não para mim.
— Eu quero melhorar para mim. Para nós.
Eu estava cauteloso, mas o que eu iria fazer? Deixá-la de volta
na casa da mãe seria um desastre, e levá-la para casa novamente,
mesmo que ela permanecesse limpa por alguns dias, seria apenas
fazer a mesma coisa repetidamente e esperar um resultado
diferente. Então, realmente, que escolha eu tinha?
— Vamos para casa. Você pode tomar um banho enquanto eu
ligo para ver se conseguimos uma vaga para você na reabilitação
novamente.
— Deus, senti sua falta. — Evie jogou os braços em volta do
meu pescoço. Havia uma conselheira esperando do lado de fora da
sala, então dei um beijo rápido nela e me afastei.
— Você parece bem — eu disse.
Ela sorriu. — Eu me sinto muito bem.
Evie estava no Centro de Recuperação South Maple há
dezenove dias. Eu visitava sempre que estava em casa e tinha
permissão, mas hoje era mais do que apenas uma visita. Era uma
sessão de aconselhamento com um ente querido. Não era realmente
minha preferência, mas tive que mostrar apoio. Especialmente
porque ela convidou a mãe para vir na semana passada e ela não
apareceu. Não foi um choque – pelo menos não para mim.
Toque. Toque.
A mulher que se apresentou como Eleanor entrou e sorriu. —
Vocês dois estão prontos para começar?
Evie respirou fundo e assentiu.
— Sr. Cassidy, por que você não vai para o outro lado da mesa
para que vocês dois fiquem sentados um de frente para o outro, e
eu me sento aqui neste lado?
— É Fox, por favor. — Puxei a cadeira de Evie antes de sentar-
me em frente a ela. Assim que minha bunda bateu no assento, ela
estendeu a mão por cima da mesa e pegou minha mão.
Claramente, ela estava nervosa.
— Então... — Eleanor começou. — A terapia de grupo consiste
em abrir as linhas de comunicação e começar a reconstruir
relacionamentos. O objetivo é compartilhar as preocupações um
do outro, ao mesmo tempo que tentamos evitar conflitos e
confrontos. — Ela olhou para mim. — O que você acha disso, Fox?
Dei de ombros. — Bom.
— Ótimo. Evie e eu temos trabalhado juntas em sessões
individuais nas últimas semanas e ela descobriu algumas coisas
sobre si mesma que gostaria de compartilhar com você. Então por
que não começamos por aí?
— Ok.
Eleanor e eu nos viramos para dar atenção a Evie. Ela mordeu
o lábio inferior antes de apertar minha mão e respirar fundo
novamente. — Tomei minha primeira bebida quando tinha nove
anos.
Meu queixo caiu aberto. Custava muito para me chocar, mas
ela me surpreendeu.
— Eu sei. — Ela sorriu tristemente. — É muita coisa para
entender – até mesmo para mim, olhando para trás agora, e vivi
isso. Mas tenho bebido desde então.
— Eu não entendo. Você não bebia quando nos conhecemos.
— Não, eu simplesmente não deixava você ver. Eu não deixo a
maioria das pessoas ver isso. Eu nunca fiz isso até recentemente.
— Passamos semanas inteiras juntos fora da temporada,
naquelas vezes em que viajei com você para as competições.
— Sim. E eu sempre tinha uma garrafa na bolsa, escondida.
Eu bebia no banheiro quando precisava. É por isso que sempre
tinha um doce na boca.
— Você me disse que estava com baixo nível de açúcar no
sangue.
Evie balançou a cabeça e olhou para baixo.
— Nunca foi fácil conversar com alguém sobre por que fazia
isso, mas acho que você pode entender as pressões de ser um
atleta tanto quanto eu. Quando eu tinha sete anos, o rinque
tornou-se minha segunda casa. No começo, eu adorava. As
pessoas ficavam de lado e assistiam-me praticar, e eu me sentia
como se estivesse no topo do mundo. Eu tinha nove anos quando
participei da minha primeira grande competição. Eu era uma
estrela no rinque local, praticava vinte horas de patinação e dez
horas de dança todas as semanas. — Ela fez uma pausa e seus
olhos ficaram fora de foco, como se ela estivesse visualizando o que
viria a seguir. — Lembro de entrar naquela primeira competição e
pensar que era a melhor e que iria vencer. — Ela balançou a
cabeça. — Eu nem subi ao pódio. Foi devastador, uma verdadeira
revelação. Naquela noite, tive dificuldade para dormir, sentindo
que todas as minhas esperanças e sonhos de um dia chegar às
Olimpíadas eram uma piada. Eu vi minha mãe ficar chateada ou
irritada com as coisas durante anos. Sua maneira de lidar era
tomar algumas doses. Então, na noite seguinte, quando eu ainda
estava me sentindo péssima, esperei até que ela desmaiasse e
tomei alguns goles de sua garrafa. Isso me fez esquecer que havia
perdido a competição por tempo suficiente para dormir. No início,
só bebia quando perdia. Mas eventualmente eu bebia para me
consolar depois de um treino ruim, um cara me dispensando, ou...
— Ela encolheu os ombros. — Qualquer coisa, mesmo.
— Meu Deus, Evie. Eu não tinha a mínima ideia. Achei que isso
era algo novo, que você estava lutando porque não entrou para a
equipe olímpica.
— Bem, eu estava, mas não é novidade.
— Sua mãe sabe?
Ela encolheu os ombros. — Se ela sabe, ela nunca disse nada.
Mas meu pai sabe. Ele conseguia identificar um bêbado a um
quilômetro de distância, depois de viver com minha mãe por doze
anos. Ele tentou ajudar anos atrás, mas eu nunca admitiria a
verdade. Foi por isso que cortei a nossa relação. Eu não queria
lidar com isso.
— Ele não parou de falar com você quando se casou novamente
e começou uma nova família, como você disse?
Eve olhou para baixo. — Não.
Leonor interrompeu. — Como Evie compartilhar essa revelação
faz você se sentir, Fox?
Balancei a cabeça, ainda em estado de choque. — Não sei.
Estúpido por não ver. É triste que ela esteja passando por isso
sozinha há tanto tempo. Raiva – da mãe por não ver que sua filha
de nove anos estava bebendo. — Olhei para cima e encontrei os
olhos de Evie. — Com medo de que seja muito pior do que eu
pensava e que você não consiga ficar sóbria...
Lágrimas escorreram pelo rosto de Evie. — Desculpe. Desculpe-
me, sou uma bagunça.
Durante a hora seguinte, Evie falou muito. Algumas coisas
realmente doeram, como quando ela admitiu que deixou de se
sentir inadequada na patinação e passou a sentir que não era o
suficiente para mim. Não era verdade, mas enquanto ela falava
sobre sua falta de autoconfiança, percebi que ela sempre buscava
segurança em mim, e eu considerava isso uma estupidez. Não
entendi que ela realmente tivesse baixa autoconfiança e se sentisse
um fracasso e precisasse mais de mim. E eu também me senti um
fracasso por não conseguir ver que a mulher com quem morava –
a mulher com quem planejava me casar – era alcoólatra.
Quando finalmente chegamos a uma pausa nas confissões de
Evie, Eleanor interveio.
— Acho que isso foi muito para um dia – tanto para Evie dizer
quanto para você, Fox, ouvir. Tenho certeza que você precisa de
algum tempo para absorver tudo.
Eu balancei a cabeça. — Sim, definitivamente.
— Você tem perguntas para Evie? Ou para mim antes de
encerrarmos as coisas por hoje?
— Ela está conseguindo tudo o que precisa aqui? Parece idiota
dizer isso agora, mas pensei que ela estava apenas começando por
causa do vício em álcool. Parece que ela tem muitas outras coisas
que precisa resolver.
Leonor sorriu. — Ela tem uma equipe inteira. Sou psicóloga,
então converso mais com Evie, mas ela também tem um
conselheiro antidependência, um médico de atenção primária e um
psiquiatra em sua equipe. Claro, também existem vários
enfermeiros e pessoal de apoio. Cada um tem uma função
diferente, mas trabalhamos juntos.
— Qual é a diferença entre o que um psiquiatra e um psicólogo
fazem?
— Esta é uma boa pergunta. As pessoas muitas vezes
confundem os papéis, mas o psiquiatra trata principalmente
prescrevendo medicamentos e um psicólogo trata com terapia
comportamental e de fala.
Senti minhas sobrancelhas se apertarem. Olhei para Evie. —
Então você está tomando remédio?
Ela assentiu. — A Dra. Cudahy diagnosticou-me com
depressão clínica. Ela prescreveu antidepressivos.
— Então você chega por causa de um vício e a resposta é
prescrever comprimidos?
Leonor interrompeu. — Eu entendo como isso pode parecer
contraproducente. Mas muitas vezes a razão pela qual as pessoas
bebem é porque estão tentando se automedicar para acalmar um
problema de saúde mental latente que não foi tratado. Um dos
nossos objetivos aqui é chegar à causa raiz do consumo de álcool
e tratá-la para que o paciente não precise se automedicar de forma
abusiva.
Isso me pareceu trocar um vício por outro. Ou pior, o
tratamento para o problema de saúde mental subjacente falhava e
o paciente estava agora dependente com dois vícios. Mas eu não
sabia muito sobre essa merda. Então balancei a cabeça. — Tudo
bem. Acho que você sabe o que está fazendo.
Josie
— Olá, querida. O que está acontecendo?
Coloquei meu celular entre o ombro e a orelha e inclinei-me
para frente para uma última pincelada. — Olá, Opal. Não muito.
Apenas pintando o interior dos armários da cozinha. Nada muito
emocionante.
— Bem, ótimo. Então não há razão para você não poder se
juntar a nós. Vou me encontrar com algumas garotas para jantar
esta noite. Elsie Wren está na cidade. Ela mudou-se para a Flórida
para ficar perto da filha, mas ela aparece uma ou duas vezes por
ano e tentamos nos encontrar. Ela morou algumas casas abaixo
da do seu pai enquanto crescia. Eles eram bons amigos. Achei que
você gostaria de conhecê-la.
Fox havia mandado uma mensagem há pouco, perguntando se
eu tinha planos para esta noite, mas ainda não respondi. As coisas
estavam erradas desde a nossa conversa no domingo de manhã,
mas nenhum de nós havia falado sobre o motivo. Eu senti como se
algo estivesse faltando nos últimos quatro dias, não falando com
ele ou vendo-o. Isso me fez perceber o quão profundo eu já estava,
e com medo de cair mais quando não havia futuro para nós. Se
quatro dias pareciam uma vida inteira, como seriam quatro meses
sem vê-lo?
Então era bom que Opal tivesse ligado. Ela me daria a distração
que precisava. — Eu adoraria me juntar a vocês. Obrigada por
pensar em mim.
— Ótimo. Sete horas no Laurel Lake Inn. Tenho que correr
antes que o chefe volte e encontre-me ao telefone novamente. Ele
ficou particularmente mal-humorado depois de me ouvir falar com
minha mãe sobre a menopausa esta manhã.
Eu ri. — Vejo você então.
Depois de desligar, terminei de pintar e lavei os pincéis. Então
respondi rapidamente à Fox.
Josie: Desculpe, tenho planos para esta noite.
Uma resposta soou antes que eu pudesse desligar meu
telefone.
Fox: Você está chateada comigo?
Josie: Por que eu estaria chateada?
Fox: Porque eu estraguei tudo no domingo.
Suspirei.
Josie: Você estava apenas sendo honesto. É o que é.
Fox: Posso passar mais tarde quando você chegar em casa?
Eu precisava me proteger, mesmo que não quisesse.
Josie: Acho que estarei muito cansada. Talvez outra hora.
Sentindo-me triste, joguei meu celular sobre a mesa e decidi
sair para tomar um pouco de ar fresco. O lago sempre me trazia
uma sensação de paz e eu queria muito procurar Margarida
novamente. Eu verifiquei todos os dias desde domingo e não havia
sinal dela. Esta manhã, um grupo de patos passou nadando e
pensei que poderia ser o grupo ao qual ela se juntou, mas não tive
certeza. Eu só conhecia as marcas de Margarida.
Depois de um tempo, sem nenhum sinal dela hoje, desisti e
entrei para preparar-me para o jantar.
Quando eu estava prestes a sair, meu celular tocou. Meu pulso
acelerou, pensando que poderia ser Fox. Mas não era. O nome de
Noah apareceu na tela. Ignorei, mas depois de um minuto ele
começou a tocar novamente. Então deslizei para atender no viva-
voz enquanto ligava o carro.
— Olá?
— Ah, ei. Eu esperava ir para o correio de voz novamente. Liguei
há alguns minutos, mas você não atendeu.
— Algo está errado?
— Não. Não deixei mensagem na primeira vez porque achei que
isso me daria uma desculpa para ligar de volta. Mas então percebi
que isso era estúpido e que você provavelmente nunca responderia
quando visse meu nome, então liguei de novo para deixar uma
mensagem de voz. — Ele fez uma pausa. — É bom ouvir sua voz,
Josie.
— O que você quer, Noah?
— Posso perguntar como você está primeiro? Suponho que,
depois de dizer o motivo pelo qual liguei, você vai desligar o telefone
às pressas.
Ele estava certo. Eu me arrependi de ter pegado o telefone e ter
que falar tanto com ele. — Estou bem. E aí?
Noah suspirou. — Recebi um lembrete por e-mail sobre as
férias que reservamos para o próximo mês – para Aruba.
Eu tinha esquecido completamente daquela viagem. — E daí?
— Não é reembolsável.
Além de estar feliz por ele ter feito o depósito, eu não tinha
certeza do que ele esperava de mim. — Ok...
— Eu esperava que talvez ainda pudéssemos ir. Como amigos.
Isso nos daria uma chance de conversar sobre as coisas. Temos
uma suíte com sala, então eu poderia dormir no sofá, se você
quisesse.
Ele está falando sério? — Não há nada para conversar, Noah.
— Nunca tivemos uma conversa civilizada sobre o que
aconteceu.
— Você me traiu. Eu peguei você com seu pau na boca de uma
mulher. Não há mais nada para discutir.
— Eu cometi um erro. Um grande. Estou com saudade, Jos.
Não podemos conversar sobre isso? Farei o que você quiser para
que me perdoe.
— Não se trata de perdão, Noah. É uma questão de confiança.
— Podemos reconstruí-la.
— Não. Não podemos. A confiança é frágil, como um espelho.
Uma vez quebrado, está quebrado. Mesmo se você juntar todas as
peças novamente, você sempre verá as rachaduras. Nunca é a
mesma coisa. Além disso, aprendi muito sobre mim mesma nos
últimos meses. E não acho que combinamos tão bem quanto me
fiz acreditar.
— Isso não é verdade. Éramos perfeitos juntos.
Fazia sentido que Noah pensasse isso. Eu nunca dei a ele
qualquer indicação de que não estava feliz antes daquela noite no
estacionamento do hospital. E, sinceramente, pensei que estava
feliz também. Mas estar em terapia e passar um tempo com um
homem que me perguntava o que eu queria me fez perceber que
estava vendendo-me por pouco. De uma forma estranha, fiquei
grata por Noah ter trapaceado. Caso contrário, poderia ter me
conformado.
— Tenho que correr. Você deveria usar a viagem. Vá sozinho e
reflita um pouco.
— Não vou sem você. Eu ficaria infeliz. Você pode ir sozinha, se
quiser. Ainda tenho seu passaporte. Você deixou aqui quando eu
estava reservando tudo.
Eu balancei minha cabeça. — Eu também não vou, Noah. Mas
preciso do meu passaporte.
— Vou enviar para você, com o itinerário da viagem, caso mude
de ideia.
— Eu não estou em casa.
— Eu sei. Você ainda compartilha sua localização comigo no
seu iPhone. Você não sabe quantas vezes senti-me tentado a entrar
no carro e dirigir até o número quarenta e seis na Rosewood Lane
para falar com você.
Ah, meu Deus. Obviamente dei a ele esse acesso em tempos
melhores. Agora me senti quase violada. Eu sabia o que estaria
fazendo no minuto em que desligasse. — Eu preciso correr, Noah.
— Posso ligar de novo?
— Desculpe. Prefiro que você não faça isso.
Não era de surpreender que Noah desligou sem se despedir
depois disso. Ele nunca foi tolerante quando não conseguia o que
queria. Provavelmente era apenas uma questão de tempo até que
ele começasse a vomitar com raiva, então foi o melhor. Além disso,
eu precisava pegar a estrada ou me atrasaria. Embora fosse
preciso esperar mais um ou dois minutos, até que eu descobrisse
como impedir que Noah visse minha localização.
— Aí está ela! — Opal me envolveu em um abraço assim que a
anfitriã me levou até a mesa. Faltava apenas um minuto para as
sete, mas fui a última a chegar. — Deixe-me fazer as
apresentações. Você já conheceu Bettina na festa na casa de sua
irmã gêmea Bernadette. E Frannie aqui trabalha nos correios,
então você a conhece.
Acenei com a cabeça para as duas. — Oi. É bom ver vocês.
Opal apontou para a última pessoa na mesa – o único rosto que
eu não reconheci. — E essa aqui é Elsie Wren.
A mulher se levantou e estendeu a mão. — Prazer em conhecê-
la. Seu pai era um querido amigo meu. Fiquei muito triste ao saber
do falecimento dele.
— Obrigada.
Assim que nos sentamos, o garçom trouxe uma garrafa de
vinho. Opal olhou para mim. — Pedimos um merlot. Está tudo bem
para você? Se não, eles têm outros no copo.
— Merlot está ótimo. Obrigada.
Opal se inclinou e sussurrou: — Ouvi dizer que você tomou
vinho neste fim de semana?
Fiquei muito chocada com o fato de Fox ter contado que
viajamos juntos. Quando viu meu rosto, ela gargalhou.
— Não, o grande idiota não me contou. Porter começou a
namorar uma professora recentemente. Rita – aquela do Rita
Beanery e irmã mais nova da Bettina aqui – mora ao lado da
mulher. Porter contou à professora que contou a Rita, que contou
a Bernadette, que contou a Bettina, que me contou. — Ela
balançou a cabeça. — Não posso acreditar que Porter escondeu
isso de mim. Mas de qualquer forma... — Ela deu um tapinha na
minha mão. — Estou feliz por você. Fox é um pé no saco, mas é
um homem bom e leal. Eu adoro o idiota mal-humorado. Mas não
diga isso a ele.
Sorri. — Eu não vou.
Bettina pegou um pãozinho do meio da mesa e acenou para
mim. — Seu pai alguma vez parou de abaixar a calça? Esqueci
tudo sobre as travessuras dele e de Tommy Miller até Elsie me
lembrar.
— Parou... de abaixar a calça? — falei.
Elsie riu. — Quando eles tinham cerca de dez anos, seu pai e
Tommy fizeram uma competição de se enroscarem um no outro
quando o outro menos esperava. Tommy batia na porta de Henry
e Henry respondia pressionando a bunda contra a porta. Ou Henry
estaria andando de bicicleta atrás de Tommy, e Tommy tiraria o
short e mostraria onde o sol não brilha. Isso durou anos.
— Eu definitivamente nunca ouvi falar de nenhum
enroscamento antes.
— Uma vez, metade das meninas da nossa série viu o traseiro
do seu pai. Henry estava na banda marcial. Quando chovia, eles
ensaiavam no auditório do palco. Tommy não tocava nenhum
instrumento, mas aqueles garotos estavam conectados pela
cintura. Então Tommy fazia a iluminação do palco e trabalhava
nas cortinas e outras coisas. Uma tarde, Henry achou que seria
engraçado se ele estivesse curvado no palco quando Tommy
abrisse as cortinas para se preparar para o ensaio. Ele não previra
que o time de futebol feminino entraria no auditório logo antes de
Tommy fechar as cortinas. Com o treinador delas.
Todas riram e isso criou o clima para a hora seguinte. Elsie
tinha um milhão de histórias engraçadas para compartilhar, mas
todas as outras contaram pequenos pedaços ao longo do caminho.
Isso me deixou com inveja de como eles cresceram. Claro, as
pessoas se metiam na vida umas das outras, mas a vantagem disso
era que a comunidade parecia uma grande família. Era o oposto
de como fui criada – frequentando uma escola particular onde as
pessoas estavam muito ocupadas com aulas de violoncelo e
competições de esgrima para se conhecerem. Minha casa estéril,
onde apenas a babá morava, não tinha o calor que as pessoas de
Laurel Lake exalavam ao falar sobre sua infância. Isso me fez
questionar como eu gostaria de criar meus próprios filhos algum
dia, algo que nunca havia pensado muito.
Estávamos pedindo a sobremesa quando Opal me deu uma
cotovelada. Ela ergueu o queixo em direção ao estande da anfitriã.
— Olha o que o gato trouxe. E ainda não é terça-feira...
Olhei para o outro lado da sala e meu coração disparou. Todos
os olhos em nossa mesa juntaram-se a mim para olhar para o
homem conversando com a recepcionista.
Fox olhou para cima, provavelmente sentindo dez olhos
queimando-o. Ele travou olhares comigo e sorriu. Mas os cantos
de seus lábios caíram rapidamente quando ele observou as outras
pessoas na minha mesa. Ele balançou a cabeça e fechou os olhos.
— É melhor você não tentar fingir que não nos vê! — Opal gritou
do outro lado do restaurante.
Por um segundo, pensei que Fox poderia fugir. Mas depois que
terminou de falar com a anfitriã, ele se aproximou. A expressão em
seu rosto era algo que eu esperaria quando um homem caminhava
para ocupar seu lugar diante de um pelotão de fuzilamento. Ele
não parecia emocionado.
— O que você está fazendo aqui? — Opal perguntou. — A última
vez que vi, é quinta-feira. Lombo de porco é a sua refeição de terça-
feira.
Os olhos de Fox deslizaram para mim. — Vim buscar um
pedaço de cheesecake, já que não posso assar um, de jeito
nenhum.
— Você não come doces.
Sorri, emocionada por ele ter se lembrado do que contei a ele
sobre meu pai usar seu cheesecake caseiro como oferta de paz. Eu
mexi meus dedos. — Oi.
Compartilhamos um sorriso sem palavras e, um minuto depois,
a anfitriã aproximou-se com um saco de papel pardo.
— Aqui está, Fox.
— Obrigado, Syl.
Fox não parecia saber como se comportar na frente do grupo
com quem eu estava sentada. Ele estava estranhamente
desajeitado, o que achei cativante. Ele acenou com a cabeça em
direção à porta. — Posso falar com você por um minuto?
— Claro. — Coloquei meu guardanapo sobre a mesa e olhei
para quatro mulheres radiantes. — Com licença. Eu volto já.
Fox e eu entramos no saguão vazio. Assim que saímos de vista,
apontei meus olhos para o saco em sua mão. — Desejo?
Ele enfiou a mão vazia no bolso e olhou para baixo. — Eu
esperava levar isso quando você chegasse em casa mais tarde, se
não for tarde demais. Eu devo desculpas a você.
Eu não queria nada mais do que passar algum tempo com ele.
Alguns dias pareceram uma eternidade. Mas também reconheci
que uma solução rápida agora só tornaria mais difícil acabar com
o vício a longo prazo.
Sorri tristemente. — Fox, você não tem nada do que se
desculpar. Você não fez nada de errado. Você deixou claro desde a
primeira vez que nos conhecemos que não estava procurando mais
do que tínhamos. E, honestamente, também era a última coisa que
eu procurava.
Os olhos de Fox fixaram-se nos meus. — Às vezes, o que você
procura chega quando você não está olhando.
Foi como se alguém tivesse colocado uma bomba de bicicleta
no meu coração vazio e bombeado de volta. A esperança floresceu
dentro do meu peito. Embora ainda houvesse medo ali, muito
medo, e eu precisava que o que ele queria dizer fosse explicado. —
O que você está dizendo?
Fox pegou minha mão e levou-a aos lábios para um beijo. —
Mande-me uma mensagem quando você chegar. Vamos conversar
sem audiência.
Eu não pensei que tivéssemos uma, mas Fox ergueu o queixo,
fazendo-me virar. Todas as minhas quatro companheiras de jantar
estavam fora de suas cadeiras, inclinando-se para um lado da
mesa para espiar o saguão. Uma cabeça em cima da outra,
pareciam um totem. Ao nos ver virar e pegá-las, todas correram de
volta para seus lugares. Eu não pude deixar de rir.
— Eu não devo demorar muito mais. Já acabamos de jantar.
Fox assentiu. — Dirija em segurança.
Fox
Eu estava sentado na varanda da frente de Josie quando ela
entrou na garagem.
Quase uma hora se passou desde que voltei do Laurel Lake Inn,
e fiquei impaciente sentado em casa. Eu também queria ter certeza
de que ela não mudaria de ideia e me dispensaria.
Fiquei de pé enquanto ela saía do carro e levantei a garrafa de
vinho em minha mão. — Trouxe algo para acompanhar o
cheesecake.
Ela sorriu, e o humor miserável em que estive nos últimos dias
foi esquecido. Quando eu não estava perto dela, parecia que todos
os dias eram cinzentos e nublados. Ela fazia o céu azul e o sol
brilhar, e não queria mais pensar no que isso significava. Eu só
queria aproveitar o calor.
Josie abriu a porta e jogou as chaves no balcão enquanto eu a
seguia. Todos os armários estavam abertos e a cozinha cheirava a
tinta.
— Você faz isso sozinha?
Ela assentiu. — A madeira estava toda lascada por dentro e
havia manchas nas prateleiras.
Olhei ao redor. — Isso parece bom. O lugar já percorreu um
longo caminho. Seu piso deve chegar na próxima semana.
— Ah, ótimo. Obrigada.
O vinho e o cheesecake ainda estavam em minhas mãos. Josie
apontou os olhos para o saco. — Eu pulei a sobremesa no
restaurante para economizar espaço para isso. Você vai
compartilhar? Porque parece que você pode não querer.
— Pegue dois garfos, espertinha.
Abri o vinho enquanto ela pegava os copos e tirava os sapatos.
Eu disse a ela que trouxe vinho para acompanhar o cheesecake,
mas precisava dele para acalmar meus nervos. Raramente bebia
mais do que uma taça de vinho ou cerveja, mas esta noite poderia
abrir uma exceção. Era hora de confessar a ela alguma merda que
eu não falava há muito tempo.
Josie colocou a sobremesa entre nós e colocou uma colherada
entre seus lábios sensuais. Quando ela fechou os olhos para
saborear, tive que evocar uma foto da minha avó para me
controlar.
— Mmm... experimente — disse ela. — É delicioso.
— Eu vou. Em um minuto. — Tomei um longo gole da minha
taça de vinho. — Escute, Jos. Eu me diverti muito neste fim de
semana. Não tive a intenção de estragar tudo com o que disse
sobre o nosso futuro.
Josie largou o garfo. — Podemos ao menos ter um? Fiquei
chateada com você por não considerar que era possível. Mas,
realisticamente, como seria isso para nós? Eu sei que você não
deseja deixar Laurel Lake.
— Esse não é o problema. Poderíamos descobrir essa merda.
— Não é?
Eu balancei minha cabeça.
— Então o que é?
Eu respirei fundo. A vulnerabilidade não era fácil para mim.
Josie devia ter percebido isso.
Ela estendeu a mão por cima da mesa e pegou minha mão. —
Fale comigo. O que é?
Minha outra mão apertou a taça de vinho. Tive que fazer um
esforço consciente para relaxar ou estaria indo para o pronto-
socorro para levar pontos na palma da mão. Mas reprimi muita
raiva e culpa. Em vez disso, terminei o vinho e recarreguei.
Josie apertou minha mão. — Seja o que for, tenho certeza de
que não é tão ruim quanto você pensa.
Eu olhei nos olhos dela. — Perdi duas pessoas que amava.
— Seu irmão e sua noiva?
Eu balancei a cabeça.
— Eu me afastei das pessoas depois que meu pai morreu —
disse ela. — Entendo que é assustador chegar perto depois de
perder entes queridos.
Engoli. — É mais do que isso.
Ela balançou a cabeça. — Então o que é?
— Ambos foram minha culpa. Se eu tivesse sido um irmão
melhor, um namorado melhor...
Josie tocou o peito e seus olhos encheram-se de lágrimas. —
Não. Você não pode fazer isso, Fox. Você não pode carregar a
responsabilidade pela morte de alguém. Acredite em mim, fiz isso
e acabei em uma situação muito ruim. Você sabe quantas vezes eu
me castiguei? Por que não sou uma cientista melhor? Por que não
verifiquei reações negativas contra vacinas antigas? A única coisa
que aprendi com a terapia é que a culpa pode detê-lo ou ensinar-
lhe uma lição. É uma escolha que só você pode fazer. Não é
saudável carregá-la com você. A culpa é como alimento para uma
tempestade. Quanto mais você a alimenta, mais forte e destrutiva
ela se torna. Por favor, não deixe que isso o impeça. Não deixe que
isso o impeça de ser feliz. Mesmo que isso não seja comigo, Fox.
— Você é a primeira coisa que me faz feliz em muito tempo.
Lágrimas derramaram e percorreram o rosto de Josie. Eu as
limpei. Não tinha certeza se era ver Josie chateada ou contar a ela
por que eu havia me desligado, mas parecia que eu tinha feito um
buraco no peito e dobrado as costelas para trás, deixando meu
coração batendo sob uma enorme ferida aberta.
Josie levantou-se da cadeira e sentou-se no meu colo. Ela
segurou meu rosto entre as mãos. — Arrisque-se. Tenha uma
chance comigo.
Balancei minha cabeça. — Não mereço outra chance. Eu não
mereço você.
— Ah, Fox. Não diga isso. Você é um homem lindo, tanto por
dentro quanto por fora. Você me faz feliz. Eu quero fazer o mesmo
por você. Você disse que gosta do simples. Bem, é tão simples
quanto isso: permita-me. E veremos se podemos trabalhar.
Engoli e senti o gosto do sal. Merecedor ou não, essa mulher
era tudo que eu queria. — Não sei como será amanhã, Jos.
— Quem sabe? Pela primeira vez na vida, quero fazer o que
parece certo, o que quero – não o que devo fazer ou o que poderia
agradar a outra pessoa. Laurel Lake me deu essa clareza. Você me
deu essa clareza. Não tenho ideia de como será o futuro, mas
parece que vale a pena arriscar e descobrir.
Fechei os olhos e balancei a cabeça. Quando os abri, a culpa
não desapareceu, mas pareceu um pouco mais leve. Eu também
já tinha conversado o suficiente por uma noite. Com a minha boca,
claro. Bem, a menos que minha boca estivesse nessa mulher. —
Você pode me perdoar por ser um idiota?
— Claro. Já que você é um idiota na maior parte do tempo.
Embalando Josie em meus braços, eu me levantei. Ela gritou,
mas o sorriso estava de volta em seu rosto.
— O que você está fazendo?
— Vou terminar minhas desculpas... dentro de você.
Josie
O homem sabia como se desculpar, isso era certo.
Fox deslizou pelo meu corpo, colocando minhas pernas sobre
seus ombros. Suas mãos deslizaram sob minha bunda e ele me
levantou enquanto abaixava a cabeça. Ele não começou com uma
vibração suave ou provocação, ele mergulhou de cara.
Oh, Deus.
Ele chupou e lambeu, a barba em suas bochechas e queixo
raspando contra minha carne sensível excitando-me mais do que
eu jamais pensei que algo assim faria. Ele alternou entre golpes
longos com a língua achatada e perfurando-me. Não era nada
como eu já havia sentido antes. Homens já fizeram sexo oral em
mim..., mas isso estava me consumindo. Normalmente eu achava
o termo meio desagradável, mas claramente não tinha entendido
como ele diferia do velho sexo oral até agora.
Minhas costas arquearam da cama. Fox estendeu a mão e
segurou-me. Eu já estava no limite e mal tínhamos começado. Sua
língua lambeu minha excitação enquanto meus dedos se
enroscavam em seu cabelo grosso. Quando ele chupou meu clitóris
com força, eu não consegui controlar o quão rudemente puxei os
fios.
— Fox! — Minha respiração tremeu.
— É isso, querida. Goze na minha língua. Você tem um gosto
tão bom...
Meu corpo começou a vibrar de dentro para fora. Gemi seu
nome e Fox respondeu deslizando dois dedos dentro de mim. Ele
bombeou para dentro e para fora uma vez... duas vezes... na
terceira vez, ele chupou meu clitóris em sua boca e fez um
redemoinho mágico, e explodi. Meu orgasmo foi tão forte que não
vi nada além de estrelas enquanto ele cuidava de mim.
Quando pude ver novamente, Fox estava em movimento. Ele
pairou sobre mim, um braço de cada lado da minha cabeça,
suportando seu peso.
— Você está bem?
Eu ainda não tinha recuperado o fôlego, então balancei a
cabeça.
— Preciso de você. Agora.
Ele alinhou sua cabeça inchada com minha abertura e
inclinou-se para beijar suavemente meus lábios.
— Eu quero observar seu rosto enquanto afundo dentro de
você. Tudo bem?
— Sim.
Preparei-me para o que viria a seguir, esperando que a
ferocidade continuasse, mas Fox mais uma vez surpreendeu-me.
Ele demorou, entrando lentamente em mim. Isso parecia diferente
das outras vezes em que estivemos juntos, mesmo há cinco
minutos. Era mais íntimo, mais amoroso. A maneira como ele
olhou para mim me fez sentir como se fôssemos as únicas duas
pessoas no mundo. Havia uma razão para isso: Fox e eu nunca
tínhamos feito isso no estilo missionário. Quando ele olhou nos
meus olhos, percebi que ele estava fazendo amor comigo pela
primeira vez. Isso fez meus olhos marejarem.
Ele deslizou para dentro e para fora lentamente, movendo-se
com propósito e ritmo. Seus olhos brilhavam com as emoções que
eu sentia, bem no fundo do meu peito. Ficamos assim por muito
tempo, conectados mente, corpo e alma, enquanto nossos
orgasmos aumentavam. Eu nunca quis que o momento de euforia
acabasse. Mas eventualmente, o rosto de Fox ficou tenso e suas
estocadas ficaram mais fortes e rápidas. Os sons de nossos corpos
molhados batendo um contra o outro ecoavam pelo quarto. Todos
os meus sentidos foram preenchidos com este homem,
consumidos por este homem, enquanto o meu orgasmo apoderava-
se de mim.
— Fox...
Ele continuou, com a mandíbula rígida enquanto se esforçava
para se segurar. — Tão linda pra caralho.
De alguma forma, ele conseguiu manter-se enquanto meu
corpo convulsionava ao seu redor. Somente quando a última onda
do meu êxtase começou a diminuir é que Fox soltou-se. Sentir o
calor dele penetrar dentro de mim fez meu corpo tremer
novamente.
Ele continuou a deslizar para dentro e para fora de mim sem
pressa.
Sorri para ele. — Uau. Fox Cassidy faz lento e doce.
Ele sorriu. — Não espalhe a notícia pela cidade.
— Seu segredo está seguro comigo. — Acariciei sua bochecha.
— Obrigada por se abrir comigo esta noite.
Fox assentiu e beijou meus lábios. — Faz algum tempo. Tenha
paciência comigo.
— Eu vou ter.
Seus olhos procuraram meu rosto.
— O quê? — perguntei.
Ele sorriu. — Perguntando-me como tive tanta sorte.
A esperança floresceu selvagem em meu peito. Talvez, apenas
talvez, minha sorte também fosse melhor desta vez.
Na manhã seguinte, meu telefone tocou um pouco depois que
Fox saiu para o trabalho. Eu estava sentada na grama do quintal,
procurando por Margarida, e sorri ao ver o nome de Nilda na tela.
— Oi — respondi. — Eu queria ligar para você.
— Como você está, querida?
Suspirei. — Muito bem, na verdade.
— É maravilhoso ouvir isso. Laurel Lake pode ter sido
exatamente o remédio que você precisava.
Eu não poderia concordar mais. — É um lugar incrível.
— Parece que você não vai voltar?
Meus olhos foram para a casa ao lado. Eu poderia morar aqui?
Adorava a sensação de estar em uma cidade pequena, onde parava
para tomar um café ou na loja de materiais de construção e as
pessoas conheciam você pelo nome. Claro, havia uma
desvantagem nisso, como todo mundo no seu negócio, mas isso
não me incomodava tanto quanto a Fox. Porque nada disso era
feito com maldade. Além disso, duvidava que houvesse uma
empresa farmacêutica num raio de centenas de quilômetros, talvez
mais. Embora, desde que tudo aconteceu no trabalho, eu estava
pensando em mudar para o mundo acadêmico. Eu tinha sido
assistente na faculdade e na pós-graduação e gostei muito de dar
aulas. Na verdade, uma vez mencionei talvez fazer isso em vez de
pesquisar. Mas minha mãe ficou chocada. — As universidades não
pagam professores como as grandes empresas farmacêuticas — ela
disse. — Você vai morar naquele apartamento de um quarto para
sempre.
— Não sei o que estou fazendo — eu disse. — Mas... conheci
alguém.
— Oh? Conte mais.
Deitei-me na grama e fechei os olhos. — Bem, ele é mal-
humorado, cabeça quente, odeia mudanças e é provavelmente a
última pessoa que eu teria pensado que seria um bom partido.
— Espero que haja mais nesta descrição, querida...
Eu ri. — Há. Embora ele seja todas essas coisas, ele também é
atencioso, protetor, generoso, respeitoso e extremamente leal.
— Essas qualidades soam muito melhores.
— Ele também é alto, forte e devastadoramente bonito.
— Agora você está falando. Você deveria ter começado com isso.
Eu gosto de alto. Continue...
Sorri. — Fox é realmente difícil de explicar. Ele era jogador
profissional de hóquei e agora é dono de uma construtora. Ele é
exatamente o que você imagina quando digo isso: robusto e
resistente. Nenhum de nós estava procurando por algo. Acho que
é bastante seguro dizer que a Fox estava lutando para não
encontrar alguém.
— Você acha que vai ficar aí?
— Não sei. As coisas são tão novas. Não tive tempo de
considerar isso seriamente. Mas tenho que voltar ao trabalho em
três semanas. Kolax e Hahm estão ficando impacientes e eu
estourei o limite da minha licença.
— Fox algum dia consideraria se mudar para Nova York?
Eu ri alto. — Definitivamente não. Ele ficaria infeliz.
— Você tem muito em que pensar então. Mas você parece feliz.
Como tem sido seu sono?
— Não consigo lembrar da última vez que dormi tão bem.
— Provavelmente todo esse ar fresco.
Ou os orgasmos. Muito melhor que Ambien7. — Talvez. Mas fale
de você. Como você está se sentindo?
Nilda e eu conversamos por mais dez minutos. Depois que
conversamos, ela abordou o assunto que sempre fazia. — Você
falou com sua mãe?
— Não recentemente. Como ela está?
— Ela está bem. Você deveria ligar para ela. Talvez contar a ela
sobre esse cara novo que você está saindo.
Isso definitivamente não estaria acontecendo. — Ela odiaria a
ideia de eu passar um tempo aqui e namorar um cara que faz
construção em vez de neurocirurgia. Acho que vou deixar isso
passar.
— Ela sente sua falta.
Nilda tinha boas intenções, então não discuti.
— Antes de desligarmos — disse ela. — Eu preciso falar com
você sobre uma coisa. Estou adiando, esperando falar com você
pessoalmente quando você voltar, mas temo que isso não funcione.
Isso parecia ameaçador. — O que está acontecendo?
— Estou me mudando, querida.
— Mudando? Quer dizer que você não vai mais morar com a
mamãe?
— Não, querida. Quer dizer, estou me mudando para a Carolina
do Sul. Minha irmã Bessy não anda mais tão bem e quero estar
7
Ambien é um sedativo, também chamado de hipnótico. Ambien (zolpidem) afeta substâncias químicas no
cérebro que podem estar desequilibradas em pessoas com problemas de sono.
mais perto para ajudar. Além disso, o tempo é mais agradável e eu
estou ficando velha.
Sentei-me, sentindo meu peito apertar. Nilda estava com quase
sessenta anos agora, mas eu era egoísta quando se tratava dela.
— Ai, meu Deus, Nilda. Você está comigo desde que eu era bebê.
— Eu sei, querida. Mas você não precisa mais de cuidados e
chegou a hora.
— Quando você vai embora?
— Em poucas semanas.
A pele do meu peito estava quente e coçando. Sem dúvida eu
teria uma erupção cutânea em breve. Eu esfreguei. — Não sei o
que dizer. Não consigo imaginar minha vida sem você.
— Sua vida nunca será sem mim, não enquanto eu estiver
respirando. Você irá me visitar e eu irei visitar você. Charleston
fica a apenas algumas horas de Laurel Lake. Se você acabar
mudando-se para aí, ficaremos mais próximas do que se eu
estivesse aqui com sua mãe.
Suspirei. — A mamãe já sabe?
— Ela sabe. Eu avisei a ela com alguns meses de antecedência.
Simplesmente nunca parecia o momento certo para contar a você.
— Desculpe, não pareço feliz. Eu prometo que estarei. Apenas
me dê um pouco de tempo para digerir. Você é meu tudo, Nilda.
— E você é meu tudo também, querida. Nada disso vai mudar.
Isso vai ser bom. Para nós duas.
Com certeza não me senti bem no momento, mas sabia que ela
estava certa. Se minha mãe me ligasse e dissesse que estava se
mudando para a Austrália, eu não teria ficado tão chateada. Nilda
foi a única pessoa no mundo que sempre esteve ao meu lado. Ela
era minha rocha.
— Ligo para você em um ou dois dias. Ok? — eu disse a ela.
— Estou ansiosa por isso.
Sentei-me no gramado, olhando para o lago por quase uma
hora depois que desligamos, lembrando de todos os bons
momentos que tive com Nilda. Depois que minha festinha de pena
acabou, mandei uma mensagem para ela.
Josie: Sinto muito pela forma como agi. Estou feliz por
você. Realmente estou.
Como sempre, ela demorou horas para responder. Nilda só
verificava o telefone algumas vezes por dia. Ela o mantinha
desligado na bolsa, porque não queria que a bateria acabasse.
Nilda: Obrigada. A família está no seu coração, então você
nunca estará longe de mim, não importa onde estejamos.
Eu sorri, sentindo-me genuinamente feliz por ela agora.
Josie: Amo você, Nilda.
Nilda: Eu amo você também. Talvez nós duas iremos seguir
em frente em breve. Novos começos nem sempre têm que vir
de finais dolorosos.
Josie
Vagas para professores perto de Laurel Lake.
Nove dias depois, vi-me no Google, digitando palavras que não
conseguia acreditar que estava digitando numa manhã de
domingo. Mas depois da semana incrível que Fox e eu tivemos,
comecei a pensar nas possibilidades. Afinal, o que me mantinha
presa a Nova York agora? Há seis meses, eu teria dito meu noivo,
Nilda e minha carreira. Mas com Noah fora da minha vida e Nilda
mudando-se, a única ligação real que eu tinha era meu trabalho.
E mesmo isso eu não tinha mais certeza se era certo para mim. Eu
tinha alguns bons amigos, mas eles trabalhavam muito como eu
ou estavam começando uma família. Mesmo minha melhor amiga,
Chloe, que ainda morava perto da casa da minha mãe em Nova
Jersey, eu não via mais do que uma ou duas vezes por ano. Às
vezes, eu saía para um happy hour com colegas de trabalho, ou
com algum amigo do meu prédio, mas nenhuma dessas pessoas
mantinha-me ancorada em Nova York.
Tomei um gole de café e folheei os resultados da pesquisa. No
meio da primeira página, depois de uma quantidade absurda de
anúncios de faculdades on-line, havia um link para a Universidade
Rehnquist. Eles tinham um programa de farmacologia, então
cliquei e fui até a página de vagas de emprego da escola. Rolei
quase até o fim, parando quando encontrei uma postagem
interessante: Professor Adjunto de Ciências Farmacológicas
(Efetivo). Lendo a descrição, o cargo exigia que os candidatos
tivessem mestrado ou doutorado, além de três anos de experiência
em pesquisa. Tudo começaria no outono e ainda faltavam quase
duas semanas para o prazo final para inscrição.
Fiquei olhando para a tela por um longo tempo. Mas quando
ouvi passos descendo as escadas, fechei imediatamente meu
laptop. Fox estava no chuveiro.
Ele aproximou-se e beijou o topo da minha cabeça antes de
apontar para o meu Mac. — Algo que você não quer que eu veja?
— Oh, não. Eu estava apenas olhando um anúncio de emprego.
Fox foi até a cafeteira e abriu o armário acima dela. Ele olhou
para a caneca em minhas mãos. — Você precisa de mais?
— Não, eu estou bem.
Ele começou a preparar o café, depois sentou-se à minha frente
na mesa e levou a caneca aos lábios. — Você está mudando de
emprego?
Dei de ombros. — Eu não tenho certeza. É algo em que estive
pensando.
— Por causa do que aconteceu?
— Não. Bem, não inteiramente, eu acho. Sou boa no que faço e
ganho um ótimo salário, mas acho que existem outras carreiras
que poderiam ser mais gratificantes. Aquelas com menos estresse
também.
— Há algo específico que você acha que gostaria mais?
— Sempre brinquei com a ideia de dar aula, de ser professora.
Fui professora de química orgânica na faculdade. É um assunto
com o qual a maioria dos alunos tem muita dificuldade, então eles
recorrem à memorização em vez de realmente aprender o assunto.
Adorei quando consegui fazer com que os alunos mergulhassem
comigo e se apaixonassem pela ciência.
Fox sorriu.
— O quê?
— Eu teria tentado transar com você na faculdade, se fosse
minha professora.
Eu ri. — De qualquer forma, é apenas algo em que estou
pensando.
— Onde era a posição que você estava olhando?
Merda. Fox e eu definitivamente havíamos entrado em território
de relacionamento, mas não tinha certeza de como ele reagiria se
eu procurasse empregos aqui. Então contei uma pequena mentira.
— Eu não tenho certeza. Eu estava olhando principalmente para
os requisitos.
Fox olhou para mim por cima da caneca enquanto bebia. Pela
forma como seus olhos se estreitaram, tive a sensação de que
talvez ele tivesse visto o site. Mas se ele viu, ele não disse isso.
Alguns minutos depois, ele colocou a caneca na pia. — Vou dar
uma volta até Lowell para comprar algumas molduras de base
novas. As antigas são uma merda e não combinam com o piso
novo.
Fox passou o sábado inteiro instalando um novo piso na minha
cozinha e na minha sala. Bem, tecnicamente não o dia inteiro
desde que acabamos fazendo sexo quando ele estava na metade.
Mas eu não queria que ele passasse o domingo trabalhando
também. Ele precisava de uma pausa.
— Você já fez o suficiente. Você precisa de pelo menos um dia
de descanso.
— Não vai demorar muito. Duas ou três horas, no máximo.
— Tudo bem, mas estou ajudando e irei com você.
— Você queria dar uma volta ao redor do lago para procurar
Margarida. Por que você não faz isso enquanto vou buscar
suprimentos? Vai fazer calor hoje, então é melhor você fazer isso
mais cedo.
Eu queria procurá-la. Comprei um par de binóculos no início
da semana e pensei que ela poderia estar perto do parque estadual,
do outro lado do lago, mas não tinha certeza. Opal contou-me
sobre uma trilha do outro lado que corria ao longo da água. — Você
não se importa?
— De jeito nenhum.
— Tudo bem então. — Apontei para as janelas traseiras, para
o lago além. — Você sabe onde começa a trilha do outro lado?
Ele assentiu. — Está no caminho. Eu vou deixar você lá.
Vinte minutos depois, desci da caminhonete de Fox. Eu estava
com a mão na porta para fechá-la quando ele me parou.
— Ei. Espere um segundo.
— Sim?
— Rehnquist é uma boa escola, a cerca de vinte e cinco minutos
de carro. — Nós travamos os olhos e ele sorriu. — Conhecendo
você, você estará pensando profundamente enquanto caminha por
essa trilha. Acho que você gostaria daqui. Eu sei que gostaria de
você aqui.
Meu coração disparou quando sorri de volta. — Ok.
Naquela noite, Fox veio atrás de mim enquanto eu estava na
beira do lago. Depois da caminhada, passei algumas horas
pintando do lado de fora, usando os materiais que Porter havia
deixado semanas atrás. Minha obra inacabada estava secando ao
sol. Ele passou as mãos em volta da minha cintura, prendendo-as
na frente.
— Uau. Você é boa.
— Nem tanto. Mas esqueci o quanto gosto de pintar a natureza.
Não faço isso desde a faculdade. A casa da minha mãe fica em uma
bela propriedade. Eu gostava de sentar lá fora e pintar as árvores
e outras coisas. Acho isso tranquilo. Deixa meu cérebro relaxar.
Ele beijou o topo da minha cabeça. — Você deveria fazer isso
com mais frequência.
Virei-me em seus braços e coloquei minhas mãos em volta de
seu pescoço. — Acho que vou. Não sei o que há neste lugar, mas
sinto que ele está me lembrando de quem eu costumava ser.
— Talvez você devesse ficar por aqui.
Fiquei na ponta dos pés e dei um beijo em seus lábios. — Talvez
eu fique.
Um pato grasnou atrás de nós, então virei-me para olhar o lago.
Mas não era minha amiguinha. Eu fiz uma careta. — Estou
preocupada que algo tenha acontecido com Margarida.
— Como o quê?
— Não sei. E se a ferida dela se abrisse novamente e ela pegasse
uma infecção ou fosse atacada por um urso?
— Nunca vi um urso por aqui. Talvez um coiote, no entanto.
Meus olhos se arregalaram. — Você acha que um coiote a
comeu? Eles percebem quando outro animal está ferido e é uma
presa fácil.
— Não disse isso. Estava apenas contando sobre as ameaças
naturais aos patos localmente. Tenho certeza que ele está bem.
— Acho que vou até o lago e procurá-la. Mais cedo, vi patos
passeando naquela ilha no meio. Talvez ela esteja lá e esteja ferida.
Você viria comigo em seu caiaque?
— Não acho que seja uma boa ideia.
— Por que não?
Fox olhou para seu quintal, para a beira da água. Seu rosto
estava sério. — É perigoso.
Minhas sobrancelhas subiram até cabelo. — Andar de caiaque?
Eu sei nadar, você sabe.
Quando ele não respondeu, algo me ocorreu. — Oh, meu Deus.
Você não nada? É por isso que você nunca entra no lago?
— Eu sei nadar.
— Você está nervoso porque vai escurecer em breve?
— Só... vou dar uma olhada na ilha e ver se o pato está lá. Tudo
bem?
— É um caiaque apenas para uma pessoa?
— Não.
— Então vamos... — Caminhei em direção ao quintal de Fox. —
A ilha não fica longe. Estaremos de volta em vinte minutos.
Na beira da água, eu me virei para perguntar onde estavam os
remos e percebi que Fox não havia se movido. Eu ri. — Você está
vindo ou não?
Ele não parecia muito feliz com isso, mas eventualmente
aproximou-se. Ele limpou algumas teias de aranha e tirou o
caiaque do suporte de madeira.
— Os remos estão embaixo do deck traseiro — ele resmungou.
— Ok! Vou pegá-los enquanto você coloca isso na água.
Corri até o deck e abaixei-me, pegando os remos no topo de
uma pilha de coisas para água que eu não tinha percebido que
estava ali embaixo. — Você tem um tapete flutuante e pranchas de
stand up paddle8? — falei, voltando. — Por que você nunca usa
essas coisas? Nunca experimentei stand-up paddle. Aposto que é
um ótimo exercício.
Fox tirou um remo da minha mão. — Entre e eu vou nos
empurrar.
Tirei as meias e os sapatos e os deixei no cais. — Tudo bem,
obrigada.
Assim que me sentei, Fox subiu. O barco estreito balançou para
frente e para trás algumas vezes, o que achei engraçado. Fox, nem
tanto. Ele tinha uma expressão muito séria no rosto quando
começou a remar. Havíamos chegado a cerca de dez metros da
costa quando percebi que meus pés estavam ficando molhados.
— Havia água aqui quando você colocou o caiaque?
Fox olhou para baixo. — Que porra é essa?
A água vinha de algum lugar e minha extremidade parecia estar
flutuando mais abaixo. Sem mencionar que meus pés estavam
quase cobertos agora. Inclinei-me para olhar para o chão atrás de
mim. — Ah, merda. Há um buraco embaixo da almofada do
assento!
Fox começou a remar rápido, tentando virar o caiaque e voltar
para a costa. Mas o pedaço de plástico não iria a lugar nenhum, a
não ser afundar. O lago rapidamente preencheu o buraco em que
estávamos sentados e meu lado inclinou-se para baixo.
8
O stand up paddle é uma atividade de esporte aquático ao ar livre onde um surfista se levanta em uma
grande prancha e usa um remo para se mover pela água.
Fiquei parada, cambaleando. — Acho que precisamos
abandonar o navio.
Fox passou um braço em volta de mim e saltamos juntos do
caiaque que estava afundando. Ele não me soltou enquanto
nadava em direção à costa.
— Fox, estou bem! Posso nadar sozinha.
Mas ele continuou, como se fosse um salva-vidas e eu um
nadador que estava se afogando. Toda a cena foi bastante cômica.
Ele nem soltou alguns golpes depois, quando eu disse a ele que
podia sentir a parte inferior sob meus pés. Depois de mais alguns
minutos, estávamos de volta à costa, e Fox finalmente soltou o
aperto mortal que ele tinha sobre mim. Nossas roupas estavam
encharcadas quando nos levantamos, e não pude deixar de rir
porque... caramba, foi engraçado.
— Vou chamar você de Mitch, de Baywatch — eu disse.
— Não é engraçado.
— Sério? — Juntei a barra da minha camisa e torci,
espremendo-a. — É muito.
Fox me olhou de cima a baixo. — Você está bem?
— Estou bem. — Eu ri. — Talvez uma costela fraturada devido
ao seu resgate mortal, mas fora isso estou bem.
— Desculpe. — Ele franziu a testa. — Eu vou me trocar. — Ele
não esperou que eu respondesse antes de se voltar para sua casa.
Eu gritei atrás dele, ainda rindo. — Eu estava brincando.
Minhas costelas estão bem. Venha quando terminar. Vou colocar
o jantar no forno.
Achei que o mal-humor de Fox seria curado assim que eu
colocasse a comida que fiz hoje na frente dele. Quando estive no
Laurel Lake Inn com Opal na semana passada, mencionei que
adoraria a receita da carne de porco que Fox tanto amava. Não
muito depois, ela desapareceu por alguns minutos e voltou com
um post-it e piscou. Aparentemente, o marido da melhor amiga de
sua irmã trabalhava na cozinha, então tudo que ela precisava fazer
era pedir.
Coloquei o assado no forno e entrei no chuveiro. Mas quando
uma hora se passou e Fox ainda não tinha aparecido, mandei uma
mensagem para ele.
Josie: Oi. O jantar estará pronto em cerca de quarenta e
cinco minutos.
Esperei alguns minutos, mas nenhuma mensagem de resposta
chegou. Na verdade, minha mensagem nem apareceu como lida.
Quando o alarme que eu havia ajustado para o assado tocou,
quarenta e cinco minutos depois, tirei-o do forno e peguei o
telefone para ligar para a Fox. Ele poderia ter adormecido? Ou
então, talvez o telefone dele estivesse no bolso quando pulamos no
lago e agora ele estava mudo. Seu telefone tocou e tocou,
eventualmente indo para o correio de voz.
Podia apostar que estava no bolso dele. Devia ser isso.
Então calcei os sapatos e saí pela porta da frente. Mas parei
quando percebi que a caminhonete de Fox não estava mais na sua
garagem.
Para onde diabos ele desapareceu?
Josie
— Olá? — Atendi no primeiro toque.
— Oi, querida. É Opal. Alguma chance de você saber onde está
o chefe?
Meus ombros caíram. — Não. Na verdade, eu esperava que você
soubesse dele. Não creio que ele tenha voltado para casa ontem à
noite.
— Para onde ele foi?
Balancei minha cabeça. — Eu não faço ideia. Ele não disse.
Mandei mensagens para ele algumas vezes, mas ele não
respondeu. Acho que o telefone dele pode ter quebrado.
— Ele deveria se encontrar com o chefe dos bombeiros esta
manhã para uma inspeção final na escola. Não é típico dele ignorar
algo assim.
Eu ficava cada vez mais preocupada a cada hora desde que a
primeira mensagem que enviei para Fox ficou sem resposta. Mas
agora eu estava realmente pirando. — Estou nervosa que algo
possa ter acontecido com ele.
— Quando você o viu pela última vez?
— Cerca das sete. Ele estava meio mal-humorado quando saiu,
mas sabia que eu tinha feito o jantar.
— Vocês dois brigaram?
— Na verdade, não. Ele estava meio irritado comigo. Eu queria
procurar um pato que encontramos ferido no lago há algumas
semanas, mas ele não queria. Mas eu não diria que brigamos. —
Dei de ombros. — Pelo menos não pensei que tivéssemos brigado.
Mas você sabe como é Fox; ele não fala muito. Talvez ele estivesse
mais chateado do que eu pensava.
— O homem tem temperamento. Ele provavelmente só
precisava desabafar.
— Talvez... — Embora eu não sentisse que era isso.
— Vou fazer algumas ligações. Tenho certeza que ele aparecerá
em breve. Não se preocupe, querida.
— Você vai me ligar de volta se descobrir alguma coisa?
— Claro que sim.
Eu mal dormi a noite toda, esperando-o voltar para casa. Por
volta das duas, subi para dormir, mas deixei a janela aberta para
poder ouvir se a caminhonete voltasse. Eu cochilava por alguns
minutos, depois preocupava-me por ter perdido o som dele
chegando e tinha que me levantar e olhar pela janela.
Não havia como eu ficar sentada aqui esperando por mais
tempo. Eu precisava fazer alguma coisa. Então peguei minha bolsa
e decidi dar uma volta. Laurel Lake não era tão grande, e sua
grande caminhonete era fácil de localizar.
Comecei pela cidade, passando lentamente pelo Beanery, pelo
banco e por todas as lojinhas da rua principal de três quarteirões.
Havia um estacionamento municipal a um quarteirão da Main,
então verifiquei lá também. Depois fui à loja de materiais de
construção, ao showroom de azulejos e a alguns restaurantes nos
arredores da cidade antes de dirigir até a pista de gelo. Mas estava
vazio em todos os lugares. Eu sabia que ele tinha comprado alguns
suprimentos recentemente, a cerca de meia hora de distância, em
um lugar chamado Wolfson, então pesquisei onde ficava no Google
e peguei a estrada. Dirigi por pelo menos duas horas antes de meu
celular tocar.
— Oi, querida. É Opal. Nós o encontramos.
Soltei um suspiro instável. — Oh! Graças a Deus. Ele está bem?
— Ele está bem. Provavelmente vai ter uma baita dor de cabeça
e vai precisar dormir a maior parte do dia, mas vai ficar bem.
— O que aconteceu?
— Ele bebeu muito e brigou. Bem, se você pode chamar assim.
Quando o tronco de uma árvore de um homem como Fox Cassidy
atinge você, não há luta. Você desce para a contagem. Mas foi isso
que aconteceu. Alguém chamou uma ambulância e a polícia
apareceu. O outro cara estava bem, mas prenderam Fox por
agressão. O xerife disse que o jogou no tanque dos bêbados para
dormir. Porter só foi pagar a fiança, já que consegui que o chefe
dos bombeiros voltasse e me encontrasse para a inspeção que
ainda precisa ser feita.
— Eu não posso acreditar nisso. Fox quase não bebe.
— Provavelmente o que tornou tão fácil ficar bêbado.
Suspirei. — Há algo que eu possa fazer?
— Não, está tudo bem. Dependendo se Fox está sóbrio o
suficiente para dirigir, Porter irá deixá-lo no carro ou dar-lhe uma
carona para casa quando ele sair.
— Tudo bem. Obrigada por ligar, Opal.
— Sem problemas. Você tenha um bom resto de dia.
Eu não tinha certeza se isso iria acontecer. Obviamente, Fox
estava mais chateado comigo do que eu pensava. Mas não entendi
o porquê. Voltei para casa, tentando descobrir o que o teria deixado
tão chateado a ponto de dispensar-me e sair para beber sem dizer
uma palavra. Não parecia algo que Fox faria.
O caiaque tinha valor sentimental para ele e ficou chateado
porque ele afundou no fundo do lago?
Ele realmente achava que precisava me salvar e estava
chateado por eu não ter levado tudo mais a sério?
Ele poderia ter ficado chateado porque eu o forcei a ir comigo e
então ele acabou encharcado e nadando de volta para a costa?
Supus que qualquer um desses poderia ter sido o motivo, mas
nenhum deles parecia certo. Para mim, a parte mais estranha de
tudo foi o desaparecimento de Fox. Ele era o tipo de homem que
lidava com as coisas de frente, em vez de fugir e evitar discussões.
Embora eu estivesse aliviada por ele estar bem – estive pensando
o pior por um tempo – uma sensação desconfortável ficou na boca
do estômago pelas próximas horas.
Por volta do meio-dia, fui usar o banheiro. Quando voltei, a
caminhonete de Porter estava na porta ao lado, na garagem. Ele
saiu da casa de Fox assim que eu cheguei à porta da frente.
Porter fechou a porta atrás de si e veio em minha direção. —
Tive que parar duas vezes no caminho do tribunal para casa para
ele vomitar. Ele vai se sentir uma merda hoje. Talvez amanhã
também. Mas ele vai ficar bem.
— O que diabos aconteceu?
— O xerife disse que foi chamado ao Crow Nest às duas da
manhã. O bartender parou de dar bebida a Fox. Fox ficou chateado
e tentou estender a mão por cima do bar e dar um soco nele, mas
ele perdeu o equilíbrio e caiu do banquinho. Alguns moradores
locais o ajudaram a se erguer até uma mesa. Fox desmaiou por
um tempo. Eles o acordaram quase na hora de fechar, imaginando
que iriam colocá-lo em um táxi para casa. Mas quando ele se
levantou, começou uma briga com Ray Langone.
— Meu tio?
— O barman disse que Ray não disse uma palavra a ele. Fox
simplesmente saiu da cabine e quando viu Ray, ele o acertou.
— Ray está bem?
Porter assentiu. — O xerife disse que ele vai ter um bom olho
roxo, mas os bêbados nunca parecem se machucar muito.
Eu balancei minha cabeça. — Não posso acreditar. Eu nem sei
o que o irritou.
— Vocês dois brigaram ou algo assim?
— Na verdade, não. Pelo menos não pensei que tivéssemos.
Tivemos um ótimo fim de semana. Por volta das sete da noite
passada, eu queria procurar um pato que se machucou há algum
tempo. Achei que ela poderia estar na pequena ilha no meio do
lago. De qualquer forma, Fox definitivamente não queria ir comigo,
mas foi. Saímos em seu caiaque e, a cerca de dez metros de
distância, começou a entrar água. O caiaque afundou e nadamos
de volta. Achei engraçado, mas Fox parecia chateado com tudo
isso. Nunca corremos risco de afogamento ou algo assim, então
não sei por que ele ficaria tão abalado.
— Ah, merda. — Porter assentiu. — Bem, faz sentido agora.
— O que faz sentido?
— Fox não entra naquele lago há anos.
— Percebi isso, mas por que não?
— Você não sabe?
— Sei o quê?
— Como a noiva dele morreu?
— Pensei que ela morreu em um acidente?
— Ela morreu. — Ele apontou para o quintal. — Naquele lago.
Fox
Eu perdi meu voo matinal de propósito.
Eu estava em Minnesota há dois dias para um jogo fora de
temporada com um grupo de meus companheiros de equipe em
um evento de caridade, uma das coisas das quais eu normalmente
ficava ansioso para voltar para casa. Embora não desta vez, não
depois de conversar com Evie na noite passada.
Rolei na cama e peguei meu telefone que estava tocando na
mesa de cabeceira sem abrir os olhos. Eu sabia que era seguro
deslizar sem verificar a tela, porque não havia nenhuma maneira
de Evie sair da cama antes do final da tarde.
Um raio de sol atingiu meu rosto. Joguei um braço sobre os
olhos para bloqueá-lo e levei meu celular ao ouvido.
— Olá?
— Cassidy? É Will.
Meu agente. Eu me sentei e limpei a garganta. Will Koker era
tão conversador quanto eu, o que era uma das coisas que gostava
nele. Ele ia direto ao ponto. Mas isso também significava que,
quando ele ligava, ele tinha algo a dizer.
— O que está acontecendo? — perguntei.
— Você saiu ontem à noite antes de conversarmos. A que horas
é o seu voo hoje?
— Era para ter sido há meia hora. Dormi demais.
— Tem tempo para almoçar então?
Por que não? Não era como se eu quisesse correr para casa de
qualquer maneira. — Claro.
— Meio-dia no restaurante do hotel?
— Parece bom.
Fiquei na cama mais uma hora antes de tomar banho e
arrumar minhas coisas. O agente de viagens da equipe me
remarcou para um voo às cinco horas, então resolvi sair do quarto
e ir para o aeroporto depois do almoço.
Will já estava sentado à mesa, falando no celular como sempre,
quando entrei no restaurante. Ele acenou para mim.
— Tudo bem, deixe-me falar com meu cliente — disse ele. —
Mas se ele concordar, precisaremos da aprovação da cópia final do
roteiro e de um treinador de atuação para trabalhar com ele em
suas falas. E, claro, acomodações de primeira classe. — Ele
gesticulou para que eu me sentasse e riu ao telefone. — Não,
obrigado. Eu não preciso de nenhum.
Ele desligou o telefone e o colocou sobre a mesa. — Oferta
comercial do tipo Viagra para um de meus clientes aposentados.
Estou apresentando a oferta por telefone, porque há uma
possibilidade distinta de ele me dar um soco quando eu contar a
ele sobre isso. — Will balançou a cabeça. — Por que essas
empresas de publicidade não podem querer jogadores de tênis ou
fracos de beisebol? Não. Eles precisam ter os maiores, mais
corpulentos e mais durões caras do hóquei para promover suas
merdas.
Eu ri. — Já estou divulgando isso agora. Você pode recusar se
eles vierem atrás de mim. Não importa o quão falido eu esteja. Não
vendo pílulas para pau.
O telefone de Will vibrou na mesa. Ele verificou a tela, mas
depois apertou o botão na parte superior. — Desculpe por isso. As
coisas têm estado complicadas ultimamente.
— Uh-oh — eu disse. — Você nunca desliga essa coisa. Devo
ter medo do que é esse almoço?
— Eu desligo.
— Não, você não desliga. Eu vi você atender no funeral de Vince
Farone.
— Aquela foi uma ligação importante. Eu estava negociando a
extensão de contrato mais longa que a liga já viu.
— Então hoje é apenas um almoço amigável? Você sentiu
vontade de falar sobre o assunto?
— Não exatamente...
A garçonete aproximou-se e pediu para anotar nossos pedidos
de bebidas. Will pediu um uísque com gelo. Eu normalmente não
bebia durante o dia, nem muito à noite, aliás, mas pensei que
poderia precisar disso hoje. Por vários motivos.
— Quero uma vodca com 7UP.
— Já estou voltando.
Will recostou-se na cadeira. — Fale comigo. O que está
acontecendo com você?
— O que você quer dizer?
— Seu jogo está ruim. Você está ainda menos amigável do que
o normal. E quando liguei para Doug Allen outro dia para iniciar
discussões sobre outra extensão de contrato, ele disse que seu
treinador mencionou que achava que talvez você estivesse
pensando em se aposentar. Ele disse que geralmente vê uma
mudança em seus jogadores logo antes de pendurarem os patins.
Achei que ele poderia estar vendo isso em você.
Ah, porra. Esfreguei as mãos no rosto. — Definitivamente não
estou pronto para me aposentar.
— Algo está acontecendo? Você está cuidando de uma lesão que
não quer contar a ninguém, porque tem medo de ser banido e
algum trapaceiro roubar seu lugar?
— Não. Não é isso.
— Então converse comigo. O que está acontecendo com você?
Eu hesitei.
Will suspirou. — Dê-me um centavo.
— Para quê?
Ele estendeu a mão. — Apenas me dê um maldito centavo.
Enfiei a mão no bolso e tirei as moedas que tinha. — Eu não
tenho um centavo.
— Então me dê uma moeda. Isso servirá.
Peguei a moeda da palma da mão e joguei-a para o outro lado
da mesa.
Will a pegou. — Obrigado. Estou em regime de retenção agora.
— Retenção de quê?
— Posso não exercer mais a profissão, mas ainda sou advogado.
Agora sou seu. Temos privilégios, então me diga o que está
acontecendo. Você matou alguém? Problemas com drogas? Um
diagnóstico que você não quer que ninguém saiba?
Esfreguei minha nuca. — Não sou eu. É Evie.
— A patinadora? Vocês dois ainda estão juntos?
Eu balancei a cabeça.
— Faz um tempo que não a vejo por aí. Os outros levaram as
esposas para a arrecadação de fundos ontem à noite. Por que você
não a trouxe?
Porque não posso confiar que ela não desaparecerá no banheiro
como Clark Kent e sairá muito bêbada. — Evie tem alguns
problemas.
— Saúde?
Encontrei os olhos de Will. — Saúde mental. Ela também tem
um problema com bebida.
Will franziu a testa. — Oh, cara. Sinto muito por ouvir isso. Ela
tentou a reabilitação?
— Três vezes. Uma desintoxicação de cinco dias e dois períodos
de trinta dias.
— Meu velho era um bêbado. Não é fácil.
— Era? Ele está sóbrio agora?
Will assentiu. — Acho que ele está limpo há cerca de dez anos.
— O que o fez parar de beber?
— Não tenho certeza se sei a resposta para essa pergunta. Foi
depois que minha mãe o deixou conosco, mas não imediatamente.
Provavelmente dois anos depois. Ele entrou e saiu da estrada
desde o momento em que se casaram até eu ter doze anos. Ele
perdia o emprego, íamos ficar na casa da minha avó com minha
mãe por um tempo, e então ele aparecia barbeado e sóbrio e a
convencia a voltar e dar-lhe outra chance. Mas isso nunca duraria.
— Will encolheu os ombros. — Foi preciso mais do que perder tudo
para ele melhorar. Todos esses anos ele tentou pela minha mãe.
Acho que ele realmente a amava. Mas nunca conseguiu até que ele
fez isso por si mesmo.
Meu rosto caiu.
Will percebeu e sorriu tristemente. — Acertei um nervo?
— Bem no maldito nariz.
A garçonete trouxe nossas bebidas. Will estendeu seu copo
para mim. Nós brindamos e ambos tomamos goles saudáveis.
Depois que meu agente pousou o copo, ele cruzou as mãos sobre
a mesa e inclinou-se para frente. — Lamento saber o que você está
passando. Eu realmente lamento. Mas vou ser direto com você.
Você precisa voltar ao jogo ou não ficará feliz com sua renovação.
A administração não sabe o que está acontecendo, então eles estão
pensando o pior – que você está caindo. Posso adiar as negociações
do contrato até que a temporada comece novamente, para que você
possa mostrar a eles que estão errados. Mas você precisa
encontrar uma maneira de se recompor.
Soltei duas bochechas de ar e balancei a cabeça. — Entendi.
— Se você quiser conversar, estou aqui. O trimestre lhe dá
muitas horas.
— Obrigado. Eu agradeço.
— Alguns meses depois de deixarmos meu pai, perguntei à
minha mãe se íamos voltar, como sempre fazíamos. Ela disse que
não, então perguntei por que não? Nunca esquecerei a resposta
que ela me deu. Ela disse: Porque finalmente descobri que você não
pode amar um alcoólatra até a sobriedade, mas pode amar a si
mesmo o suficiente para deixá-lo ir.
Deitei-me na prancha de paddle, coloquei o remo na cintura e
inalei o cheiro do lago matinal. Esta casa... este lago sempre foi
meu consolo. Mas a única maneira de conseguir alguma paz
ultimamente era vir aqui e flutuar.
Eu estava de volta há três dias. Normalmente, quando eu
chegava em casa para um show de merda como o da primeira noite
– um carro amassado, seis pontos no dedo de Evie e uma lixeira
que pesava mais que a de lixo – Evie dormia por um dia e depois
chorava e pedia desculpas. Não dessa vez. Ela simplesmente
continuou bebendo. E eu estava infeliz em minha própria casa.
Ontem à noite, enquanto discutíamos, pensei em ir para um hotel.
Mas em vez disso vim aqui e me deitei na prancha para pensar.
Quando voltei para dentro, ela estava desmaiada.
Nosso relacionamento não era mais divertido – não que
qualquer relacionamento tivesse que ser divertido o tempo todo,
mas precisava haver um equilíbrio. Esta era uma gangorra que não
oscilava há muito tempo. Se Evie fosse qualquer outra mulher, eu
já teria terminado tudo. Mas ela não era. Ela dedicou vinte anos a
um esporte em vez de criar amigos e uma vida. E a única pessoa
real de quem ela esteve próxima foi sua mãe, e aquela mulher
apenas a arrastaria até o fim. Então o que eu deveria fazer, chutá-
la para o meio-fio? Eu me importava com ela, eu a amava mesmo
não gostando muito dela. Embora o que Will disse outro dia no
almoço continuasse martelando na minha cabeça. — Você não
pode amar um alcoólatra até a sobriedade, mas pode amar a si
mesmo o suficiente para deixá-lo ir.
Fiquei no lago, tomando banho de sol por quase duas horas,
tentando descobrir uma maneira de sair dessa bagunça. A única
conclusão a que cheguei foi ir embora. Achava que já sabia há
algum tempo que essa era a única escolha. Mas eu não a deixaria
sozinha. Eu encontraria uma casa para ela e a alugaria para que
ela tivesse um lugar para ir. E eu estaria lá para ela tanto quanto
pudesse, só que não como seu noivo e não morando na mesma
casa. Eu também procuraria o pai dela, tentando encorajá-lo a
trabalhar no relacionamento deles novamente. Ela iria precisar de
todo o apoio que pudesse conseguir.
Decisão tomada, sentei e tirei meu telefone do bolso. Lynn
Walker foi a corretora imobiliária que usei para comprar esta casa.
Percorri meus contatos até encontrar o número dela e apertei
Ligar. Ela atendeu no segundo toque.
— Fox Cassidy. Como você está, querido?
Acho que meu número também foi salvo no telefone dela. —
Estou bem. Como você está, Lynn?
— Sobrevivendo de café e boas intenções. O que posso fazer por
você, filho?
— Umm... tenho um amigo procurando um aluguel, de
preferência uma casa em Laurel Lake.
— Não acho que haja muito para alugar em Laurel Lake no
momento.
— E Hollow Hills? Em algum lugar perto do rinque pode
funcionar.
— Deixe-me fazer algumas pesquisas. É para uma pessoa ou
uma família?
— Apenas uma pessoa.
— Qual é o orçamento para o aluguel?
O dinheiro era a menor das minhas preocupações. — Não há
nenhum.
— Algum requisito, como um quintal grande ou um certo
número de quartos e banheiros?
Eu balancei minha cabeça. — O único requisito é que esteja em
uma boa vizinhança e tenha segurança. É para uma mulher que
mora sozinha. — Nem esta cidade nem as cidades vizinhas eram
inseguras, mas quando Evie bebia, ela não prestava atenção em
coisas como trancar a porta. Portanto, um bom sistema de
segurança era importante.
— Ok. Deixe-me ver o que posso fazer e entrarei em contato
com você em um instante.
— Obrigado, Lynn.
Depois que desliguei, fiquei mais um pouco no lago, pensando
se estava fazendo a coisa certa. Mas quando entrei em casa e
encontrei Evie enterrando uma garrafa na lata de lixo às nove da
manhã, eu me senti melhor com o que havia iniciado. Agora
precisava de um momento em que ela estivesse sóbria o suficiente
para dar a notícia.
— Você acha que poderia não beber hoje? Quero sentar e
conversar mais tarde.
— Sobre o quê?
— Sobre nós.
— O quê, como você nem me beija mais? — Os olhos de Evie
encheram-se de lágrimas. — Você nem gosta de mim, não é?
Eu podia sentir o cheiro de álcool em seu hálito. Esta não era
uma conversa que eu teria com ela bêbada. Talvez eu tivesse que
esperar um pouco, mas achei importante que ela entendesse como
eu havia chegado à decisão que precisava tomar.
— Evie...
Ela começou a se despir, tirando primeiro a blusa e depois a
calça. — Aposto que você vai me foder, certo?
Eu não tinha certeza de onde isso vinha. Não fazíamos sexo há
semanas. —Evie, pare.
Ela não ouviu. Ela estendeu a mão e desabotoou o sutiã. — Oh,
vamos lá. Vamos apenas fazer isso. É a única razão pela qual você
me mantém por perto e você sabe disso. — Meio vestida, ela
aproximou-se e jogou os braços em volta do meu pescoço, ficou na
ponta dos pés e pressionou os lábios no meu queixo. — Vamos.
Toque-me.
— Por favor, pare.
Ela agarrou minha mão e a levou até sua bunda, forçando-a
em mim. — Pegue isso. Isso tornará tudo melhor.
Eu a sacudi e dei um passo para trás. — Não, não vai, Evie.
— Porra, toque-me!
Tirei as chaves do carro do gancho e fui até a porta. Evie
continuou a gritar a plenos pulmões enquanto eu saía. Ela me
seguiu quase sem roupa enquanto eu marchava para o carro.
— Volte para a maldita casa, Evie!
— Não! Venha aqui e foda-me!
Balancei a cabeça e entrei. Ao sair da garagem, vi a Sra.
Craddox do outro lado da rua, espiando pelas persianas. Ótimo.
Abaixei a janela e gritei do carro. — Entre na maldita casa, Evie!
Ela mostrou-me o dedo do meio, mas virou-se e pelo menos
voltou para dentro.
Eu não sabia para onde ir, então fui para o lugar onde minha
cabeça estava sempre mais clara: o rinque.
Dez horas depois, eu estava deitado de costas no banco da área.
Fiquei sentado no escritório a maior parte do dia e, depois que a
arena fechou, calcei os patins e patinei com alguma agressividade.
Agora eu estava cansado e queria voltar para casa, mas a ideia de
dormir em uma prancha de madeira de trinta centímetros de
largura na área de penalidade era na verdade mais atraente. Talvez
eu vá para a casa da minha mãe.
Eu odiava arrastar pessoas para o meu negócio, mas não tinha
energia para mais Evie esta noite. Peguei meu telefone para ligar
para minha mãe, mas então o nome de Evie começou a piscar na
tela.
Suspirei e pensei em responder. No quarto toque, decidi que se
não atendesse, ela continuaria ligando de volta. Então atendi.
— Olá?
Ela chorou ao telefone. — Você... você está me expulsando?
Eu me sentei. — O que você está falando?
Eu mal conseguia entender o que ela estava dizendo, suas
palavras eram tão lentas e arrastadas. — A senhora da
imobiliária... ela passou por aqui.
Ah, merda. — Evie, vamos conversar amanhã quando você
estiver sóbria.
— Não podemos — ela soluçou. — Eu não quero acordar
amanhã.
— Não diga isso, Evie.
— Mas é verdade.
Eu fiquei de pé. — Evie, apenas fique quieta. Estou voltando
para casa.
Ela soluçou mais forte.
—Evie, fale comigo.
Ela acalmou-se respirando fundo e sussurrou ao telefone: —
Eu tenho que ir. Sinto muito, Fox.
Algo na maneira como ela disse isso causou arrepios nos meus
braços. Ela parecia tão desolada.
— Sente pelo quê? Evie!
— Adeus.
— Evie... espere!
A linha ficou em silêncio. Liguei de volta, mas tocou uma vez e
caiu direto no correio de voz. Liguei novamente enquanto corria
pelo rinque e ia até o carro. Quando ela ainda não atendeu ao ligar
o carro, telefonei para o 911.
— Nove-um-um. Declare sua emergência.
— Preciso que alguém vá até minha casa. Rosewood Lane,
quarenta e quatro.
— Você pode me dizer o que há de errado?
— Acho que minha noiva está em perigo.
— Alguém vai machucá-la?
— Não. Receio que ela possa se machucar.
Fox
— Você deve estar brincando comigo...
— Você demorou o suficiente para abrir a maldita porta. —
Opal passou por mim.
Minha mãe pelo menos teve a decência de parecer que se sentia
mal por aparecer sem avisar. Ela beijou minha bochecha antes de
entrar. — Desculpe não termos ligado primeiro. Mas isso é
necessário, Fox.
Não fiquei feliz, mas recuei e estendi a mão para ela entrar.
Ela sorriu tristemente. — Obrigada.
Dei uma olhada na porta ao lado antes de me fechar com duas
mulheres com quem não estava em condições de conversar.
Nenhum sinal de Josie.
Na cozinha, minha mãe já estava preparando um bule de café
e Opal limpava a bagunça que eu tinha feito nos últimos dois dias.
Isso não era bom. Elas já estavam sincronizadas e tinham um
plano de ataque. Enquanto isso, sentia-me desequilibrado. A
comida que comi no meio da noite ameaçava aparecer, e minha
cabeça já estava começando a latejar, embora eu ainda não
estivesse totalmente sóbrio. Eu não era páreo para essas duas no
meu estado atual. Mas não era como se eu pudesse ficar sóbrio
rapidamente, então fui em outra direção. Peguei um uísque do
balcão, tirei a tampa de plástico barata e bebi o máximo que pude.
Opal balançou a cabeça. — Pelo menos compre as coisas boas.
Essa porcaria vai matar você.
— Da próxima vez, traga com você. Ou melhor ainda, não
venha.
Com a mesa limpa, Opal apontou para as cadeiras. — Por que
não nos sentamos?
— Eu tenho escolha?
— Não se você quiser que a gente desapareça logo.
Eu fiz uma careta e puxei a cadeira.
Mamãe ficou diante da cafeteira, esperando que terminasse de
preparar.
— O que aconteceu? — Opal perguntou.
— Ray disse algo que me irritou, então eu bati nele. A polícia
veio.
— Isso não. Não nos importamos com Ray. Alguém deveria ter
dado uma surra naquela cobra há muito tempo. O que aconteceu
com Josie que deixou você em lágrimas?
Dei de ombros. — Isso nunca deveria ter acontecido. A mulher
manda cartões de Natal para estranhos porque acredita em
alguma fantasia que não existe. Não sou um cavaleiro de armadura
brilhante.
— Bem, isso nós sabemos. Porque, até onde sei, não existem
cavaleiros chamados Sir Surliness ou Lord Grumpalot. Mas isso
não vem ao caso. Josie é uma mulher inteligente. Ela sabe
exatamente quem você é. No entanto, por algum motivo insano, ela
ainda se preocupa com sua bunda. Então conte-nos o que
aconteceu e tentaremos ajudá-lo a consertar.
Passei a mão pelo meu cabelo. — Não há nada para consertar.
A cafeteira apitou. Minha mãe estava encostada no balcão
observando-me com Opal, mas ela virou e abriu o armário acima
de sua cabeça, aquele onde eu guardava as canecas. Ela congelou
com uma na mão, olhando para o quintal pela janela. — Onde está
o caiaque que fica sempre no mesmo lugar do cais?
Quando não respondi rápido o suficiente, mamãe se virou. —
Fox, onde está o caiaque?
Isso não iria acabar a menos que eu lhes desse algo. Poderia
muito bem ser para isso que elas vieram. Fechei os olhos, porque
sabia a reação que minha resposta iria gerar. — Afundou no lago.
Comigo e Josie nele.
A cozinha ficou em silêncio. Imaginei os olhares sendo trocados
antes que os olhares de pena fossem dirigidos a mim.
Eventualmente, houve um barulho de louças e o som da cadeira
ao meu lado raspando no chão de ladrilhos. Quando abri os olhos,
fiquei surpreso ao descobrir que não havia canecas na mesa –
havia copos de shot. Mamãe pegou a garrafa de uísque que estava
na minha frente e serviu uma rodada. Nós três bebemos em
silêncio. Duas doses pareciam ter um efeito muito maior em mim
do que deveria. Pareceu reativar minha embriaguez. Minha cabeça
girou e me inclinei sobre o pequeno copo.
Mamãe estendeu a mão e pousou a mão no meu antebraço. —
Eu sei que é assustador, mas você não pode permitir que coisas
do seu passado o impeçam de ter um futuro.
— Eu não estou assustado. Estou fazendo um favor à Josie. Eu
a ajudei com alguns trabalhos na casa. Ela entendeu que isso
significava mais do que realmente significava.
Opal revirou os olhos. — Ela não estava vendo coisas que não
estavam lá. Ela estava vendo o que estava escrito em seu rosto.
Todos nós vimos isso. Você está louco por aquela mulher. Você tem
estado desde o primeiro momento em que colocou os olhos nela.
Eu zombei. — Você não sabe do que está falando.
— Eu vi você sorrir, Fox. Não o malvado que você mostra
quando um proprietário pensa que pode manipular você e escapar
impune, mas um sorriso de verdade, do tipo que começa por dentro
e se espalha para fora, fazendo todo o seu rosto se iluminar.
— Acho que você precisa de óculos.
Ela balançou a cabeça. — Sempre admirei sua inteligência. Mas
agora você está sendo um idiota.
Eu precisava me mudar. Esta cidade tinha muitas pessoas no
seu negócio e todos sabiam onde morava para passar por aqui e
compartilhar suas opiniões. Eu não tinha dúvidas de que Porter,
Rita, Frannie, Bernadette e Bettina – e todos os outros na discagem
rápida de Opal – chegariam em breve. Eu definitivamente
desligaria a campainha assim elas saíssem pela porta.
Eu bufei. — Terminamos?
Minha mãe pareceu desapontada, mas assentiu. Alguns
minutos depois, levei-as até a porta. Opal saiu primeiro, mas
mamãe ficou para trás.
Novamente ela beijou minha bochecha. — Espero que você se
recupere. Porque aquela senhorita ao lado é algo especial. Mas se
não se recuperar, pelo menos dê a ela um encerramento. Converse
e liberte-a. Você não foi o único que caiu forte.
Suas palavras atingiram como um soco no estômago. Mas ela
estava certa, então balancei a cabeça. — Tudo bem, mãe.
Quinta de manhã – pelo menos achava que era quinta – acordei
de madrugada, ainda agitado da noite anterior, com os pés
pendurados no sofá onde não cabia. Olhei em volta no escuro,
tentando descobrir que diabos era esse cheiro pungente. Então
levantei meu braço e cheirei minha axila. Droga, era eu.
Forçando minha bunda para cima, parei na cozinha para tomar
um café da manhã de campeões – três Motrin e uma palma cheia
de água da torneira na minha mão, na pia. Debati se deveria
esperar até que minha cabeça parasse de latejar para tomar
banho, mas tinha certeza de que foi isso o que fiz ontem e nunca
consegui. Então engoli tudo e subi as escadas.
A água quente caiu sobre meus ombros tensos. O que
normalmente fazia-me sentir bem era como agulhas espetando
minha pele hoje. Tudo doía – minha cabeça, meus ombros, meu
pescoço. Embora a maior dor viesse de dentro do meu peito. Doía
pra caralho, parecia que um elefante tinha estacionado sua bunda
gorda nas minhas costelas por alguns dias. Mas eu merecia.
Logo que lavei o fedor de mim, o sol já havia nascido. Um raio
irritante atravessou as persianas e abriu um caminho rude em
meus olhos turvos. Apertei os olhos e peguei as ripas de madeira.
Antes que eu pudesse achatar as peças ofensivas, eu a vi. Isso me
tirou o fôlego. Josie entrou no quintal carregando seu pato nos
braços. Ela o colocou na grama e deu alguns passos para trás. Mas
a coisa correu direto para ela, aninhando-se em suas pernas. Sim,
eu sabia, amigo.
Ela abaixou-se para coçar sua cabeça e sorriu, mas o sorriso
não alcançou seus olhos. Isso me fez sentir como se alguém tivesse
atirado um dardo e perfurado meu coração. Fiquei aqui
observando às escondidas por mais dez minutos, sentindo que
merecia cada grama de dor que isso causava, até que ela
finalmente pegou o pato e voltou para dentro.
Minha mãe estava certa sobre uma coisa: Josie merecia coisa
melhor do que eu tinha dado a ela. Então era hora de me preparar
e conversar. Quanto mais cedo ela seguisse em frente, melhor para
nós dois.
Vinte minutos depois, eu estava do lado de fora da porta da
frente dela. Minhas mãos estavam suadas e pensei em virar e
tomar uma ou duas doses antes de bater. Antes que eu pudesse
cagar ou sair do mato, a porta abriu.
Josie deu um pulo para trás. — Merda. Eu não esperava que
alguém estivesse aí.
— Desculpe.
Ela não estava sorrindo, mas vi algo brilhar em seus olhos.
Achei que poderia ser esperança. — Como vai você?
— Ok. Nós precisamos conversar.
Seus olhos encontraram os meus. Ela estava em guarda, mas
pareceu suavizar. Eu odiava que ela confiasse em mim tão
facilmente. — Claro. — Josie deu um passo para o lado.
O pato estava agora empoleirado na cama de cachorro mais
uma vez, assistindo à TV. Levantei meu queixo, gesticulando dessa
forma. — Você o encontrou.
Ela sorriu. — Ela. E ela me encontrou. Outra manhã ela
apareceu na minha porta.
Enfiei as mãos nos bolsos e balancei a cabeça. — Isso é bom.
Houve um momento de silêncio constrangedor. Quebrou
quando começamos a falar ao mesmo tempo.
Trocamos sorrisos hesitantes. — Você vai primeiro — eu disse.
— Não, você. Por favor.
Balancei a cabeça e limpei a garganta. — Sinto muito pelo outro
dia. Desaparecendo e tudo. Eu não deveria ter feito isso.
O rosto dela suavizou-se. — Tudo bem. Falei com Porter e ele
preencheu os espaços em branco. Eu sei sobre o lago... sobre Evie.
Minha mandíbula apertou.
Josie pegou minha mão. — Deve ter sido muito difícil para você
quando aconteceu. Tenho certeza que você já guarda muita coisa
há muito tempo. Mas quero que você saiba que estou aqui se
quiser conversar sobre isso. Eu também nunca fui uma pessoa que
discutia meus sentimentos, mas às vezes isso realmente ajuda.
Porra. Eu deveria ter tomado aqueles shots antes de vir. Aqui
estava eu, pronto para arrancar seu coração, e ela estava tentando
me consolar. Eu me senti o maior pedaço de merda do planeta.
Mas eu precisava arrancar o band-aid, mesmo que doesse.
— Josie, escute... acho que você deveria voltar para Nova York.
Ela piscou algumas vezes. — Você quer dizer voltar para ficar?
Eu balancei a cabeça.
— Sozinha?
Balancei a cabeça novamente.
A mão dela estava apoiada no meu braço, mas ela a puxou para
trás como se tivesse acabado de perceber que estava tocando um
fogão quente. — Você está falando sério agora?
— Eu nunca deveria ter deixado as coisas irem tão longe quanto
foram. Não é o que eu quero. — As últimas palavras tiveram um
sabor amargo, mesmo quando eu as soltei. Provavelmente porque
elas eram feitas de merda. Eu a queria, porra. Mesmo assim,
balancei a cabeça. — Sinto muito.
Sua voz aumentou. — Você sente muito?
— Olha, Josie, você tem todo o direito de estar chateada. Eu...
Ela me interrompeu. — É claro que tenho todo o direito de estar
chateada! Vim aqui para me curar, para me reencontrar. Eu não
estava pronta para começar algo novo. Quando você recuou depois
do fim de semana em que viajamos, fiquei triste, mas achei que era
o melhor. Eu não queria me apegar ainda mais se não fosse o que
você queria. Mas então você me atraiu de volta. Eu confiei em você.
— Eu sei. — Passei a mão pelo meu cabelo. — Estraguei tudo.
Desculpe. Eu não deveria ter deixado as coisas irem tão longe.
Seus olhos moveram-se ao redor, como se ela estivesse
tentando absorver tudo o que eu tinha acabado de dizer e
entender. Mas nem fazia sentido para mim, e as palavras saíram
da minha boca. Eventualmente, seu olhar encontrou o meu
novamente. — Por quê? — ela torceu.
— Por que o quê?
— Por que o que temos não é o que você quer? O que você não
gosta? O que há de errado conosco? Ou melhor ainda, diga-me o
que você quer.
— Eu... eu gosto de não estar amarrado.
Josie continuou balançando a cabeça. — Ridículo.
— Vou terminar tudo o que você precisa fazer na casa.
Ela franziu a testa. — Não, obrigada.
Eu não sabia mais o que dizer, então fui em direção à minha
casa. — Eu devo ir.
— Sim, você deveria.
A vulnerabilidade em seus olhos quando ela abriu a porta havia
desaparecido agora, fechada pela raiva e pela tristeza.
— Espero que possamos ser amigos — falei.
Josie abriu a porta da frente em resposta. Acho que deveria ter
ficado grato por ela ter parado de me dizer para não deixar isso
atingir-me na saída. Ela não falou novamente até que eu estava na
varanda.
— Não podemos ser amigos. Eu não gosto de covardes. Adeus,
Fox.
Josie
— Ei, Josie.
Forcei um sorriso e empurrei meus óculos escuros ainda mais
para cima do nariz. — Olá, Bernadette.
No dia seguinte, pensei em ir ao supermercado comprar um
pote de café em vez de parar no Rita quando percebi que estava
sem café. Agora eu estava me culpando por não ter feito isso.
Ela apontou para trás dela. — Você está indo para o Beanery?
— Estou. — Ela tinha um avental marrom amarrado na
cintura, então imaginei que ela estivesse trabalhando no
restaurante da irmã. — Você está ajudando Rita hoje?
— Eu abri para ela. Ela faz parte do clube de mães da turma
da escola dos filhos e foi vender bolos esta manhã. Mas ela está de
volta agora, então vou almoçar na casa de Bettina. Você que vir
comigo? Bettina fez torta de frango, então tem bastante.
— Obrigada pela oferta, mas tenho muito que fazer hoje.
— Outra hora, então?
— Claro.
— Vi Fox na semana passada, quando fui buscar Opal no
trabalho. O carro dela estava na oficina para colocar freios novos.
— Bernadette balançou a cabeça. — A mulher dirige por um mês
depois de ouvir o som de metal contra metal, mas fica surpresa
quando precisa sempre raspar os rotores. De qualquer forma,
entrei no escritório porque cheguei alguns minutos adiantada e
Fox estava lá. O homem sorriu para mim. Você sabe quanto tempo
faz desde que vi o sorriso daquele homem? Eu não tinha mais
certeza se ele ainda tinha dentes.
Acho que ainda não se espalhou a notícia de que ele havia me
largado – o que não era surpreendente, já que Fox odiava que todos
conhecessem o seu negócio. Mas eu não estava disposta a acender
o fogo da fofoca. Além disso, se eu tivesse que dizer as palavras em
voz alta, provavelmente acabaria chorando de novo. Já era ruim o
suficiente eu ter que me esconder atrás de óculos escuros hoje
porque meus olhos estavam muito inchados. Felizmente, meu
telefone tocou, dando-me uma desculpa na hora certa. Eu o tirei
da bolsa e segurei como prova, sem sequer verificar a tela para ver
quem era.
— Desculpe, Bernadette. Eu preciso atender. Estive esperando
por esta ligação. Mas foi bom ver você.
— Você também. Aproveite o clima hoje.
Apertei o botão Ignorar, mas levei o telefone ao ouvido enquanto
afastava-me, acenando. — Olá? — Assim que havia distância
suficiente entre mim e Bernadette, parei de fingir que tinha
atendido e abaixei o telefone novamente. Alguns passos depois, ele
apitou, avisando que eu tinha uma mensagem. Havia também uma
segunda mensagem de uma ligação que devia ter perdido enquanto
estava no banho mais cedo. Apertei para ouvir enquanto
caminhava o resto do quarteirão até a cafeteria.
— Oi. Esta mensagem é para Josie Preston. Meu nome é
Florence Halloran e estou ligando da Universidade Rehnquist.
Recebemos seu currículo para o cargo de professora adjunta e
queria marcar uma entrevista.
Meu coração afundou. Eu tinha esquecido completamente que
havia enviado uma inscrição online. Parecia ter sido há muito
tempo, mas foram apenas quatro ou cinco dias. No entanto, muita
coisa mudou. Devia me preocupar em ligar de volta para a mulher?
Eu consideraria ficar em Laurel Lake agora? Eu realmente gostava
daqui. A vida era mais simples e o ritmo não se parecia em nada
com Nova Iorque. E fiz muitos amigos – não muitos da minha
idade, mas tinha certeza de que conheceria muitas pessoas mais
jovens se conseguisse o emprego na Rehnquist. Senti uma
verdadeira conexão aqui – com a natureza, com a comunidade,
com meu pai. A única coisa com a qual as pessoas em Manhattan
estavam conectadas eram seus telefones. Mas eu poderia ficar aqui
e ver Fox na casa ao lado todos os dias? A ideia de parar na minha
garagem enquanto ele acompanhava outra mulher até sua casa
depois de um encontro me fez sentir enjoada.
Oh, Deus. Imagine se eu os ouvisse fazendo sexo através de
uma janela aberta?
O resto da mensagem da mulher de Rehnquist havia terminado
de ser reproduzida, embora eu não tivesse assimilado, porque
estava muito perdida em pensamentos. Mas não importava o que
ela tinha dito, já que eu não estava no espaço certo para tomar
uma decisão sobre ligar de volta para ela, então mantive a
mensagem, rolei para a próxima e apertei para ouvir.
— Olá, Josie. Esta é Lauren Cahill do RH da Kolax and Hahm.
Mandei um e-mail outro dia para você confirmar que retornará no
dia dez, ao final da licença médica. Não recebi resposta, então
pensei em fazer o check-in. Por favor, ligue quando tiver tempo.
Dois-um-dois...
Deslizei para cima para interromper a mensagem quando
cheguei à porta do Rita. Todos pareciam querer uma decisão
minha hoje, mas eu teria sorte se pudesse escolher o café que
queria. Joguei meu telefone de volta na bolsa e decidi concentrar-
me nisso primeiro. A cafeína tornaria mais fácil enfrentar o dia.
— Olá, Rita.
— Ei, Josie. O que posso oferecer para você hoje?
Olhei para o cardápio acima de sua cabeça. Li as primeiras
opções de café, mas nenhuma delas pareceu ser absorvida.
Suspirei. Deus, eu estava realmente indecisa hoje. — Quer saber,
quero um café preto grande, por favor.
Ela piscou. — Fox pede a mesma coisa.
Meus dentes cerraram. — Pensando bem, vou querer aquele
primeiro café especial listado ali em cima.
Ela se virou para verificar o quadro. — O macchiato de
caramelo?
— Sim, por favor. — Eu não tinha ideia do que era um
macchiato, mas não me importava. — Café puro é muito chato.
Rita sorriu. — Já está chegando.
Depois, parei no supermercado. O passeio de hoje já tinha sido
ruim o suficiente. Eu não queria ter que sair para um segundo
depois e conversar com mais pessoas. Enquanto estava ali, peguei
meio litro de sorvete – na verdade coloquei dois na cesta, mas
obriguei-me a colocar um de volta. Então peguei uma garrafa de
vinho e uma caixa de pizza congelada – todos os ingredientes para
uma festa de piedade na cama. Eu iria me permitir mais um dia
disso. Então eu chutaria minha própria bunda e terminaria o
trabalho que restava na casa. O que quer que eu decidisse, isso
precisava ser feito.
Eu estava em casa há dois minutos quando a campainha tocou.
Eu odiei que meu coração tivesse começado a disparar, esperando
que pudesse ser Fox. Mas quando abri a porta era apenas o
carteiro com um envelope expresso.
Ele estendeu um computador portátil. — Só preciso que você
assine aqui, Josie.
— Oh, tudo bem. Obrigada, Tom.
Eu não tinha pedido nada ultimamente, então não tinha
certeza do que poderia ser. De volta à casa, rasguei a aba. Dentro
estava meu passaporte e um envelope tamanho carta. Franzi a
testa, vendo a caligrafia familiar de Noah do lado de fora, em tinta
azul.
Josie,
Estou dando um salto de fé. Estarei naquele voo para Aruba. Dê-
me uma chance de mostrar que mudei e venha me encontrar. Eu amo
você.
- Noah
Suspirei e joguei o pacote no balcão da cozinha. Hoje era o dia
que as coisas continuavam acontecendo. Talvez eu precisasse
daquele segundo pote de sorvete, afinal.
Josie
Uma semana depois, eu estava na janela da cozinha,
observando a caminhonete de Fox parar na garagem. Não tivemos
contato desde que ele saiu da minha casa. Fiquei com vergonha de
admitir, mas no começo estava esperando que ele mudasse de
ideia, percebesse que havia cometido um erro e pedisse desculpas.
Mas com o passar dos dias, eu me senti uma idiota por considerar
que isso era mesmo possível. O homem era um homem de ideias
feitas. Ele gostava de sua vida organizada e descomplicada. Mas
pelo menos uma coisa boa saiu de mim tentando fingir que não
estava à espera dele: eu me mantive bem ocupada.
Olhei ao redor da casa. Pintura fresca, todo o ambiente tinha
teto de verdade, piso novo, eletrodomésticos, luminárias, ferragens
e deck. Eu tinha substituído algumas janelas, a casa tinha sido
lavada, a entrada de automóveis selada, e hoje eu substituí a
última das telas esfarrapadas. Estava quase irreconhecível como a
casa em que entrei há dois meses. Sentindo-me orgulhosa, tirei
algumas fotos e mandei uma mensagem para Nilda. Alguns
minutos depois, meu telefone tocou e sorri para a tela.
— Essa não é a mesma casa — disse ela quando respondi.
— Mas é. Tenho um buraco na minha conta bancária e dores
nas costas por causa de todo o esforço para provar isso.
— Parece incrível. Não acredito que você fez tudo isso sozinha.
Detestava dar crédito ao idiota, mas não podia mentir para
Nilda. — Na verdade, eu não fiz tudo sozinha. Fox é um empreiteiro
e ajudou muito.
— Ah, que maravilha! O Sr. Rabugento Cabeça Quente, que é
atencioso, ferozmente leal e devastadoramente bonito, também é
útil! Parece bom demais para ser verdade.
Palavras verdadeiras nunca foram faladas. Pena que eu tinha
caído em sua atuação: anzol, linha e chumbada 9 . Suspirei. —
Acontece que ele era, Nilda.
— Oh, não. Você está bem?
Eu não gostava de mentir, mas não queria que ela se
preocupasse. Ela já tinha o suficiente em mente com sua
mudança. — Estou bem. Afinal, ele não era meu tipo. — Respirei
fundo e segui em frente. — Quando você vai para a Carolina do
Sul?
— Quatro dias. Depois de amanhã é meu último dia com a Dra.
Preston e saio na terça de manhã.
Deus não permitisse que mamãe a ocupasse, devia lhe dar
algum tempo para respirar depois de vinte e cinco anos de
emprego. Apostava que ela nem estava fazendo nada de especial
no último dia. Nilda merecia uma festa.
9
Usado para enfatizar que alguém foi completamente fisgado.
Com isso, uma lâmpada acendeu na minha cabeça. Ela merecia
uma festa. Tudo havia sido feito agora aqui. Não havia razão para
eu não voltar e organizar uma.
Tão rapidamente quanto o pensamento surgiu, virei-me para
olhar a casa ao lado. Mas forcei meus olhos a desviar e me
repreendi interiormente.
Não.
Não, não, não.
Eu acabei por aqui. Cansei de chafurdar. E a saída de Nilda era
importante. Eu não deixaria um homem virar-me de cabeça para
baixo novamente.
— Você jantará comigo na sua última noite? — perguntei.
— Eu pensei que você voltaria depois da minha partida?
— Mudança de planos. Estou voltando para casa.
— Significaria muito para mim uma última noite aqui com você,
Josie.
Eu sorri. Esta foi a decisão certa. — Vejo você na segunda à
noite.
— Boa viagem para casa, querida.
Depois que desliguei, comecei a trabalhar. Liguei para a única
oficina mecânica em Laurel Lake e marquei um horário para trocar
o óleo e verificar os pneus. Depois liguei para uma corretora de
imóveis que conheci na festa que Bernadette Macon deu quando
cheguei. Lynn Walker era amiga do meu pai na escola primária e
era dona de uma das duas agências da cidade. Ela disse que
passaria aqui na manhã seguinte para dar uma olhada na casa e
discutir o aluguel novamente.
Com as grandes coisas resolvidas, depois do jantar decidi me
servir de uma taça de vinho, sentar e escrever uma lista de tarefas
do que precisava ser feito antes de partir, depois de amanhã.
Depois de três tarefas, meu telefone tocou.
Opal.
Achei que era seguro responder. Eu poderia ter acreditado que
Fox havia se apaixonado por mim, mas tinha certeza de que ele
não estava espalhando fofoca. Então atendi.
— Oi, Opal.
— Eu vou matar aquele homem!
Ah, ah. Aparentemente, tinha me enganado mais do que
pensava sobre o vizinho. Mesmo assim, fingi não saber do que ela
estava falando. Só para garantir... — De quem estamos falando?
— Aquele meu chefe idiota. Eu sabia que havia uma razão para
ele ter sido particularmente odioso na última semana e meia.
Suspirei. Imaginei que isso iria sair mais cedo ou mais tarde.
Embora preferisse que fosse mais tarde, depois que eu tivesse
partido. — Ele disse a você...
— Eu juntei dois mais dois. Ele demitiu três subcontratados
esta semana, não consegue largar nada sem bater e parece que
não dorme há um mês. Ele tentou fingir para Porter que estava
estressado porque um de nossos trabalhos estava demorando
muito. Mas então Regina Watson ligou.
— Quem?
— Eu não acho que você a conheceu ainda. Regina joga boliche
com Bob nas noites de sexta-feira. Ela é uma jogadora muito boa.
Dá uma coça em todos os homens.
Eu estava perdida. — Ok...
— Bob é Bob Walker. Ele é casado com Lynn, a corretora de
imóveis com quem você está conversando sobre anunciar a casa
para alugar. Lynn mencionou isso ao marido, que mencionou isso
a Regina no boliche hoje à noite, e Regina me ligou. Agora faz
sentido porque o chefe está ainda mais mal-humorado. Você está
indo embora. E meu palpite é que ele fez algo para causar isso.
Ah, Jesus Cristo. Eu não conseguia acompanhar o jogo do
telefone que essas pessoas jogavam. Mas o gato estava fora do
saco. Exalei. — Eu estou partindo. Mas Fox não fez nada comigo.
De verdade. Ele e eu só... não estamos procurando a mesma coisa.
— Quando você vai embora, querida?
— Depois de amanhã.
— Bem, então precisamos fazer a festa amanhã!
— Quanta gentileza. Mas não quero festa, Opal. Eu realmente
não estou com vontade disso.
— Se você preferir uma festa pequena, eu posso fazer isso. Que
tal apenas algumas garotas então?
Não passou despercebido que uma mulher que conheci há
apenas dois meses estava pronta para se apresentar e dar uma
festa para mim com um dia de antecedência, mas minha mãe nem
sequer levou Nilda para jantar. Laurel Lake era um lugar especial.
Não seria certo se eu escapasse sem me despedir de algumas de
suas pessoas especiais.
— Isso parece perfeito, Opal.
— Ótimo. Vou ligar para a turma e configurar tudo e retorno
com os planos. Mas que tal amanhã à noite, às sete?
— Ok.
— Boa noite, querida.
— Boa noite, Opal.
Algumas acabaram sendo doze. Mas também acabou sendo
exatamente o que eu precisava depois de um dia inteiro fazendo as
malas. Opal havia combinado o jantar em um restaurante
mexicano alegre, a duas cidades de distância, com uma animada
banda de mariachis e uma longa lista de margaritas. Quando
entrei, ela me abraçou e sussurrou: — O idiota odeia esse tipo de
lugar. Ele nunca pisaria aqui. — Isso me ajudou muito a relaxar e
aproveitar a noite. Todo mundo já tinha ido embora, e éramos só
eu e Opal à mesa, tomando sorvete frito.
— Obrigada por organizar isso. Você me fez sentir como uma
família desde o momento em que cheguei, Opal.
— Você é da família, querida. Seu pai cresceu aqui e nós
cuidamos dos nossos. Mas parece que é uma obrigação. — Ela
balançou a cabeça. — Com você, é uma honra.
Meus olhos encheram-se de lágrimas. Grande parte de mim
não queria sair daqui. Depois de dois meses, este lugar parecia
mais um lar do que minha própria casa jamais havia sido. Opal
estendeu o braço por cima da mesa e cobriu minha mão com a
dela.
— Ele é louco por você — disse ela. — Eu sei que ele é.
— Ele tem uma maneira engraçada de mostrar isso.
— O homem pode continuar patinando depois de levar um
pedaço de pau na cabeça. Ele é o cara mais durão que conheço.
Mas ele não consegue superar o que aconteceu.
Isso podia ser verdade, mas eu prometi a mim mesma que
nunca me contentaria com um homem que não estivesse disposto
a devolver-me o que eu daria a ele. — Não posso ficar esperando
por algo que pode nunca acontecer. Você sabe como ele é, tudo é
preto e branco. Eu não existo mais para ele.
— Eu acho que você está errada nisso. Ele pode não estar mais
batendo na sua porta, na verdade, aposto que aquele idiota
mantém a cabeça trancada quando sai de casa porque ele não se
permite ver você de relance, mas você, você está aqui... — Opal
bateu no coração. — Ele pode fingir o quanto quiser, mas você
existe em um lugar que ele não pode ignorar para sempre. Talvez
ele mude de ideia.
— Não consigo envolver minha vida em um talvez.
— Claro que não. Você tem que fazer o que é melhor para você.
— Cuide dele, sim, Opal?
— Você sabe que eu vou. Quer o idiota mal-humorado goste ou
não.
Fox
Por que fazer a coisa certa sempre parecia uma merda?
Fiquei no quarto de hóspedes no segundo andar, observando-a
através das cortinas quase fechadas enquanto ela arrumava o
carro. Parecia errado por mil razões. Josie acabara de colocar uma
caixa no banco de trás. Ela parou a meio caminho da porta e usou
as costas da mão para enxugar o suor da testa.
— Por que você não abre as persianas? — ela gritou enquanto
olhava para frente. — É menos assustador.
Merda. Eu pulei para fora da vista da janela, com as costas
encostadas na parede ao lado dela. Meu coração batia forte como
o de um criminoso que acaba de ser pego em flagrante. Porra.
Talvez eu fosse um. Depois de recuperar o fôlego, inclinei-me para
frente e dei uma rápida olhada para fora. Josie estava saindo de
casa com outra caixa e parecia que estava lutando para carregá-
la. A meio caminho do carro, ela caiu, tombou e o papelão rasgou.
A merda começou a rolar pela calçada.
Porra. Eu não podia ver isso. Corri até lá como uma espécie de
herói e comecei a falar com ela. Josie ergueu a mão, sem erguer os
olhos. — Eu consigo.
— Apenas deixe-me ajudar.
— Você já fez o suficiente.
— Jos...
Ela olhou para cima e estreitou os olhos, como se estivessem
carregados de adagas que ela estava tentando atirar em mim. Mas
foram as coisas que ela não conseguiu encobrir que fizeram meu
peito doer. Seus olhos estavam inchados de tanto chorar e
rodeados de olheiras.
— Não — ela retrucou. — Você não vem até mim, como se eu
fosse a ridícula. Quem está sendo ridículo é você. Você não olha
na minha direção há duas semanas, e hoje você corre até aqui
como se eu fosse uma espécie de donzela em perigo. Eu não sou.
Não preciso da sua ajuda e não a quero. Você só quer se sentir
melhor.
Fiquei ajoelhado ao lado da caixa enquanto ela jogava a merda
dentro dela, sem saber meu próximo movimento. Mas o próximo
passo não foi meu, aparentemente, foi de Josie.
Ela se levantou, tirou a poeira das mãos e marchou para dentro
de casa. Como ela não bateu a porta atrás dela, tomei isso como
um sinal de que ela estava voltando. Pelo que eu sabia, ela poderia
estar pegando um taco para me acertar na cabeça, e parte de mim
esperava que fosse isso que ela estivesse fazendo, porque eu
merecia. Mas o que ela trouxe de volta doeu muito pior.
Josie estendeu um cheque. — Eu pesquisei quanto teria
custado todo o trabalho que você fez na casa. Isso deve cobrir tudo.
Quando não levantei o braço para tirar o cheque da mão dela,
ela agitou-o enquanto sua voz subia algumas oitavas. — Pegue o
maldito cheque.
Eu fiquei de pé. — Não vou aceitar o cheque, Josie.
Ela o enfiou no meu peito. — Pegue o maldito cheque!
Levantei as mãos e dei um passo para trás. — Eu não vou
aceitar o maldito cheque. Fiz esse trabalho porque me importo com
você e queria. Não porque fosse um trabalho.
— Você se importa comigo. — Ela riu loucamente. — Você quer
dizer importava. Passado.
— Não é desse jeito.
— Não? Então me diga como é, Fox. Porque num minuto
estávamos passando um fim de semana em uma pousada e você
estava fazendo amor comigo, e no minuto seguinte fui jogada no
meio-fio como lixo.
Enterrei as duas mãos no meu cabelo, puxando. — Isso é o
melhor para você.
— Melhor para mim? Você não decide o que é melhor para mim.
Não havia nada que eu pudesse dizer que ela não me
devolvesse. Ela não entendia como as coisas funcionavam com um
bastardo egoísta como eu. Evie também não sabia. Abaixei a
cabeça. — Sinto muito.
Ela suavizou. — Eu também. Você poderia, por favor, aceitar
este cheque?
— Vou aceitar, mas não vou descontar.
Isso pareceu acalmá-la por enquanto. Enfiei o cheque no bolso
e ela marchou para dentro da casa novamente. Quando ela voltou,
inclinei-me para frente e dei uma espiada lá dentro. A casa estava
vazia – até os cartões nas paredes haviam sumido.
Josie empurrou a caixa no banco de trás e fechou a porta. Ela
deu a volta até a traseira do SUV e bateu a porta, voltando sua
atenção para mim. — Dei todos os móveis ou joguei fora. A
imobiliária disse que é melhor alugar sem mobília. Mas vou deixar
a casa da Margarida lá atrás. Você poderia pelo menos ficar de olho
nela para mim?
Enfiei as mãos nos bolsos. — Claro.
— Obrigada.
— Quando você vai embora?
— Antes do sol nascer amanhã de manhã.
Engoli. — Ok.
Ela ficou quieta até que meus olhos se levantaram e
encontraram os dela. — Adeus, Fox.
Porra. Doeu mais do que qualquer osso que quebrei em meus
vinte anos jogando hóquei. Parecia que todo o ar tinha sido
espremido dos meus pulmões. Eventualmente consegui murmurar
duas palavras.
— Tchau, doutora.
Fiquei na porta da frente às quatro da manhã, observando as
luzes traseiras desaparecerem no quarteirão. Eu não dormi a noite
toda. Não consegui fechar os olhos o tempo suficiente para tentar.
Mesmo depois que o carro virou a esquina e não havia mais nada
para ver, continuei ali olhando, perdido em pensamentos. Às seis,
os caminhões de lixo passavam pela rua. Olhei para o meio-fio ao
lado e vi que nenhuma lata havia sido colocada. Ela tinha que tirar
o lixo depois de arrumar o que restava da casa. Então fui até a
porta ao lado para verificar.
Ambas as latas estavam cheias, então levei-as até o final da
entrada, quando o pessoal do saneamento aproximava se da casa.
— Bom dia, Fox.
Eu balancei a cabeça. — Hank.
Hank abriu a tampa da primeira lata e jogou o conteúdo na
traseira do caminhão. Eu não conseguia me afastar, então resolvi
ajudá-lo e retirei a parte de cima da segunda.
Hank jogou a primeira lata de volta no meio-fio e agarrou a
segunda. Quando ele a levantou, o conteúdo chamou minha
atenção.
Eu coloquei minha mão para cima. — Espere um segundo.
Hank parou, colocando a lata de volta no lugar. — Algo errado?
Estava escuro. Achei que poderia ter chegado à conclusão
errada, então enfiei a mão e peguei parte do conteúdo de uma caixa
que estava aberta dentro da lata. Com certeza, eram cartões de
Natal – todos os que ela tinha nas paredes, todos de pessoas daqui
de Laurel Lake.
Jesus Cristo. Eu tinha fodido tudo tão regiamente que ela não
acreditava mais na fantasia que carregava consigo há quinze anos.
Meu rosto esquentou. — Você está demitida.
A resposta de Opal foi gargalhar. Ela acenou-me com a cabeça
e sentou-se atrás de sua mesa. — Oh, por favor. Sua ideia de
digitar é digitar dez palavras por minuto com dois dedos
indicadores, você não sabe usar nenhum software, e fazer a folha
de pagamento é assinar os cheques depois de calcular todos os
impostos e deduções. A última vez que tive um dia de folga e a
impressora ficou sem tinta, você dirigiu quarenta minutos até a
Best Buy mais próxima e comprou uma nova, porque não
conseguiu descobrir como trocar o cartucho sozinho. — Ela
balançou a cabeça. — Eu não estou demitida. Na verdade, acho
que mereço um aumento.
Porter entrou no escritório no meio do discurso de Opal. O filho
da puta lançou-me um sorriso de pena. — Rabugento porque Josie
foi embora — disse ele.
— Dê o fora!
— Ele está infeliz — disse Opal. — O maior erro de sua vida, e
ele sabe disso.
Porter assentiu. — Ainda me arrependo de ter terminado com
Stacey Krans quando tinha vinte anos. Pensei que ser amarrado
era estúpido quando eu era tão jovem. Agora ela é casada, tem um
filho e possui uma academia de ginástica. Tem uma aparência
melhor do que tinha na época.
Isto era mesmo a minha vida? Esses dois idiotas... inspirei
profundamente por paciência e apaguei tudo. — O que você quer,
Porter?
— O pessoal do azulejo trabalhando em Two Lakes disse que
não consegue terminar amanhã. Vamos precisar de mais dois dias,
então teremos que adiar as entregas dos eletrodomésticos.
— Besteira. Diga-lhes para trazerem trabalhadores extras até
esta tarde e não voltarem para casa até que tudo termine. Eles vão
terminar na hora certa.
Porter olhou para Opal. Ela assentiu. — Vou ligar para a
empresa de entrega e transferir para quinta-feira, caso dois dias
se transformem em três.
— Obrigado, Opal.
— Sem problemas, querido.
Joguei meu lápis para o alto enquanto Porter saía.
— O que diabos você pensa que está fazendo? — eu rosnei. —
Eu administro esta empresa, não você.
— Bem, então tire a cabeça da sua bunda e faça isso. Will
Rupert é o cara dos azulejos nesse trabalho. Sua mãe foi colocada
em aparelhos de suporte vital na semana passada, e sua esposa
de 33 anos está no meio da segunda rodada de quimioterapia para
o câncer de mama. Eles também têm dois filhos menores de cinco
anos. Não há nenhuma boa razão para não adiarmos a entrega dos
eletrodomésticos e dar-lhe uma folga.
— Tudo bem — eu resmunguei entre os dentes cerrados.
Opal suspirou e levantou-se, depois caminhou até minha mesa
e parou.
— Escute, querido. Eu entendo que você está sofrendo. Você
fez algo estúpido. Você deixou aquela mulher ir embora ontem e
está atacando, porque acha que vai fazer você se sentir melhor
magoar outras pessoas. Eu estive lá uma ou duas vezes. Mas você
sabe o quê? Não funciona. Você acabará se odiando ainda mais.
Minha mandíbula apertou enquanto eu olhava para ela. Quase
pude sentir o vapor saindo do meu nariz.
— Você ama aquela garota. Eu sei que você ama. — Opal
levantou-se da minha mesa e voltou para a dela. Ela abriu uma
gaveta, tirou a bolsa e colocou-a no ombro. — Então pare de ser
covarde e descubra como se curar antes que seja tarde demais
para recuperá-la.
Fox
— Sim, eu ouvi você...
O maldito pato parecia tão triste e solitário quanto eu. Eu
poderia jurar que apenas suspirei. Nas últimas noites, passei a
sentar na varanda dos fundos da casa de Josie. Na primeira noite,
a coisa me assustou muito. Ele saiu valsando da casinha de
cachorro, apareceu atrás de mim e mordeu meu dedo. Depois
disso, ele ficou mais amigável. Ele parecia estar esperando pelas
minhas aparições noturnas. Achei que ele não estaria por perto
agora, já que era meio-dia, mas ele apareceu há cerca de cinco
minutos e juntou-se a mim. A miséria adorava companhia,
supunha.
— O que você acha que ela está fazendo agora?
Nenhuma resposta. Margarida – o pato macho com nome de
fêmea – olhou para mim como se eu fosse louco. Talvez eu
estivesse. Afinal, deixei a melhor coisa que já aconteceu comigo
sair pela porra da porta. Não. Balancei a cabeça. Eu não a deixei
ir, eu a empurrei para fora.
O pato apoiou o bico amarelo na minha coxa.
O som de uma caminhonete parando interrompeu meu olhar
para o nada. De onde eu estava sentado, eu podia ver
diagonalmente a entrada da minha garagem. Não havia nada lá,
exceto minha caminhonete, então imaginei que devia estar do
outro lado da rua. Pelo menos até ouvir o som de passos roçando
a grama. Virei-me para encontrar Porter caminhando em minha
direção.
— Ei, o que você está fazendo aqui? — ele disse.
— Eu moro aqui. O que diabos você está fazendo aqui?
Ele ergueu a chave na mão e apontou para a porta dos fundos
de Josie. — Vim buscar uma coisa.
Eu semicerrei os olhos. — Daqui?
Porter assentiu. — Josie esqueceu algo.
— Por que diabos ela está ligando para você?
Porter sorriu. — Você não tem ideia do quanto eu quero dizer
que ela me deixou a chave e mantemos contato, só para irritar
você. Mas já vi você nocautear caras com o dobro do meu tamanho
com um soco. Portanto, não estou arriscando, por mais tentador
que seja.
Eu não tinha paciência para essa merda. — Que porra você
está fazendo aqui, Porter?
— Josie deu a Opal uma chave para emergências antes de
partir. Ela ligou esta manhã e disse que percebeu que havia
deixado algo de que precisava e perguntou a Opal se ela se
importaria de pegar e entregar durante a noite. A gata da Opal
engoliu um pombinho, então ela ligou e pediu para eu pegar e levar
ao correio para que ela pudesse ir ao veterinário.
— O que Josie deixou?
Porter encolheu os ombros. — Não sei. Um envelope na
prateleira do armário do quarto à esquerda no andar de cima. —
Ele apontou para o suporte de papelão ao meu lado. Restavam
cinco. — Posso pegar uma dessas?
Eu não estava com muita vontade de ter companhia, mas fui
um idiota gigante com todo mundo nas últimas semanas, então
tirei uma garrafa do suporte e estendi para ele.
— Obrigado.
Eu balancei a cabeça. Eu esperava que ele levasse a coisa
embora, mas não tive essa sorte. Ele se sentou do outro lado de
Margarida e tirou a tampa.
— Este é seu único amigo? — Ele apontou a cerveja para o pato
antes de levá-la aos lábios.
— Sim. Não fala muito. Você deveria seguir o exemplo dele.
Porter acariciou a cabeça do animal e olhou para o lago. Uma
família de cisnes nadou. Eles diminuíram a velocidade quando
chegaram à nossa frente e olharam. Margarida não estava
gostando muito disso. Ele se levantou e pulou da varanda, batendo
as asas e grasnando enquanto corria em direção à beira do lago.
Os cisnes geralmente não se assustavam facilmente, mas
receberam o memorando de Margarida. Feito o trabalho, ele voltou
para o deck.
Porter riu. — Opal mencionou que Josie pegou um pato um
tempo atrás. Eu acho que é ele?
— Sim.
— Ela deu um nome a isso, certo?
— Margarida.
As sobrancelhas de Porter se juntaram. — Você sabe que é um
macho, certo? Os machos são mais ásperos. O som da fêmea é
mais suave.
— Sim.
Ficamos sentados em silêncio por alguns minutos enquanto
Porter terminava sua cerveja. Assim que acabou, ele colocou a
garrafa vazia de volta no suporte de papelão.
— Eu gosto dela — disse ele. — Josie, não o pato.
Bebi minha cerveja enquanto olhava para frente. Porter ainda
não entendeu a dica.
— Eu pensei que ela era boa para você. Você merece ser feliz,
chefe.
— Sim? Então você deveria sair daqui. Isso vai ajudar muito a
me levar até lá.
O idiota sorriu e se levantou.
Estendi minha mão. — Dê-me a chave. Vou pegar o que ela
deixou e levar ao correio.
— Oh, não. Tudo bem. Entendi.
— Não estava pedindo, Porter.
Ele hesitou, mas quando viu a expressão em meu rosto, cedeu
e colocou a chave na palma da minha mão. — Tudo bem então,
obrigado. Os correios fecham cedo no sábado, então você precisa
ir logo. Opal vai me dar uma surra se não for enviado hoje.
— Entendi.
Ele assentiu e acenou. — Tenha um bom fim de semana, chefe.
Esperei até terminar minha cerveja e ouvi sua caminhonete se
afastar antes de me levantar e entrar. Um passo e já me arrependia
de ter pegado a chave de Porter. O lugar ainda cheirava a ela. Eu
não sabia como isso era possível depois de uma semana, mas
aconteceu. Senti um cheiro profundo de tortura e fechei os olhos.
Porra. Eu sentia falta dela. Sentia falta de cheirá-la. Sentia falta
de vê-la sorrir para mim, apesar de eu nunca ter merecido. Sentia
até falta dos cartões pendurados na parede. Era como um soco no
estômago estar aqui. Mas eu merecia.
Eu me atormentei um pouco mais na cozinha, imaginando-a
parada diante da cafeteira, vestindo minha camisa da noite
anterior, com cartões de Natal idiotas pendurados nas paredes
atrás dela. Ela sorria para mim enquanto estendia a mão para
pegar as canecas, revelando sua bunda nua e perfeita. Porra, eu
era realmente um idiota.
No andar de cima, abri a porta do quarto à esquerda – o quarto
de Josie – e parei dois passos para dentro. Estava vazio. Outro
golpe no estômago. Olhei para as marcas no tapete onde ficava a
cama e imaginei que ela ainda estava ali. Eu fiz amor com ela
naquela cama. Não fazia isso há anos. Já fazia tanto tempo que eu
nem lembrava que havia uma diferença entre foder e fazer amor.
Mas havia, e a diferença deixou um buraco no meu coração.
Forcei-me a ir para o armário. Também estava vazio, nem
mesmo um cabide foi encontrado. Estendendo a mão, procurei na
prateleira o que ela havia deixado para trás. Era um daqueles
envelopes de serviço social, do tamanho de um pedaço de papel. O
endereço do remetente era um lugar na cidade de Nova York.
Pensei em não olhar para dentro por cerca de meio segundo, mas
rapidamente justifiquei minha intromissão dizendo a mim mesmo
que precisava ter certeza de que havia alguma coisa dentro. Seria
estúpido enviar um pacote vazio.
A primeira coisa que tirei foi um passaporte. Abri-lo e ver o
rosto sorridente de Josie deu um soco duplo. Fiquei olhando para
ele por muito mais tempo do que o necessário. Felizmente eu tinha
que levar essa coisa ao correio antes que fechasse ou não saberia
quanto tempo eu ficaria sentado aqui. Saindo do armário, fui
colocar o livrinho de volta no envelope. Mas quando o coloquei,
percebi que havia mais dentro. Não havia motivo para eu tirar o
resto, obviamente o envelope não estava vazio, mas fiz isso mesmo
assim.
E meu coração parou quando li o bilhete.
Josie,
Estou dando um salto de fé. Estarei naquele voo para Aruba. Dê-
me uma chance de mostrar que mudei e venha me encontrar. Eu amo
você.
- Noah
Era isso que ela precisava esta noite? Tirei os papéis do
envelope e os desdobrei. Meus olhos mal conseguiam ler as
palavras impressas, porque minhas mãos tremiam a página com
muita força. Mas eu escolhi as partes importantes.
Ritz Carlton Aruba 12/09-19/09
Delta Airlines partida às 6h00 – Aeroporto JFK em 12/09
Meu coração disparou fora de controle. Ela estava viajando com
aquele idiota? Em dois dias. Uma ova que iria enviar esta merda
pelo correio.
Mas depois de alguns minutos de raiva, minha pressão arterial
reduziu para fogo brando. Passei as mãos pelo cabelo. Que direito
eu tinha de impedi-la de fazer alguma coisa? Eu a chutei para o
meio-fio para que ela pudesse ser feliz. Mas seria esse idiota do
Noah realmente quem a faria feliz? O idiota a traiu. Parecia errado,
contra todos os meus instintos, enviar o envelope. Mesmo assim,
cerrei os dentes e desci as escadas, trancando a porta atrás de
mim.
Durante todo o trajeto até o correio, continuei a debater o
assunto.
Ela podia ficar com qualquer homem que ela quisesse. Estaria
enviando.
O idiota que se danasse. Ele não a merecia. Talvez até mais do
que eu não a merecia. Não estaria enviando merda nenhuma.
Eu a machuquei. Se isso era o que era preciso para ela ser feliz...
enviaria.
Esse idiota só iria machucá-la ainda mais. Não. Não enviaria.
Então me dei conta. Talvez ela só quisesse o passaporte e não
tivesse intenção de fazer aquela viagem.
Mesmo assim, ela precisava dele esta noite e o voo era daqui a
dois dias.
Eu cambaleei para frente e para trás durante todo o trajeto
antes de chegar ao correio dez minutos antes de fechar. Perdi
outros cinco debatendo se deveria entrar. No final das contas,
concluí que Josie era esperta demais para aceitar aquele idiota do
Noah de volta e que ela havia pedido o passaporte esta noite porque
era mais seguro do que enviá-lo por correio normal.
Sim, era isso. Pelo menos foi isso que me convenci quando me
aproximei do balcão. Frannie, a grande fofoqueira do governo, fez
uma careta ao me ver. Acho que todo mundo sabia agora.
— O que posso fazer por você, Fox?
— Você tem um daqueles envelopes para correios noturnos10?
Ela se abaixou e pegou um, deslizando-o sobre o balcão. —
Fechamos em quatro minutos. Vá até lá enquanto você preenche
para que eu possa atender a próxima pessoa.
10
Significa correio expresso ou prioritário com confirmação de entrega ou serviço noturno com sistema de
rastreamento on-line.
Olhei para trás, pensando que alguém tinha vindo atrás de mim
e eu não tinha ouvido. Não. Completamente vazio. Não importava.
Fui até o pequeno balcão no canto e peguei uma caneta
acorrentada. Mas quando coloquei um ponto no envelope para
escrever, percebi que não sabia o maldito endereço de Josie.
Ótimo. Simplesmente ótimo.
Percorri meus contatos até chegar ao nome de Opal e apertei
para ligar. A saudação dela foi tão calorosa quanto a de Frannie.
— O que você quer?
Eu balancei minha cabeça. — Preciso do endereço de Josie em
Nova York.
— Por quê?
— Eu trouxe o envelope que Josie quer que seja enviado para
ela. Percebi que não tinha o endereço dela.
— Por que Porter não o levou?
Suspirei. — Posso explicar isso para você outra hora? O correio
fecha em dois minutos e Frannie não vai ficar aqui três por minha
causa.
— Está bem. Dê-me um segundo. Está na minha bolsa e estou
com Ernestine no consultório do veterinário.
Ela desapareceu e voltou à linha um minuto depois.
— 220 East Eighteenth Street. Nova York, Nova York, Um-zero-
zero-zero-três.
— Obrigado.
Fui desligar meu telefone e então pensei melhor e coloquei meu
celular de volta no ouvido. — Opal?
— O quê?
Demorou alguns batimentos cardíacos para sufocar as
palavras. — Ela está realmente voltando com Noah?
Houve uma longa pausa, especialmente longa para Opal, que
achava que era seu dever encher o ar de palavras sem parar. Sua
voz estava baixa quando ela finalmente respondeu. — Sim, ela
está.
Porra.
Porra. Porra. Porra!
Meu peito apertou tanto que me perguntei se estava tendo um
ataque cardíaco.
— Fecharemos em trinta segundos — gritou Frannie. — Se você
quiser enviar algo, vá em frente, Cassidy.
Engoli em seco e caminhei até o balcão atordoado.
Frannie olhou para mim. — Bem? Entregue-o.
Levantei o envelope até o balcão e o deslizei para o lado dela.
Ela foi pegá-lo, mas eu não conseguia soltá-lo.
— Você realmente tem que me dar o envelope para enviá-lo.
Olhei para ela, ou talvez através dela, porque na verdade não
estava vendo nada além de meu futuro desaparecer.
Frannie franziu a testa. — Agora ou nunca, Cassidy.
Pisquei de volta para o momento. — Você sabe o quê? Pensando
bem, vou entregar isso pessoalmente.
Josie
Estendi a mão para o interruptor de luz e virei-me para olhar o
laboratório vazio com um suspiro. Eu já fui feliz aqui? Em um
determinado tempo, pensei que sim. Mas talvez estivesse
confundindo sucesso com felicidade. Deus sabia que minha mãe
me ensinou que eles eram a mesma coisa.
Desliguei o interruptor e fechei a porta. Já tinha voltado há
uma semana e não tinha ficado mais fácil – nem ir para o trabalho,
nem ir para casa, para o meu apartamento vazio, nem a dor no
meu coração. Peguei o elevador até o térreo e passei pela catraca,
saindo na movimentada rua de Manhattan. Por mais que todos
que estivessem no seu negócio em Laurel Lake pudessem ser
muitos, havia algo de bom em passear e todos dizerem olá. Eu
sentia falta disso. Aqui, sentia-me invisível.
A caminhada do meu escritório até o apartamento durou pouco
mais de meia hora. Normalmente eu pegava o metrô, mas esta
noite precisava de ar fresco. Olhei para o concreto como metade
dos passageiros, evitando contato visual, perdida em
pensamentos.
No pouco tempo que fiquei em Laurel Lake, ela se tornou minha
casa. Aqui tudo que eu tinha eram quatro paredes, tijolos e vigas.
Eu morava no mesmo apartamento há sete anos e não tinha tantas
lembranças boas lá dentro quanto na casa na Rosewood Lane.
Claro, muitas delas foram com Fox. Mas gostei de quem me tornei
enquanto morava lá. O eu que apreciava a beleza de um pôr do sol,
passava um tempo ouvindo histórias contadas pelos amigos de
setenta anos do meu pai e plantava na terra. O eu que assumiu
trabalhos de construção – claro, às vezes eu mordia mais do que
conseguia mastigar e precisava de ajuda, mas pelo menos mordia.
Aqui eu não mordia nada. Eu ia para o trabalho. Voltava para casa,
para meu apartamento caro. Talvez fosse jantar ou beber com um
amigo uma ou duas vezes por semana. Lavar. Enxaguar. Repetir11.
Será que eu poderia sair de Nova York e fazer de Laurel Lake
meu lar? Ou seria muito doloroso estar tão perto do homem ao
lado?
Fox. Sempre que pensava nele, sentia-me como se tivessem me
tirado o fôlego. Como se houvesse um vazio no meu peito que eu
ansiava por preencher.
Eu sentia falta dele.
Sentia falta do jeito que ele falava apenas algumas palavras,
mas dizia muito.
11Usado para indicar a repetição contínua de uma ação ou sequência de eventos,
normalmente de uma forma considerada cansativamente previsível.
Eu sentia falta da maneira como ele era ferozmente protetor
com as pessoas de quem gostava, mesmo que fingisse que isso o
irritava.
Eu sentia falta do jeito que ele não conseguia deixar de ser um
cavalheiro, mesmo que isso o deixasse mal-humorado. Como
quando eu bati na caixa de correio dele e percebi que estava
trancada do lado de fora da casa na noite em que cheguei, mas ele
ainda carregou minha bagagem.
Sentia falta do jeito que ele não era um cavalheiro na cama.
Caminhei no meio de uma neblina, de alguma forma
manobrando entre as multidões de pessoas na calçada e não
colidindo com nenhuma delas. Quando finalmente cheguei ao meu
prédio, percebi que não me lembrava de metade da viagem para
casa. No elevador, as pessoas entravam e saíam. Os rostos eram
familiares e alguns provavelmente moravam aqui há tanto tempo
quanto eu, mas eu não sabia nenhum de seus nomes.
Quantas pessoas conheci em Laurel Lake? Opal, Frannie,
Bernadette, Bettina, Rita, Porter, Hope, Tommy, Rachael, Sam,
Reuben... depois de apenas dois meses, aposto que conseguiria
recitar duas dúzias de nomes sem ter que pensar muito.
Saí do elevador no trigésimo primeiro andar com uma sensação
de pavor. Meu apartamento tornou-se um lembrete diário de quão
vazia era minha vida. Mas no meio do corredor, um movimento à
frente tirou-me do meu torpor. Meu coração, que estava no meu
peito como uma bola de futebol murcha, de repente encheu-se e
começou a bater descontroladamente – batendo como se estivesse
recuperando o tempo perdido.
Eu congelei a seis metros da minha porta. — Fox?
Ele estava sentado com os joelhos dobrados perto da minha
porta, mas agora levantou-se. Quando nossos olhos se
encontraram, tive que me concentrar em lembrar de respirar.
Inspirar. Expirar. Inspirar. Expirar. Fox parecia cansado e
estressado, suas roupas estavam amassadas, os olhos cheios de
olheiras como se ele não tivesse dormido tão bem ultimamente.
Mas mesmo com tudo isso, ele era incrivelmente bonito.
— Por que você está aqui? E como você chegou aqui?
Ele passou a mão pelos cabelos. — O porteiro me reconheceu
dos meus tempos de jogador. Eu disse a ele que estava visitando
uma amiga e queria surpreendê-la. Ele me deixou subir depois de
tirar algumas fotos e dar um autógrafo.
— Mas por que você está aqui? Em Nova Iorque?
Ele acenou com a cabeça em direção à minha porta. — Você
acha que podemos entrar e conversar? Eu realmente preciso usar
o banheiro. Bebi muita água no caminho, mas tive medo de que,
se fosse embora, o porteiro noturno não me deixaria entrar e eu
perderia você.
— O porteiro noturno? A que horas você chegou aqui?
Ele encolheu os ombros. — Talvez três horas atrás?
— Você está sentado aqui há três horas?
Ele se moveu para frente e para trás de um pé para o outro. —
E agora que me levantei, realmente preciso ir ao banheiro. — Ele
apontou para a porta novamente. — Você se importa?
— Oh. Claro. — Tirei as chaves da bolsa e destranquei a porta.
— No final do corredor, primeira porta à esquerda.
Fox desapareceu no banheiro, o que me deu alguns momentos
para me recompor. Respirei fundo e fechei a porta, então me
concentrei em diminuir a velocidade do sangue bombeando pelos
meus ouvidos. Embora quando ele voltou, senti como se meu corpo
tivesse acelerado todo o seu funcionamento interno. Meu coração
e minha mente dispararam, o sangue correu em minhas veias e as
perguntas giraram como um tornado tomando forma.
Limpei a garganta. — Sente-se melhor?
Ele sorriu. — Bastante. Obrigado.
— Bem, isso faz de um de nós. Preciso de uma taça de vinho
antes de sentir-me melhor. Você gostaria de uma?
— Claro.
Fui até a cozinha e servi uma taça bem cheia. Infelizmente,
sobrou apenas o suficiente para servir regularmente a segunda
taça. Normalmente, eu daria a um convidado a melhor oferta, mas
precisava mais dela do que ele. Ele sabia o que estava vindo.
Deslizei a meio cheia para o outro lado do balcão. — Desculpe.
Você está recebendo uma dose ruim.
— Estou muito grato por você não ter quebrado a garrafa vazia
na minha cabeça por ter aparecido assim.
Levei o vinho aos lábios. — Você acabou de chegar aqui. Ainda
não descartei isso.
Depois de um gole saudável, contornei o balcão e entrei na sala
de estar. — Por que não nos sentamos aqui?
Meu apartamento tinha um tamanho decente para os padrões
de Nova York, mas de repente parecia muito pequeno com Fox
dentro dele. Sentei-me em uma poltrona que raramente usava, a
uma distância protetora do outro lado da mesa de centro, onde Fox
seria forçado a sentar-se no sofá.
Uma vez acomodado, ele soltou um suspiro audível e trêmulo.
— Sinto muito por aparecer assim sem ligar. Tive medo de que, se
ligasse, você me dissesse para não vir.
Minha cabeça faria isso, mas meu coração.... — O que você está
fazendo aqui, Fox?
— Eu vim para entregar isso a você. — Ele enfiou a mão no
bolso de trás e tirou um envelope dobrado.
— O que é?
— O envelope que você deixou na casa. Aquele com o seu
passaporte.
— Você veio até aqui para entregar meu passaporte? Quando
você poderia tê-lo deixado no correio a oitocentos metros da sua
casa?
— Não foi a única razão pela qual vim.
— Ok... bem, o que mais então?
Ele respirou fundo e apontou para a almofada ao lado dele no
sofá. — Você acha que poderia se sentar aqui?
— Por quê?
— Porque estou pirando e preciso de você perto de mim para
me acalmar.
Debati sua sinceridade, com medo de ler o que ele estava
dizendo. — Por que você está pirando?
— Porque acho que nunca estive tão em jogo como neste
momento. — Ele olhou nos meus olhos. — Por favor, Jos. Apenas
venha sentar-se ao meu lado, mesmo que eu não mereça nenhuma
gentileza sua. Eu preciso tanto de você agora.
Era impossível pensar direito com seus lindos olhos verdes
penetrando-me. Mas quando tentei desviar o olhar, vi suas
grandes mãos tremendo. Foi o suficiente. Levantei-me e fui para o
sofá, sentando com uma boa distância entre nós.
Fox avançou lentamente até que nossos joelhos se tocassem,
depois fechou os olhos. — Obrigado.
Esperei, observando a subida e descida do seu peito até que ele
abriu os olhos novamente.
— Estou aqui porque finalmente percebi que joguei fora a
melhor coisa que já aconteceu comigo.
Meu coração disparou de esperança, mas ainda tinha medo de
não entender o que achava que ele estava dizendo. Eu precisava
me proteger. Engoli. — O que você está dizendo, Fox? Preciso que
você seja muito claro comigo.
Ele olhou para baixo. Depois de muito tempo, ele estendeu a
mão e pegou minha mão. — Está tudo bem?
Eu balancei a cabeça.
— Preciso começar do início, se você não se importar em
acompanhar-me por um tempo.
— Estou ouvindo...
Ele respirou fundo novamente. Quando ele falou, sua voz era
suave. — Você sabe que meu irmão morreu em um acidente anos
atrás. Eu tinha dezenove anos e Ryder tinha dezessete. Ele estava
voltando para casa um dia antes de seu aniversário de dezoito
anos. Mas o que não mencionei foi que ele estava bebendo. Ele
adormeceu ao volante e bateu o carro em uma árvore.
— Sinto muito.
Eu podia ver a dor gravada no rosto de Fox. Isso me fez querer
impedi-lo, mas também parecia que, qualquer que fosse a história
completa, ele precisava divulgá-la. Então apertei sua mão,
tentando oferecer apoio silencioso.
Fox sorriu tristemente e continuou. — Era uma noite de sexta-
feira e eu estava na faculdade. Saí com uma garota. Ele ligou meia
hora antes do acidente, mas eu não atendi, porque estava me
divertindo muito. Eu nem percebi que ele tinha me deixado uma
mensagem até o dia do seu velório. Se ao menos eu tivesse
respondido. Suas palavras estavam tão arrastadas. Levaria dois
minutos para dizer a ele para não dirigir.
— Ah, Fox. Não é sua culpa.
— Acho que isso é discutível. Mas enfim... anos depois, conheci
Evie. No começo tudo estava ótimo. Éramos ambos aspirantes
olímpicos. Depois do meu irmão, eu praticamente afastei-me de
tudo e de todos, exceto do hóquei. De alguma forma, baixei a
guarda quando se tratava de Evie. — Ele ficou olhando por um
tempo antes de continuar. — A mãe dela era ex-patinadora
artística e sua empresária. Ela também era uma alcoólatra. Eu não
suportava ficar perto daquela mulher. Acho que porque lembrava
do meu irmão e de como ele morreu. É também por isso que
raramente tomo mais do que uma ou duas taças de vinho.
Resumindo, Evie não se classificou para a equipe olímpica. Ela
acabou voltando para casa e fazendo uma farra com a mãe. Ela já
era uma das mais velhas tentando se classificar. Ela não teria
outra chance, então eu entendi por que ela entraria em espiral por
um tempo. Mas a espiral tornou-se algo mais. Achei que as coisas
iriam melhorar sem a influência da mãe dela, então pedi a Evie
para morar comigo. Ela foi morar comigo, e as coisas pareceram
suavizar, pelo menos no início. Um mês depois que ela se mudou,
ficamos noivos.
— Mas havia muita coisa que eu não sabia. Acontece que as
lutas de Evie com o álcool não eram novas. Ela bebia escondida
desde... — Ele balançou a cabeça e ficou quieto por um momento
antes de engolir. — Desde que ela tinha nove anos.
— Nove?
Ele assentiu. — Eu sei. Até hoje, quando olho para trás, não
faço ideia como é que não vi isso. Mas ela bebia muito e eu viajava
muito com a equipe, então não nos víamos todos os dias, mesmo
depois que ela se mudou.
— Uau.
— De qualquer forma, Evie entrou e saiu da reabilitação
algumas vezes. Ela ficava sóbria por um mês, e então eu voltava
de um jogo fora de casa e ela tinha caído do controle. Os médicos
da reabilitação prescreveram antidepressivos para tratar a raiz do
problema, mas isso só agravou seus problemas, porque ela bebia
enquanto os tomava, e o álcool a atingia com mais força. Depois
de um tempo, não consegui mais. Decidi que estaria ao lado dela
como amigo, mas precisava acabar com as coisas. Entrei em
contato com uma corretora de imóveis para encontrar um lugar
para ela morar e planejei sentar e conversar com ela quando ela
estivesse sóbria. Mas a corretora de imóveis passou na minha casa
quando eu não estava, e Evie somou dois mais dois. Ela ficou
muito chateada e tomou um monte de comprimidos. Liguei para a
polícia, mas quando a encontraram ela estava flutuando no lago.
— Oh, Deus.
— Quando cheguei, eles estavam fechando o zíper de um saco
para cadáveres em uma maca. — Ele balançou sua cabeça. — Na
noite do funeral, eu me embebedei. Caí alguns degraus na escada
da minha casa, pisei em falso e estourei o joelho. A carreira
também acabou. Algumas pessoas nunca aprendem a lição. Não
atendi ao telefone quando meu irmão ligou porque estava muito
ocupado me divertindo, e queria dispensar Evie porque ela dava
muito trabalho. Eu deveria estar lá pelos dois.
Posso não ter conhecido Ryder ou Evie, mesmo assim senti
uma perda profunda. Não apenas pelos dois humanos que
morreram, mas pela perda de fé e confiança em si mesmo que Fox
sofreu como resultado. Lágrimas escorreram pelo meu rosto. —
Você experimentou uma tragédia inimaginável. Mas você não pode
se culpar pelas decisões que outros tomaram.
— Duas pessoas que me amavam precisaram de mim e eu não
estava lá para ajudar nenhuma delas. Eu não merecia uma
segunda chance. Certamente não mereço uma terceira. — Ele
estendeu a mão e enxugou minhas lágrimas com os polegares e
engoliu. — Mas sou tão egoísta que quero isso de qualquer
maneira, Josie.
Olhei nos olhos dele. — Você está dizendo o que eu acho que
está dizendo?
Ele encolheu os ombros. — Eu não tenho a mínima ideia. Eu
sou péssimo com palavras.
Eu ri em meio às lágrimas. — Você está indo muito bem hoje.
— Então vou continuar. Se o que você aprendeu com tudo o
que eu disse até agora é que estou loucamente apaixonado por
você e farei tudo ao meu alcance para compensar por ter
machucado você, se me der outra chance, então talvez haja
esperança para mim afinal.
— Você me ama?
Fox segurou minhas duas bochechas. — Querida, se você me
deixar, vou gastar o tempo que for preciso e fazer o que for
necessário para que você nunca mais duvide disso.
— O que for preciso? Então você vai se mudar para Manhattan?
Fox congelou. Parecia que ele poderia cagar na calça. Eu
deveria tê-lo mantido sob controle por muito mais tempo depois do
inferno que ele me fez passar, mas cedi e sorri. — Eu estou
brincando.
Ele soltou todo o ar que estava prendendo e seus ombros
tremeram com uma risada silenciosa. — Você vai me fazer pagar
muito por ter estragado tudo, não é?
Torci meus lábios como se estivesse considerando isso. — Não
muito tempo. Suponho que as mulheres de Laurel Lake têm feito
isso por mim desde que parti.
Ele gemeu. — Você não tem ideia.
Eu sorri. — É isso que a família faz. Fica junto.
— Como é que você é da família depois de apenas alguns meses,
mas eu morei lá toda a minha vida e estou sendo rejeitado?
— Porque você merece, idiota.
— É verdade. — O rosto de Fox clareou um pouco, mas ele ficou
sério novamente. — Mas o que eu não mereço é você, doutora. Não
mereço nem um pouco.
Eu sorri. — Eu sou espetacular.
O lábio de Fox contraiu-se. — Você com certeza é, querida. Você
com certeza é.
Já era meio da noite quando terminamos de conversar. Fox,
homem normalmente de poucas palavras, realmente abriu as
comportas. Conversamos mais sobre Ryder e Evie, sobre como foi
para mim a volta para Nova York e a despedida de Nilda, e até
mesmo sobre como ele lutou para encontrar o caminho depois que
sua lesão forçou sua aposentadoria do hóquei.
Eu estava emocional e fisicamente exausta quando fomos para
a cama. Fox também havia dirigido doze horas seguidas, então eu
não conseguia imaginar como seus olhos ainda estavam abertos.
Deitei-me com a cabeça em seu peito enquanto ele passava o dedo
por cima do meu ombro, traçando um oito em silêncio no escuro.
— Você ainda o ama? — ele finalmente disse.
Senti minhas sobrancelhas se aproximando do nariz. — Amo
quem?
— O idiota.
Esse foi o nome que ele deu ao meu ex. Mas ele não poderia
estar perguntando se eu estava apaixonada por Noah depois de
tudo que compartilhamos esta noite. Ele poderia?
— Quem é o idiota?
— O cara com quem você estava indo para Aruba.
Eu me levantei para olhar para ele. — Como você sabia que
Noah e eu tínhamos planejado uma viagem para Aruba?
— Havia a papelada sobre isso no envelope que eu trouxe para
você, junto com seu passaporte.
— Oh. Sim, está certo. Mas por que você perguntaria se eu
ainda o amo?
A testa de Fox enrugou-se. Ele parecia tão confuso quanto eu.
— Porque Opal disse que vocês iriam voltar. — Assim que ele disse
isso, ele fechou os olhos. — Besteira. Ela estava apenas tentando
me tirar do sério, não estava?
— É por isso que você veio até aqui? Porque você pensou que
eu iria para Aruba com Noah?
— Não é o motivo que importa, mas pode ter algo a ver com o
motivo pelo qual dirigi a noventa quilômetros por hora através de
cinco estados segurando o volante.
— E aqui eu pensei que você sentiu tanto a minha falta que
finalmente caiu em si.
— Senti sua falta.
— No entanto, foi preciso cutucar o monstro de olhos verdes
para que você agisse sobre ele. Caramba, se eu soubesse disso,
teria dito a você que voltaria para casa para dormir com Noah
antes de partir e nos pouparia de muita dor de cabeça.
Os olhos de Fox brilharam. — Nem diga isso.
— Dizer o quê? — Eu sorri. — Que eu planejava foder Noah?
Mais rápido que um piscar de olhos, fui virada e caí de costas.
Fox pairou sobre mim, parecendo ardentemente possessivo – um
olhar que ele usava sem remorso, como todos os seus outros
estados de espírito. — Você acha que isso é divertido?
— Por quê? Sim. Sim, eu acho.
— Por que você precisava do seu passaporte esta noite se não
sairia do país amanhã?
— Não havia muita pressa. Quando percebi que tinha
esquecido, liguei para Opal e pedi que ela fosse buscá-lo antes que
a corretora começasse a mostrar a casa a potenciais inquilinos.
Ela disse que faria isso durante a noite para que fosse rastreável.
Ele abaixou a cabeça. — Eu sou tão ingênuo.
Minutos atrás eu estava exausta, mas com Fox pairando tão
perto, meu corpo encontrou seu segundo fôlego. Achei que cutucar
o urso um pouco mais poderia ser divertido. — Não sei. Entre a
papelada e Opal contando que eu estava de volta com meu ex,
parece lógico pensar que poderia estar dormindo com ele de novo,
o Noah idiota...
Os olhos de Fox brilharam. — Você realmente precisa parar de
dizer isso.
Inclinei-me para que ficássemos nariz com nariz. — Qual é o
problema? A ideia de outro homem dentro de mim incomoda tanto
assim você?
— Você está realmente gostando disso, não está?
— Talvez...
Fox juntou minhas duas mãos em uma das suas e puxou-as
para cima e sobre minha cabeça. Ele sussurrou em meu ouvido
com uma voz rouca: — Só há uma maneira de livrar-me do ciúme
que estou sentindo agora.
Arrepios salpicaram minha pele e meus mamilos endureceram
em picos. — Oh, sim? Como?
Ele abaixou seus lábios até os meus. — Vou foder todos os
pensamentos de qualquer outro homem de nós dois.
Eu gostei muito do som disso.
Sua boca moveu-se para meu pescoço e ele beijou até minha
orelha. Quando ele falou, as palavras vibraram na minha pele. —
Vou me desculpar antecipadamente pelo quanto preciso de você.
— Ele arrastou os nós dos dedos pela lateral do meu corpo.
Quando ele alcançou minha calcinha, ele a puxou e arrancou.
Eu suspirei.
— Você vai ter meu suave mais tarde.
— Eu não me importo como vou conseguir você, contanto que
eu tenha você.
— Oh, você me tem, querida. Pelas bolas.
Fox alinhou-se com minha abertura e selou sua boca sobre a
minha enquanto empurrava para dentro. Raspei meus dedos em
suas costas, cavando quando ele afundou profundamente. Meu
corpo parecia cheio, mas meu coração também. Parecia... voltar
para casa. Como o alívio de entrar na garagem depois de uma longa
viagem. Nós dois estávamos enfiados dentro de uma bolha e eu
nunca queria sair. Cada vez que ele se retirava, eu ficava
desesperada por mais. Outro impulso forte, outro mergulho
profundo. Meu corpo contraiu-se avidamente, a escalada em
direção ao orgasmo começando.
— Fox...
— Foda-se — ele gritou. — Vou encher tanto você que meu
esperma ficará aí dentro durante dias.
E foi o que aconteceu. O desespero em sua voz me fez voar além
do limite. Meu corpo vibrou em um orgasmo devastador. Fox
resmungou uma série de palavrões, bombeando e triturando até
que eu comecei a relaxar. Então ele afundou profundamente e se
soltou. E tudo parecia certo novamente, como se a Terra estivesse
girando fora de seu eixo há semanas e agora a gravidade a tivesse
forçado de volta ao lugar.
Mais tarde, minha cabeça descansou no peito de Fox enquanto
ele acariciava meu cabelo.
— Eu realmente sinto muito pelo que fiz você passar nas
últimas semanas.
— Eu sei que você sente.
Fox ergueu o braço, mostrando-me o polegar. Eu não tinha
notado o Band-Aid enrolado nele.
— O que aconteceu?
— Seu pato me mordeu.
Eu ri. — Você está falando sério?
— Foi alguns dias depois que você partiu. Mas nós resolvemos
isso. Agora somos amigos. — Ele balançou sua cabeça. — Até um
pássaro descobriu que eu era um idiota antes de mim. — Ele fez
uma pausa. — Ele sente sua falta.
— Eu também sinto falta dela.
Fox ficou quieto por um tempo. — Eu quero tudo, doutora.
Inclinei minha cabeça para olhar para ele. — Tudo o quê?
— Você. Crianças. Um pato. Um cachorro. Quintal cercado
onde todos possam correr. Talvez até uma minivan estúpida. E eu
quero isso logo, querida.
Meu coração disparou tão rápido que pensei que fosse pular do
meu peito. — Tem certeza?
— Nunca tive tanta certeza sobre nada em minha vida. Se você
não quiser voltar para Laurel Lake, vou me mudar para cá.
Tive uma visão repentina de Fox andando pelas ruas de
Manhattan, com a cabeça e os ombros acima da maioria,
parecendo querer arrancar a cabeça de todos em seu caminho. Eu
ri. — Você? Em Manhattan?
— Por que não?
— Ah, eu não sei. Você já andou de metrô?
— Não.
— Pegou um ônibus público?
— Não.
— Você sabe o que é estacionamento em lados alternados da
rua?
— Não.
— Como você se sente em relação à carne de rua?
— Huh?
Eu sorri. — Você seria infeliz em Manhattan, Fox.
— Que tal algum lugar fora da cidade, então? Portanto, não
seria um trajeto muito longo para você. Eles têm lugares assim
perto daqui, certo? Jersey ou Long Island?
Olhei para frente e para trás entre os olhos de Fox. — Você
realmente se mudaria para cá por minha causa?
— Eu faria qualquer coisa por você, Josie.
Meu coração derreteu. — Isso significa o mundo que você
desistiria de tanto. Mas você não precisa se mudar para Nova York.
Vou me mudar para Laurel Lake.
— Sério?
Eu balancei a cabeça. — Eu adoro lá. É o único lugar que
realmente me faz sentir em casa.
Fox soltou um suspiro. — Ah, graças a Cristo.
Eu ri. — Um pouco aliviado?
— Você não tem ideia. Mas eu realmente teria me mudado para
cá se você quisesse ficar. Laurel Lake é onde moro, mas quando
você saiu, percebi que nada disso importava. Onde você está é meu
lar.
Josie
— Por que você a deixou ir? Acho que ainda não conseguimos
uma foto boa, porque você estava carrancudo nos primeiros
minutos.
Fox grunhiu e apertou sua mão. — A maldita coisa acabou de
me morder. De novo.
Margarida disparou pelo gramado. Opal riu. Ela estava parada
a poucos metros de distância, tentando tirar uma foto nossa com
o tema do feriado natalino. A mãe de Fox, Hope, estava ao lado
dela. Nenhuma das duas parou de sorrir desde que chegaram, há
uma hora.
— Ah, chefe. Acho que ela fez mais do que apenas beliscar você.
— Opal apontou para a camisa de Fox. — Você pode querer olhar
para baixo.
Fox gemeu. — Jesus Cristo.
Tentei não parecer divertida. — Algumas pessoas diriam que
isso é boa sorte.
— Como diabos um pato cagar em você é sorte?
— Bem, tivemos sorte de eu não ter conseguido decidir qual
camisa gostei mais para a foto e comprei duas para você, não é?
— Eu não precisava de uma flanela, muito menos de duas —
ele resmungou.
— Discordo. Vá se trocar. Vamos deixar Margarida correr por
aí por alguns minutos para que ela fique mais feliz quando você
voltar.
Fox murmurou algo baixinho que não entendi, mas foi até a
casa.
Hope viu seu filho desaparecer. — Não acredito que você o fez
usar uma flanela xadrez vermelha.
Não achava que seria apropriado contar a ela o que tive que
prometer para que ele fizesse isso, mas, ei, não me importava. O
visual de Paul Bunyan realmente funcionava para mim.
— Então, quantos cartões você vai enviar este ano? — Opal
perguntou.
— Mil quatrocentos e oitenta e oito.
— Isso é bem específico.
— Estou enviando para toda a lista telefônica de Laurel Lake.
Acabei de inserir todos os nomes e endereços em um banco de
dados.
— Então, todas as pessoas nesta cidade vão ter uma foto de
Fox vestindo uma flanela vermelha e segurando um pato com um
laço combinando na cabeça?
— Sim.
Ela sorriu. — Meu Deus, como os tempos mudaram para o
chefe.
E eles mudaram. Mas eles não mudaram apenas para Fox.
Muita coisa mudou para nós dois. Depois que Fox foi até Nova
York, eu larguei meu emprego, arrumei tudo o que tinha,
subloquei meu apartamento e disse adeus a qualquer um que
significasse alguma coisa – tudo em uma semana. Eu até levei Fox
comigo para a casa da minha mãe quando fui avisar que estava
me mudando. Como esperado, ela não ficou feliz. Recebi um
sermão sobre jogar fora minha carreira por um homem. Mas então,
no final do dia, algo inesperado aconteceu.
Depois que terminamos de comer, fiquei impaciente para ir
embora. Fox perguntou se poderia conversar com minha mãe em
particular antes de partirmos. Eu sabia que ele era durão, mas
minha mãe era especialista em reduzir o tamanho das pessoas à
metade. Fiquei nervosa quando as portas do escritório se
fecharam. Eles não saíram novamente por noventa minutos. E
minha mãe estava sorrindo e rindo quando apareceu.
Fale sobre um choque.
Fox deu um abraço de despedida em minha mãe como se
fossem velhos amigos, depois foi esperar no carro, dando a nós
duas, alguns minutos a sós. Nunca esquecerei o que ela disse.
— Cometi muitos erros na minha vida. Muitos deles com você,
Josephine. Mas a única coisa que fiz bem foi me casar com seu pai.
Algo sobre Fox me lembra dele. Há algo puro dentro. Segure-se nele
e nunca o tome como garantido. A vida é muito curta.
Lágrimas arderam em meus olhos quando joguei meus braços
em volta da minha mãe.
Talvez a aprovação dela não devesse ter significado tanto para
mim. Mas aconteceu. Nunca seríamos melhores amigas, mas
agora nos falávamos a cada poucas semanas.
Opal interrompeu meus pensamentos. — Quando suas novas
inquilinas vão se mudar?
Eu sorri. — Nilda e sua irmã chegam na próxima semana.
Um mês depois de voltar permanentemente para Laurel Lake,
Nilda e sua irmã vieram me visitar. Elas se apaixonaram pela
pequena cidade tão rapidamente quanto eu e decidiram morar
juntas aqui. Acontece que eu iria começar a procurar um inquilino
em breve, já que finalmente concordei em mudar para a casa de
Fox ao lado. Então tudo parecia estar se encaixando. Eu até tinha
feito uma entrevista na Universidade Rehnquist há algumas
semanas e fiz uma segunda entrevista na segunda-feira. Se tudo
desse certo, eu seria professora adjunta de ciências farmacológicas
em janeiro.
Fox saiu pela porta dos fundos de sua casa, ainda enfiando a
flanela para dentro.
— Margarida está lá com as amigas. — Eu apontei. — Só vou
dar a ela mais alguns minutos. Se ela não voltar sozinha, vou pegar
uma guloseima.
Fox encolheu os ombros. — Tanto faz.
— Querido? — sua mãe chamou. — Você acha que poderia
passar um dia desta semana e tirar minha árvore do porão?
Fox olhou para ela, mas não respondeu. Sua mente estava
obviamente em outro lugar. Então eu o cutuquei.
— Sua mãe fez uma pergunta...
— Ela fez?
Eu balancei a cabeça.
Ele ergueu o queixo para Hope. — E aí, mãe?
Ela repetiu a pergunta. Mas, alguns minutos depois, Opal
perguntou-lhe algo sobre um trabalho e aconteceu a mesma coisa.
Tive que cutucá-lo uma segunda vez. — Você está bem?
— Sim, por quê?
— Não sei. Você parece distraído de repente.
Fox encolheu os ombros. — Tudo bem.
Eu atribuí isso a ele estar mais infeliz do que eu pensava ao
tirar a foto para o cartão de Natal, então achei que deveríamos
acabar logo com isso. — Vou buscar uma guloseima para
Margarida e depois vou pegá-la para que possamos tirar a foto.
Atraí Margarida para longe de seus amigos com uma cenoura e
a peguei. Fui entregá-la para Fox, mas ele balançou a cabeça. —
Por que você não a segura?
Eu queria uma foto nossa em frente ao lago com Fox segurando
Margarida para nosso cartão de Natal. Ele ficava tão adorável
quando a segurava. Mas, no momento, ele parecia mais infeliz do
que qualquer coisa. Então não discuti e nos posicionamos em
frente ao lago com Margarida nos braços.
Opal ergueu o telefone e sorriu. — Gravando! Pronta quando
você estiver, chefe.
Gravando? Como em um vídeo? Eu estava prestes a dizer a
Opal que queria uma foto, não uma gravação, quando senti Fox
movendo-se ao meu lado. Olhei e meu coração parou.
Ele estava de joelhos.
— Oh, meu Deus! — Minha mão voou para cobrir minha boca.
Mas o grito que soltei assustou Margarida, e ela começou a bater
as asas por todo lado. Eu a teria deixado cair se Hope não tivesse
vindo correndo.
Ela sorriu. — Eu vou pegá-la.
Eu não conseguia respirar. Isso estava realmente acontecendo?
Não admirava que Fox parecesse tão distraído! Embora, no
momento, meu gigante Paul Bunyan parecesse mais nervoso do
que qualquer coisa. Fazia vinte e dois graus esta tarde, mas ele
tinha uma camada de suor cobrindo sua testa. Ele a limpou com
a parte de trás da manga de flanela e pegou minha mão.
— Josie, desde o minuto em que você atropelou minha caixa de
correio, você tem sido o centro do meu universo. Tentei me manter
afastado, mas algo em você me puxava como a gravidade. Eu só
precisava estar perto de você, mesmo que isso significasse
pendurar gesso nos fins de semana e agir como se um pato
selvagem como animal de estimação fosse normal.
— Ei. — Eu sorri. — É normal.
— Não importa. Eu teria um bando de patos se isso fizesse você
sorrir do jeito que sorrindo está agora.
Cobri meu coração acelerado com a mão.
Fox olhou para baixo por um longo tempo. Quando ele olhou
para cima, seus olhos estavam cheios de lágrimas. — Você me
trouxe de volta à vida, Josie. E não quero nada mais do que passar
o resto dos meus dias com você. Quero estar no seu estúpido
cartão de Natal e ter cartões idiotas de Natal pendurados nas
minhas paredes em março. Quero que você seja a última coisa que
vejo todas as noites antes de fechar os olhos e a primeira coisa que
vejo quando os abro todas as manhãs. Você me faz um homem
melhor e faz querer me esforçar para melhorar a cada dia, porque
cada dia que passo com você supera o anterior. Então, por favor,
diga que você será minha esposa. — Ele olhou para Opal e sua
mãe, ambas radiantes com câmeras de celulares apontadas para
nós. — Se não for porque você me ama, então para salvar-me de
ter que me mudar, porque aquelas duas estão gravando agora, e
seus vídeos da minha rejeição estarão em toda Laurel Lake em
trinta segundos.
Eu ri e me inclinei para frente, pressionando minha testa na
dele enquanto lágrimas escorriam pelo meu rosto. — Eu adoraria
me casar com você, Fox Cassidy.
Fox colocou um lindo anel de diamante com lapidação
esmeralda em meu dedo e se ergueu, levantando-me do chão
quando ele ficou em pé. Ele pressionou seus lábios nos meus. —
Eu amo você, doutora.
— Eu também amo você. Mas você sabe que esse vai ser o nosso
cartão de Natal, certo? Você de joelhos. É como se eu tivesse
fechado o círculo. Sonhei com uma vida de conto de fadas em
Laurel Lake desde pequena. Agora você me deu isso.
— Tenho certeza que foi você quem me deu isso, querida. — Ele
piscou. — Mas vou dar a você algo ainda melhor mais tarde.
Fim.
(Mas vá para a próxima página para ver como ficou a foto do cartão de Natal!)