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Tese Isabel Maias

A dissertação investiga os efeitos do turno de hemodiálise e do cronótipo nos padrões de sono, sintomas psicológicos e qualidade de vida em pacientes com Doença Renal Crônica. Os resultados indicam que o turno noturno está associado a melhor qualidade de vida e menos sintomas depressivos, enquanto os matutinos apresentam menos sonolência diurna e ansiedade em comparação aos vespertinos. As conclusões são limitadas por diferenças sociodemográficas e clínicas entre os turnos, sugerindo a necessidade de estudos futuros com grupos equivalentes.

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A dissertação investiga os efeitos do turno de hemodiálise e do cronótipo nos padrões de sono, sintomas psicológicos e qualidade de vida em pacientes com Doença Renal Crônica. Os resultados indicam que o turno noturno está associado a melhor qualidade de vida e menos sintomas depressivos, enquanto os matutinos apresentam menos sonolência diurna e ansiedade em comparação aos vespertinos. As conclusões são limitadas por diferenças sociodemográficas e clínicas entre os turnos, sugerindo a necessidade de estudos futuros com grupos equivalentes.

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Universidade de Coimbra - UNIV-FAC-AUTOR

2018
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação

Efeitos combinados do turno de hemodiálise e do cronótipo, nos padrões


de sono, sintomas psicológicos e qualidade de vida, em pessoas com
Doença Renal Crónica TITULO DISSERT

Isabel Sofia Pereira Maias


([email protected]) - UNIV-FAC-AUTOR
UC/FPCE

Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde, Subárea de


Especialização em Intervenções Cognitivo-Comportamentais nas
Perturbações Psicológicas e Saúde, sob a orientação da Professora Doutora
Ana Cardoso Allen Gomes- U

UNIV-FAC-AUTOR
Isabel Sofia Pereira Maias

Efeito combinado do turno de tratamento com o cronótipo, nos padrões de sono, em

pessoas com Doença Renal Crónica

Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde Subárea de Especialização

em Intervenções Cognitivo-Comportamentais nas Perturbações Psicológicas e Saúde, sob a

orientação da Professora Doutora Ana Allen Gomes- U

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação

Universidade de Coimbra

Setembro de 2018
Agradecimentos

À Professora Doutora Ana Allen Gomes, pela disponibilidade e apoio prestado ao longo

deste último ano. Pelos ensinamentos académicos, pelas opiniões e críticas construtivas que

tanto contribuíram para a minha formação.

Aos meus pais e irmã por todo o apoio, amor e sacrifício. Pelos valores que me

transmitiram e pela motivação e incentivo que sempre me deram ao longo deste percurso.

Aos meus avós, os meus grandes amores e meus segundos pais! Por estarem sempre lá

para mim, pela compreensão e amor incondicional. E à minha restante família, especialmente,

tio Vitor e Madrinha, por estarem sempre presentes e disponíveis para mim.

Ao Hernâni, pelo teu apoio, pela tua companhia e amor. Por me teres acompanhado

sempre ao longo do meu percurso académico e por valorizares sempre o meu esforço e trabalho.

Aos meus amigos pelos momentos fantásticos que me proporcionaram ao longo destes 5

anos. À Eulália, minha amiga de infância e companheira de casa nestes últimos anos, pela

paciência e pela amizade, pela ajuda e companheirismo e por seres das melhores pessoas que

tenho na minha vida.

Às minhas colegas de tese, pela partilha de conhecimentos e pelo apoio. Especialmente

à Helena, pelos momentos passados juntas para a concretização deste projeto.

À Clinica de Santa Filomena, SANFIL, pela disponibilidade para recolher a amostra e a

todos os doentes que contribuíram para este estudo, o meu sentido agradecimento.
Índice

Agradecimentos

Manuscrito

[Página de título, autorias e afiliações]......................................................................... 1

Nota de autor ................................................................................................................ 1

Resumo ......................................................................................................................... 2

Abstract ........................................................................................................................ 3

Introdução ..................................................................................................................... 4

Metodologia .................................................................................................................. 7

Participantes ............................................................................................................ 7

Instrumentos .......................................................................................................... 10

Procedimentos ....................................................................................................... 14

Resultados ...................................................................................................................... 17

Estatísticas descritivas e exploração das relações entre as variáveis .................... 17

Análise dos efeitos combinados do cronótipo e do turno de tratamento ............... 21

Discussão .................................................................................................................... 28

Referências ................................................................................................................. 34

Anexos............................................................................................................................ 38
Maias, I., Gomes, A. A. (2018). Efeitos combinados do turno de hemodiálise e do cronótipo,

nos padrões de sono, sintomas psicológicos e qualidade de vida, em pessoas com

doença renal crónica. Manuscrito em preparação.


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 1

Título para cabeçalho: TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO

Efeitos combinados do turno de hemodiálise e do cronótipo, nos padrões de sono,

sintomas psicológicos e qualidade de vida, em pessoas com Doença Renal Crónica

Autores

Isabel Maias1

Ana Allen Gomes1,2

Nota de autor:
1
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, Universidade de Coimbra, Portugal.
2
Unidade de I&D (FCT): CINEICC – Centro de Investigação em Neuropsicologia e

Intervenção Cognitivo-Comportamental.

O presente trabalho consiste na dissertação de mestrado da primeira autora, sob

supervisão da segunda, acolhida na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da

Universidade de Coimbra, no âmbito do Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde, subárea

de especialização em Intervenções Cognitivo-Comportamentais nas Perturbações Psicológicas

e Saúde.

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada a Ana Allen Gomes.

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação Universidade de Coimbra. Rua do Colégio

Novo, 3000-115 Coimbra, Portugal. Email: [email protected]


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 2

Resumo

O sono é influenciado por diversas doenças, sendo uma delas a Doença Renal. Os problemas

de sono associam-se a uma diminuição da qualidade de vida. Fatores psicológicos,

bioquímicos, fisiopatológicos, estilo de vida e até a própria hemodiálise relacionam-se com

problemas de sono nestes pacientes.

Foi nosso objetivo estudar os efeitos do turno de tratamento e do cronótipo nos padrões

de sono de pacientes com Doença Renal Crónica em hemodiálise. Participaram 92 utentes

repartidos por quatro turnos de tratamento não equivalentes (nomeadamente, proporção de

diabéticos: 12.5% no turno noturno vs. 58.8% ao início da tarde), de um centro de diálise de

Coimbra, que responderam a questões sociodemográficas, clínicas, ISI, STOP-Bang, PSQI,

QCM, ESS, HADS e WHOQOL-Bref.

Os resultados em função do turno de tratamento revelaram, no turno noturno, melhor

qualidade de vida, menos depressão, menos dificuldade em adormecer e melhor qualidade de

sono nalgumas componentes do PSQI, e piores resultados no turno do início da tarde. Quanto

ao efeito do cronótipo, os matutinos revelaram menores sonolência diurna, ansiedade e

disfunção diurna, em oposição aos vespertinos. A interação turno X cronótipo foi pouco

expressiva, com exceções pontuais: destacou-se a significância estatística nas pontuações de

ansiedade, tendencialmente superiores em turnos consonantes com o cronótipo.

Apesar dos resultados promissores respeitantes ao turno noturno de tratamento, as

conclusões ficam limitadas por diferenças sociodemográficas e clínicas entre turnos, em

especial diabetes inferior no turno da noite e superior no da tarde. Assim, será indispensável

que futuros estudos consigam compor grupos de turno equivalentes através de aleatorização.

Palavras-chave: sono-vigília; hemodiálise; hora do dia; cronótipo; início e manutenção

do sono; qualidade de sono


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 3

Abstract

Sleep is influenced by several diseases, such as Renal Disease. Disturbed sleep is associated

to decreased quality of life. Psychological, biochemical, pathophysiological, lifestyle and

even hemodialysis treatment factors are related to increased sleep disturbances in these

patients.

The aim of this study was to analyse the effect of treatment shift/schedule and

chronotype on the sleep patterns of patients with Chronic Renal Disease doing hemodialysis.

Ninety two participants distributed by four non-equivalent treatment shifts (namely in terms

of diabets distribution: 12.5% at night shift vs. 58.8% at afternoon shift), from one dialysis

centre in Coimbra, answered to sociodemographic and clinical questionnaires, ISI, STOP-

Bang, PSQI, CSM, ESS, HADS and WHOQOL -Bref.

The results according to the treatment shift revealed, for the night shift, better quality of

life, lower depression, less difficulty falling asleep and better of sleep in some of the PSQI

components, contrarily to the afternoon shift that presented higher symptoms. The

chronotype effect was also observed, as morning-types showed lower levels of daytime

sleepiness, anxiety and diurnal dysfunction, as opposed to evening-types. The

shift*chronotype interaction effect was minor and non-significant for most variables. One

exception concerned anxiety scores that appear to be higher in shift schedules more

concordant with chronotype.

Despite the promising results regarding the night treatment schedule, conclusions are

limited by the demographic and clinical non-equivalence between patients in each treatment

shift, especially diabets frequency. Therefore, future research using experimental designs able

to compose equivalent treatment shift groups through randomization will be vital.

Keywords: sleep-wake patterns; haemodialysis; time of day; chronotype; onset and

maintenance of sleep; sleep quality


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 4

Introdução

“O sono é um processo de vida fundamental, assim como comer e beber”

(Broomfield & Espie, 2005, p. 401)

Durante muitos séculos, considerava-se, de forma intuitiva, que o sono era um processo

passivo do corpo e da mente. No entanto, a ciência veio demonstrar que esta crença estava

errada, por exemplo, com a descoberta da existência dos vários estádios durante o sono e a

existência de atividade a nível cerebral diferenciada (Moorcroft, 2013).

Carskadon e Dement (2017) e Moorcroft (2013) consideram o sono um estado

comportamental reversível, cíclico, de desligamento preceptivo com diminuição da resposta ao

ambiente, que engloba processos comportamentais e fisiológicos.

Podem distinguir-se dois tipos de sono: REM (rapid eye movements) e NREM (non-rapid

eye movements). O sono NREM divide-se tradicionalmente em 4 estádios (E1 a E4), atualmente

designados de N1 a N3, sendo que este último (N3) engloba os estádios E3 e E4. Há ainda uma

alternância permanente entre estes dois tipos de sono, ocorrendo cerca de 4 a 5 ciclos por noite

(Carkskadon & Dement, 2017).

Existe uma flutuação diária no ritmo sono-vigília, quer por influências endógenas, como

por exemplo o relógio biológico, quer exógenas, como as rotinas e atividades sociais, o uso de

modificadores da ativação, a luz solar, a convivência com amigos e família, entre outros.

Deve-se ainda mencionar que existem diferenças interindividuais, nomeadamente, ao

nível da dimensão da matutinidade-vespertinidade ou tipo diurno. Nesta perspetiva podemos

fazer uma divisão em três categorias. Assim sendo, as pessoas matutinas, caracterizam-se por

terem acrofases mais adiantadas do que o normal, acordando mais cedo, sentindo-se assim mais

eficientes de manhã. No outro extremo, temos as vespertinas que, por oposição às anteriores,

têm acrofases atrasadas, acordam mais tarde e, por conseguinte, sentem-se mais eficientes ao

final do dia ou mesmo até durante a noite. Por sua vez, podemos considerar ainda as de tipo
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 5

intermédio, que é a categoria que engloba a maioria das pessoas e que se encontra entre esses

dois extremos (Silva, 2000 cit. in Gomes, 2005).

O sono é diretamente influenciado por inúmeras doenças, sendo uma delas a Doença

Renal Crónica. A doença renal é definida pela existência de anormalidades na estrutura ou na

função renal, existente há 3 meses ou mais e com implicações negativas para a saúde (Park &

Ramar, 2017).

A prevalência de pessoas com doença renal crónica tem aumentado significativamente,

o que por sua vez, faz aumentar a prevalência de pessoas com perturbações de sono. No entanto,

esta relação também existe no sentido oposto, ou seja, um aumento dos problemas de sono

aumenta os riscos associados à Doença Renal Crónica e assim, a sua prevalência (Park &

Ramar, 2017). Os problemas de sono também estão intimamente relacionados com uma

diminuição da qualidade de vida, o aumento da procura de cuidados de saúde e da mortalidade

(Novak et al., 2006). Segundo Park e Ramar (2017) e Bathla et al., (2017), entre 40 a 90% dos

pacientes que realizam hemodiálise apresentam uma pobre qualidade de sono, medida pelo

Pittsburg Sleep Quality Index (PSQI) percentagem esta que comparativamente com a

população geral é bastante superior. Fatores psicológicos, bioquímicos, fisiopatológicos, estilo

de vida e fatores relacionados com o tratamento estão relacionados com o aumento de

problemas e distúrbios de sono nestes pacientes (Novak et al., 2006).

A insónia é um dos distúrbios de sono mais comuns em pacientes com doença renal,

sendo que cerca de 60% dos pacientes que realizam diálise apresentam este distúrbio. É

definida como uma dificuldade persistente relacionada com a iniciação, duração, consolidação

e qualidade do sono, que ocorre apesar de existirem condições adequadas para o sono e que

resulta em alguma forma de comprometimento diurno (Classificação Internacional dos

Distúrbios do Sono, terceira edição [ICSD-3]), American Academy of Sleep Medicine (2014).

No entanto, a insónia nestes pacientes pode ser causada por fatores psicológicos e fisiológicos.
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 6

A nível psicológico, a ansiedade, o stresse e a depressão são queixas muito comuns

apresentadas por estes pacientes, sendo estes fatores de risco para a insónia. Existe uma

associação complexa entre a insónia e a depressão, na medida em que a insónia pode ser um

dos principais e primeiros sintomas de depressão, mas por sua vez, a insónia crónica não tratada

pode aumentar o risco de depressão (Novak et al., 2006).

É de realçar a importância da depressão na Doença Renal Crónica, sendo que se sabe

que pacientes com esta doença, a realizar hemodiálise e que apresentem uma depressão têm

um maior risco de morte e de hospitalizações, comparativamente àqueles pacientes a realizar

hemodiálise mas sem sintomas depressivos. Por outro lado, a depressão é ainda um distúrbio

diagnosticado por causa dos sintomas relacionados com a uremia (e.g., fadiga e problemas de

sono). Estar desempregado, ser de raça branca e do sexo feminino são outros fatores associados

à depressão em pacientes em diálise (Gul, Aoun & Trayner, 2006; Teles et al., 2014).

Por outro lado, também ocorrem mudanças a nível fisiológico, como por exemplo, a

queda do pH do fluido espino-cerebral e o movimento lento do bicarbonato através da barreira

hematoencefalica durante a diálise, o que pode provocar uma maior sonolência diurna e, desta

forma, diminuir a qualidade de sono noturno (Novak et al., 2006).

Alterações no metabolismo da melatonina são detetadas em pacientes com insuficiência

renal e podem contribuir para a patogénese da insónia. Por outro lado, a medicação prescrita a

estes pacientes (e.g., beta-bloqueadores, esteroides …) também pode produzir alterações no

sono (Novak et al., 2006)

O horário a que se realiza hemodiálise também pode afetar o sistema circadiano, na

medida em que altera a exposição aos zeitbergs, como a exposição à luz solar, atividade social,

horários de acordar/deitar, padrões de atividade, horários de refeições, entre outros. Além disso,

aquando da realização da hemodiálise os pacientes apresentam um ligeiro aumento da

temperatura corporal, de aproximadamente 0.5ºC/1ºC, sendo que estas mudanças podem


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 7

interferir e interromper a regulação circadiana (Parker et al., 2013).

O impacto da altura do dia em que se realiza hemodiálise já foi anteriormente

investigado, tendo-se verificado que a hemodiálise no turno da manhã está associada a um

aumento do tempo de sobrevida (Bliwise et al., 2001), a melhor qualidade do sono subjetiva

medida pelo PSQI, mais sonolência diurna medida pela Epworth Sleepiness Scale (Wang et

al., 2013), e com a insónia (Sabbatini et al., 2002). No entanto, na literatura são encontradas

algumas contradições consideráveis relativas ao turno de tratamento. Alguns estudos relataram

má qualidade do sono subjetiva e alta prevalência de depressão em pacientes submetidos à

hemodiálise no turno da manhã, bem como boa qualidade de sono nos pacientes do turno da

noite (Čengić et al., 2012; Hsu et al., 2008).

O presente estudo teve como objetivo principal examinar, em função do turno de diálise,

do tipo diurno individual (matutinidade-vespertinidade) e da interação entre ambos, os diversos

padrões de sono de pessoas com doença renal crónica, nomeadamente, qualidade de sono,

queixas de insónia, sinais sugestivos de apneia sono e sonolência diurna, indicadores de saúde

mental (em termos de ansiedade e depressão) e de qualidade de vida habitualmente

interrelacionados com o sono. Se vários estudos publicados têm incidido na análise dos padrões

de sono em função do turno de tratamento, até ao momento não parecem existir estudos sobre

o potencial efeito moderador do tipo diurno.

Metodologia

Participantes

O presente estudo baseou-se em 92 casos válidos de 97 participantes com Doença Renal

Crónica que aceitaram integrar a investigação (5 participantes não conseguiram finalizar os

questionários por motivos diversos (e.g., cansaço, idade avançada, incompreensão das

questões). A amostra foi recolhida numa das unidades de hemodiálise da cidade de Coimbra,

que se encontra em funcionamento de segunda a sábado. Às segundas, quartas e sextas-feiras


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 8

o centro realiza quatro turnos de hemodiálise nos seguintes horários: o primeiro turno funciona

das 7 horas às 11 horas (turno da manhã [M]); o segundo turno das 12 às 16 horas (aqui

designado turno do início da tarde [IT]); o terceiro turno, do final da tarde, começa às 17:30

horas e termina às 21:30 horas (aqui designado fim de tarde [FT]; por sua vez, o quarto turno,

turno da noite [N], decorre das 24 horas às 6 horas da manhã, sendo este o turno de maior

duração. Às terças-feiras, quintas-feiras e sábados realizam-se os mesmos turnos com a

exceção do turno noturno.

A amostra é composta por 51 participantes do sexo masculino (55.43%) e 41 do sexo

feminino (44.57%). A média de idades é de 69.22 (DP=13.67) anos para a amostra geral, sendo

que para o sexo feminino é de 68.02 (DP=14.28) anos e para o sexo masculino é de 70.18

(DP=13.22) anos. Quanto à situação ocupacional, a maioria da amostra está reformada

(84.80%) e em relação ao estado civil 63% são casados/união de facto.

Os participantes encontram-se a realizar diálise em média há 65 meses, e quando

questionados sobre “qual a causa da doença renal crónica” 46.70% da amostra refere não saber

o motivo e a restante percentagem está diversificada do seguinte modo: 7.60% refere que a

causa foi “rins poliquisticos ou outra causa hereditária”, 4.30% refere ter sido “pielonefrite ou

outra infeção renal”, 16.30% menciona “diabetes” e 25.00% “outras”.

No que concerne à questão “tem diabetes?” 42.40% da amostra afirma ter a doença.

Foram ainda relatadas outras complicações de saúde sendo as mais frequentes a depressão,

hipertensão e problemas cardíacos. Em relação à toma diária da medicação, 87.00% da amostra

respondeu afirmativamente, sendo que entre estes 94.50% assume tomar regularmente

medicação para dormir. A maioria dos pacientes (88.00%) deslocam-se para o centro de

hemodiálise de ambulância, demorando em média 27.12 (DP=18.68) minutos.

Relativamente à distribuição da amostra por turnos (cf. tabela 1), constata-se que o

primeiro e o terceiro turno são muito semelhantes no que concerne ao número de pessoas que
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 9

contêm, sendo que o único que se destaca é o turno da noite que é composto apenas por 8

pessoas. Relativamente à distribuição por sexo não se encontraram diferenças estatisticamente

significativas (embora seja visível a baixa representação de mulheres no turno noturno), assim

como relativamente ao tempo (meses) em diálise. Quanto à idade, existiu uma diferença

estatisticamente significativa (p<0.01) entre os turnos, sendo as diferenças entre o turno

noturno, em que a média de idades é inferior, com os turnos do final de tarde (p=0.044), início

da tarde (p=0.001) e manhã (p=0.037). Existe também uma diferença significativa quanto à

situação ocupacional (p<0.001), em que no teste post-hoc se verificou que o turno noturno

difere dos restantes, nomeadamente, do turno da manhã (p=0.00), do início da tarde (p=0.00)

e do final da tarde(p=0.002), sendo o turno noturno aquele que contém uma maior percentagem

de pessoas a trabalhar, a tempo completo e parcial.

No que concerne à duração da Doença Renal Crónica, em anos, verificam-se diferenças

tendencialmente significativas (p=0.069), em que que o segundo turno é aquele em que os

doentes apresentam doença renal há mais anos, comparativamente com os restantes turnos que

se equiparam entre si.

Relativamente à diabetes, verificou-se uma diferença significativa entre os turnos

(p<0.05), sendo que a diferença acontece entre o turno da noite, em que existe uma menor

percentagem de pessoas diabéticas, e o turno do inicio da tarde (p=0.037), sendo este o turno

que contém mais pacientes com diabetes.


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 10

Tabela 1

Caracterização sociodemográfica da amostra por turnos

Turno 1 Turno 2 Turno 3 Turno 4


M DP M DP M DP M DP
Idade
Ambos os sexos 68.57 13.69 74.18 11.45 67.96 12.54 54.25 15.96
Masculino 68.58 14.72 76.94 9.11 70.00 10.61 56.86 15.29
Feminino 68.55 13.19 71.41 13.09 65.42 14.68 36.00 -
Doença Renal
9.68 8.22 12.68 10.38 9.68 8.44 19.00 9.93
(Anos de)
Tempo em Diálise
64.14 64.58 69.45 44.65 50.93 54.79 93.75 77.63
(meses)
n (%) n (%) n (%) n (%)
Distribuição global 23 (25.00%) 34 (37.00%) 27 (29.00%) 8 (9.00%)

Feminino 11 (47.80%) 17 (50.00%) 12 (44.40%) 1 (12.50%)


Masculino 12 (52.20%) 17 (50.00%) 15 (55.60%) 7 (87.50%)
x2 p=0.280
Diabetes
7 (30.40%) 20 (58.80%) 11 (40.70%) 1 (12.50%)
Sim
Não 16 (69.60%) 14 (41.20%) 16 (59.30%) 7 (87.50%)

x2 p=0.045
Situação Ocupacional
Reformado 20 (87.00%) 33 (97.10%) 21 (77.80%) 4 (50.00%)
Desempregado 2 (8.70%) 1 (2.90%) 4 (14.80%) -
Atestado/ Baixa 1 (4.30%) - - -
Trabalhar tempo - - 1 (3.70%) 2 (25.00%)
completo - - 1 (3.70%) 2 (25.00%)
Trabalhar em tempo
Parcial
x2 p=0.000
Legenda: Grupo 0 - Profissões das Forças Armadas; Grupo 1 - Representantes do poder
legislativo e de órgãos executivos, dirigentes, diretores e gestores executivos; Grupo 2 - Especialistas
das atividades intelectuais e científicas; Grupo 3 - Técnicos e profissões de nível intermédio; Grupo 4 -
Pessoal administrativo; Grupo 5 - Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e
vendedores; Grupo 6 - Agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta;
Grupo 7 - Trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices; Grupo 8 - Operadores de
instalações e máquinas e trabalhadores da montagem; Grupo 9 - Trabalhadores não qualificados; Grupo
10- Domésticas. Adotou-se o sistema de classificação de profissões do Instituo Nacional de Estatística
(INE, 2011), ao qual acrescentámos o grupo 10.

Instrumentos

Questionário Sociodemográfico e Clínico: este questionário foi elaborado para o presente

estudo com o propósito de recolher dados sociodemográficos tais como, sexo, idade, estado

civil, situação habitacional, partilha de quarto e/ou cama, situação ocupacional atual e anterior,
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 11

forma e tempo de deslocação para o centro e dados clínicos como a toma regular de medicação,

a existência de outras doenças físicas e psicológicas, a duração da Doença Renal Crónica, a

causa e o tempo em diálise.

Escala de Ansiedade e Depressão Hospitalar (versão portuguesa: Pais-Ribeiro, Silva,

Ferreira, Martins, Meneses & Baltar, 2007;orig: Hospital Anxiety and Depression Scale /

HADS, de Zigmond & Snaith, 1983): escala de autoadministração com o objetivo de avaliar

os níveis de ansiedade e depressão em doentes com patologia física e em ambulatório na última

semana. É constituída por 14 itens – 7 itens para avaliar a depressão (2, 4, 6, 8, 10, 12 e 14) e

7 itens para avaliar a ansiedade (1, 3, 5, 7, 9, 11 e 13) – em que cada questão é cotada numa

escala de Likert de 0 a 3 pontos (0 corresponde a “Baixo” e 3 corresponde a “Elevado”). O total

é obtido pela soma dos valores dos itens de cada subescala e os resultados variam de 0 a 21. A

pontuação entre 0 e 7 é “normal”, entre 8 e 10 corresponde a “leve”, entre 11 e 14 significa

“moderada” e entre 15 a 21 pontos “grave”. No presente estudo a subescala da ansiedade

apresentou um valor de alfa razoável (α =0.78) e a subescala de depressão um valor de alfa

considerado bom (α=0.80) (Pallant, 2007).

Índice de Gravidade de Insónia (versão em português de Portugal: Clemente, 2007,

2013; orig.: Insomnia Severity Index / ISI, de Morin, 1993): questionário de autoadministração

que avalia a natureza, gravidade e impacto da insónia no último mês. É constituído por 7 itens

referentes à gravidade da dificuldade em iniciar o sono, manutenção do sono, problemas de

despertar precoce, insatisfação sobre a qualidade de sono, interferência das dificuldades para

dormir no funcionamento diurno, em que medida o impacto da insónia é notado por terceiros

e a preocupação sobre as dificuldades de sono. A nível de cotação, é uma escala de Likert de 5

pontos em que 0 corresponde a “nenhum problema” e 4 corresponde a “problema muito grave”.

A pontuação total varia de 0 a 28, sendo que de 0 a 7 indica ausência de insónia; de 8 a 14

pontos, sintomas próximos do limiar da insónia; de 15 a 21 pontos, insónia moderada; e de 22


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 12

a 28 pontos insónia grave. Este instrumento apresentou neste estudo um α de Cronbach de 0.90

mostrando um nível de consistência interna muito bom.

Inquérito STOP-Bang (versão portuguesa: Silva, Pereira, Xará, Mendonça, Cunha,

Santos & Abelha, 2013; orig: STOP-Bang Questionnaire, de Chung et al., 2008): este

questionário, com o acrónimo STOP-Bang (s - snoring; t – tiredness during daytime; o-

observed apnea; P – high blood Pressure; B – Body mass index; A – Age; n – neck

circumference; G – Gender) tem como objetivo identificar sintomas e fatores de risco de

Apneia Obstrutiva do Sono. É constituído por 8 perguntas de resposta tipo “sim” / “não”, em

que a classificação é de 1 e 0 respetivamente. Se a pontuação total for maior ou igual do que 3,

o sujeito apresenta “elevado” risco de Apneia Obstrutiva do Sono; se a pontuação for inferior

a 3, o sujeito apresenta um baixo-risco de Apneia Obstrutiva do Sono.

Questionário de Pittsburgh sobre a qualidade do sono, versão portuguesa (tradução

oficial do Mapi Institute, 2008, caracterização psicométrica de Gomes et al., 2018; orig:

Pittsburgh Sleep Quality Index / PSQI, de Buysse et al., 1989): O questionário visa medir a

qualidade de sono no último mês, classificando-a como boa ou pobre de acordo com o ponto

de corte>5. É composto por 19 questões de autorrelato e 5 questões adicionais direcionadas

para o parceiro de quarto ou de cama. Estas últimas são usadas para fins clínicos, mas não são

consideradas para fins de cotação. O PSQI é constituído por 7 componentes - qualidade de sono

subjetiva, latência de sono, duração do sono, eficiência habitual do sono, distúrbios de sono,

uso de medicação para dormir e disfunção diurna, sendo que cada uma é classificada numa

escala de Likert de 4 pontos (entre 0 a 3 pontos), de acordo com normas de cotação específicas.

A pontuação total das 7 componentes varia de 0 a 21, sendo que quanto mais alta for a

pontuação pior é a qualidade de sono. A caracterização psicométrica do PQSI em português

europeu aponta para adequada fiabilidade, validade e acuidade em amostras portuguesas

(Gomes et al., 2018). As análises psicométricas do PSQI neste estudo, tendo em conta as 7
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 13

componentes do questionário, mostraram um valor de α de 0.67, o que indica um nível aceitável

de consistência interna para uso na investigação.

Questionário Compósito de Matutinidade (QCM; Smith et al., 1989; Barton et al., 1992,

traduzido e adaptado por Silva, Azevedo e Dias, 1994, 1995): instrumento de autorrelato,

composto por 13 itens, que tem como objetivo determinar tipo diurno através de questões que

se reportam às preferências do sujeito no que concerne à escolha de horários. O resultado

obtém-se através da soma de todos os itens (cotados de 1 a 4 ou 1 a 5, nalguns casos de modo

inverso) sendo que uma maior pontuação aponta para um perfil do tipo matutino. Existem

pontos de corte disponíveis no país a partir de um amplo estudo em universitários (Gomes,

2005). Este instrumento apresentou uma aceitável consistência interna no primeiro estudo de

validação em Portugal (α=0.69) numa amostra de trabalhadores por turnos (Martins et al.,

1996) e valores indicativos de boa consistência (cerca de 0,80) em estudantes universitários e

adolescentes (Costa et al., 2013; Gomes, 2005; Gomes et al., 2016) o que também se sucede

para a amostra do presente estudo, α=0.84.

Epworth Sleepiness Scale / Escala de Sonolência de Epworth (ESS; orig.: Johns, 1991;

versão portuguesa: Santos et al., 2001): esta escala permite avaliar a sonolência diurna

inquirindo sobre a probabilidade de adormecer durante o dia em diferentes situações

correspondentes a 8 itens. A pontuação total varia de 0 a 24, sendo que valores acima de 10

indicam sonolência excessiva diurna. Através da análise psicométrica obteve-se um α=0.85,

que indica uma boa consistência interna.

World Health Organization Quality of Life Instruments – Bref - versão breve do

WHOQOL-100, trata-se de uma medida geral de qualidade de sono percebida, proposta pela

Organização Mundial de Saúde (WHOQOL-Bref; orig.: Skevington, Lotfy, & O'Connell,

2004; versão portuguesa: Vaz-Serra et al., 2006). Contém 26 itens que avaliam uma faceta

geral e quatro domínios de qualidade de vida (físico, psicológico, relações sociais e meio
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 14

ambiente). A cotação pode ser feita manualmente ou mediante recurso a uma sintaxe para o

programa SPSS. Todos os itens são cotados de 1 a 5 e três dos itens, referentes a perguntas

formuladas de forma negativa (Q3, Q4 e Q26), devem ser invertidos.

O Centro de avaliação da Qualidade de Vida para português de Portugal, de acordo com

as tendências atuais da OMS, optou por transformar os resultados numa escala de 0 a 100, em

que quanto mais elevada a pontuação melhor será a qualidade de vida. O cálculo dos domínios

faz-se recorrendo à seguinte fórmula geral (cf. Vaz-Serra et al.,2006):

Somatório de todos os itens – Número de itens


Resultado do Domínio = X 100
4 x Número de itens
Quando realizada a análise psicométrica dos 26 itens no presente estudo obteve-se um

alfa de 0.95. Relativamente ao domínio físico α =0.89; ao domínio psicológico α =0.89; ao

domínio das relações sociais α =0.75 e do meio ambiente α= 0.86.

Procedimentos

O primeiro passo para a realização deste estudo foi o pedido de autorização aos autores

dos instrumentos utilizados.

Para a recolha da amostra clínica foi elaborada e reúnida toda a documentação requerida

para obtenção de autorizações junto da Direção de Unidade de Hemodiálise e da Comissão de

Ética e Deontologia da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de

Coimbra. Uma vez concedidos pareceres positivos, iniciou-se o processo de recolha dos dados

num dos Centros de Hemodiálise de Coimbra.

A recolha de dados foi conduzida somente após consentimento livre e esclarecido por

parte de cada doente, depois de explicados os objetivos e natureza do estudo. Foi garantido a

cada paciente o direito de recusar participar no estudo sem qualquer consequência e a qualquer

momento, assim como a participação a título meramente voluntário, não existindo, portanto,

quaisquer prejuízos ou benefícios inerentes à participação. Utilizou-se um sistema de


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 15

codificação que permitiu garantir a confidencialidade dos dados recolhidos e o seu

armazenamento em base de dados estatística de modo a assegurar o anonimato dos doentes ao

longo do tratamento dos dados, análise, apresentação e discussão dos resultados. A aplicação

dos questionários foi realizada durante as sessões de diálise, de um modo individual. Embora

as escalas sejam na sua maioria de auto-preenchimento, a modalidade de administração foi

ajustada ao contexto específico uma vez que os doentes se encontram deitados e com os braços

impossibilitados de escrever.

Assim, as questões a cada paciente foram colocadas oralmente, tendo sido registado para

cada item a resposta dada. A aplicação completa sob a forma oral demorou cerca de 30 minutos,

ocupando no máximo 1 hora em doentes mais velhos. A recolha decorreu entre março e abril

de 2018.

Procedimentos estatísticos e de análise dos dados

Para realização da análise estatística foi utilizado o software estatístico IBM SPSS,

(versão 22.0).

Para a caracterização sociodemográfica e clínica da amostra foram calculadas estatísticas

descritivas em termos de frequências simples, absolutas e relativas (percentagens), e

determinadas médias, desvios-padrão, mínimos e máximos relativamente às diferentes medidas

(HADS; ISI; STOP-BANG; ESS; QCM; PSQI; WHOQOL-Bref).

Para verificar se uma variável apresentava uma distribuição normal, considerou-se que

os valores de assimetria (skeweness) e achatamento (kurtosis) teriam que se situar entre -2 e +2

(Lomax & Hahs-Vaughn, 2012). A consistência interna dos instrumentos foi avaliada através

do alfa de Cronbach, interpretado segundo Pallant (2007) da seguinte forma: muito bom se

superior a 0.90; bom entre 0.80 e 0.90; razoável entre 0.70 e 0.80; aceitável a partir de 0.60

(ainda que fraca), sendo valores inferiores considerados inadmissíveis.

Primeiramente foi explorada a existência de diferenças significativas entre os turnos de


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 16

diálise nas pontuações obtidas nas diferentes escalas através do teste paramétrico ANOVA em

todos os instrumentos, com exceção das componentes do PSQI e dos itens da ISI, sendo que

para estas foi utilizado o teste não paramétrico equivalente Kruskal-Wallis. De referir que foi

também analisada a magnitude adotando os valores de eta quadrado através dos critérios

Cohen, em que valores até 0.01 indicam um efeito pequeno, valores de 0.01 a 0.06 indicam um

efeito médio e valores superiores de 0.06 até 0.138 indicam um efeito grande (Pallant, 2007).

De referir que quando os testes apresentaram valores significativos foram realizados testes

post-hoc, nomeadamente o de Tukey para quando há homogeneidade das variâncias e o de

Games-Howell para quando não existe homogeneidade. No entanto, quando existe

homogeneidade das variâncias, mas o tamanho dos grupos é muito diferente entre si, o que

acontece quando a amostra é dividida por tunos de diálise, utilizou-se o de Hochberg’s GT2

(Field, 2013). No caso do teste Kruskal-Wallis os tamanhos de efeito foram estimados através

da determinação de um valor aproximado de r, conforme fórmula descrita por Pallant (2007).

Explorou-se também a eventual existência de correlações significativas do QCM e da

idade com os restantes instrumentos, com recurso às correlações paramétricas de Pearson. No

entanto, em algumas das variáveis utilizou-se o coeficiente de correlação não paramétrico

correspondente de Spearman. As relações entre as escalas foram analisadas, não só face à sua

significância estatística, como em relação à magnitude das correlações definidas pelos critérios

de Cohen (Pallant, 2007): fortes para coeficientes iguais ou superiores a |0.50|, moderada para

coeficientes entre |0.30| e |0.49| e baixa quando os valores se situam entre |0.10| e |0.29|.

Posteriormente, fez-se a categorização dos valores do QCM por cronótipo através, quer

dos valores “convencionais” (e.g., normas descritas em amostras predominantemente de jovens

adultos, como tem sido prática generalizada) quer dos valores definidos na amostra em estudo.

Procedeu-se ainda à realização de ANOVAs a dois fatores, em que se pretendeu verificar

os efeitos do cronótipo, dos turnos, e da interação de ambos, nas variáveis de interesse. É


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 17

importante referir que para as componentes do PSQI e itens da ISI se recorreu a testes não

paramétricos, nomeadamente, fazendo o split file e utilizando o teste de Kruskal-Wallis

Foi ainda efetuada a ANCOVA a dois fatores para verificar os efeitos referidos,

controlando a variável idade.

Adotou-se o valor de p<0.05 enquanto indicador de significância estatística, mas tendo

em conta o reduzido número de sujeitos da amostra, quando divida em turnos, decidiu-se

reportar resultados em que o p<0.06, considerado marginalmente significativo, e p<0.10 como

tendencialmente significativo. Por sua vez, p<0.15 foi considerado indicador de um resultado

com potencial relevância clínica/prática.

Resultados

Estatísticas descritivas e exploração das relações entre as variáveis

As pontuações médias e desvios-padrão dos questionários para cada turno de diálise

mostram-se na tabela 2, assim como os níveis de significância nos testes de comparação entre

os grupos.

Houve diferenças estatisticamente significativas entre os turnos nos domínios físico e

ambiente do WHOQOL-Bref, nas componentes de distúrbios de sono e de latência do sono do

PSQI e ainda na subescala da depressão da HADS. Ainda importante referir que o item 1 da

ISI referente à dificuldade em adormecer pode ser considerado como tendencialmente

significativo enquanto que a componente qualidade de sono subjetiva do PSQI e o domínio

psicológico do WHOQOL-Bref podem ser considerados como com potencial relevância

clínica/prática. O turno noturno foi aquele que apresentou média mais elevada nas referidas

facetas do WHOQOL-Bref, o que se traduz numa melhor qualidade de vida, bem como média

mais baixa nas componentes latência qualidade de sono e distúrbios de sono do PSQI (e ainda

tendencialmente mais baixa na componente de qualidade de sono), o que se reflete num melhor

sono nestas componentes. Quanto à subescala depressão da HADS foi o turno onde se obteve
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 18

pontuações mais baixas e assim menos depressão. Pelo contrário, o turno do início tarde foi

aquele em que os pacientes obtiveram em média pontuações mais baixas nas facetas do

WHOQOL-Bref, o que se traduz numa pior qualidade de vida e em que pontuaram em média

de forma mais elevada nas componentes latência e distúrbios de sono do PSQI. Este turno

obteve ainda a média mais elevada na subescala depressão da HADS, o que se traduz em mais

depressão.

No item 1 da ISI, referente à dificuldade em adormecer, os resultados são compatíveis

com os anteriores, na medida em que o turno na noite é aquele que apresenta média mais baixa

e assim menos dificuldade em adormecer e o turno do início da tarde apresenta a média mais

elevada, ou seja, mais dificuldade em adormecer. Na componente de distúrbios de sono do

PSQI surge o turno do final da tarde como sendo aquele com média mais elevada.

Como o turno do início da tarde compreende os pacientes mais velhos e do turno da noite

os doentes com menor idade, os resultados descritos poderão traduzir diferenças de idade (e

não de turno). Assim, despistou-se a existência de associações dos instrumentos utilizados com

a idade através da análise dos coeficientes de correlação e dos diagramas de dispersão.

Verificou-se uma correlação positiva da idade com a subescala depressão da HADS (r=0.336,

p=0.001) e com o STOP-Bang (r=0.293, p=0.005), o que significa que aumentando a idade

aumenta a depressão e o risco de apneia obstrutiva do sono. Por sua vez, verificou-se uma

correlação negativa com a componente disfunção diurna do PSQI (r=-0.285, p=0.006), em que

aumentando a idade diminui a disfunção diurna. Os restantes coeficientes não foram

estatisticamente significativos nem clinicamente relevantes.


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 19

Tabela 2

Resultados da amostra global por turnos de tratamento

Turno 1 Turno 2 Turno 3 Turno 4


Medidas M DP M DP M DP M DP p
ESS 4.35 5.15 2.74 4.53 1.93 3.60 3.38 2.07 Ns
ISI Total 6.78 5.92 9.03 6.99 7.81 6.29 6.00 4.63 Ns
ISI 1a 1.22 1.20 1.71 1.34 1.33 1.41 0.38 0.74 (<0.10)
ISI 2 a 1.61 1.27 1.50 1.38 1.74 1.35 0.63 0.92 Ns
ISI 3 a 1.09 1.16 1.41 1.37 1.15 1.43 0.63 1.19 Ns
QCM 42.00 5.99 38.47 6.68 38.78 6.03 38.13 6.79 Ns
WOQOL-faceta geral 52.18 14.91 42.64 16.88 44.44 23.59 46.87 21.91 Ns
WOQOL-Físico 60.24 15.94 42.75 18.27 53.04 22.01 73.21 14.28 <0.001
WOQOL- 64.68 11.78 58.57 11.60 63.28 14.66 69.80 16.03 (<0.15)
Psicológico
WOQOL-Relações 66.30 14.09 60.53 15.40 63.89 21.55 72.92 19.28 Ns
Sociais
WOQOL-Ambiente 70.25 12.50 61.95 12.06 66.43 14.87 80.47 13.33 <0.01
PSQI Global 7.52 3.93 9.35 4.10 8.04 4.32 6.63 2.62 Ns
C1 a 0.83 1.23 0.65 1.01 0.62 0.90 0.25 0.71 Ns
C2 a 1.09 0.42 1.18 0.46 1.27 0.53 0.63 0.52 <0.001
C3 a 1.26 1.01 1.97 1.14 1.62 1.24 0.88 0.84 <0.05
C4 a 0.52 0.73 0.68 0.73 0.62 0.85 1.00 0.93 Ns
C5 a 1.48 1.20 1.91 1.06 1.58 1.14 1.00 0.93 Ns
C6 a 1.26 1.48 1.59 1.52 1.27 1.46 1.88 1.36 Ns
C7 a 1.09 0.42 1.38 0.74 1.08 0.63 1.00 0.54 (<0.15)
HADS- Depressão 6.35 3.71 9.88 4.58 6.41 3.34 5.13 3.60 <0.01
HADS-Ansiedade 4.78 3.83 6.26 4.44 4.70 3.07 4.38 3.93 Ns
STOP BANG 3.39 1.27 3.65 1.35 3.70 1.32 3.13 1.55 Ns

Legenda: ISI 1- dificuldade em adormecer; ISI 2 – dificuldade em manter-se a dormir; ISI 3


despertar precoce; C1=duração de sono; C2=distúrbios de sono; C3= latência de sono; C4= disfunção
diurna; C5= eficiência de sono habitual; C6=uso de medicação para dormir; C7= qualidade de sono
subjetiva; Nota: O teste utilizado foi a ANOVA, exceto para os itens assinalados com a , em que se
utilizou o teste não paramétrico correspondente de Kruskal-Walis.

No que concerne à associação do QCM com os restantes instrumentos, verificou-se uma

correlação negativa com a ESS, a componente de disfunção diurna do PSQI e a subescala de

ansiedade da HADS, de modo que quanto mais matutinas as pontuações, menores foram a

sonolência diurna, a disfunção diurna e a ansiedade. Por sua vez, verificou-se uma correlação

positiva com o domínio físico, relações sociais e ambiente do WHOQOL-Bref, o que mostra

que quanto mais matutino, melhor a qualidade de vida nos domínios referidos.
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 20

Tabela 3

Coeficientes de correlação do QCM com os restantes instrumentos

QCM
Medidas r
ESSE -0.226*
ISI Total -0.078
ISI 1ª -0.124
ISI 2ª 0.001
ISI 3ª -0.068
WHOQOL-faceta geral 0.114
WHOQOL-físico 0.274**
WHOQOL-Psicológico 0.201
WHOQOL-Rel. Sociais 0.258*
WHOQOL-Ambiente 0.276**
PSQI Global -0.045
C1a 0.092
C2a -0.121
C3a -0.204
C4a -0.316**
C5a -0.060
C6a -0.177
C7a -0.172
HADS- Depressão -0.067
HADS-Ansiedade -0.351**
STOP BANG -0.094

*p<0.05; **p<0.01;***p<0.001
a
Foi utilizado o rô de spearman; nos restantes instrumentos utilizou-se o r de pearson
Legenda: ISI 1- dificuldade em adormecer; ISI 2 – dificuldade em manter-se a dormir; ISI 3
despertar precoce; C1=duração de sono; C2=distúrbios de sono; C3= latência de sono; C4= disfunção
diurna; C5= eficiência de sono habitual; C6=uso de medicação para dormir; C7= qualidade de sono
subjetiva;

Seguidamente, fez-se uma categorização dos valores do QCM em três grupos: vespertino,

intermédios e matutinos. Numa primeira fase, foi feita essa categorização utilizando o

procedimento mais comum na literatura publicada, que consiste em usar valores provenientes

de amostras de adultos não idosos (no caso da versão portuguesa, recorreu-se aos percentis 25

e 75 definidos por Gomes, 2005), como demonstrado na tabela 4. Através da utilização desses

valores, verificou-se que na amostra global, 3 dos sujeitos são vespertinos, 26 são considerados

intermédios e 63 são considerados matutinos. No entanto, tendo em conta que a amostra é na

sua maioria composta por pessoas idosas, em que a média de idades é de 69 anos, não seria
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 21

adequado utilizar os valores convencionais proveniente de populações mais jovens. Desta

forma, consideramos pertinente definir os valores de categorização através da nossa amostra,

utilizando os percentis 25 e 75 (cf. tabela 4). Assim, verificaram-se grandes alterações na

distribuição pelos três grupos de forma que passou-se a ter 23 sujeitos vespertinos, 46

intermédios e 23 matutinos.

No que concerne à distribuição dos tipos diurnos por turnos, através da categorização

pelos novos valores, verificou-se que o primeiro turno (manhã) é composto maioritariamente

por matutinos e intermédios e o último turno (noturno) é composto apenas por vespertinos e

intermédios, não existindo doentes com o cronótipo matutino neste turno. Nos restantes dois

turnos (início e final de tarde), verificou-se que englobam sujeitos matutinos, intermédios e

vespertinos.

Tabela 4

Distribuição do cronótipo por turnos através dos valores “convencionais” e dos valores

adotados para a amostra

Cronótipo pelos valores convencionais


Turno 1 Turno 2 Turno 3 Turno 4
M DP M DP M DP M DP
QCM 42.00 5.99 38.47 6.68 38.78 6.03 38.13 6.79
n % n % n % n %
Vespertino 0 0.00% 1 2.90% 1 3.70% 1 12.50%
Intermédio 4 17.40% 10 29.40% 11 40.70% 1 12.50%
Matutino 19 82.60% 23 67.60% 15 55.60% 6 75.00%
Cronótipo pelos valores definidos para a amostra
Turno 1 Turno 2 Turno 3 Turno 4
M DP M DP M DP M DP
QCM 42.00 5.99 38.47 6.68 38.78 6.03 38.13 6.79
n % n % n % n %
Vespertino 3 13.00% 10 29.40% 8 29.60% 3 25.00%
Intermédio 12 52.20% 15 44.10% 13 48.10% 6 75.00%
Matutino 8 34.80% 9 26.50% 6 22.20% 0 0.00%

Análises dos efeitos combinados do cronótipo e do turno de tratamento

Posteriormente, procedeu-se há realização de um conjunto de Anovas a 2 fatores (cf.

Tabela 5), em que se pretendeu verificar a influência dos turnos, do cronótipo e da interação
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 22

entre ambos sobre os instrumentos utilizados. Procedeu-se também à realização de ANCOVAs

a dois fatores nas variáveis que tinham evidenciado uma correlação com a idade: depressão-

HADS e STOP-BANG

Verificou-se que relativamente à subescala de ansiedade da HADS, o efeito do cronótipo

é significativo (p<0.01) bem como a interação dos turnos com o cronótipo (p<0.01), ao passo

que o turno evidencia um efeito não significativo. Constata-se que a diferença em termos de

cronótipo se dá entre os matutinos, que apresentam valores mais baixos de ansiedade e os

vespertinos (p=0.014) que apresentam os valores mais elevados. No que concerne à interação,

observou-se o seguinte quanto aos níveis médios de ansiedade em função dos turnos e dos

cronótipo:

― nos matutinos, os níveis médios de ansiedade mostraram uma tendência decrescente

ao longo dos três turnos (manhã, início tarde e final de tarde; nenhum matutino no turno da

noite), ou seja, a ansiedade foi em média mais elevada nos matutinos tratados de manhã e mais

baixa nos matutinos colocados no turno do final da tarde (sendo a média intermédia nos

matutinos do grupo de início da tarde);

― nos intermédios, a média de ansiedade mais elevada ocorreu no turno do início da

tarde, seguindo-se os turnos da manhã e do final da tarde com valores idênticos, sendo no turno

da noite que se observa a média mais baixa de ansiedade;

― nos vespertinos, a média mais elevada de ansiedade ocorreu nos que frequentam o

turno noturno, seguindo-se, por ordem decrescente de ansiedade, o turno da manhã, o turno do

final da tarde e o turno de início da tarde.

Relativamente à subescala depressão, verificou-se o efeito significativo do fator turno

(p<0.01). O turno do início da tarde destaca-se dos restantes turnos, nomeadamente com o da

manhã (p=0.006), do final da tarde (p=0.004) e o noturno (p=0.013), por ser aquele que

apresenta valores médios mais elevados de depressão. O cronótipo mostrou um efeito com
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 23

potencial relevância clinica/prática, em que através da consulta das médias se verifica que os

intermédios são os que apresentam valores mais baixos de depressão, ao passo que a interação

mostrou um efeito não significativo. Procedendo-se à ANCOVA controlando a idade (co-

variável), na subescala de depressão da HADS os resultados obtidos foram consonantes com

os da ANOVA a dois fatores, indicando que as diferenças observadas não são atribuíveis à

idade.

Relativamente ao WHOQOL-Bref, nenhum dos efeitos, nem principais nem de interação,

foram significativos com a faceta geral. No domínio “físico” verificou-se um efeito

significativo do turno de diálise (p<0.001). Segundo os testes post-hoc, o turno noturno obteve

valores significativamente superiores aos restantes, seguido do turno matinal, ao passo que os

dois turnos da tarde evidenciaram valores equivalentes entre si, significativamente inferiores

aos dos outros turnos.

No domínio “psicológico” observou-se um efeito significativo do cronótipo (p<0.01),

em que segundo os testes post-hoc os vespertinos apresentaram resultados mais baixos

comparados com os intermédios (p=0.005) que apresentaram os resultados mais elevados. O

efeito da interação não se mostrou significativo.

No domínio das “relações sociais” verificou-se um efeito significativo do cronótipo

(p<0.05), no entanto o teste post-hoc não sinalizou diferenças significativas. Quanto ao turno

de diálise e à interação não se verificou um efeito significativo.

No domínio do “ambiente” verificou-se um efeito significativo do cronótipo (p<0.05),

existindo diferenças entre os intermédios que apresentaram média mais elevada, ou seja,

melhor qualidade de vida, e os vespertinos (p=0.016) que apresentaram a média mais baixa. O

efeito turno foi tendencialmente significativo (p<0.10), em que o turno noturno apresentou a

média mais elevada, quando comparado com o turno do inicio da tarde(p=0.003) e o turno do

final da tarde(p=0.047). Tal como nos domínios anteriores, não se verificou um efeito
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 24

significativo da interação.

No que concerne à ESS verificou-se apenas um efeito da interação com potencial

relevância clínica/prática (p<0.15), observando-se que:

― nos vespertinos, aqueles que apresentam em média menos sonolência diurna são os

pacientes tratados no turno da manhã, seguindo-se os do final de tarde. Os do turno do início

da tarde e do noturno apresentam valores idênticos, sendo aqueles que apresentam em média

mais sonolência diurna;

― nos intermédios aqueles que apresentam em média resultados mais baixos de

sonolência diurna são os que são tratadas nos turnos de início e final de tarde, seguindo-se os

do turno da noite. Os intermédios no turno da manhã são os que apresentam em média mais

sonolência;

― os matutinos mostraram uma tendência decrescente ao longo dos três turnos (manhã,

início tarde e final de tarde; nenhum matutino no turno da noite), sendo que aqueles que são

tratados no turno da manhã apresentaram em média mais sonolência diurna e aqueles tratados

no turno do final da tarde apresentaram menos sonolência diurna.

Relativamente ao total da ISI, PSQI e ao total do STOP-Bang não se verificou nenhum

efeito significativo principal nem de interação. Contudo, no STOP Bang, quando controlada a

idade através de uma ANCOVA, verificou-se que o tipo diurno passou a ter um efeito

tendencialmente significativo (F(2,80)=2.45, p=0.093), em que os matutinos são aqueles que

pontuaram de forma mais baixa na STOP-Bang, sendo que os vespertinos obtiveram as

pontuações mais elevadas.


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 25

Tabela 5

Sono, qualidade de vida e sintomas psicológicos em função das variáveis turno e

cronótipo (somente resultados significativos/relevantes)

Turno Turno Post-


Turno 1 Turno hoc
3 4 Efeito
M 2 Total F gl Eta2 Efeitos
M M s
(DP) M (DP) principai
(DP) (DP) s
HADS-Ansiedade
Ves 7.33 5.40 6.87 9.00 6.47
Cron. 5.62** 2, 81 0.12 V> M
(1.15) (2.45) (3.84) (5.65) (3.16)
4.42 8.73 4.24 2.83 5.56
Int Turno 0.47Ns 3, 81 0.02 -
(3.87) (5.01) (2.25) (1.95) (4.29)
4.37 3.11 2.83 3.47
Mat - Inter. 3.41** 5, 81 0.17 -
(4.34) (2.67) (2.04) (3.16)
6.27
4.78 4.71 4.37
Total (4.44)
(3.82) (3.07) (3.93)
HADS-Depressão
Vesp 11.00 9.20 8.25 5.00 8.74
Cron. 1.96† 2, 81 0.05 -
(3.46) (4.29) (3.85) (5.66) (4.11)
5.33 9.00 5.23 5.17 6.48 IT>FT e
Int Turno 5.36** 3, 81 0.17
(3.03) (5.35) (2.83) (3.43) (4.21) MeN
6.13 12.11 6.50 8.57
Mat - -
(3.80) (2.85) (3.02) (4.25) Inter. 1.50Ns 5, 81 0.09
6.41
6.35 9.88 5.13
Total (3.34)
(3.71) (4.58) (3.60)
WHOQOL-Físico
69.05 33.57 45.08 58.93 44.41
Vesp Cron. 1.29Ns 2, 81 0.03 -
(4.12) (16.51) (19.08) (17.68) (19.96)
59.53 49.53 55.22 77.97 57.45 IT=FT<
Int Turno 6.90*** 3, 81 0.20
(18.55) (17.33) (20.95) (10.69) (19.68) M<N
58.04 41.67 58.93 51.86
Mat - -
(14.64) (18.72) (28.28) (21.15) Inter. 0.90Ns 5, 81 0.05
60.24 42.75 53.04 73.21
Total
(15.94) (18.26) (22.01) (14.28)
WHOQOL-Psicológico
52.78 56.25 60.94 50.00 56.88
Vesp Cron. 5.53** 2, 81 0.12 I>V
(2.40) (14.60) (18.22) (17.68) (14.84)
68.75 61.67 63.47 76.39 65.94
Int Turno 1.01Ns 3, 81 0.04 -
(13.82) (10.93) (14.65) (9.38) (13.25)
63.03 56.02 65.97 61.06
Mat - Inter. 1.24Ns 5, 81 0.07 -
(6.47) (8.61) (11.00) (9.29)
64.68 58.57 63.28 69.80
Total
(11.78) (11.60) (14.66) (16.03)
WHOQOL-Relações socais
60.42
63.89 51.67 50.00 56.15
Vesp (30.78) Cron. 3.16* 2, 81 0.07 -
(4.82) (20.34) (11.78) (22.50)
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 26

67.36 63.89 62.18 80.56 66.49


Int Turno 0.66Ns 3, 81 0.02 -
(16.04) (12.85) (18.83) (14.60) (16.34)
65.62 64.82 72.22 67.02
Mat - Inter. 0.91Ns 5, 81 0.05 -
(14.39) (9.11) (11.38) (11.64)
66.30 60.54 63.89 72.92
Total
(14.09) (15.40) (21.55) (19.28)
WHOQOL- Ambiente
57.29 56.56 64.84 67.19 60.46
Vesp Cron. 4.12* 2, 81 0.09 I>V
(7.22) (9.93) (16.09) (2.21) (12.13)
75.00 62.29 66.83 84.90 69.84 N>FT e
Int Turno 2.53†† 3, 81 0.09
(11.54) (12.96) (15.39) (12.41) (14.97) IT
67.97 67.36 67.71 67.66
Mat - Inter. 1.01Ns 5, 81 0.06 -
(12.25) (11.17) (14.61) (11.90)
70.24 61.95 66.44 80.47
Total
(12.50) (12.05) (14.88) (13.34)
ESS Total
0.67 5.50 4.25 6.00 4.48
Vesp Cron. 0.89Ns 2, 81 0.02 -
(1.15) (5.82) (5.78) (1.41) (5.23)
5.67 1.40 0.92 2.50 2.52
Int Turno 0.55Ns 3, 81 0.02 -
(5.57) (3.81) (1.55) (1.38) (4.19)
3.75 1.89 1.00 2.30
Mat
(4.43) (2.71) (1.67)
-
(3.30)
Inter. 1.83† 5, 81 0.10 -
4.35 2.74 1.93 3.38
Total
(5.15) (4.53) (3.60) (2.07)
Ns= Não significativo, nem relevante; † p<0.15 ††p<0.10; (*) p=0.05; *p<0.05; **p<0.01 ***p<0.001

No que concerne às componentes do PSQI e aos itens da ISI utilizou-se o teste

correspondente não paramétrico, fazendo split file e utilizando o teste de Kruskal-Wallis (cf.

tabela 6). Na componente dos distúrbios de sono, verificou-se que os vespertinos e os matutinos

pontuam sempre de forma semelhante, independentemente do turno de tratamento em que se

encontram. Relativamente aos indivíduos de cronótipo intermédio, verifica-se diferenças

relativamente ao turno da noite, que obteve em média resultados mais baixos, ou seja menos

problemas de sono, comparativamente com os turnos do início de tarde (p=0.022) e do final de

tarde (p=0.038), que foram aqueles que apresentaram os resultados mais elevados e assim mais

dificuldades de sono.

Na componente latência de sono, os vespertinos pontuam da mesma forma,

independentemente do turno em que se encontram. Por sua vez, nos intermédios verificaram-

se diferenças entre os indivíduos do turno da noite, que apresenta em média menor latência de

sono, e os indivíduos do turno do final da tarde (p=0.032) que apresentam em média valores
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 27

mais elevados de latência de sono. Nos indivíduos matutinos também se verificam diferenças

entre turnos, nomeadamente, do turno do início da tarde, que apresentou valores mais elevados,

com o turno do final de tarde (p=0.002) e da manhã (p=0.031).

Na componente medicação, não se verificou influência do turno de tratamento nos

indivíduos vespertinos e matutinos. No entanto, nos indivíduos intermédios verificou-se um

efeito com potencial relevância clinica.

Na componente duração de sono, tal como na componente anterior, apenas se verificaram

diferenças tendencialmente significativas quanto ao turno de tratamento nos indivíduos

intermédios, em que o turno do início da tarde se destaca dos restantes por ser aquele que obtém

pontuações mais elevadas.

Na componente eficiência de sono apenas se verificaram diferenças marginalmente

significativas nos indivíduos matutinos. Nestes pacientes, os que estão no turno do início da

tarde são os que revelam piores resultados na eficiência de sono, em oposição aos que estão no

turno do final da tarde.

Na componente de qualidade de sono subjetiva verificou-se um efeito com potencial

relevância clinica nos indivíduos matutinos, em que os que frequentam o turno do início da

tarde pontuam de forma mais elevada que os restantes, demonstrando pior qualidade de sono.

Nos itens da ISI não verificaram diferenças estatisticamente significativas.

Tabela 6

Componentes do PSQI em função das variáveis turno de tratamento e cronótipo

Turno 1 Turno 2 Turno 3 Turno 4 Kruskal-Wallis


Total
Md (M) Md (M) Md (M) Md (M) χ2
PSQI-Medicação
Vesp. 3.00 (3.00) 1.50 (1.50) 3.00 (2.00) 0.00 (0.00) 3.00 (1.73) 5.21Ns
Int. 0.00 (1.17) 3.00 (1.80) 0.00 (1.00) 3.00 (2.50) 1.50 (1.50) 5.63†
Mat. 0.00 (0.75) 0.00 (1.33) 0.00 (1.00) - 0.00 (1.04) 0.68Ns
Total 0.00 (1.26) 3.00 (1.59) 0.00 (1.27) 2.50 (1.88)

PSQI- Distúrbios de sono


Vesp 1.00 (1.00) 1.00 (1.20) 1.00 (1.43) 1.00 (1.00) 1.00 (1.23) 2.99Ns
Int. 1.00 (1.08) 1.00 (1.7) 1.00 (1.23) 0.50 (0.50) 1.00 (1.11) 9.47*
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 28

Mat. 1.00 (1.13) 1.00 (1.00) 1.00 (1.17) - 1.00 (1.09) 0.44Ns
Total 1.00 (1.09) 1.00 (1.18) 1.00 (1.27) 1.00 (0.63)

PSQI-Latência de sono
Vesp. 2.00 (1.67) 2.50 (2.20) 1.00 (1.57) 2.00 (2.00) 2.00 (1.91) 1.65Ns
Int. 1.00 (1.25) 2.00 (1.47) 2.00 (2.15) 0.50 (0.50) 1.00 (1.48) 8.52*
Mat. 1.00 (1.13) 3.00 (2.56) 0.00 (0.50) - 2.00 (1.52) 12.82**
Total 1.00 (1.26) 2.00 (1.97) 2.00 (1.62) 1.00 (0.88)

PSQI-Duração de sono
Vesp. 0.00 (1.00) 0.00 (0.80) 0.00 (0.14) 0.00 (0.00) 0.00 (0.55) 2.45Ns
Int. 0.00 (0.67) 0.00 (0.27) 1.00 (1.00) 0.00 (0.33) 0.00 (0.59) 6.49††
Mat. 0.00 (1.00) 1.00 (1.11) 0.00 (0.33) - 0.00 (0.87) 2.50Ns
Total 0.00 (0.83) 0.00 (0.65) 0.00 (0.62) 0.00 (0.25)

PSQI-Eficiência de sono
Vesp. 2.00 (2.00) 2.00 (2.10) 2.00 (1.71) 1.00 (1.00) 2.00 (1.86) 2.76Ns
Int. 1.00 (1.25) 1.00 (1.47) 2.00 (1.77) 1.00 (1.00) 100 (1.43) 2.26Ns
Mat. 2.00 (1.63) 3.00 (2.44) 1.00 (1.00) - 2.00 (1.78) 5.86(*)
Total 2.00 (1.48) 2.00 (1.91) 2.00 (1.58) 1.00 (1.00)

PSQI-Qualidade de sono
Vesp. 1.00 (1.00) 1.50 (1.50) 1.00 (1.14) 1.50 (1.50) 1.00 (1.32) 4.03Ns
Int. 1.00 (1.17) 1.00 (1.20) 1.00 (1.15) 1.00 (0.83) 1.00 (1.13) 1.62Ns
Mat. 1.00 (1.00) 2.00 (1.56) 1.00 (0.83) - 1.00 (1.17) 4.38†
Ns= Não significativo nem relevante; † p<0.15; ††p<0.10; (*) p=0.05; *p<0.05; **p<0.01 ***p<0.001

Discussão

Este estudo teve como objetivo o estudo dos diversos padrões de sono, de sintomatologia

ansiosa/depressiva e de qualidade de vida, em pessoas com Doença Renal Crónica, em

tratamento de hemodiálise, em função do efeito combinado do turno de tratamento com o

cronótipo.

No que concerne à qualidade de vida, os doentes que realizam hemodiálise no turno da

noite são aqueles que revelam melhor qualidade de vida a nível físico, psicológico e do

ambiente. No turno do início da tarde verifica-se o contrário, sendo este o turno em que os

pacientes relatam uma pior qualidade de vida nos domínios mencionados. Poderíamos pensar

que este aumento de qualidade de vida se associava ao facto do turno da noite ser o turno que

contém as pessoas mais jovens, e desta forma, este aumento estar relacionado com a diminuição

da idade. No entanto, não se apura uma relação significativa com a idade, parecendo assim que
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 29

o aumento da qualidade de vida está relacionado apenas com o turno e com o cronótipo. Ainda

assim, não é possível excluir a possibilidade dos resultados se deverem a uma melhor condição

física à partida nos doentes do turno da noite. É importante recordar que o turno do início da

tarde compreende a maior proporção de diabéticos e o turno da noite a menor (apenas 1 pessoa),

o que poderá explicar os resultados. No que concerne à relação da qualidade de vida com o

cronótipo, verificam-se diferenças nas relações socias, no ambiente e no domínio psicológico,

em que os vespertinos são aqueles que demonstram ter pior qualidade de vida, ao passo que os

intermédios e os matutinos se assemelham, apesar de os intermédios serem aqueles que, de

forma geral, apresentam melhor qualidade de vida. Sabe-se que a Doença Renal Crónica

restringe a atividade social e profissional dos doentes, desta forma, provavelmente aqueles que

realizam a diálise no turno da noite beneficiam, na medida em que, têm o dia para poder

usufruir de atividades sociais, despender mais tempo com a família, investir nas relações

sociais, atividades estas que acabam por melhorar também a sua qualidade de vida a nível

psicológico. Ainda importante referir, que o turno da noite é composto, à partida, por pessoas

com melhor condição física, o que não foi possível controlar, podendo ter sido um fator com

influência nestes resultados.

Por sua vez, quanto à depressão, diagnóstico muito frequente em pacientes com Doença

Renal Crónica, neste estudo verifica-se que o turno do início da tarde é aquele em que os

pacientes demonstram mais sintomas de depressão. Estes valores contrastam com os valores

de Teles (2014) e de Gul, Aoun e Trayner (2006) que referiram que se notou uma associação

entre a realização de dialise no turno da manhã e um aumento da depressão, apesar de essa

associação não ter sido totalmente explorada. Importante referir que, no nosso estudo, o turno

do início da tarde é aquele que é composto pela população mais idosa, e desta forma, pensou-

se se poderia ter sido o fator da idade que tenha influenciado estes valores, na medida em que,

também se verificou que com o aumento da idade se dá um aumento da depressão. No entanto,


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 30

a ANCOVA a dois fatores sugere que os resultados por turno não devem ser atribuíveis à idade.

Resta como possível explicação o fato do turno da tarde compreender a maior proporção de

doentes que também são diabéticos.

Relativamente à ansiedade, existe uma relação com o tipo diurno, não se verificando

influência dos turnos de tratamento. Neste caso, os vespertinos evidenciam os valores mais

elevados de ansiedade e os matutinos demonstraram ser os menos ansiosos. Estes resultados

são compatíveis com os de Passos et al. (2017), onde se demonstrou uma associação do

cronótipo vespertino com o aumento da ansiedade. Por sua vez, verificou-se uma influência da

interação do turno de diálise com o cronótipo, em que: a) os indivíduos matutinos apresentam

ansiedade mais elevada quando tratados de manhã e mais baixa quando tratados no turno do

final da tarde; b) nos indivíduos intermédios, aqueles que fazem diálise no turno do início da

tarde apresentam mais ansiedade, contrariamente aos do turno da noite que são aqueles que

apresentam menos; c) quanto aos indivíduos vespertinos a média mais elevada de ansiedade

ocorre nos que frequentam o turno noturno, seguindo-se, por ordem decrescente de ansiedade,

o turno da manhã, o turno do final da tarde e o turno de início da tarde. Como hipótese que

justifique estes interessantes resultados, também sugerida por Teles et al. (2014), podemos

considerar que o cronótipo pode ter impacto na qualidade de vida e na ansiedade se as

atividades que a pessoa desempenha durante o dia têm que ser realizadas no período contrário

ao seu ritmo endógeno, ou seja, por exemplo, os matutinos que realizam diálise no turno da

manhã depois têm que realizar as atividades do quotidiano num período que não lhes é

favorável.

Em termos de qualidade de sono, medida pelo PSQI, verificou-se que o turno da noite

demonstrou melhores resultados, em particular, nas componentes de distúrbio de sono, latência

de sono e qualidade de sono subjetiva. Por sua vez, foi o turno do início da tarde que apresentou

pior qualidade de sono, nessas mesmas componentes. Estes resultados contrastam com o estudo
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 31

de Wang et al. (2013) que afirmou que realizar hemodiálise no turno da manhã está associado

significativamente a uma melhor qualidade subjetiva de sono medida pelo Pittsburgh Sleep

Quality Index. No entanto, neste estudo apenas existiam os três primeiros turnos,

nomeadamente, o da manhã, do inicio da tarde e do final da tarde. Desta forma, não podemos

fazer uma comparação uma vez que não continha o turno da noite. Acresce que o facto do turno

da tarde do nosso estudo ser composto por mais diabéticos poderá constituir uma explicação

para a pior qualidade de sono. Por sua vez, relativamente ao tipo diurno, verificou-se que os

matutinos apresentavam menos disfunção diurna que os vespertinos. No entanto, quando

estudado o efeito combinado do cronótipo e do turno de tratamento verifica-se que nos

pacientes vespertinos, independentemente do turno de diálise que frequentam, não mostram

diferenças a nível de qualidade de sono. Nos intermédios verifica-se que o turno tem influência

nas componentes distúrbios de sono, latência de sono, medicação e duração de sono.

Relativamente aos indivíduos matutinos apenas se verificaram diferenças na qualidade de sono

subjetiva e na latência de sono, em que os indivíduos matutinos em tratamento no turno do

início da tarde apresentam piores resultados.

Segundo Hsu et al. (2008) os doentes do turno da manhã apresentavam mais sonolência

diurna, medida pela Epworth Sleepiness Scale. No nosso estudo, não se verificou uma

diferença significativa entre os turnos. No entanto, verificou-se a influência do tipo diurno, em

que quanto mais matutino menor é a sonolência diurna. Por sua vez, no que concerne à

interação do turno de tratamento com o cronótipo, verifica-se que nos vespertinos, aqueles que

apresentam em média menos sonolência diurna são os pacientes tratados no turno da manhã,

seguindo-se os do final de tarde. Os do turno do início da tarde e do noturno apresentam valores

idênticos, sendo aqueles que apresentam em média mais sonolência diurna; nos intermédios

aqueles que apresentam em média resultados mais baixos de sonolência diurna são os que são

tratadas nos turnos de início e final de tarde, seguindo-se os do turno da noite. Os intermédios
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 32

no turno da manhã são os que apresentam em média mais sonolência; os matutinos mostraram

uma tendência decrescente ao longo dos três turnos (manhã, início tarde e final de tarde;

nenhum matutino no turno da noite), sendo que aqueles que são tratados no turno da manhã

apresentaram em média mais sonolência diurna e aqueles tratados no turno do final da tarde

apresentaram menos sonolência diurna. Estes resultados são de difícil interpretação e a

literatura sobre cronótipo na doença renal é extremamente escassa. Por isso, não dispomos de

uma explicação convincente para estes resultados, que devem constituir um estímulo para

investigação futura.

Ainda nas variáveis de sono, e no que concerne à insónia, medida pela ISI, verificou-se

que o turno do início da tarde é aquele que apresenta maior dificuldade em adormecer o que se

verifica também no estudo de Al-Jahdali et al. (2010). Uma explicação poderia residir na idade

mais avançada dos doentes deste turno (dada o aumento de queixas da insónia com a idade

relatado na literatura), não fosse o facto da idade não se ter relacionado com a pontuação da

ISI. Uma explicação mais provável reside no maior número de doentes diabéticos neste turno.

Como limitações do presente estudo, pode-se considerar o facto de os pacientes terem

respondido aos questionários durante a sessão de hemodiálise, o que não garantiu a sua

privacidade. Por outro lado, pelo facto de os pacientes se encontrarem a fazer o tratamento

durante a recolha de dados, as questões foram colocadas oralmente quando, por norma, são

aplicadas na modalidade de autorresposta. Outra limitação é o facto de a amostra ter sido

recolhida por duas pessoas diferentes, sendo que desta forma não foi possível controlar um

possível enviesamento da recolha de informação. Pode ainda ser considerado a diferença de

tamanho entre turnos de tratamento, especialmente no turno noturno, sendo que teria sido

importante que esse turno fosse maior e semelhante aos restantes. Importa também destacar

que os doentes estavam distribuídos à partida pelos turnos de diálise, não sendo portanto

possível aos investigadores constituir grupos equivalentes através de procedimentos do tipo


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 33

aleatorização. Assim, o turno da noite distingue-se dos restantes pela idade mais jovens e

apenas um sofrer de diabetes, entre outras possíveis diferenças (melhores indicadores de saúde

como condição importante para admissão a esse turno; sessão de diálise durante 6 horas,

permitindo resultados melhores do que a duração habitual de 4 horas).

Ainda a acrescentar que embora os instrumentos escolhidos se encontrem entre os

melhores instrumentos de autorresposta, também possuem limitações no que se refere ao

diagnóstico de problemas de sono, na medida em que não permitem o diagnóstico de quadros

clínicos propriamente ditos. Como sugestão para futuros estudos, seria relevante utilizar

entrevistas para complementar a ISI no que toca à avaliação da insónia, bem como recorrer

métodos objetivos, de forma a permitir uma avaliação mais minuciosa, nomeadamente, a

actigrafia e a polissonografia de modo a complementar o STOP Bang para uma avaliação do

risco de apneia obstrutiva do sono.

Este estudo é pertinente para uma melhor compreensão dos padrões de sono em doentes

com Doença Renal Crónica, principalmente pelo facto de estudar os efeitos do turno em que

se realiza diálise e do cronótipo na influência das variáveis clinicas, qualidade de vida e sono.

Este estudo parece ser o primeiro a analisar o efeito combinado do turno e do cronótipo. Na

literatura internacional encontram-se estudos interessados na influência do turno de dialise mas

sem considerar o tipo diurno dos doentes. Ainda como pontos fortes ao estudo podem-se

considerar a boa qualidade psicométrica dos instrumentos utilizados e o facto de a amostra

parecer traduzir o perfil sociodemográfico da população estudada.

O presente estudo revela resultados promissores relativamente ao turno noturno, mas

seria indispensável que a investigação futura pudesse adotar um design experimental, ou

procedendo à alocação aleatória dos doentes por turnos, ou através da avaliação dos mesmos

participantes quando submetidos a diferentes turnos de tratamento. Na ausência destes

procedimentos, afigura-se arriscado concluir que o turno noturno se associa a melhor sono ou
TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 34

qualidade de vida para a generalidade dos doentes.

Referências

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TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 38

Anexos

1. Parecer da Comissão de Ética e Deontologia da Faculdade de Psicologia e Ciências da

Educação da Universidade de Coimbra.


TURNO DE HEMODIÁLISE, CRONÓTIPO E SONO 39

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