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Sinta A Música K.M. Neuhold

O documento apresenta um resumo do livro 'Sinta a Música', que faz parte da Série Replay, focando em um membro da banda que enfrenta desafios na composição musical e questões pessoais. O protagonista, Lando, lida com a pressão de criar novas músicas enquanto enfrenta problemas emocionais e relacionais. A narrativa explora temas de amor, amizade e a busca por identidade em meio ao sucesso da banda.

Enviado por

Cleyde Rosário
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
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Sinta A Música K.M. Neuhold

O documento apresenta um resumo do livro 'Sinta a Música', que faz parte da Série Replay, focando em um membro da banda que enfrenta desafios na composição musical e questões pessoais. O protagonista, Lando, lida com a pressão de criar novas músicas enquanto enfrenta problemas emocionais e relacionais. A narrativa explora temas de amor, amizade e a busca por identidade em meio ao sucesso da banda.

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SUMÁRIO

Avisos
Faixa 1: Lado A
Faixa 2: Lado B
Faixa 3: Lado A
Faixa 4: Lado B
Faixa 5: Lado A
Faixa 6: Lado B
Faixa 7: Lado A
Faixa 8: Lado B
Faixa 9: Lado A
Faixa 10: Lado B
Faixa 11: Lado A
Faixa 12: Lado A
Faixa 13: Lado B
Faixa 14: Lado A
Faixa 15: Lado A
Faixa 16: Lado B
Faixa 17: Lado A
Faixa 18: Lado A
Faixa 19: Lado A
Faixa 20: Lado A
Faixa 21: Lado A
Faixa 22: Lado A
Faixa 23: Lado A
Faixa 24: Lado A
Faixa 25: Lado A
Faixa 26: Lado A
Faixa 27: Lado B
Faixa 28: Lado A
Faixa 29: Lado A
Faixa 30: Lado A
Faixa 31: Lado A
Nota
Sobre a Autora
Conheça a Galuba Editorial
Créditos e copyright

Sinta a Música é o segundo livro da Série Replay. Todos os livros da série


focarão num membro diferente da banda tendo uma segunda chance no
amor. Todos os livros podem ser livros isoladamente.
Faixa 1: Lado A
LÁGRIMAS DE UMA INSPIRAÇÃO

Lando

As folhas em branco me provocam cruelmente. Não importa quantas vezes


coloque a ponta do meu lápis no papel, ele continua em branco. Você já
sentiu como se toda a sua vida dependesse da sua habilidade em fazer
alguma coisa que, de repente, não é mais capaz? Não que eu vá morrer se
não conseguir escrever. Mas, se não conseguir, a banda estará morta, e eu
posso muito bem morrer junto com ela.
– Apenas escreva – ordeno a mim mesmo, colocando a ponta do lápis no
papel mais uma vez. – Não pode ser tão difícil. Você já compôs três dúzias
de músicas, se não mais. Apenas coloque uma palavra na frente da outra até
ter palavras suficientes para preencher cerca de três minutos.
Arrasto a ponta do lápis no papel, mas ainda assim as palavras não
aparecem.
– Maldição – urro, quebrando o lápis com a mão, e jogo os pedaços no
chão. – Maldição, maldição, maldição.
Uma mágoa familiar fervilha em meu peito. Se Lincoln não estivesse tão
fodido, eu não estaria nessa posição. Quando assinamos nosso primeiro
contrato com a Epic Records há dez anos, Lincoln e eu concordamos em
dividir a responsabilidade de compor as músicas. E quantas músicas
Lincoln compôs? Duas. Duas porras de músicas em dez anos, enquanto eu
fico sentado aqui com uma úlcera por precisar compor um álbum inteiro nas
próximas semanas.
– Vai se foder, Lincoln, e eu que me foda também – resmungo,
levantando-me do sofá e indo para a minha cozinha pegar outra cerveja.
Que tal isso para uma noite selvagem de sexta-feira na vida de uma
estrela do rock? Beber cerveja e me autocriticar na minha cobertura
mortalmente silenciosa.
Vou até a janela que ocupa toda a parede leste. As luzes da cidade
brilham como se fossem estrelas por todos os lados, só que quando eu
inclino a cabeça para ver as estrelas de verdade, não há nada além de uma
neblina poluindo o céu.
Ergo a garrafa de cerveja até os meus lábios e tomo metade de um gole
só. Nada disso era como deveria ser. Quando começamos a banda, não
éramos nada além de melhores amigos compartilhando o amor pela música.
Quando assinamos com a Epic, tínhamos tanta certeza de que isso mudaria
nossas vidas. Não estávamos errados. Uma década depois, temos sete
álbuns, três deles foram platina, temos um nome conhecido, nossas músicas
– minhas músicas – tocam em todas as estações de rádio. Estamos vivendo
o sonho. Então, por que isso parece tão vão?
Descanso as palmas das mãos contra o vidro gelado da janela e me
pergunto, pela milionésima vez, qual o sentido disso tudo.
O som estridente do meu telefone tocando me faz dar um pulo. Coloco a
mão no bolso e vejo o nome de Archer na tela. Só existe um motivo para o
nosso empresário me ligar depois da meia-noite numa sexta-feira qualquer.
– Ele está bem? – pergunto assim que atendo. Minha voz soa indiferente
para os meus próprios ouvidos, e eu me pergunto se Archer percebe. Eu me
sinto esgotado física e emocionalmente. Sou uma bateria com apenas dez
porcento de vida restante e nenhum carregador à vista.
– Ele está no hospital – responde Archer, soando tão exausto quanto eu.
– É muito ruim?
– Ainda não tenho certeza. Estão fazendo uma lavagem estomacal.
Parece que ele bebeu um litro de uísque. Eu o encontrei desmaiado na
varanda, quase congelado.
– Na varanda? – Coloco a mão de volta no vidro congelante e estremeço.
– Está por volta de doze graus negativos lá fora.
– É – concorda Archer.
– O que você precisa que eu faça?
– Esta noite, nada. Só queria que você soubesse, e esperava que pudesse
passar aqui para conversar depois que ele sair do hospital. Amanhã à noite,
talvez?
– Sim, a hora que for – concordo. – Quer que eu ligue para o Benji e o
Jude?
– Pode deixar que eu ligo, preciso de algo para me distrair enquanto
espero. Mas obrigado.
– Sem problemas. Até amanhã.
Desligo e bebo o resto da cerveja. Às vezes, parece que esta não é a vida
que deveríamos viver. Todos nós nos desviamos em algum momento. Posso
identificar exatamente onde a minha vida se dividiu entre antes e depois.
Escrevi uma dúzia de músicas sobre ele. Fiquei noites acordado pensando
nele. Fiquei bêbado e chorei por ele. Eu mal o conheço, mas, em nove anos,
não consegui esquecê-lo. O que eu não daria para voltar e fazer algo
diferente. Talvez eu nunca o tivesse deixado. Talvez eu tivesse implorado
para ele vir comigo. Não sei o que faria, mas qualquer outra opção seria
melhor do que isso.
Jogo a garrafa vazia na lixeira de recicláveis e vou para o meu quarto,
tirando a roupa pelo caminho. Talvez eu sonhe com alguma maldita letra e
salve a minha vida. É mais provável que eu sonhe com ele.
Faixa 2: Lado B
LOUCO POR VOCÊ NUM AVIÃO

Lando

Franzi o nariz diante do cheiro de avião velho que me atingiu quando


embarquei. Eu me perguntei se aviões particulares tinham este mesmo
cheiro de chulé e se algum dia eu teria a chance de descobrir. Com a
trajetória ascendente da banda, esperava ter. Mas eu não gostava de contar
com o ovo no cu da galinha. Eu só tenho dezenove anos e ainda não
consigo acreditar na vida de estrela do rock que está a minha frente.
Acomodei-me no meu assento e subi a cortina para olhar pela janela.
Fazia um dia cinzento e deprimente lá fora: um reflexo perfeito do que
acontecia na minha mente.
Estava me sentindo nervoso logo depois da nossa primeira turnê como
abertura de uma grande banda de rock. Lincoln estava estranho; primeiro,
tão depressivo que mal saía da cama, para repentinamente sair todas as
noites com Jude, sem dormir, irritado o tempo inteiro… Eu achei que ele
estava cheirando cocaína junto com Jude, mas, depois de mais ou menos
um mês, voltou a ser ele mesmo do nada. Não consegui entender porra
nenhuma do comportamento dele.
Depois, recebi uma ligação, no final de semana anterior, da minha mãe
me contando que meu pai estava no hospital depois de um infarto e
precisava de uma cirurgia de safena. Nosso álbum de estreia já estava
pronto, e faltava um pouco mais de uma semana para sairmos na nossa
primeira turnê como atração principal, então, voei para casa para a cirurgia
dele. Correu tudo bem, mas não conseguia me livrar da imagem do meu pai
pálido naquela cama de hospital.
O estalo do compartimento superior tirou minha atenção da janela para
analisar a pessoa que passaria as próximas horas sentada ao meu lado. Meu
olhar passeou por um homem lindo com cachos castanhos saindo de um
gorro vermelho, uma jaqueta preta de couro combinando com seu corpo
esbelto e impressionantes olhos azuis. Quando um sorriso lento se abre em
seus lábios, duas covinhas aparecem em suas bochechas, e eu sinto o
estranho impulso de passar minha língua nelas.
– Sou eu ou uma fita num assento de avião não inspira muita confiança?
– brinca ele, apontando para a fita isolante no braço do seu assento.
– Tenho certeza de que usaram muita fita isolante para manter o motor no
lugar – asseguro-lhe sério.
– Assim espero. – Ele se senta no assento ao meu lado e uma fragrância
de baunilha flutua à minha volta, isso faz eu me inclinar para frente para
cheirá-lo e encher meus pulmões com este odor delicioso.
– Eu sou o Lando. – Estendo a mão e ele a aceita.
– Dawson – respondeu. – Você mora na Flórida ou está indo de férias?
– Na verdade, é uma conexão. Estou indo para Nova Iorque.
– Ah… – assente em compreensão, há uma pontada de decepção por trás
de seu olhar. – Estou voltando para casa. Acabei de terminar a faculdade e
estou tentando descobrir que diabos fazer agora que sou oficialmente um
adulto.
– Em que você se formou?
Dawson me olha desconfiado como se estivesse se preparando para ser
zoado.
– Mestrado em Literatura. Eu sei, deve ser a graduação mais inútil em se
tratando de conseguir um emprego.
– Você é escritor? Ou apenas um amante da palavra escrita?
– Os dois – Dawson suspirou com um sorriso contente. – Eu adoro
palavras. Adoro o jeito que certas palavras soam, o jeito com que a frase
perfeita pode fluir da sua língua para a sua caneta. A língua é linda e
inspiradora.
– É, sim – concordei. – Eu sou meio que um escritor.
– Meio? – questionou ele com uma sobrancelha arqueada. – Ou você
escreve ou não.
– Eu escrevo músicas – expliquei. – Faço parte de uma banda.
– Hmm, excelente cantada – ronronou ele, e minha pele se arrepiou de
calor. – É uma banda de garagem ou o quê?
– Não exatamente – resmungo, passando os dedos pela minha barba
longa.
– Ai, merda, você é famoso e eu simplesmente não te reconheci? Calma
aí, se você é famoso, o que está fazendo num avião que está remendado
com fita isolante?
– Não sei se somos famosos – eu me esquivei. – Acabamos de terminar a
turnê de abertura para o Next Weekend, e nossa primeira turnê solo começa
na semana que vem.
– Ai, meu Deus, você é do Queda Vertiginosa?
– Sou. – Senti o rubor correndo pelo meu rosto, mas a admiração no rosto
de Dawson me deixou um pouco convencido também.
– Isso é legal pra caralho. Você compôs Alameda Cherry?
– Não, não compus essa. Eu compus as outras músicas deste álbum.
O sorriso de Dawson se alargou.
– Posso te contar um segredo?
– Claro – dou uma risada.
– Achei as outras músicas melhores do que Alameda Cherry – admitiu
ele. – Quero dizer, essa era legal, mas as outras eram muito… mais.
Poéticas e cativantes. Originais e lindas.
Senti meu rubor crescer, meu rosto fervia.
– Obrigado – murmurei.
– Desculpe, sou efusivo – desculpou-se Dawson. – Chato você só estar
na Flórida para pegar outro voo.
Sua voz era melancólica e seu olhar quente, cheio de promessas. Alguma
coisa dentro de mim me dizia para adiar o voo. Eu não precisava realmente
estar de volta a Nova Iorque até terça-feira. Que mal faria passar um final
de semana dando uns amassos sem compromisso?
Faixa 3: Lado A
SIRVA-ME OUTRA BEBIDA

Dawson

Acordo num nevoeiro, piscando os olhos para me livrar dos resquícios de


um sonho que está desaparecendo como se fosse fumaça. Alguma coisa no
sonho parecia muito real, muito familiar. Mas, agora, já se foi, e não posso
voltar a ele. É uma sensação com a qual me acostumei nos últimos nove
anos.
Uma luz pisca na minha sala, e eu sorrio. É o jeito de a minha irmã
anunciar sua presença. Uma luz anexada à campainha é um dos muitos
dispositivos que venho adquirindo ao longo dos anos para possibilitar que
eu more sozinho.
Tiro o lençol de cima de mim, meu corpo já está todo suado. São dez
horas da manhã, pelo amor, ainda não deveria estar este maldito calor. Sei
que estou na Flórida, mas é dezembro, caramba. Visto um short de basquete
e uma camiseta limpa, e vou para a sala ver minha irmã, Parker.
– Eu trouxe café – diz ela em linguagem de sinais, e eu balbucio
“obrigado” para ela, levantando as mãos juntas em oração para ela saber o
quanto estou grato.
– Dormi mal pra cacete – digo em sinais.
– Pesadelo?
– Não consigo lembrar. Acho que eram memórias, que desaparecem
assim que acordo – admito com um sinal triste.
Quando acordei do coma, depois de um acidente de carro que quase me
matou, não tinha praticamente memória nenhuma. Não reconheci minha
mãe nem minha irmã, não conseguia me lembrar de quem eu era nem de
onde estava. Depois de alguns dias, algumas memórias foram voltando aos
poucos, mas não tudo. Os médicos me disseram que as partes esquecidas da
minha memória poderiam voltar algum dia… ou não. Depois de nove anos,
não espero mais recuperá-las.
Não me importo em não me lembrar de algumas coisas esporádicas da
minha infância. O que me incomoda é ninguém saber onde passei o final de
semana antes do acidente. Não me lembro de nada do ano anterior, mas sei
que estava terminando meu último ano de faculdade. Tudo está mais ou
menos registrado. Com exceção do final de semana. Disseram que eu estava
vindo da faculdade para casa quando liguei do aeroporto para contar que
meus planos haviam mudado e chegaria em casa só na segunda. Parker diz
que eu parecia animado, mas não dei nenhum detalhe de onde eu passaria o
final de semana. É a única coisa que tenho me esforçado para lembrar.
Porém, quanto mais tento lembrar, mais distante essas lembranças parecem
ficar.
É uma sensação estranha, como se estivesse entrando num cômodo e não
fosse capaz de lembrar por que estou ali. É sempre assim quando tento me
lembrar daquele final de semana. É como se alguma coisa importante
tivesse acontecido, e eu nunca saberei o que foi.
Minha irmã cutuca meu ombro para chamar minha atenção e me passa
uma tigela de cereal que encheu para mim. Reviro os olhos diante de seus
cuidados maternais. Eu sou surdo, não paraplégico. Sou perfeitamente
capaz de pegar o meu cereal e qualquer outra porcaria de que eu precise.
Aquele acidente tirou duas coisas de mim: minha memória e minha
audição. Os médicos me disseram que a audição também poderia voltar,
mas, depois do primeiro ano sem nenhum sinal de qualquer mudança, eles
admitiram que era improvável que eu voltasse a escutar, a menos que
estivesse disposto a tentar uma cirurgia experimental arriscada e cara.
É estranho o quanto a maioria das pessoas não dá valor à audição. O
barulho irritante de um alarme, pássaros piando na janela, o tráfego, música,
risadas gravadas em seriados antigos… tudo se foi. Mais do que qualquer
coisa, sinto falta do som das palavras, a fluência da linguagem saindo da
boca de alguém. E sinto mais falta de música do que pensei que sentiria.
Levo a tigela de cereal para o sofá e pego a edição de Music Insider que
deixei aqui. É uma edição especial com os integrantes da banda Queda
Vertiginosa. Sorrio e passo o dedo pela imagem do rosto de Lando Meyer
sorrindo na capa da revista. Um leve arrepio vai do meu peito direto para o
meio das minhas pernas. Admito que tenho uma quedinha patética por uma
celebridade que nunca conheci, então, me processe.
Só queria poder ouvir a música deles. Não me lembro de algum dia tê-los
ouvido tocar, mas a obsessão que tenho por eles deve significar que já ouvi
as músicas deles em algum momento, não é? É estranho como o cérebro
consegue fazer esse tipo de coisa, se prender tanto a algo sem lembrar o por
quê.
Gosto de aumentar o volume das músicas deles para sentir o baixo
vibrando em meu peito. E eu li as letras, admirando a poesia e me
perguntando, com inveja, quem Lando ama tanto a ponto de escrever sem
parar sobre este homem.
Parker se joga no sofá ao meu lado, e eu largo a revista.
– Você trabalha hoje? – pergunta ela.
Concordo com um movimento de cabeça e mostro meu celular para ela.
– Desculpe, sei que deveria verificar sua agenda.
– Sempre verifique a agenda do todo-poderoso – brinco.
Se ao menos as pessoas da minha faculdade de Belas Artes pudessem me
ver agora: com problemas cerebrais, trabalhando em um bar e incapaz de
escrever uma única palavra. Eu era um merdinha arrogante naquela época,
com tanta certeza de que escreveria um livro que mudaria o mundo. Não
escrevi porcaria nenhuma em nove anos. Morra de inveja, Dickens.
– Precisa de carona? – pergunta Parker, e eu reviro os olhos. Faço meu
sinal preferido para ela: o dedo do meio. Ela balança a cabeça em
reprovação e me dá um beijo no rosto antes de se levantar do sofá.
– Vou te levar para jantar amanhã para comemorar o seu aniversário. Te
pego às seis. Vista algo bonito. Precisa de alguma coisa antes de eu ir
embora?
Faço joinha para ela e balanço a cabeça em negação para que ela saiba
que não preciso de nada.
Quando ela sai, anoto os planos no calendário do celular imediatamente.
Aí, levanto do sofá e dou uma olhada em volta. Cairia bem um pouco de
decoração natalina, mas o fato de Parker e eu sermos os únicos para
apreciá-las é meio deprimente.
Não me atrevo a contar a Parker o quanto me sinto solitário às vezes, ela
simplesmente começaria dizendo o quanto sou exigente com os homens.
Ela diz que estou contrapondo todos os homens com um cara perfeito que
sonhei em algum momento. Ela está certa, mas não sei exatamente de onde
tirei este arquétipo do homem perfeito. Em algum momento durante o ano
que está completamente perdido, imagino eu. Antes disso, namorei bem
indiscriminadamente, satisfeito em me divertir com qualquer um que
conseguisse virar a minha cabeça.
Namorar é supervalorizado mesmo.
Eu me levanto do sofá e dou uma arrumada no meu apartamento,
tentando me distrair. Geralmente eu leio, mas me sinto empolgado hoje por
algum motivo. Era assim que eu costumava me sentir ao que chamo de
“vontade de escrever”, mas já faz um tempo que não consigo colocar
nenhuma palavra no papel. Pelo menos, nenhuma palavra que valha a pena.
Mesmo assim, tento quando estou empolgado. Pego meu notebook e
volto para o sofá. Parece que desliguei um interruptor: toda a energia que
ardia em mim momentos antes desaparece de repente.
Encaro o cursor piscando no documento em branco do Word e me odeio
um pouco. Eu consegui escrever uma frase ontem, mas a apaguei
imediatamente. Não era boa. Era chata e sem sentido. Provavelmente,
porque eu não faço ideia do que estou tentando escrever.
Eu sei que tinha ideias brilhantes que se tornariam histórias inéditas
necessárias de serem compartilhadas com o mundo. Mas não sei onde elas
estão agora. Acho que o acidente fodeu com a parte do meu cérebro que
sabia como criar frases lindas que grudam na sua mente e fluem de sua
língua. Eu era um bom escritor… não era?
Acho que não surpreende muito o fato de uma lesão cerebral me tirar as
minhas palavras, a única coisa que já amei.
Assim como a minha memória, parece que quanto mais tento forçá-las,
mais indefiníveis as palavras se tornam. Talvez seja a hora de aceitar que
nunca voltarei a escrever.

Lando

Acordo com uma dor conhecida no meu peito e ainda sem palavras.
Levanto da cama e vou para a cozinha. O relógio no forno me diz que
dormi muito mais do que pretendia, porque já passa do meio-dia. Encontro
minha calça onde a deixei, no chão, tiro meu celular do bolso e vejo uma
mensagem de texto de Archer de algumas horas atrás me dizendo que
Lincoln estava bem e já voltara para casa, e que ele viria aqui por volta de
13h, o que era daqui a cinco minutos.
Ouço uma batida na porta e balanço a cabeça, sorrindo com a
pontualidade de Archer. Vestido apenas de cueca, abro a porta, e recebo um
olhar de Archer que me diz que não está achando graça.
– Acabei de acordar – explico. – Se importa de colocar o café para fazer
enquanto me visto?
– É para isso que estou aqui – responde Archer secamente.
No meu quarto, visto uma calça jeans e uma camiseta chique que alguma
figurinista da empresa de relações públicas colocou no meu armário.
– Eu poderia te dar um beijo – anuncio quando Archer me passa uma
caneca fumegante de café.
– Passo – ele sorri sarcasticamente.
– Magoou.
– Você vai sobreviver – garante-me ele. – Podemos conversar agora?
– Sim, vamos acabar com isso – concordo, apontando para o sofá. Fico
envergonhado quando ele olha para os papeis largados e os lápis quebrados
espalhados pelo sofá. O fato de eu não conseguir escrever é um segredo tão
bem guardado quanto a autoagressão de Lincoln. Isto é, todos sabem, mas
ninguém tem culhões para comentar. – O que você vai fazer em relação ao
Lincoln? Fizemos vista grossa por muito tempo, esperando que fosse só
uma fase que iria passar, mas ele está se tornando mais autodestrutivo. Na
próxima vez, pode acabar sendo muito pior do que uma passagem rápida
pelo hospital para uma limpeza estomacal ou alguns pontos – digo enquanto
nos acomodamos no sofá.
– Concordo. Minha preocupação é que Lincoln não esteja pronto para
receber ajuda. Poderíamos interná-lo numa clínica psiquiátrica, mas se ele
não quiser ajuda, isso só vai piorar a situação.
– O que vamos fazer? – pergunto desesperado.
– Não estou preocupado só com Lincoln – diz Archer de maneira
enigmática.
– Jude? – palpito. Nosso baterista… a veia selvagem de Jude é muito
mais divertida do que a de Lincoln, mas não menos prejudicial.
– Sim, e…
– Comigo? – resmungo.
– Acredito que todos vocês precisem tirar umas férias. Você não escreve
uma única palavra desde que terminou com aquele babaca do Roland no
verão passado. Lincoln pode fazer uma pausa para repensar e, se Deus
quiser, voltar pronto para receber ajuda. E Jude… estou planejando ligar
para um amigo meu que pode ajudá-lo.
– E quanto ao Benji? – Pobre Benji, foi pego no meio de toda a nossa
merda.
– Eu diria que ele também merece umas férias, não acha?
– Com certeza – concordo com um nó na garganta. – Então, é isso? A
banda acabou?
– Não sei. – A honestidade crua em sua voz dificulta ainda mais ouvir
isso. – Espero que não, mas as coisas precisam mudar.
Concordo com um movimento de cabeça.
– Para quem você vai ligar para ajudar Jude?
– Bennett – responde Archer com a voz entrecortada.
– Calma aí… seu ex-noivo? – Arregalo os olhos, e sorrio do jeito com
que Archer se mexe no sofá. Numa noite regada a bebida, anos atrás,
Archer me contou tudo sobre seu ex. Eles não estavam noivos no sentido
tradicional, já que o casamento homoafetivo não era permitido naquela
época, mas eles usavam alianças e se prometeram que era para sempre.
– Ele é o melhor no ramo – defende ele.
– Claro que é – concordo com um sorriso cúmplice. – Afinal, por que foi
que vocês terminaram?
Archer esfrega o rosto com a mão e meneia a cabeça para mim.
– Esta não é mais uma conversa entre o empresário e um integrante da
banda, e ninguém mais precisa saber o que estou prestes a falar. Entendeu?
Gesticulo um X sobre meu coração. Para quem eu contaria, afinal? Jude e
Lincoln não se importam com fofocas sobre Archer, e Benji só gosta de
fofoca que tenha alguma coisa a ver consigo mesmo.
– Minha boca é um túmulo – afirmo.
– Nós nos amávamos muito, mas não éramos compatíveis na cama. Fora
do quarto, não poderíamos ser mais perfeitos um para o outro. Ambos
fervorosos viciados em trabalho, adorávamos viajar e um bom vinho,
gostávamos das mesmas músicas e filmes. Ele era o meu melhor amigo e
um excelente parceiro de vida. Mas não conseguimos superar o problema
da cama.
– Qual era o problema? Os dois só gostavam de ficar por cima ou algo
assim? – palpito.
– Em parte, sim – assente Archer. – Mas tinha mais uma coisa. Bennett
tinha uma veia meio dominante que não funcionava para mim. Ele não
queria um relacionamento dominante/submisso o tempo todo, mas
implorava por mais controle na cama do que eu estava disposto a dar. Ele
tinha uma ânsia que eu simplesmente não podia atender, e isso afetou nós
dois, por saber que eu nunca seria o bastante para ele.
– Ai, que merda, isso é péssimo.
– É sim. Eu ainda amo o Bennett, o que torna ainda pior saber que nunca
serei o homem certo para ele.
– Vocês terminaram há uns vinte anos. As coisas mudam, as pessoas
também. Talvez não fosse a hora certa para vocês dois.
– Algumas coisas mudam; isso, não – diz Archer, triste. – Agora chega
de falar do meu passado deprimente.
– Sinto muito. Concordo com você sobre a parte das férias. Uma pausa
fará bem a todos nós. Mas e quanto à turnê?
– Cancelei. Lincoln não está em condições de sair em turnê. Ele está por
um fio, e Jude não está muito melhor do que ele. Vamos reavaliar as coisas
depois que vocês tiverem uma chance de limpar suas mentes.
– Acho que vou para a Flórida – falo sem pensar. As palavras pairam no
ar entre nós dois e fazem minha alma se iluminar de uma maneira
inesperada.
– Você acha que é uma boa ideia?
Outro segredo mal guardado é sobre o homem que mal conheci, mas me
apaixonei perdidamente.
– Talvez me ajude a ter um desfecho. Ou talvez apenas me inspire a
voltar a escrever. Quem sabe?
– Se você acha que vai ajudar… – Archer soa cético, mas não discute.
– Acho, sim. Obrigado por nos dar essas férias.
– Você sabe que eu faria qualquer coisa por vocês.
– A gente também por você, Arch.
Faixa 4: Lado B
NÃO LUTE CONTRA O ÍMPETO

Lando

Quando desembarcamos do avião, eu vasculhei desesperadamente em


minha mente por uma maneira de impedir o homem sexy, interessante e
perfeito de se afastar de mim sem sequer dar uma olhada para trás.
Nós havíamos passado todas as três horas do voo conversando, rindo e
flertando. Certo, foi ele quem flertou mais, mas só porque eu não tenho
nenhum jeito para isso. Ele estava claramente interessado, mas seria muito
bizarro se eu adiasse a ida a Nova Iorque por alguns dias?
– Ei… – comecei no mesmo segundo em que Dawson disse:
– Eu estava pensando…
Nós caímos na gargalhada, e Dawson gesticulou para que eu falasse.
– Isso deve soar meio louco, mas não tenho que estar em Nova Iorque
antes de terça-feira de manhã – despejei nervoso. – Você me acharia muito
maluco se te pedisse para ficar aqui o final de semana? Comigo, quero
dizer.
Um sorriso se abriu no rosto de Dawson antes de ele disfarçar.
– Hmmm. – Dawson fingiu pensar sobre o assunto, batendo no queixo. –
Vai ter sexo?
Surpreso, soltei uma risada engasgada.
– É… sim, vai ter sexo.
– Hmmm. – Dawson continuava acariciando o queixo. – E o que esse
sexo envolveria exatamente?
– Jesus – dou uma risada. – O sexo pode envolver o que você quiser. Só
me diga que vai passar o final de semana comigo.
– Vamos lá – concordou ele. – Estava só enchendo seu saco.
– Espero que você não me deixe com as mãos abanando.
– Elas estarão muito ocupadas, se você der sorte – provocou ele com uma
piscadela obscena.
– Preciso fazer uma ligação bem rapidinho, está bem?
– Pego nossas malas e te encontro aqui em alguns minutos?
Concordei com um movimento de cabeça e lhe disse como era a minha
mala. Depois, senti meu sorriso sumir, e a minha expressão se tornou séria
novamente. Alcancei Dawson e o puxei para mim. Fiquei sem ar quando a
sua respiração soprou em meus lábios, minha barba cheia roçava em seu
rosto. Seu nariz bateu no meu e meu estômago embrulhou com a
expectativa pouco antes de seus lábios encostarem nos meus.
O beijo foi gentil e lento, nada apressado e superficial como eu estava
acostumado. Foi uma exploração, uma introdução, uma promessa de todas
as coisas que estavam por vir.
– Já volto – afirmou atordoado quando o soltei.
Meu coração batia descompassado enquanto via Dawson ir até a esteira
de bagagens. Eu mal conseguia acreditar que ele concordara em passar o
final de semana comigo.
Tirei o celular do bolso e liguei para Archer.
– Lando, como vai? Os voos estão tranquilos hoje?
– Sim. Olha… Acabei de descer do avião na Flórida e já ia pegar meu
voo de conexão. Mas fiquei pensando… acho que seria interessante passar
o final de semana aqui em Miami e pegar um voo para Nova Iorque só na
segunda-feira…
– É?
– Com tudo o que está acontecendo com o meu pai, uns dias para clarear
a minha mente seriam úteis.
– Claro. Desculpe por não ter pensado em te sugerir isso. Vou alugar um
lugar na praia para você e trocar seu voo. Te mando uma mensagem com os
detalhes e te vejo na segunda à tarde.
– Obrigado, Arch.
– Disponha. Aproveite seu fim de semana.
Olhei para Dawson, rebolando em minha direção com um sorriso de
orelha a orelha e uma mala em cada mão.
– Vou aproveitar, pode acreditar.
Faixa 5: Lado A
ÚLTIMA CHAMADA

Dawson

Sei que as pessoas se perguntam como uma pessoa surda pode ser um
barman. Eu afirmaria que uma pessoa surda é o barman ideal. Não importa
o quanto fique barulhento, não me incomoda, não posso ouvir nenhuma
reclamação, e as pessoas se sentem mal por mim, então, deixam boas
gorjetas. Com toda franqueza, funciona bem. Entrego meu bloquinho para
os clientes e eles anotam o que querem. A perfeição do sistema está na
simplicidade.
Eu posso ter perdido a minha memória, minha audição e as minhas
palavras, mas, pelo menos, sempre vou poder servir bebidas a estranhos.
Termino de preparar um mojito e o coloco na frente de uma loura,
ganhando um sorriso em troca. Verifico se todos os outros ainda estão bem,
e, aí, trabalho na próxima preparação: limões, gelo… você entendeu. É
noite de terça-feira, então os clientes são, em sua maioria, os de sempre. O
que é bom, porque eles deixam gorjetas excelentes e não precisam de muita
atenção. Eles querem mais é serem deixados sozinhos com suas bebidas, e
eu fico feliz em fazer exatamente isso.
Suspiro quando uma tristeza se aloja em meu coração. Tenho certeza de
que é apenas a meia-luz do bar me colocando para baixo. O cheiro de álcool
velho me faz pensar em como a minha vida está estagnada. Não sei por que
sequer me incomodo em colocar minha rotina no meu calendário na nuvem
a esta altura. A única coisa que está lá é “trabalho” ou “casa com Parker”.
Não consigo lembrar exatamente qual era o meu plano para depois da
formatura, mas tenho a ligeira desconfiança de que não era esse.
Eu me debruço no balcão e observo a televisão no canto. Estão falando
sobre o Queda Vertiginosa em algum programa de fofocas. Leio a legenda
que passa no pé da tela. A história é alguma coisa sobre o desaparecimento
do vocalista, Lincoln Miller, e a especulação de que ele possa estar no
hospital depois de outra tentativa de suicídio ou na reabilitação.
Aparentemente, a banda cancelou a turnê que estava para começar, e há
uma teoria de que eles podem não renovar o contrato com a gravadora.
Uma foto da banda aparece e me falta o ar diante do sorriso fácil de Lando.
Será que dá para eu ser mais patético?
Uma mão cutucando meu braço me assusta. Luke, um dos clientes
regulares, me lança um olhar apologético e aponta para sua bebida. Coro
um pouco por ter sido pego tão perdido na minha quedinha patética e me
apresso em encher o copo de cerveja de Luke.
Me passa um pensamento estranho pela cabeça de que eu queria poder
mandar uma mensagem para Lando e perguntar se ele está bem. Caramba, o
que tem de errado comigo? Ter uma quedinha por uma celebridade é uma
coisa, mas ter fantasias estranhas de mandar mensagens para ele, confortá-
lo, conhecê-lo pessoalmente… isso já é ser um perseguidor louco. Se não
tomar cuidado, vou acabar como uma dessas aberrações que se convencem
de que têm algum tipo de relacionamento com um famoso que nunca nem
conheceram pessoalmente.
Passo a cerveja gelada para Luke e foco minha atenção em enxugar o
balcão, ao invés de alimentar meu vício em assistir televisão.

Algumas horas depois, estou desabando na minha cama no meu


apartamento escuro. Arranco minha camisa e a jogo em algum lugar, depois
tiro as calças e a cueca com as pernas e faço o mesmo. O lençol frio dá uma
sensação boa contra a minha pele quente de correr pelo bar nas últimas
horas.
Fecho os olhos, e a imagem de Lando sorrindo preenche a minha visão
mental, fazendo meu pau inchar e crescer encostado à minha coxa. Patético,
patético, patético… entoo enquanto alcanço minha ereção crescente.
Seguro meu pênis e me bombeio até ficar totalmente duro. É quando a
imagem de Lando muda. Não é mais como uma fotografia da televisão ou
da revista. Esta imagem é mais nebulosa, quase como uma lembrança.
Quem sabe não é de um sonho? Ou, talvez, meu cérebro esteja pegando
uma lembrança real e colocando o rosto de Lando sobre quem quer que seja
que eu estivesse de verdade.
Eu me toco lentamente, imaginando Lando esparramado numa cama,
com a luz do luar banhando sua pele, e sua cabeça jogada para trás
enquanto ele grita em êxtase. Meu pau está enterrado bem fundo no cu dele,
e o pré-gozo escorre da cabeça do seu membro.
Eu me masturbo com força, imaginando que é mesmo a bunda de Lando
me envolvendo, e não a minha própria mão. Empurro no meu punho e meu
saco comprime. O Lando na minha mente está arranhando a minha bunda
enquanto gritos irregulares soam de seus lábios. Quase posso sentir o gozo
dele espirrando no meu peito…, mas, infelizmente, é só o meu quando o
orgasmo chega.
Solto um longo suspiro e pego sem ver uma peça qualquer da roupa que
havia tirado para limpar meu gozo, tentando não sentir a vergonha de me
masturbar para uma paixonite famosa como se eu tivesse quatorze anos.
Isso está se tornando mais deplorável a cada dia que passa. Preciso sair
de casa e voltar a namorar. Não é como se eu não tivesse namorado desde o
acidente. Mas não encontrei ninguém excitante que também não se importe
de namorar um cara surdo com lapsos de memória. Parker disse que não
tem nada a ver com a minha deficiência, mas, sim, com a minha atitude de
merda. Eu respondi mandando ela ir se foder.
Viro para o lado e puxo a coberta até o queixo, sentindo um friozinho que
parece, de alguma forma, vir de dentro de mim. E dormir me arrasta para o
fundo.

Levo uma camisa ao nariz e a cheiro, porque não consigo lembrar qual é
a pilha de roupas limpas e qual a de roupas sujas. Ela não está com cheiro
ruim, então, visto-a. Pelo canto do olho, vejo a luz piscando na sala,
anunciando que Parker está aqui.
Confiro minha roupa no espelho e passo os dedos pelos meus cachos
desgrenhados.
Sorrio para Parker quando saio do meu quarto e ela retribui. Então, ela
atravessa a sala e me dá um abraço apertado. Eu a abraço de volta pela
cintura. Quando ela se afasta, leio seus lábios quando diz “feliz
aniversário”. Posso ver seu olhar brilhante por causa das lágrimas por cair
em seus olhos, e dou um tapinha em seu ombro, esperando que ela
mantenha o choro sob controle.
Eu compreendo por que ela está emotiva. Parece que foi ontem que
acordei numa cama de hospital, com Parker dormindo na cadeira ao meu
lado. Fiquei apavorado quando olhei em volta, incapaz de entender onde
estava e sem a mínima ideia de quem era a mulher dormindo ao lado da
minha cama. Depois, me dei conta de que eu nem sabia quem eu era, e
surtei. Uma enfermeira entrou correndo e me sedou. Quando voltei a
acordar, algumas coisas começaram a fazer sentido para mim. Eu me
lembrei do meu nome e de que Parker era minha irmã. E, nas semanas
seguintes, mais lembranças voltaram.
Minha mãe chorou de soluçar quando descobriram que eu estava surdo e
que poderia nunca recuperar a memória. Eu também chorei.
Eu compreendo por que meu aniversário a deixa emotiva. Eu quase não
tive mais aniversários, e isso é impossível de esquecer.
– Pronto para o jantar? – sinaliza ela depois de me soltar.
Assinto entusiasmado.
Parker me leva para o meu restaurante preferido de frutos do mar e,
depois de fazermos o pedido, ela me entrega um envelope.
– Obrigado – sinalizo, e ela gesticula dizendo que não preciso agradecer,
apontando para o envelope como se mal pudesse esperar para que eu o abra.
Deslizo o dedo por baixo da aba e abro. Lá dentro, tem um cartão de
aniversário que diz um monte de coisas melosas que definitivamente não
me fazem chorar. E, aí, vejo um pedaço de papel solto com um endereço de
Miami nele.
– O que é isso?
– Férias. Aluguei uma casa na praia para você em Miami por uma
semana. Quem sabe um tempo longe te inspire a voltar a escrever?
Minha respiração falha diante do presente atencioso dela.
– Para quando é? Vou ter que folgar no trabalho.
– Já cuidei disso. Conversei com seu chefe e você tem a semana que vem
livre.
Coloco o cartão e o papel na mesa e dou a volta para abraçar minha irmã.
Depois, dou um beijo em seu rosto e balbucio “obrigado” novamente
enquanto algo aquece meu coração.
Parker me deixa em casa depois do jantar. Alguma coisa no fundo da
minha cabeça me incomoda e não consigo me livrar dessa sensação
estranha. Meu estômago se agita e meu coração acelera. É como se meu
corpo estivesse tendo uma reação física à ideia de ir para Miami, mas meu
cérebro não sabe por quê.
Por ter crescido a duas horas de distância de Miami, eu devo ter estado lá
centenas de vezes, e não consigo me lembrar de nada que me deixaria tão
ansioso e agitado em passar uma semana lá. Mas a questão é justamente
essa: não consigo me lembrar de nada.
Não vou a Miami desde antes do meu acidente. A última vez que me
lembro de ter ido foi no verão antes da formatura. Fui com um cara
chamado Tim, com quem estava saindo na época. Tim e eu terminamos
cerca de um mês depois amigavelmente. Não consigo cogitar que esse
nervosismo seja relacionado a ele.
Eu afasto a bizarrice e subo na cama com um sorriso. Uma semana na
praia vai ser legal, mesmo que seja dezembro. Então, quando eu voltar, será
Natal. Parker e eu teremos um jantar agradável na véspera de Natal e depois
iremos passar o dia de Natal juntos assistindo a filmes e comendo biscoitos.
Antes que eu me esqueça, pego o celular na mesa de cabeceira e coloco
Férias em Miami no bloco inteiro dos dias da próxima semana. Como ainda
não tenho nada planejado para esse período, o jeito vai ser ir descobrindo
aos poucos.
Coloco meu telefone de volta e me aconchego debaixo do cobertor,
adormecendo rapidamente com um sorriso.

Lando

Meu joelho bambeia quando olho pela janela minúscula do avião e


espero pelo término do embarque para chegar de vez em Miami. Eu deveria
ter aceitado a oferta de Archer de me conseguir um voo particular, mas, por
algum motivo, me pareceu errado voltar à Flórida assim.
Não sei por que estou nervoso. Até parece que vou sair do avião e
encontrar Dawson esperando por mim no portão.
A casa na praia que Archer alugou – a mesma que Dawson e eu ficamos
– não terá a presença do único homem que não sou capaz de parar de
pensar. Mesmo que aconteça de eu esbarrar em Dawson por algum milagre,
o que eu vou dizer? Dei a ele meu número antes de ir embora e ele nunca
ligou. Fui um casinho divertido para ele e, assim que embarquei de novo,
ele superou. Agora, eu serei o cara esquisito e apegado aparecendo anos
depois e insistindo que o que tivemos foi mais do que um final de semana
de prazer. Ótimo, sempre quis ser esse cara.
Eu me pergunto se Lincoln foi para Wisconsin sem nenhum problema, e
se Archer estava certo sobre dar um tempo para fazer Linc se dar conta de
que precisa de ajuda. Acho que só podemos esperar. E espero pra caralho
que Lincoln se dê conta e aceite ajuda antes que seja tarde demais.
Mas eu não deveria ficar preocupado com Lincoln neste momento. Eu
deveria estar limpando minha mente para reencontrar as minhas palavras.
Eu, encontrando Dawson ou não, espero que um tempo sozinho numa
casinha na praia seja bom para mim. Mesmo que eu veja Dawson em todos
os cômodos.
O voo parece se arrastar dolorosamente devagar e, não importa quantas
vezes eu me lembre de que as chances de esbarrar em Dawson são
praticamente nulas, meu coração se recusa a receber esse comunicado e
continua a bater furioso.
No aeroporto, pego minha mala depressa e saio correndo antes de atrair
qualquer atenção. Minha relação com os paparazzi não é tão ruim quanto
Lincoln e Jude, principalmente porque eu não faço nada tipicamente
interessante. E, felizmente, ninguém sabe onde estou agora além dos meus
companheiros de banda e de Archer, então, ninguém está prestando atenção
em mim. Sou só um cara com uma barba desalinhada e óculos de sol, até
onde todos sabem.
Quando pego meu carro alugado, a mulher no balcão para ao ver meu
nome na tela do computador. Mas, por sorte, ela não diz nada quanto a isso,
apenas seu sorriso aumenta e me dá um upgrade.
Lembranças me atacam conforme dirijo para a casa na praia. Vejo
Dawson no banco do carona cantando junto com o rádio uma música da
Britney Spears a plenos pulmões. Eu rio com a lembrança dele virando para
mim, levantando os óculos de sol e dizendo “It’s Britney, bitch”.
A imagem faz meu peito doer de saudade. Eu, obviamente, coloquei
Dawson em um tipo de pedestal impossível, certo? Afinal, eu o conheci por
pouco tempo, talvez tivesse sido apenas encenação. Mas não parece ser
isso. Ele pareceu tão real e autêntico. Ele pareceu tudo que eu jamais soube
que queria.
Pisco surpreso quando avisto a casa da praia. Devo ter ficado perdido nas
lembranças mais tempo do que imaginei.
Saio do carro e subo os degraus correndo. Quando abro a porta de
entrada, parece que levei um soco no estômago. Continua exatamente igual.
Eu meio que esperava que Dawson me chamasse do quarto, anunciando que
a cama é da altura perfeita para me curvar confortavelmente.
Largo minhas malas e tiro os sapatos com os pés. Depois, vou até a porta
dos fundos, direto para a praia.
A areia quente afunda embaixo dos meus pés e penetra entre meus dedos.
Uma brisa agradável que vem do mar sopra em meus cabelos e me enche de
uma estranha sensação de calma. Está cerca de 21º, o que é um paraíso
comparado a Nova Iorque agora. Mas não está tão quente quanto achei que
estaria. Acho que é porque estamos em dezembro.
Caminho um pouco pela beirada da água, antes de voltar para a casa e me
sentar na varanda para observar o céu escurecer conforme a noite cai sobre
mim.
Meus dedos gritam pelo meu baixo, mas eu o deixei em Nova Iorque. Se
não consigo compor, por que continuar me torturando com isso? Estou
fazendo o que Archer mandou e tirando umas semanas de férias. Talvez
isso convença as palavras a saírem do esconderijo.
Meu telefone vibra no meu bolso e eu vejo que é uma ligação de Archer.
– Oi – atendo.
– Você acha que cometi um erro mandando Lincoln para longe sozinho?
Em que diabos eu estava pensando em deixar uma pessoa com tendência
suicida ir sozinha a uma cabana na floresta?
– Hmm… é, talvez não tenha sido a decisão mais brilhante do mundo.
– Porra. Você deveria me tranquilizar, não confirmar meus medos –
reclama, e eu rio.
– Desculpe. Quer que eu ligue para ver como ele está? – ofereço.
– Não, acabei de ligar. Ele parecia para baixo, mas não tão no fundo
quanto fica às vezes. Eu o fiz prometer ligar se estiver se sentindo mal, para
eu mandar alguém ficar com ele.
– Tenho certeza de que ele amou a ideia de você mandar uma babá – falo
sarcasticamente.
– Que diabos eu deveria fazer? – exclama Archer.
– Você está fazendo tudo o que pode – garanto-lhe. – Talvez você precise
destas férias tanto quanto o resto de nós. Relaxe, deixe que outra pessoa se
preocupe com você para variar.
Archer solta uma gargalhada.
– É, se você encontrar alguém que queira me mimar, mande-o para mim.
– Pode deixar. Ei, quem sabe o Bennett…
– Por favor não faça isso – resmunga.
– Por que não?
– Porque ele está deslumbrante, e tão arrogante e atraente quanto sempre
foi. Mas nada mudou.
– Nunca se sabe.
Archer suspira.
– Acho melhor te deixar aproveitar a praia. Se precisar de qualquer coisa,
me ligue.
– Ligo. Obrigado, Arch. Aproveite suas férias também. Tchau.
– Vou tentar. Tchau.
Desligo e me encosto na balaustrada da varanda, olhando mais uma vez
para a casa escura. Se ouvir com atenção, quase posso escutar Dawson
rindo, gemendo, cantando… Entretanto, o som do mar e das gaivotas
abafam tudo, e eu lembro que estou completamente sozinho aqui.
Faixa 6: Lado B
AZUL CELESTE

Lando

Entramos na pequena casa de praia que Archer alugou para mim e largamos
nossas malas.
– Hmm… bom, cheio de quartos pra gente batizar – declarou Dawson e o
meu corpo aqueceu. Eu não conseguia decidir se ele estava mesmo tão
ansioso para ir para baixo dos lençóis ou se era simplesmente o tipo de
pessoa que usava sexo como um jeito de encontrar conforto numa situação
peculiar.
– Por que não pensamos primeiro no jantar? Quem sabe aproveitar um
pouco a praia que temos só para nós neste fim de semana?
– Comida é uma boa – concordou Dawson. – Gosta de frutos do mar?
– Gosto.
– Perfeito, conheço um lugar ótimo. Não é muito longe, quer ir andando?
– Bora. – Aponto para a porta e sigo Dawson.
Tenho o impulso estranho de pegar sua mão enquanto caminhamos pela
praia rumo à civilização. Não era um relacionamento; era um casinho de
final de semana. Mas será que isso significava que eu não poderia me
entregar a um gesto de carinho fora do quarto? Nunca havia segurado a mão
de ninguém antes. Senhor, que coisa mais patética! Mas a verdade era que,
no colégio, eu era tímido e não namorava. Tinha dado uns amassos em
algumas pessoas no verão passado, depois que assinamos nosso contrato
com a Epic, antes de sairmos em turnê. E não se costuma andar de mãos
dadas com um peguete.
Antes de terminar de analisar a situação, a mão de Dawson deslizava na
minha. Ele entrelaçou seus dedos nos meus. E, quando olhei surpreso, ele
abriu um sorriso largo e sincero.
– Eu meio que gosto de toques, tudo bem por você?
– Perfeito – garanto-lhe, abrindo um sorriso também.
– Qual é a sua comida preferida? – pergunta ele, puxando conversa.
– Bolo de chocolate.
– Hmm… ótima escolha. As minhas estão empatadas entre torta de limão
e lagosta. O problema é que, por ter crescido na Flórida, fiquei mal-
acostumado e estragou meu paladar para a maioria das tortas de limão e
frutos do mar de qualquer lugar que não seja banhado por um oceano. – Ele
franziu o nariz enquanto falava, gesticulando animadamente com a mão
livre.
– Aposto que sim – concordei com uma risada.
– Cor preferida? – foi sua próxima pergunta, como se estivesse fazendo
uma lista mental.
– Roxo, mas mais para lilás do que para púrpura.
– A minha é azul. Mas não qualquer azul, é o azul de um mar cristalino…
como o mar das Maldivas, o Oceano Índico. Nunca fui, mas já vi fotos, e
sempre pensei que seria incrível nadar lá.
Faltou muito pouco para eu dizer que talvez um dia eu pudesse levá-lo;
as palavras estavam na ponta da língua. Mas isso certamente cruzaria a
linha entre um casinho de final de semana e um relacionamento.
Seu interrogatório continuou jantar adentro, previsivelmente mudando de
perguntas inocentes para as mais ousadas conforme a noite avançava e as
bebidas eram servidas e consumidas.
– Posição preferida? – quis saber ele, debruçando-se sobre a mesa com
um sorriso relaxado.
– Vou te mostrar quando voltarmos para a casa – respondi
sugestivamente.
– Vocês vão querer algo mais? – perguntou a garçonete ao parar na nossa
mesa.
– Não, e pode trazer a conta, por favor, precisamos sair daqui
imediatamente.
Disfarcei uma risada diante da ansiedade de Dawson. Meu pau, já pronto,
doeu com a promessa. Se eu tinha apenas 48 horas com ele, não iria
desperdiçar nenhum segundo bancando o tímido.
Paguei a conta e saímos cambaleantes do restaurante; ambos passamos
do ponto da embriaguez. Ao invés de segurar a minha mão, Dawson
agarrou a minha bunda, correu os dedos pelos meus cabelos, acariciou
minha barriga com suas mãos exploradoras, até me deixar sem fôlego.
Peguei seu braço e o puxei para que parasse, desesperado para provar dos
seus lábios mais uma vez. Tínhamos voltado para nossa faixa particular da
praia, por isso, não me senti mal por me entregar ao doce sabor da sua
língua enquanto ela se enroscava na minha.
O ar pesado pairava sobre nós como um cobertor e o suor se grudava à
nossa pele por causa da umidade. Puxei a camisa de Dawson quando meus
dedos buscavam contato com sua pele. Ele roçava o quadril no meu,
pressionando nossas ereções.
– Já transou na praia? – perguntou Dawson contra meus lábios, e eu
gemi, enterrando os dedos em seus cachos, forçando sua boca ainda mais na
minha.
– Não temos preservativos nem lubrificante aqui – falei com relutância
depois de mais alguns minutos beijando.
– Chato. Acho que sempre haverá amanhã à noite. Vamos lá para dentro;
estou morrendo de vontade de entrar em você.
Ele agarrou a minha bunda e deu um apertão, me fazendo gemer outra
vez.
– Sim, por favor – concordei antes de pegar a mão dele e arrastá-lo pelo
resto do caminho da praia para dentro de casa.
Faixa 7: Lado A
FÉRIAS DE MIM MESMO

Dawson

Desci do ônibus algumas quadras de distância do lugar que Parker alugou


para mim esta semana. Anotei o nome da parada onde eu precisava descer e
havia conferido a informação várias vezes durante a longa viagem,
preocupado de esquecer e perder o ponto. Na maioria dos dias, o medo de
esquecer alguma coisa é pior do que esquecer de verdade.
Teria sido mais rápido e mais fácil dirigir até aqui, mas não dirijo desde o
acidente. Fisicamente, sou perfeitamente capaz de dirigir. Mas, quando me
sento no banco do motorista de um carro…
Eu tremo, lembrando-me da última vez em que tentei antes de Parker
desistir de me incentivar. Ainda não consigo lembrar exatamente o que
aconteceu na noite do acidente, mas quando me sento atrás do volante de
um carro, meus pulmões se recusam a se encher com ar suficiente, minha
cabeça começa a rodar e meu coração bate tão forte que me deixa tonto.
Posso ouvir vidros estilhaçando, metal sendo esmagado.
Dirigir é supervalorizado mesmo. Não tive problema algum em adaptar a
minha vida sem fazer uso de um carro. Diabos, tive que me adaptar a viver
sem a minha audição; acho que um carro é o menor dos meus problemas.
O sol bate bem em cima da minha cabeça, me fazendo suar enquanto
caminho pela rua. Só demora cerca de quinze minutos para chegar no
endereço. Eu me vejo parado na frente de uma linda casinha localizada bem
na praia. Por algum motivo, esperava que ela fosse branca, talvez um pouco
maior, e que tivesse uma praia particular atrás dela. Não tenho certeza de
onde meu cérebro tirou essa imagem, mas meu coração murcha um
pouquinho por não ser como eu estava imaginando. Muito mal-agradecido?
Encontro a chave debaixo do capacho como prometido e entro. Largo as
malas e vou abrir as janelas para deixar o cheiro da praia entrar, depois
exploro o pequeno espaço. Tem uma cozinha pequena para a qual eu
realmente deveria comprar comida, uma sala com uma porta de correr que
dá numa varanda na parte de trás e, claro, um quarto agradável e um
banheiro. É o lugar perfeito para relaxar e passar uma semana de solidão.
Eu trouxe meu leitor digital e meu notebook para me distrair, e, geralmente,
isso é mais do que o suficiente para me manter feliz. Por que estou me
sentindo tão inquieto e nervoso?
Tiro os sapatos com os pés e pego meu leitor digital da mochila. Depois,
vou para a varanda de trás aproveitar o sol enquanto leio.
Como graduado em Literatura Inglesa, tenho tendência aos clássicos na
maioria das vezes. Mas eu tenho um vício secreto… romance obsceno e
glorioso. Às vezes, quero algo profundo e cheio de metáforas com uma
linguagem linda e temas complexos. Outras, tudo o que quero é algo cheio
de sexo suado e o felizes para sempre garantido. Não que também não haja
temas profundos e emoções nos romances. Só que eu leio eles mais pelo
sexo.
Eu me acomodo numa espreguiçadeira na varanda e abro o livro que
baixei antes de sair. Estou viciado nessa série sobre estrelas pornô gays
chamada Ballsy Boys, e agora eu preciso saber se esse bofe vai conseguir ou
não que o dono do estúdio seja seu velho da lancha.
Leio por algumas horas antes de sentir a boca seca e de meu estômago
exigir comida. Coloco meu leitor digital de lado e faço uma lista de
compras rápida, me vendo acrescentar preservativos e lubrificante nela. Faz
um tempão que não trepo. As férias são o momento ideal para corrigir este
problema.
Talvez depois de comer alguma coisa eu devesse ir a um bar esta noite,
ver se consigo encontrar alguém divertido para passar a noite comigo.
Qualquer coisa seria melhor do que outra noite sozinho com a minha mão e
fantasias do meu crush famoso.
Deve ser por isso que não consigo escrever: minha vida é chata demais
para inspirar qualquer coisa. Acho que poderia escrever um livro sobre um
fracassado que tem medo de dirigir e fica por aí sentindo pena de si mesmo.
Tenho certeza de que seria uma leitura interminavelmente envolvente. Ou,
eu poderia beber até voltar a ser um bom escritor, isso pareceu funcionar
para o Hemingway e para o Hunter S. Thompson, entre outros incontáveis
escritores.
Sinto meu celular vibrar na minha coxa, dentro do bolso, e o tiro, vendo
uma mensagem da Parker. Nenhuma surpresa nisso.
PARKER

Como estão as férias?

Estou aqui há literalmente quatro horas.

PARKER

Só me diz que adorou, para eu poder me parabenizar.

Eu adorei.

PARKER

Uhu! Planos para se divertir?

Estou pensando em tentar transar.

PARKER

Finalmente, caramba, nesse ritmo, achei que você iria morrer


com o saco inchado.

Obrigado, mana.

PARKER

Disponha ;) Divirta-se! Me mande mensagem amanhã para


me contar sobre o cara que você pegou.

Vai querer saber se fiquei por cima ou por baixo também?

PARKER
Não, obrigada. Espertinho.

Amo você, P.

PARKER

Também amo você.

Fico sorrindo enquanto devolvo o celular para o bolso. Não sei o que
faria sem a Parker.
Adiciono “mercado” e “bar para trepar” ao meu calendário para hoje,
calço os sapatos e saio.

Lando

A brisa leve e o cheiro do mar me despertam em algum momento no


início da tarde. Meu cérebro ainda está meio que no sonho bom que estava
tendo – deitado na praia com Dawson –, e, sem pensar, estendo a mão para
o lado vazio da cama esperando encontrá-lo ali com um sorriso sonolento e
cabelos despenteados.
Meu coração murcha quando só encontro o lençol frio. Deixo meus olhos
abrirem lentamente, piscando para encarar a realidade e deixando o sonho
desaparecer como ondas no mar.
Pego o travesseiro onde a cabeça de Dawson descansou anos atrás e o
levo ao meu nariz. Permito-me fingir, por alguns segundos, que ainda dá
para sentir o cheiro dele ali, que milhares de outras cabeças não repousaram
naquele mesmo local.
Talvez tenha algo de errado comigo. Com certeza não pode ser normal,
depois de nove anos, ainda o querer tanto. Ou, talvez, simplesmente
tenhamos perdido um pouco do romantismo do velho mundo na nossa
sociedade moderna. Meu avô me disse uma vez que ele soube assim que
pousou os olhos na minha avó que iria se casar com ela. Ele a conheceu
através de amigos numa festa que deram para ele e seus companheiros que
estavam partindo para lutar na guerra. Eles conversaram a noite toda. Ele
disse para ela que quando voltasse da Alemanha iriam se casar, por isso, ela
devia esperar por ele. Eles se casaram na semana em que ele voltou para
casa e nunca passaram outro dia separados na vida.
Eu sei que essa situação não tem nada a ver comigo. Mas por que não
posso saber que Dawson é a minha pessoa exatamente como meus avós
souberam?
Meu telefone toca, me tirando dos meus pensamentos. Eu o pego e vejo
que quem está ligando é Benji.
– Oi – atendo, minha voz ainda está rouca porque acabei de acordar.
– Mano, você está dormindo às duas da tarde?
– Não. Estou falando com você; como poderia estar dormindo? – rebato.
A risada de Benji do outro lado da linha me anima um pouco. Já fazia
muito tempo que ele não soava tão despreocupado.
– Como está a praia?
– Boa, dei uma caminhada ontem à noite e, depois, fiquei sentado na
varanda por um bom tempo. É bom acordar com o barulho e o cheiro do
mar.
– Que maravilha. Tem planos de sair de casa em algum momento? – quer
saber Benji.
– Hmm… isso é discutível – brinco. Claro que planejo sair de casa.
Como eu posso esbarrar em Dawson se ficar enfiado aqui este tempo todo?
– Estava pensando em ir a um bar hoje.
– Boa, vai trepar. Faz um tempão que você não pega ninguém.
– Bom saber que você está controlando isso para mim.
– Alguém tem que fazer – fala simplesmente.
– E você? Está fazendo alguma coisa legal?
– Cheguei ontem à noite, vou sair com London daqui a pouco. Estou só
relaxando, sabe?
– Bom, você merece.
– Obrigado, você também. Só pensei em ver como vão as coisas, mas
parece que é melhor deixar você se levantar e tomar um café.
– É, café é tudo. Mas me liga de novo logo, está bem? Quero saber como
suas férias estão indo.
– Idem, cara. Falamos depois – concorda Benji.
– Tchau.
Agora que ele falou em café, meu cérebro só quer saber disso. Passei por
uma pequena cafeteria na estrada a caminho daqui, podia dar uma olhada lá.
Saio da cama e penteio os cabelos com os dedos, depois, visto uma
camiseta e um short, e saio pela porta.
Inclino a cabeça e deixo o sol banhar o meu rosto enquanto caminho pela
estrada. Seria impossível não estar com o humor melhor aqui com o sol
brilhando do que estava na fria e cinzenta Nova Iorque em dezembro.
Alguns minutos depois, entro na cafeteria e sinto um choque estranho
dentro de mim quando vejo as decorações de Natal e placas anunciando os
especiais de fim de ano. Só faltam oito dias para o Natal. Como eu fui me
esquecer disso? Provavelmente porque parece um universo diferente aqui.
Quase não parece possível que o Natal possa existir em algum lugar com
tanto sol e areia.
Este será o primeiro Natal que vou passar sozinho. Normalmente,
estamos em turnê ou, no mínimo, a banda está junta. Este ano, dei uma
viagem à Europa para os meus pais no Natal, então, não existe a opção de
ficar com eles no feriado. Talvez eu compre um garrafão de gemada e rum e
passe o feriado totalmente bêbado.
– Oi, posso te ajudar? – cumprimenta a adolescente atrás do caixa.
Peço um café gelado de baunilha e um bolo de amora. Percebo um breve
lampejo de reconhecimento em seus olhos quando ela olha para mim, mas
ela parece não ligar o nome à pessoa. Graças a Deus por isso. É pior para
Lincoln. Ninguém nunca confunde o vocalista.
Com o café e o bolo na mão, vou caminhando para casa, curtindo o
clima. Por fim, acabo de volta à silenciosa casa branca.
Eu me sento na varanda e pego meu celular para dar uma olhada no
Instagram, esperando que algumas imagens de gatinhos fofos me animem
um pouquinho. Não dá certo.
Faixa 8: Lado B
SUOR COM GOSTO DOCE

Lando

Dentro da casa da praia, não demoramos a fundir nossas bocas. Nossas


mãos arrancam nossas roupas selvagemente, sem nos importarmos com
sons errantes de tecido sendo rasgado enquanto focamos numa única
missão: ficarmos nus.
Meu pau latejava dolorosamente dentro da minha calça jeans; cada
centímetro da pele de Dawson que eu expunha me deixava mais
descontrolado. Seu corpo era uma combinação arrebatadora de partes
macias e ásperas, pelos grossos e extremidades delicadas e lisas.
A partir dos seus lábios, desci com os meus e explorei seu maxilar,
pescoço e ombros, memorizando cada sabor sutil conforme explodia na
minha língua. Dawson enrolou os dedos em meus cabelos como se achasse
que precisava me ancorar a ele. Como se eu conseguisse, em algum
momento, me afastar. Meu corpo desejava o dele, minha alma clamava por
ele.
– Quarto? – perguntou ofegante, sua voz mais rouca do que antes.
Com as mãos em sua cintura, guiei-o em direção ao cômodo mais
próximo, esperando que fosse o quarto, sem tirar os lábios de sua pele. Abri
o olho por um segundo e vi uma cama, bingo!
Quando a parte de trás dos seus joelhos bateu na cama, ele me agarrou
pela cintura e me deitou junto com ele. Nossas bocas se encontram
novamente, nossas línguas se emaranham enquanto engolimos nossos
gemidos de prazer. Nossos paus se alinham perfeitamente, pressionando um
ao outro, melados de pré-gozo.
As mãos de Dawson passeavam pelo meu peitoral, beliscando meus
mamilos, arranhando meu abdômen, tocando todos os lugares, como se
estivesse tentando me memorizar da mesma maneira que eu fazia com ele.
Ele agarrou as minhas nádegas, massageando e abrindo-as, assim, o ar frio
no meu ânus me fez suspirar e gemer.
– Por favor – implorei com sua língua dentro da minha boca.
– Não precisa implorar, gato. Vou te foder tão gostoso que você não vai
querer outro.
Gemi em sinal de aprovação.
– Vou ficar puto se você for só garganta.
Dawson gargalhou e deu um tapão na minha nádega esquerda.
– Por que você não fica de quatro pra mim?
Eu me desprendo dele e fico de quatro.
– Tem preservativos e lubrificante na minha mochila, no chão.
– Você estava planejando ter uma noitada na viagem? – provocou ele.
– Eu fui escoteiro: esteja sempre preparado e essa coisa toda.
– Boa desculpa – declarou ele, saindo da cama para pegar as coisas na
minha mochila.
A cama afundou com seu peso quando ele subiu ao meu lado. O som
inconfundível do frasco de lubrificante abrindo e o barulho de Dawson
apertando para colocar um pouco em suas mãos me fez estremecer e meu
pau flexionar, buscando atrito.
Balancei os quadris para trás numa súplica silenciosa, e Dawson colocou
uma das mãos na minha lombar, depois deslizou para a minha bunda e abriu
novamente minhas nádegas.
– Caramba, seu cu é lindo – elogiou ele, seu dedo cheio de lubrificante
brincava na minha entrada, me tirando o fôlego. – Rosado e apertado. Está
desesperado pelo meu pau, não está?
– Sim – concordei com um gemido, me contorcendo contra seu dedo
numa tentativa de fazê-lo meter dentro de mim.
Ao invés disso, um segundo dedo apareceu também para brincar na
minha entrada. Caralho, eu precisava disso, precisava dele me preenchendo,
me arrombando, me marcando para que eu me lembrasse desta noite para
sempre.
– Assim que eu gosto – gabou-se Dawson quando meu cu cedeu à sua
provocação e seus dois dedos finalmente deslizaram para dentro.
A distensão e a ardência só duraram um segundo antes de eu começar a
empurrar contra ele, necessitando dos seus dedos mais fundo, com mais
força, mais tudo.
– Por favor, por favor, só me fode.
– Tem certeza? – indagou ele, testando a flexibilidade do meu cu ao abrir
os dedos.
– Sim, porra, sim – rosnei.
Gemi quando seus dedos desapareceram. Mas o barulho do pacote de
camisinha sendo rasgado silenciou o meu protesto.
Quando a cabeça grossa do pau dele encostou na minha entrada, travei,
agarrando o lençol, com a cabeça abaixada.
Dawson empurrou devagar o bastante para me tirar do sério, cada
centímetro parecia demorar uma hora para me invadir. A sensação de estar
completo só tornou tudo melhor.
Antes de entrar por inteiro, ele tirou bruscamente, e eu grunhi indignado
com a perda repentina.
– Shhh, está tudo bem, gato. Só quero olhar para você. Vire-se – instruiu
ele, batendo na minha coxa de maneira encorajadora.
Virei de costas, respirando erraticamente e com o saco dolorido. Sem
demora, ele levantou as minhas pernas e voltou a meter em mim. Desta vez,
entrou numa estocada estarrecedora que quase me fez gozar na hora.
O suor se grudava à nossa pele enquanto nos contorcíamos juntos à luz
do luar, gemendo e praguejando conforme nossos orgasmos se
aproximavam. Dawson estava com a cabeça jogada para trás enquanto
gemidos lindos saíam de sua boca e minha bunda apertava seu pau. Eu
estava com os tornozelos em seus ombros enquanto ele me fodia, levando
seu membro à minha próstata a cada estocada.
– Dawson, por favor – falo ofegante, cravando as unhas em seus braços.
Ele grunhiu uma confirmação das minhas súplicas e me fodeu com mais
força, fazendo meu corpo tremer e minha garganta secar por causa dos sons
que ele arrancava de mim. Minhas pernas caíram de seus ombros e se
prenderam aos seus quadris quando ele se inclinou para frente e entrelaçou
os dedos nos meus, prendendo minhas mãos à cama e me fazendo soluçar
com a necessidade de me tocar para chegar ao orgasmo.
– Por favor, por favor, por favor – implorava conforme cada estocada me
levava mais perto do meu limite.
Os lábios de Dawson me encontraram novamente, mas estávamos os dois
muito longe de conseguir beijar direito, esbarrando as bocas e batendo os
dentes, enquanto nossa respiração misturada aos nossos gemidos formavam
uma linda sinfonia.
Eu comprimia o pau duro de Dawson como se isso, de alguma forma, o
mantivesse dentro de mim por mais tempo, marcando-o ali para sempre. E,
quando a cabeça do pau dele se arrastou pela minha próstata mais uma vez,
tive que gozar. Deixei escapar um grito sufocado quando meu saco
comprimiu e a minha ereção brandiu profundamente, lambuzando nós dois
com a minha porra densa.
Dawson gozou logo depois de mim, jogando a cabeça para trás e
praticamente uivando de prazer quando seu pau latejou profundamente
dentro de mim. Eu pude sentir o calor de seu gozo através do preservativo.
Quando ele desabou ao meu lado, eu o puxei para os meus braços e
repousei o nariz em seu rosto. Havia gotas de suor em sua pele e eu não
pude resistir a adicionar também este gosto à minha memória. Passeei com
a língua para reunir algumas gotas picantes. O peito de Dawson retumbava
contra o meu com uma risada.
– Você me lambeu? Devo estar salgado e nojento.
– Não, seu suor tem gosto doce.
– Por que tenho a sensação de que isso é letra de música? – provocou.
– Talvez seja.
Faixa 9: Lado A
LAPSOS DE MEMÓRIA

Lando

Entro no bar cheio e abaixo o boné, esperando pra cacete esconder minha
identidade. Sento numa banqueta e aceno para a garçonete.
– O que vai querer? – pergunta ela sorrindo largamente, debruçando-se
para que eu pudesse ter uma visão privilegiada do seu decote, com certeza
esperando que isso aumente a gorjeta.
– Alguma coisa com tequila.
– É pra já.
Suspiro e acaricio a barba, puxando de leve na ponta. Meu olhar passeia
pelo bar, analisando os outros turistas e, provavelmente, alguns residentes.
Escolhi este bar porque não me pareceu um barzinho da moda. Não queria
ir a algum lugar que estivesse lotado.
A garçonete coloca uma bebida na minha frente:
– Tequila sunrise, deleite-se. – Ela pisca para mim e aceno um
“obrigado”.
Tomo um gole da bebida e fico gratamente surpreso com a combinação
de fruta com um pouco de tequila no final. Continuo a minha leitura visual
do bar, o canudo entre meus dentes e meu joelho balançam com a batida da
música tocando nos alto-falantes.
Meu olhar trava num homem sentado no final do balcão, ligeiramente
encurvado sobre sua bebida. Seus cachos escuros são a primeira coisa que
chamam a minha atenção. Meu coração acelera, mesmo tentando dizer a
mim mesmo que milhões de homens têm cabelos cacheados escuros. É
muito improvável que seja Dawson. Meu coração não está interessado em
ouvir nada disso, insistindo que aquele homem por quem venho perdendo o
sono por quase uma década está ao meu alcance novamente.
Sem pensar, desço da banqueta, largando minha bebida. Com as mãos
trêmulas, caminho até o homem.
Quanto mais perto chego, mais tenho certeza de que é ele. Se o corpo
magro e o converse vermelho surrado não são convincentes, a citação de
Shakespeare tatuada em seu braço é.
– Dawson? – pergunto com a voz trêmula. Ele não reage, então, limpo a
garganta e tenho mais uma vez. – Dawson? – Nada ainda. Será que estou
errado? Ou talvez ele esteja perdido em pensamentos e por isso não
responde?
Leio as palavras tatuadas com traço fino em seu antebraço: A jornada do
amor verdadeiro nunca é fácil. Não posso ir embora sem ter certeza.
Me sinto meio tarado quando me aproximo. Encosto em seu ombro e ele
dá um pulo; vira a cabeça devagar e meu coração dispara. Quando consigo
ver seu rosto, quase me sufoco com a minha própria língua. É ele.
Abro a boca, sem saber o que deveria dizer. Por que não pensei em algo
para falar? Porra.
Dawson me encara inexpressivamente, então, levanta uma sobrancelha
questionadora. Ele não me reconhece. Fiquei obcecado por ele durante nove
anos e ele nem se lembra de mim. Será que dá para eu ser mais patético?
Sinto a bile subir. Quero me derreter numa poça de vergonha e escorregar
pelas frestas no chão para que ele pare de me olhar.
Mordo o lábio inferior e passo a mão na barba, me perguntando se
deveria dizer alguma coisa ou simplesmente ir embora antes disso ficar
mais constrangedor. Ele aperta os olhos e inclina a cabeça, então, arregala
os olhos.
Ele gira na banqueta, ficando totalmente de frente para mim. Ele
gesticula rapidamente com as mãos, sorrindo enlouquecidamente.
Tento entender o movimento afobado de seus dedos e mãos. Demoro
alguns segundos para me dar conta de que é linguagem de sinais.
– Dawson? – pergunto confuso. Será possível que seja apenas alguém
que se parece extremamente com Dawson?
Ele arregala os olhos mais uma vez e para de se mexer; olha para suas
mãos como se acabasse de perceber o que estava fazendo, se vira de novo e
acena para a garçonete. Ela se aproxima com um sorriso e ele começa a
gesticular como se estivesse escrevendo no ar.
Ela tira um bloquinho do avental, mostrando-o. Ele assente
freneticamente e estende a mão. Ela lhe oferece também uma caneta.
Ele escreve alguma coisa e passa o bloquinho para mim.

Puta merda, você é Lando Meyers. Como sabe meu nome???

Pisco diante das palavras, tentando processá-las. É o Dawson. Mas não é.


– Você é Dawson Hayes? – esclareço, seus olhos estão grudados nos
meus lábios. Ele assente cautelosamente, parece desconfiado. – Você é
formado em Literatura Inglesa e gosta da cor azul, como o Oceano Índico?
Sua expressão muda lentamente, de cautela para desconfiança e um
pouco de pavor. Ele arranca o bloquinho da minha mão, escreve alguma
coisa e me devolve.

Como você sabe tanto sobre mim? É alguma pegadinha esquisita da


Parker?

Meu coração murcha ainda mais. É ele mesmo; mas, não é. Ele não
escuta? Ou não fala? Não sei dizer agora, mas fico mal em saber que
claramente aconteceu algo com ele e eu não sabia. E ele não se lembra de
mim. Todos esses anos estive pateticamente sonhando com ele, enquanto
ele se esqueceu totalmente de sequer ter me conhecido.

Dawson

Minha mente está acelerada tentando entender o que está acontecendo.


Meu crush famoso está parado a um toque de distância num bar em Miami.
Não só ele está parado aqui, mas também fala comigo como se me
conhecesse. Como ele me conhece? Parker não faz pegadinhas e, mesmo
que fizesse, como ela conseguiria que uma celebridade aceitasse? E, mais
importante, por que ele parece tão triste? Não parece que está fazendo uma
brincadeira. Parece desolado.
Sem pensar, coloco a mão em seu antebraço, querendo confortá-lo. Os
olhos de Lando encontram os meus e eu perco o ar. Ele é ainda mais lindo
na vida real do que nas fotos. Estou tocando na porra do Lando Meyers. Ele
está parado aqui, sua pele quente contra a minha mão, sua camisa ajustada
distraidamente em seu bíceps, sua barba desalinhada me tentando a tocá-la.
Pego o bloquinho de novo e volto a escrever.

Sofri um acidente de carro e perdi a memória. Já nos conhecemos?

Lando arregala os olhos quando lê.


– Você está bem?
Dou de ombros e faço um gesto de “mais ou menos” com a mão. Aponto
para os meus ouvidos e ele assente em compreensão.

Quando nos conhecemos?

Desta vez, entrego a caneta para que ele escreva a resposta, caso ele
tenha algum tipo de justificativa interminável para o nosso encontro.
Ainda não acredito que isso seja possível. De alguma maneira, eu
conheço o homem por quem sou obcecado à distância e não me lembro?
Será que não foi por alto? Será que eu dei uma de fã para cima dele e passei
vexame? Não deve ter sido tão ruim, já que ele se aproximou de mim num
bar por vontade própria.
Ele hesita antes de escrever a resposta e passá-la para mim.
Meu sangue congela nas veias quando leio as palavras na folha. Balanço
a cabeça, sem conseguir acreditar.

06 de agosto de 2009. Passamos o final de semana juntos.

Minhas mãos começam a tremer muito, deixo cair a caneta, que sai
rolando. Olho para Lando, meu coração dispara e meu cérebro rodopia. O
mistério sobre onde eu estava naquele final de semana finalmente me
encara. De algum modo, inexplicavelmente, eu estava com Lando Meyers.
Mas não é inexplicável, imagino. Ele sabe exatamente o que aconteceu. Ele
sabe tudo o que venho me perguntando há cerca de nove anos.
– Você está bem? – pergunta, franzindo a testa de preocupação.
Abano as mãos novamente. Ele franze os lábios, depois acena com a
cabeça em direção à porta.
Desço da banqueta e o sigo para fora do bar, engolindo lufadas de ar do
mar salgado. Do lado de fora, eu me curvo e coloco as mãos nos joelhos. A
mão grande de Lando desenha círculos relaxantes nas minhas costas,
fazendo minha pele arrepiar. Quando me acalmar, vou ficar muito
envergonhado por ter desmoronado assim na frente do meu crush famoso.
Puta merda… algumas peças começam a se encaixar e meu coração bate
impossivelmente mais rápido. O jeito como Lando me olha, o jeito casual
como ele me toca, nós passamos um final de semana secreto juntos.
Eu me endireito e Lando abaixa a mão.
– Nós trepamos? – solto. Raramente eu falo em voz alta porque é
perturbador pra caralho não conseguir ouvir minhas próprias palavras
quando as pronuncio. Sem falar que não faço ideia se estou falando num
volume razoável. Mas momentos desesperados pedem medidas
desesperadas.
Ele recua, olha para os pés e assente.
Eu transei com a porra do Lando Meyers e meu cérebro não conseguiu
guardar essa memória? Vai se foder, cérebro estragado.
Quando ele volta a erguer o olhar, seus olhos estão cheios de tristeza e
uma pontada de culpa que não pertence ali de jeito nenhum. Pego meu
celular e dou a ele. Ele demora alguns segundos para entender, mas digita
seu número e me devolve.
– Você está chateado?
Balanço a cabeça em negação e escrevo uma mensagem para ele.

Não com você. Estou puto pra caralho por não conseguir
lembrar. Desculpe, mas meio que estou surtando neste
momento. Por nove anos, me perguntei onde eu estava
naquele final de semana. Não contei à minha irmã nem a
nenhuma outra pessoa.

Lando lê a mensagem e digita a resposta.

Quando foi seu acidente?

Na noite do dia 08 de agosto de 2009. Estava voltando para


casa, aparentemente, de Miami.

Lando põe uma mão sobre a boca e aperta o celular com a outra. Por um
segundo, acho que ele vai jogá-lo longe ou socar alguma coisa. Em vez
disso, ele cambaleia para trás até suas costas baterem na lateral do prédio,
então, ele abaixa e se senta no chão.

Você está bem? – digito.

Seu telefone acende e, quando ele lê a minha mensagem, ergue o olhar


para mim, dando um sorriso triste. Ele balança a cabeça em negação e meu
coração sofre por ele.
Parte de mim quer rastejar para seu colo e encontrar um jeito de confortar
nós dois. Uma grande parte de mim quer correr pra cacete para não
enfrentar nada disso. Por nove anos, me perguntei o que aconteceu, mas,
por algum motivo, estou apavorado por ter descoberto.

Tenho que ir – digito.

Posso te ver de novo? Amanhã?

Meu estômago revira quando leio sua mensagem. Quase posso ouvir o
desespero triste na pergunta. Nada disso faz sentido.

Tudo bem. Me manda mensagem – concordo.

Vejo os ombros de Lando relaxando antes de ele digitar uma resposta.

Durma bem.

Você também.

A caminhada de volta para casa não é longa e passa num borrão enquanto
meus pensamentos continuam a correr em círculos vertiginosos. Mal
consigo começar a processar tudo que aconteceu agora. Saio para beber e,
quem sabe, encontrar um corpo quente para passar a noite, e, em vez disso,
encontro com meu crush famoso, Lando Meyers, e, ao que tudo indica, não
foi a primeira vez.
Tiro a roupa e subo na cama, meu corpo está exausto. Nem consigo
decidir se quero acordar e me dar conta de que foi tudo um sonho ou não.
Por mais que tente, não consigo fazer as coisas se encaixarem. Passo um
final de semana nu com a porra de uma estrela do rock e não consigo
lembrar? Injusto pra caralho! E que olhar era aquele de Lando? Ele pareceu
arrasado porque eu não me lembrava dele. Mas foi só um casinho de final
de semana, não foi? As pessoas se esquecem de transas o tempo todo. A
propósito, por que ele sequer se lembra de mim?
Os pensamentos correm pelo meu cérebro até me fazerem gritar. Não sei
se estou contente por, enfim, ter resolvido o mistério de onde estava naquele
fim de semana, ou se saber apenas deixa tudo mais complicado.
Abro meu calendário e meus dedos pairam sobre o dia de hoje, sem saber
ao certo como descrever sucintamente o que acabou de acontecer. Digito e
deleto várias vezes antes de deixar “Encontro com Lando Meyers, ele disse
que passamos AQUELE fim de semana juntos”. Olhando fixamente para o
texto, me dou conta de que Parker verá isso se ela quiser checar meu
calendário. Penso em apagar e deixar simplesmente “fui ao bar”, mas a
ideia de ter um registro incompleto parece gelo nas minhas veias. E se
alguma coisa acontecer e eu esquecer dele outra vez?
Deixo o registro e espero que Parker não olhe. Até onde sei, ela não
costuma ler meu calendário a menos que eu peça para dar entrada em
alguma coisa. Ela tem acesso para o caso de algo acontecer e eu não puder
checar ou lembrar que o evento existe.
Fico olhando para o teto. Sombras dançam na superfície escura, enquanto
eu tento desesperadamente buscar o rosto de Lando na minha mente em
algum lugar que não seja numa fantasia ou numa capa de revista.
Vejo um breve sorriso, quase escondido por uma barba desalinhada, e a
lembrança de uma risada rouca. Mas não sei bem se é real. Talvez seja só
uma ilusão. Não entendo como poderia ser real.
Respiro fundo e fecho os olhos, tentando buscar qualquer coisa mais
concreta. Quanto mais tento, mais as lembranças parecem fugir de mim.
Passei nove anos me perguntando onde passei aquele final de semana e,
posso afirmar que mesmo se tivesse mais cem anos para analisar, nunca
chegaria à conclusão de ter passado numa cama com uma estrela do rock.
Agora, depois de todas as dúvidas e noites sem dormir, finalmente sei.
Então, por que isso parece tão… insuficiente? Talvez parte de mim achasse
que se eu soubesse, a minha memória voltaria instantaneamente. Ou, talvez,
seja porque parte de mim sabia que aquele fim de semana foi significativo
e, ao invés de conseguir todas as informações esta noite, apenas fui embora
como um covarde.

Lando

Se a minha cabeça não estivesse girando descontroladamente até agora,


poderia ter ido atrás de Dawson quando ele foi embora. Desse jeito, não
consegui muito mais do que vê-lo partindo e desejar que tudo fosse
diferente.
Ele não se lembra de mim. Ele não se lembra de nenhum segundo do
final de semana pelo qual fiquei obcecado na maior parte desses nove anos.
Quando finalmente consigo me levantar do chão, a única coisa em que
sou capaz de focar é pegar uma porcaria de uma garrafa de tequila e levá-la
para a casa da praia para afogar meu sofrimento e a confusão.
Quando volto, com a recém comprada garrafa de Jose Cuervo na mão,
tiro os sapatos com os pés e me jogo na areia úmida, bem perto da linha do
mar, e abro a garrafa. Estremeço diante da queimação do álcool descendo
pela minha garganta e inclino a cabeça para trás para olhar a lua.
E me pergunto em que Lincoln estava pensando quando estava deitado
congelando e bêbado na espreguiçadeira em sua varanda. Será que ele
queria morrer? Será que simplesmente não queria sentir mais nada? Será
que sequer se importava? Aí, minha linha de raciocínio muda para a
imagem de Dawson consideravelmente machucado, talvez preso dentro do
carro. Será que ele estava consciente em algum momento? Será que ficou
com medo? Ele pensou em mim? Será que me culpou por ser o motivo de
estar na estrada naquele exato momento? Se ele pudesse se lembrar de mim,
será que se arrependeria de ter passado aquele fim de semana comigo?
Dou outro gole longo e tiro um pouco da umidade do meu rosto com as
costas da mão.
Não estou nem aí que Dawson não seja o mesmo. Meu coração ainda o
conhece. Mas será que alguma parte do coração dele ainda me conhece?
Faixa 10: Lado B
NÃO CONSEGUIRIA TE ESQUECER NEM SE
TENTASSE

Lando

Lábios quentes na minha pele me tiram do meu sono agradável. Acordar


com cheiro de sexo e suor pairando no ar fez minha ereção matinal latejar
enquanto busco Dawson sem abrir os olhos. Passo os dedos em seu peitoral
peludo e ele estremece quando encosto em um de seus mamilos eriçados.
– Hmmm, eu ia te tirar da cama para sairmos numa aventura, mas se você
vai ficar me apalpando, talvez precise repensar o plano – murmurou ele
com um toque sensual em sua voz grossa.
– Não tem por que não fazermos os dois. Posso ser bem rápido com o
estímulo certo – asseguro-lhe quando encontro sua ereção pronta e a seguro.
Dawson enterrou o rosto no meu pescoço e sua respiração ofegante
soprando na minha pele me deu arrepios. Acariciei devagar da base à ponta
e ele deslizou a língua pelo meu pescoço. Estremeci de prazer quando
Dawson pegou a minha perna e a colocou em seu quadril para nos
aproximar, nossas ereções se alinham perfeitamente, me deixando sem ar.
Segurei nossos membros com a mesma mão e aumentei a intensidade.
Dawson lambeu e mordiscou meus lábios, o gosto do meu gozo da noite
anterior ainda estava em sua boca. Projetei meus quadris, empurrando em
minha mão. Seu pré-gozo pingou na cabeça do meu pau e me deixou
dolorido com vontade de gozar.
As mãos de Dawson me tocavam e me provocavam por inteiro. Ele
passeou com os dedos pelas minhas costas até meu ânus. Gemi contra seus
lábios quando seus dedos deslizaram pelas minhas pregas e dançaram pelo
meu cu.
Meu saco ficou comprimido e pesado conforme eu estocava com mais
força contra seu pau. Quando a ponta do dedo dele deslizou para dentro de
mim, soltei um gemido do fundo do meu peito e meu pau latejou contra o
dele, deixando-o melado.
Dawson não demorou muito, ele enterrou os dedos da outra mão no meu
bíceps quando foi pego pelo prazer, deixando nossos paus ainda mais
melados.
– Cacete! Tem certeza de que só pode ficar até amanhã? – Sem fôlego,
Dawson lamentou com um sorriso, seus cabelos despenteados estavam
úmidos de suor.
– Que aventura você tinha planejado? – perguntei numa tentativa de
mudar de assunto. Só de pensar em ir embora sentia um peso na boca do
estômago, mas que escolha eu tinha?
– Vamos passear de aerobarco pelo Everglades – revelou Dawson.
– Parece incrível. Quer tomar um banho primeiro?
– Não, prefiro sair pelo mundo todo gozado – brincou, revirando os
olhos, e ganhou uma mordida na lateral do pescoço, fazendo-o rir e
espernear.
– Corrida até o chuveiro – sugeri, saindo da cama antes de Dawson
conseguir responder.
– Trapaceiro! – Ouço-o gritar enquanto eu corria para o banheiro rindo.
Chego no chuveiro alguns segundos antes de Dawson, sem nem nos
incomodarmos com a água gelada que lavava o suor e o gozo de nossos
corpos.
Quando a água esquentou um pouco, peguei o sabonete e comecei a
ensaboar os ombros e o peito de Dawson, assistindo à espuma deslizar pela
sua barriga e parar no seu pau ainda meia bomba.
– O que vai acontecer depois desse final de semana? – perguntou
Dawson, chamando minha atenção de volta. – Não que eu esteja tentando
algo mais, nem quero parecer grudento, mas vamos no ver de novo algum
dia?
– Não sei ainda – respondi, minha voz carregada de desespero. Não sabia
como tinha ficado tão carente deste homem em tão pouco tempo, mas não
dava para negar o espaço vazio em meu peito diante da ideia de ir embora
sem olhar para trás. Mas como isto iria funcionar? A banda está só
começando. Haverá longas turnês e quem sabe o que mais. Não dá para me
comprometer com alguém neste momento da minha vida. Não seria justo
nem com Dawson nem comigo. – Vamos ver como ficam as coisas depois
deste final de semana, está bem?
Ele hesitou por um segundo e depois assentiu.
– Prometa que não vai me esquecer quando estiver famoso? – pediu ele
com humor e uma pitada de medo. – Sei que é idiota dizer isso quando
acabamos de nos conhecer. Mas, por favor, prometa que não vai se esquecer
deste final de semana?
– Covinhas, não conseguiria te esquecer nem se tentasse.
Faixa 11: Lado A
NÃO SOU EU

Lando

Nem mesmo a tequila que entornei conseguiu me derrubar, passo a noite


inteira me revirando com imagens de Dawson inundando a minha mente.
Meu cérebro bêbado não parecia capaz de separar as lembranças do nosso
final de semana perfeito do homem parado à minha frente ontem à noite,
parecendo apavorado e danificado. Queria tanto tocar nele e acalmá-lo, mas
ele nem sabia quem eu era.
Minha cabeça pesa e, na boca, sinto o gosto de esgoto. Talvez tanta
tequila tenha sido imprudente.
Durante todos esses anos eu venho recordando o melhor final de semana
da minha vida, sem nunca saber que Dawson quase morreu antes de eu
sequer conseguir voltar a Nova Iorque. Eu não o culpo por fugir ontem à
noite. Se não fosse por mim, ele estaria seguro em casa naquela noite. Eu
estraguei a vida dele. Meu peito dói diante da constatação.
Rolo na cama e observo, pela janela, o sol começar a aparecer. Eu me
sinto vazio por dentro, como se tudo tivesse sido escavado e jogado fora.
Passei todos esses anos apaixonado pela lembrança de um homem que não
existe mais.
Minhas pálpebras se fecham e imagens de Dawson sorrindo para mim,
descrevendo animadamente seus livros preferidos e escutando com muito
interesse eu tocar para ele, preenchem minha mente. É difícil dizer agora
quais lembranças são reais e quais foram projetadas pela saudade que senti
ao longo dos anos. Não importa; dá na mesma.
Meu celular vibra na minha mesa de cabeceira e o pego sem entusiasmo.
É bem provável que seja mais drama sobre Lincoln, e estou cansado demais
para lidar com isso.
Meu coração parece que vai sair pela boca quando vejo que é uma
mensagem de Dawson. Minhas mãos tremem enquanto a abro.
DAWSON

Oi, desculpe por ter surtado ontem à noite. Foi muita coisa
para absorver.

Engulo em seco, encarando a mensagem por alguns segundo antes de


conseguir responder.

Tudo bem. Sinto muito por não saber o que aconteceu.

DAWSON

Sem problemas. Como você poderia ter sabido?

Mesmo assim…

DAWSON

Quer me encontrar e conversar? Tenho muitas perguntas


sobre aquele final de semana, se não se importar.

Meu coração despenca ao ler a última mensagem. O que eu deveria falar


para ele sobre aquele fim de semana? Nós éramos praticamente estranhos e
trepamos até cansar. Ah… também tivemos momentos ridiculamente fofos
que guardei em meu coração por quase uma década. Isto não soa nem um
pouco patético.
Mas isso significa que eu o veria de novo. Mesmo que esta não seja a
segunda chance que eu esperava, ainda assim é uma segunda chance.

Sim. Quer almoçar?


DAWSON

É uma boa.

Combinamos um restaurante dentro de algumas horas e, repentinamente,


estou mais leve, como não me sentia há anos.
Fico mais um tempo deitado na cama, desta vez, com um sorriso no rosto
enquanto observo o céu clarear. A única lembrança na minha mente agora é
a última manhã que tive com Dawson, a certeza que eu tinha de que não
seria a última vez que o veria. Parece que eu estava certo; só não contava
com tudo o que aconteceu nesse meio tempo.

Dawson

Estou agitadamente nervoso enquanto tomo banho e me barbeio. Passei a


noite inteira me esforçando para lembrar qualquer coisa sobre o final de
semana que passei com Lando. A única coisa que me veio à mente foram os
sonhos que tive com ele. Mas foram lembranças ou sombras de como eu
cobiçava meu crush famoso?
Sinto certo alívio em finalmente saber por que estive tão obcecado com
esta banda durante anos, quando não fazia ideia de como era a música deles.
Acho que escutei em algum momento durante o ano perdido, mas não
consigo lembrar.
Seja como for, nada disso explica como conheci Lando, ou a expressão
em seu olhar ontem à noite. Também não explica por que ele se lembra de
mim depois de todos esses anos. Certamente, houve centenas de finais de
semana lindamente suados com incontáveis homens gostosos. Eu sou
apenas mais um. Uma pontada de amargura me atinge bem lá no fundo ao
pensar nisso, e eu rio de mim mesmo. Eu deveria estar feliz por já ter
transado com ele, não com ciúmes de outros que ele teve.
Só queria poder me lembrar daquele final de semana. Parece
infinitamente injusto eu ter conseguido passar horas na cama com Lando
Meyers, meu tipo de homem ideal, e não me lembrar de nada.
Observo o relógio a manhã inteira, respirando aliviado quando está na
hora de sair para me encontrar com Lando.
É uma linda tarde para caminhar até o restaurante de frutos do mar mais
próximo. Este sempre foi um dos meus lugares preferidos para visitar em
Miami.
Enquanto caminho, devaneio sobre sua cor e sua comida preferidas. Me
pergunto se ele já se apaixonou e de onde tira inspiração para compor.
Imagino a sensação de sua barba no meu queixo ou nas minhas coxas.
Essa linha de raciocínio me faz ajeitar minha ereção e me perguntar se
tem alguma possibilidade de Lando estar aberto a criar novas memórias
comigo nesta semana.
Quando chego ao restaurante, meu coração perde um compasso diante da
visão surreal de Lando esperando por mim. Ele levanta o olhar quando me
aproximo e sorri para mim, me deixando sem ar. Meu Deus, ele tem um
sorriso lindo!
Aceno de leve para ele, que imita o gesto antes de abrir a porta do
restaurante e gesticular para que eu entre. Sinto o cheiro de peixe frito e
lagosta; fico com água na boca. Olho para Lando e o vejo inspirando o
cheiro também.
Pego meu celular e digito uma mensagem para ele enquanto esperamos
para nos sentar.

Gosta de frutos do mar? Não pensei em perguntar antes,


desculpe.

Lando lê minha mensagem e sorri suavemente.

Gosto. Você me trouxe aqui na última vez em que estivemos


juntos.

É difícil descrever a sensação de ter perdido a memória. É um pouco


como começar um filme pela metade. Dá para entender a maior parte do
contexto, mas nunca saberei o quanto deixei escapar.
Antes que eu possa passar muito tempo preso a esses pensamentos, a
recepcionista nos conduz a uma mesa.
Pego o celular e o coloco na mesa, para me comunicar com Lando. Ainda
bem que fiquei surdo na era da tecnologia. Cacete, acho que a maioria das
pessoas prefere que eu só consiga mandar mensagens de texto.
Qual a sua cor preferida? – pergunto assim que nos
sentamos.

Um leve sorriso aparece no canto dos lábios de Lando. Ele começa a


digitar sua resposta, mas coloco a mão sobre seu celular. Quero ver seus
lábios se movimentarem quando ele fala comigo.
Ele demora um pouco para entender, mas, então, responde em voz alta.
– Era lilás, mas agora é azul-celeste – diz ele, então inclino a cabeça para
o lado, me perguntando que tom de azul é esse. Seu sorriso fica tímido. – É
o azul do Oceano Índico.
Meu coração dá uma acelerada.

Como nos conhecemos? – digito.

– Eu tinha um voo de Cincinnati para Nova Iorque com conexão em


Miami. Nós nos sentamos ao lado um do outro no primeiro voo.
Conversamos, flertamos, e, quando pousamos em Miami, eu não queria ir
embora ainda. Então, liguei para o empresário da banda e disse a ele que
passaria o final de semana aqui… com você.
Isso soa tão fofo que meu estômago dói. Eu me pergunto o que eu disse
de tão encantador para ele em pouquíssimas horas.

Por quê? O que eu tinha de especial?

O sorriso de Lando se transforma em tristeza quando ele lê a mensagem.


– Você foi sarcástico, engraçado e seguro. Eu te invejei pra caramba.
Quis ser você. Ou talvez só precisasse estar perto de você para absorver isso
tudo. Fiquei completamente encantando por você.
A cada elogio que sai de sua boca, meu coração pesa. Seus olhos brilham
conforme ele descreve este homem incrível que conquistou seu interesse, e
eu invejo tudo sobre este homem.

Acho que não conheço esta pessoa – digito.

– Ele ainda está aí dentro.


Franzo a testa, mas, antes que eu consiga responder, a garçonete aparece
para anotar nosso pedido. Aponto para a opção de ravioli com lagosta e ela
anota. Lando pede o mesmo enquanto tento desesperadamente me
recompor. Quando a garçonete sai, pego meu telefone de novo, digitando
furiosamente a próxima mensagem.

O que exatamente você quer de mim? Com certeza uma


estrela do rock tem coisas melhores para fazer com seu
tempo do que ficar por aí com alguém como eu.

– Eu só… – Ele olha para mim com tanta tristeza no olhar que sinto uma
dor física no meu peito. Nada disso faz sentido. – Você disse que está
diferente agora; quero conhecer essa sua nova versão. Estamos os dois aqui,
isso tem que significar alguma coisa. Podemos passar algum tempo juntos?
Me permito um tempo para assimilar suas palavras. Ele quer me
conhecer. Não entendo por que, mas ele quer passar um tempo comigo.
Meu coração martela dentro do peito e eu forço uma indiferença casual,
como se não me importasse nem um pouco se passamos um tempo juntos
ou não, como se eu já não estivesse imaginado nós dois terminando nus
juntos na cama.
Quase me engasgo com a minha própria linha de raciocínio. Eu nem o
conheço. Claro que o conheço como celebridade, mas quem Lando
realmente é?
Depois disso, a conversa volta a ser casual. Conto a ele que trabalho num
bar e falo um pouco sobre a minha irmã. E ele me conta sobre os pais e
como é se perguntar toda vez que sai de casa se alguém está tirando fotos
suas para vender em sites de fofoca.

Acho melhor ir para casa.

Digito depois que terminamos de comer, esperando que ele me convide


para ficarmos mais tempo juntos. Sinto que mal passamos da superfície.
Ainda quero saber mais sobre aquele fim de semana, mas não sei como
perguntar. Quero saber tudo que aconteceu entre nós.
– Se você estiver disposto a ficar mais um pouco comigo, estou pensando
em uma coisa – sugere ele com um sorriso malicioso. Inclino a cabeça em
questionamento, me perguntando o que ele poderia ter planejado. – É
surpresa.
Balanço a cabeça, meu peito comprime diante da ideia de não saber para
onde estamos indo. E se alguma coisa acontecer antes de eu conseguir
colocar no meu calendário?
– Não? – indaga Lando, enrugando a testa enquanto tenta entender.
Pego meu calendário e mostro a ele. Todos os lugares para onde fui e o
que fiz nos últimos nove anos, mesmo que todos os dias digam “assisti a
filmes o dia inteiro em casa”.
A testa de Lando fica ainda mais enrugada, de modo que eu pego meu
celular de volta para enviar uma explicação.

Você sabe como é ter um ano inteiro da sua vida apagado?


Sem falar nas memórias falhadas dos anos anteriores. Nem
posso olhar para trás e me perguntar o que estava fazendo
em algum dia em particular de novo.

Enquanto lê a mensagem, a expressão de Lando muda de confusa para


triste, compreendendo.
– Que tal se eu colocar no seu calendário para onde estamos indo e você
só olhar depois que eu puder te surpreender? – sugere ele.
Solto um suspiro de alívio e concordo, e passo sorrindo meu telefone
para ele.
Faixa 12: Lado A
AMOR DE LIMA

Dawson

Estacionamos na frente de uma pequena confeitaria a alguns quilômetros de


distância do restaurante de frutos do mar.
– Fiz uma vasta pesquisa e parece que este lugar tem a melhor torta de
lima da região – diz Lando, e eu fico boquiaberto.

Como você sabe? – digito.

– Você me falou.
Claro que falei.
Isso me faz pensar na sua música “Amor de Lima”. É uma das minhas
preferidas.
Lando dá um sorriso forçado e sai do carro sem responder. Talvez a
música seja um assunto doloroso neste momento por causa da turnê
cancelada. Quero saber mais sobre isso. Quero saber tudo sobre ele. Não
entendo a necessidade sufocante dentro de mim em relação a Lando. É
assustador e estimulante ao mesmo tempo.
Saio do carro e fico surpreso em vê-lo esperando por mim com um
sorriso tímido. Caminho em direção a ele, e ele estende a mão com o olhar
praticamente questionador. Demoro um segundo para entender que ele está
perguntando se podemos dar as mãos.
Mordo o lábio inferior para esconder meu sorriso e dou minha mão para
ele.
– Tudo bem? – pergunta, franzindo a testa de preocupação.
Pego meu celular e digito uma resposta.

Estou tentando descobrir se bati a cabeça outra vez e estou


em coma sonhando.

Lando lê minha mensagem e ergue uma sobrancelha para mim, sem


entender.

Alô! Estou de mãos dadas com uma estrela do rock, caramba.

Desta vez, ele balança a cabeça e faz um biquinho.


– Posso não ser uma estrela do rock por muito mais tempo. – Ele joga os
ombros para trás como se estivesse tentando liberar a tensão e, aí, dá um
puxão na minha mão. – Vem, vamos comprar a torta.
Eu o sigo para dentro da loja e fico com água na boca com tantas tortas
diferentes na vitrine. É oficial: morri e fui para o céu.
Meu olhar corre pela vitrine, tentando decidir qual torta pedir.
Evidentemente, lima está no topo, já que é a minha preferida. Mas o
cheesecake de cereja parece maravilhoso, assim como a de maçã holandesa,
sem falar na de merengue de limão.
Lando passa os dedos em meu braço para chamar minha atenção, e eu
olho para ele.
– Você quer essa? – Ele aponta para uma vitrine com um prato cheio de
fatias de oito tortas diferentes. Assinto entusiasmado e meu estômago
ronca, mesmo tendo acabado de almoçar. Lando sorri largamente, com os
lábios abertos, e eu me pergunto como é o som da risada dele.
Num impulso, estico o braço e coloco a mão em seu peito para sentir a
vibração. Eu sorrio timidamente para ele, que pega minha mão, levando-a
aos seus lábios para dar um beijo na minha palma.
– Quer levar a torta para a casa onde estou ficando? Podemos nos sentar
na varanda, nos enchermos de torta e conversar…
Concordo com a cabeça, colocando a informação no meu calendário,
depois, pego contente a caixa de torta que a moça atrás do balcão nos
estende.
Não demoramos muito para estacionarmos em frente a uma casinha de
praia fofa.
Ele bate em meu ombro e eu me viro para ler seus lábios.
– É o mesmo lugar em que ficamos juntos nove anos atrás.
Meu coração pesa. Ele está perguntando se eu me lembro deste lugar; se
alguma parte de mim se lembra dele. Volto meu olhar para a casa e tento
reconhecê-la. É apenas uma casinha branca na praia, exatamente como eu
estava imaginando quando soube que Parker alugou um lugar para mim.
Mas, além disso, não surge nenhuma outra lembrança. Eu fico tenso,
desejando que meu cérebro extraia uma lembrança útil do abismo escuro.
Só que nada acontece, e relaxo os ombros.
Sorrio apologeticamente para Lando, que dá de ombros como se dissesse
que não tem problema. Mas tem problema, sim. Cerro os dentes e tento
lembrar de alguma coisa, porém, quanto mais eu tento, mais as lembranças
parecem distantes.
Com o dedo em meu queixo, Lando vira a minha cabeça para olhar para
ele.
– Você está bem?
Balanço a cabeça e pego meu celular para digitar uma mensagem.

Eu odeio meu cérebro pra caralho neste momento. Ele decidiu


que a lembrança de fazer xixi nas calças na aula no primeiro
ano valia manter. Mas um final de semana com um baixista
sexy e famoso precisava ser descartado.

Lando sorri e balança a cabeça enquanto lê minha mensagem, e volta a


olhar para mim.
– Vamos criar novas memórias.

Lando

Queria não ter mencionado que este foi o lugar onde ficamos. Dawson
pareceu continuamente preocupado e se questionando sobre a casa desde
que chegamos. Queria que ele conseguisse se lembrar do final de semana,
mas, se eu tiver que reconquistá-lo uma segunda vez, farei isso.
A brisa está muito forte quando nos sentamos na varanda para comer
torta.
Dawson coloca seu prato no chão e digita algo em seu telefone. O meu
vibra segundos depois.

Sinto muito por não lembrar nada do que aconteceu naquele


final de semana. Estou tentando muito mesmo.

Coloco meu celular de lado e pego a mão de Dawson.


– Não é culpa sua. Mas, sabe, acho que parte de você se lembra de
algumas coisas daquele fim de semana – falo. Ele inclina a cabeça para o
lado, esperando que eu explique. Passo o dedo sobre sua tatuagem. – Você
disse estas mesmas palavras para mim quando te adverti que tentar ter um
relacionamento comigo poderia não ser fácil.
Dawson revira os olhos e me manda outra mensagem.

Eu me formei em Literatura, não acho que ter uma tatuagem


de Shakespeare prove muita coisa.

– Você poderia ter tatuado um milhão de citações. Mas escolheu esta.


Alguma parte de você se lembra de mim – insisto, não porque preciso que
ele se lembre, mas porque sinto que ele precisa reconhecer que é verdade.
Ele assente, formando um sorriso em seu rosto antes de digitar outra
mensagem.

E eu adoro sua banda, mesmo não conseguindo lembrar


como é a música…

Essa confissão me aquece por dentro. Parte dele se lembra de mim.


Percebo um leve rubor em seu rosto, e não consigo evitar tocar sua pele
macia.
– Sempre adorei seu rosto corado. – O rubor se intensifica e meu sorriso
se alarga.

É constrangedor – digita ele.


– O quê?

A queda que tive por você por tanto tempo. Eu nem te


conhecia e estava obcecado.

Mordo o lábio inferior para não gargalhar diante de sua confissão. Não
estava rindo dele, claro. Mas, sim, da natureza absolutamente ridícula da
situação.
– Covinhas, acho que você não está nem pronto para saber da dimensão
da minha obsessão por você. Acredite, qualquer queda que você achava que
tinha por uma celebridade, não chega aos pés do jeito que sinto por você há
anos.
Ele arregala os olhos e eu me pergunto por um segundo se me expus
demais. Mas aí ele se inclina para frente e dá um beijo suave em meu rosto,
me iluminando da cabeça aos pés. É desconcertante e estimulante descobrir
que, depois de todos estes anos, Dawson consegue me excitar mais com um
beijo no rosto do que qualquer outro homem consegue fazer embaixo dos
lençóis.
Nós dois voltamos a focar na torta depois disso e curtimos a paisagem
que temos na varanda.
– Você ainda escreve? – pergunto.
A expressão de Dawson desanima e ele balança a cabeça em negação.
Quero lhe contar sobre o meu problema. Posso imaginar o alívio de ter
alguém para conversar sobre minha falta de palavras. Sei que os caras estão
tentando esconder isso, mas posso sentir o peso da preocupação e da
expectativa deles. Se eu não conseguir encontrar minhas palavras, vamos
todos perder uma tonelada de dinheiro. Sem as minhas palavras, podemos
nos despedir do Queda Vertiginosa. Mas a expressão fechada de Dawson
me mantém calado. Ele não quer conversar sobre sua escrita, e eu duvido
que me queira descarregando nele sobre a minha.
Terminamos nossa torta e encontramos tópicos mais leves e fáceis de
conversar por um tempo antes de me dar conta de que tem uma coisa
importante que ainda não lhe perguntei.
– Você está morando por aqui agora? Ou está tirando uns dias de
férias…?
Não posso deixá-lo sumir de novo tão cedo, mas e se ele precisar ir para
casa amanhã ou algo assim? Vai ser difícil insistir em ir com ele sem
parecer um psicopata.

Uma semana de férias. Minha irmã organizou isso para o meu


aniversário.

– É o seu aniversário? – O fato de eu saber tão pouco sobre este homem


que me assombrou em cada despertar e adormecer durante anos me atinge
como um soco no estômago.

Na semana passada.

– Feliz aniversário. – Dou um beijo leve em sua covinha esquerda. Sua


pele é macia e quente, dificultando que eu mantenha o contato breve. –
Podemos passar mais tempo juntos antes de você voltar para casa?
Dawson concorda, e eu solto um suspiro de alívio. Pelo menos, terei uma
semana para lembrá-lo o quanto somos bons juntos.
No fim, o sol começa a descer e eu ofereço uma carona para Dawson
voltar para onde ele está. A casa da praia fica silenciosa e vazia quando
volto. Caminho por um tempo, imaginando o que Dawson está fazendo e
por que eu o levei em vez de convencê-lo a ficar aqui comigo.
Termino com meu notebook na minha frente, navegando em vão por
alguns dos meus sites preferidos. Então, um pensamento me ocorre.
Digito “Aprender linguagem de sinais” na barra de pesquisa e milhares
de vídeos e sites aparecem. Suspiro, me dando conta de que isso seria uma
tarefa gigantesca. Mas Dawson e eu não podemos depender de mensagens
de texto e leitura labial para sempre. Quero saber o máximo de maneiras de
me comunicar com ele quanto possível.
Faixa 13: Lado B
PROMESSAS

Lando

Voltamos à casa da praia ainda eufóricos por causa do passeio de aerobarco.


Em vez de ir direto para a casa, Dawson foi em direção à praia e eu fui atrás
dele. A areia estava quente e áspera, e a brisa do mar me envolvia como se
fosse um casulo gostoso. Eu queria ficar aqui para sempre, construir uma
vida bem aqui à beira-mar com Dawson. Pensar nisso era tão irresponsável
quanto estimulante.
Dawson parou perto da água e pegou a minha mão. Ele a ergueu, abrindo
o outro braço e inclinou a cabeça em direção ao céu.
– A vida é maravilhosa, não é? – Ele suspirou, sorrindo de maneira
satisfeita. Meu coração ansiava por ele, mesmo ele estando parado bem ao
meu lado. Eu precisava dele. Não queria deixá-lo ir embora.
– É, sim – concordei. – Se eu te der meu número, você promete ligar?
Podemos tentar fazer isso dar certo?
– Com toda certeza – concordou ele, sem hesitar.
– Não será fácil – aviso. – Eu viajo muito. Pode ser que demore um
pouco para eu conseguir voltar para te ver.
– A jornada do amor verdadeiro nunca é fácil – citou Dawson
sabiamente. – E se Shakespeare escreveu isso, deve ser verdade.
Eu fiquei preso na parte do “amor verdadeiro”. Era cedo demais para ter
certeza de que o que estamos vivendo era tão real assim. Mas pensava que
talvez algum dia olharíamos para trás e diríamos que foi amor à primeira
vista. Parece cafona, mas algumas pessoas se casam poucos meses depois
de se conhecerem e vivem felizes para sempre. De vez em quando, loucuras
acontecem. E, de vez em quando, o coração sabe exatamente quem ele quer.
Dawson abaixou os braços e parou para pegar alguma coisa no chão.
Quando voltou a se levantar, estendia uma pedra com formato de palheta de
guitarra.
– Isso é para tocar rock – explicou sério, e eu rachei de rir. Não conseguia
entender como me sentia desse jeito em tão pouco tempo, mas as palavras
“eu te amo” estavam na ponta da minha língua. Elas não saíram. Era cedo
demais; seria loucura. Mas era o suficiente para guardá-las em meu coração
e acreditar que pudessem ser verdadeiras… algum dia.
Depois de outra rodada de sexo apaixonado, terminamos pelados na sala
com meu baixo no colo.
– Toca pra mim? – pediu ele, se espreguiçando feliz como um gatinho
preguiçoso ao sol, completamente desinibido.
– O que você quer que eu toque?
– Algo que ninguém nunca tenha escutado – pediu, com esperança.
Tive que pensar por alguns segundos antes de achar alguma coisa que
nunca houvesse tocado nem mesmo para Lincoln. E, então, sem me dar
conta, estava tocando uma música que escrevi na semana anterior, enquanto
meu pai estava no hospital. Era sobre querer que ele tivesse orgulho de mim
antes de morrer. Fechei os olhos quando as palavras começaram a sair dos
meus lábios, e a melodia suave do baixo acompanhou a letra.
Quando terminei, lágrimas corriam pelo rosto de Dawson.
– Meu pai morreu no ano passado – contou ele depois que coloquei o
baixo de lado.
– Sinto muito. Se soubesse, não teria tocado esta.
Dawson gesticulou como quem diz que não tem problema e se aninhou
em meu colo.
– Ele era escritor, um escritor brilhante. Eu morria de medo de mostrar
qualquer coisa que escrevi a ele porque achava que ele odiaria. Agora,
queria ter mostrado.
– Tenho certeza de que ele tem orgulho de você. Um diploma em
literatura não é insignificante.
Dawson deu de ombros.
– Eu tenho minha irmã, e a minha mãe não é tão ruim. Só é chato querer
poder voltar no tempo e mudar as coisas.
Assenti e abracei Dawson até ele sair do meu colo e pedir para ouvir
outra música. Desta vez, toquei algo um pouquinho menos deprimente, e
deixei mais um pedacinho do meu coração com Dawson quando ele dançou
pela sala, cantando o refrão junto ao aprendê-lo.
Faixa 14: Lado A
COMEÇOU COM UM BEIJO

Dawson

Na manhã seguinte, acordo com uma mensagem de Lando perguntando se


quero sair para beber alguma coisa esta tarde. Um lado do meu cérebro me
diz para pisar no freio, que nada de bom pode vir do que está acontecendo
entre nós dois. Lando gosta de mim de um jeito que eu não entendo, e isso
só pode levar a sofrimento.
Eu me deito na cama por meia hora debatendo se aceito ver Lando outra
vez. No fim, o coração vence a razão e digo a ele que me pegue às 14h.
Depois disso, fico enrolando pela casa, lendo mais alguns capítulos no
meu leitor digital, então, tomo banho e faço a barba. Além disso, insiro os
planos para hoje no calendário e leio as anotações dos últimos dias sem
acreditar. Se elas não estivessem bem ali, preto no branco, provavelmente
eu não acreditaria. Caramba, se eu acordasse de outro acidente e esquecesse
esses últimos dias, nunca acreditaria nessas anotações.
Se tivesse anotado cada detalhe daquele final de semana de antes com
Lando, será que teria acreditado quando acordei? Improvável. Não acredito
agora, e ele me disse claramente que é verdade. Lando não tem motivos
para mentir sobre nada disso. O que não significa que faça algum sentido.
Quando Lando chega para me buscar, fazemos uns movimentos estranhos
tentando decidir se queremos nos abraçar ou nos beijar no rosto. Acabamos
dando um abraço lateral e Lando me dando um tapinha no ombro.
Tem uma vozinha no fundo da minha mente que não para de me chamar
de covarde por simplesmente não agarrar o rosto de Lando e beijá-lo pra
valer. Queria ainda ser o homem que não pensava duas vezes em transar
com um estranho lindo no final de semana. Quando Lando descreveu o
homem que conheceu naquela época, não parecia comigo de jeito nenhum.
É difícil pensar que um dia fui assim, ou talvez ele tenha inventado uma
versão idealizada do homem perfeito e a carregou por nove anos.
Presumo que em algum momento eu tivesse menos medo do que tenho
agora. Mas isso foi antes de eu saber o quanto a vida é frágil. Eu era um
garoto idiota que tinha certeza de que era invencível. Agora, sei o quanto
isso não é verdade. É óbvio que sou mais cauteloso. Seria estupidez não ser
depois do que passei. Não sou covarde; sou prático.
Fomos a um bar próximo, na mesma rua onde estivemos na outra noite.
Lando pega duas bebidas enquanto eu me sento a uma mesa e olho para as
pessoas no bar rindo, dançando, se divertindo. Queria poder me sentir tão
livre quanto elas parecem sentir. O toque de Lando no meu ombro chama a
minha atenção.
– Você joga sinuca? – pergunta, apontando para a mesa.
Digo que sim com a cabeça e desço do banco para ir com ele até a mesa
de sinuca. Escolho um taco e observo Lando fazer o mesmo. Vejo sua testa
franzida em concentração enquanto ele pesa dois tacos diferentes,
claramente levando o processo bem a sério, e não consigo evitar uma
risada. Quem diria que o astro do rock seria tão empenhado com um jogo de
sinuca amistoso? Com certeza não se acha isso em nenhuma de suas
biografias online. Eu saberia, já li todas elas milhares de vezes. Talvez
Lando estivesse certo ontem: meu coração se lembra dele mesmo que meu
cérebro não.
Lando, enfim, escolhe um taco, e eu termino de arrumar as bolas.
– Quer tornar o jogo interessante? – propõe Lando, agitando as
sobrancelhas e sorrindo.
Eu solto uma gargalhada e assinto; aí, pego meu celular para detalhar
minha resposta.

Não sou milionário como você. Vamos manter a aposta


razoável. Tipo $5,00.

– Eu estava pensando em algo mais interessante do que isso – instiga


Lando, e eu ergo uma sobrancelha. – Se eu vencer, ganho um beijo?
Mordo o lábio inferior, tentando não deixar seu adorável sorriso
esperançoso influenciar minha resposta. Claro que ele poderia encontrar
centenas de caras numa distância de um quilômetro que iriam para a cama
com ele num piscar de olhos. Por que eu? O que ele poderia querer com um
fracassado surdo com danos cerebrais?
Lanço outro olhar para ele e meu estômago revira. Quantas chances na
vida eu terei de beijar uma estrela do rock? Aparentemente, pelo menos
duas, mas, espero que me lembre desta vez.
Concordo com relutância e passo giz no meu taco.
Acontece que ficamos quase empatados e eu não consigo decidir se quero
ou não que Lando ganhe. Ele me tenta durante o jogo, balançando a bunda
quando se curva para alinhar as tacadas, atraindo meu olhar para as suas
lindas nádegas redondas. Será que já as abri e coloquei a cara ali? Será que
fiz Lando ter um orgasmo apenas com a minha língua na sua bunda? Será
que ele deixaria?
Ele me olha por sobre o ombro e seu sorriso me diz que meus
pensamentos estão estampados na minha cara.
– Ganhei – informa ele, e eu pisco para afastar o estupor cheio de luxúria
para olhar para a mesa de sinuca. Cacete, ele ganhou.
Lando se levanta e se vira para mim sorrindo. Tenho dificuldade em
respirar enquanto tento acalmar meu coração. Ele quer mesmo me beijar.
Fecho os olhos e inclino a cabeça em sua direção. Em vez de lábios, como
eu esperava, Lando percorre meus lábios e minhas covinhas com o dedo.
Surpreso, abro os olhos.
– Por que não saímos daqui? – sugere. – Prefiro te beijar sem público.
Concordo letárgico e o sigo para fora do bar.
A volta para a minha casa é curta, mas passo o caminho inteiro pensando
em qualquer maneira possível de isso dar errado. O risco de deixar Lando
me beijar parece baixo, mas e se isso desbloquear as lembranças daquele
final de semana que esqueci? E se não desbloquear? Não sei o que seria
pior. Quero saber e, mesmo assim, não acredito que consiga lidar com isso.
Ele estaciona na entrada e desliga o motor, enquanto eu diminuo minha
frequência cardíaca. É só um beijo. Ele acende a luz do teto do carro e nós
nos viramos um para o outro.
– Posso entrar? Ou você prefere que eu te deixe aqui? – pergunta, me
deixando boquiaberto. E o meu beijo? Aponto para a minha boca e olho
para ele de maneira questionadora. Lando ri. – Eu não tinha certeza se você
queria.
Eu me pergunto se ele faz alguma coisa porque ele quer, ao invés de fazer
o que deixa todos ao seu redor mais felizes. Acho que é uma boa política
quando se trata de beijo ou sexo, mas tenho a sensação de que ele aplica
isso a tudo.
Aponto novamente para os meus lábios e aceno com a cabeça para que
ele saiba que quero de verdade o beijo que ele prometeu. Aí, tiro o cinto de
segurança e aceno para que ele entre comigo.
Dentro de casa, tiramos os sapatos e Lando me segue até o sofá. Sinto
como se tivesse treze anos de novo, curtindo no porão de Greg Olson,
paquerando com olhares constrangedores e me perguntando se ele vai me
beijar. Não consigo lembrar se ele beijou ou não, e essa é apenas uma das
muitas lembranças que queria ter de volta. Pela primeira vez, vou recuperar
uma lembrança. Se não consigo lembrar qual foi a sensação dos lábios de
Lando nos meus há nove anos, então, vou descobrir neste exato momento.
Pego Lando pela nuca e colo sua boca na minha. Sua barba é mais macia
do que eu esperava contra a minha pele, e seus lábios são delicados. Eu
esperava que o beijo fosse quente e ávido, mas, em vez disso, é calmo e
suave. É como voltar para casa.
Quando termina, fico buscando uma maneira de tornar isso real e me
proteger. Lando dá um beijinho em cada uma das minhas covinhas.

Lando

– Senti sua falta, Covinhas – murmuro em seus lábios, mesmo sabendo


que ele não escuta o que estou dizendo.
Quando o solto, Dawson tira o celular do bolso e, com as mãos trêmulas,
digita uma mensagem.
Eu não sei o que você está procurando, mas se é uma transa
de férias, preciso que tenha ciência de que não está de
sacanagem com quem quer que seja aquele cara de quem
você tanto se lembra. Quem está aqui é um aspirante a
escritor surdo com danos cerebrais, que não escreve nada há
anos.

– Eu também perdi as minhas palavras – admito, sentindo uma afinidade


desesperada com ele.

Não escrevo nada desde o acidente. Acho que agora meu


cérebro está muito danificado. Naquela época, eu era um
merdinha arrogante. Tinha certeza de que seria o próximo
Dostoievsky. Não escrevo porcaria nenhuma desde a
faculdade.

Suas palavras se reviram em meu cérebro por um minuto, então, balanço


a cabeça.
– Sabe qual eu acho que seja o seu problema? – indago, e Dawson
estreita o olhar para mim como se já estivesse se preparando para discutir
com o que quer que eu esteja planejando dizer, mas ele gesticula para que
eu continue. – Acho que suas expectativas só te levam ao fracasso. Seria
ótimo escrever o próximo Crime e Castigo? Claro. Mas isso não torna os
outros livros menos válidos ou importantes para quem os lê. Ao invés de
tentar escrever um livro que vai mudar o mundo, se deixe tentar escrever
um livro que vai mudar uma única pessoa.
Ele abre a boca em surpresa, e depois se recompõe e dá de ombros
fingindo indiferença diante da minha sugestão. Sorrio quando ele começa a
digitar uma resposta.

Não é justo me analisar se não posso retribuir. Há quanto


tempo VOCÊ não escreve nada?

Leio sua mensagem e meu sorriso desaparece.


– Há mais de um ano. As músicas do nosso último álbum foram escritas
anos atrás.
Achei que seu último álbum teve uma energia diferente de
todos os anteriores. É estranho eu ler suas letras?

– Não é estranho, é meio que legal. E, sim – concordo com um sorriso


triste. Eram músicas que compus antes. Antes de ficarmos famosos, antes
da merda toda começar a desmoronar, antes de eu conhecer Dawson. Nem
conheço a pessoa que compôs aquelas letras, mas, caramba, ele era um
idiota de olhos arregalados, sem ideia do que estava por vir.

Para onde você acha que foram suas palavras?

– Não sei. Para algum lugar inatingível. Perto o bastante para me


enlouquecer, mas longe demais para agarrá-las. Você… – Paro antes de
falar algo estúpido. Dizer a Dawson que ele era a minha musa não ajudará
agora, não depois de ele falar que não é a pessoa de quem me lembro. Mas,
talvez, quem quer que ele tenha se tornado ainda possa me inspirar. – Eu
estava saindo com um cara, Roland… – admito e Dawson fica tenso. – Ele
não tinha nada de especial, mas foi o segundo cara seguido com quem saí e
que se revelou estar apenas atrás da minha fama. Tudo começou a parecer
tão… vazio. Eu costumava saber por que este era o meu sonho, mas mal
consigo me lembrar agora.

A vida de estrela do rock perdeu o brilho. Você está desiludido


demais para escrever – supõe Dawson.

Concordo com sua afirmação certeira.


– Quem sabe não encontramos nossas palavras juntos? – sugiro, contente
por ele não poder ouvir o tremor na minha voz.
Dawson sorri enquanto digita uma nova mensagem.

Eu só estou interessado em encontrar sua próstata.

– Por mim, tudo bem – concordo, pronto para ignorar as paradas pesadas
por enquanto.
Posição preferida?

Meu rosto ferve ao ler suas palavras, lembranças voltam à minha mente,
fazendo rapidamente meu pau latejar e minha espinha arrepiar.
– Na última vez que você me perguntou isso, terminamos…
Dawson franze a testa.

Não pode parar uma frase bem quando ela vai ficar
interessante.

Eu solto uma gargalhada e, em vez de responder em voz alta, digito uma


resposta.

Nós trepamos em cada cômodo da casa na praia, em todas


as posições que conseguimos pensar.

Dawson fica sem ar e meu pau intumesce contra a minha perna enquanto
o sangue corre para preenchê-lo.

Que pena que não consigo lembrar sua posição preferida.


Você vai ter que me mostrar ;)

– Com prazer – concordo. – Mas não agora. Agora, vou voltar para a
minha casa e te mandar uma mensagem amanhã, porque não tem motivo
nenhum para apressarmos o que quer que esteja acontecendo entre nós.
Faixa 15: Lado A
VERDADE DOLOROSA

Lando

O barulho ritmado das gotas de chuva na janela embala o meu sono durante
a manhã, sonhos gostosos com os lábios de Dawson movimentando-se
preguiçosamente nos meus se confundem com a realidade e me deixam
duro e agitado, mas incrivelmente feliz.
Quase posso sentir as palavras que descrevem a sensação, bem na ponta
da minha língua. Mas, melhor do que pegar um bloquinho para tentar
capturá-las, apenas deixo as palavras e as sensações me preencherem.
Esqueci como era estar tão feliz assim, com tanta esperança. E isso só
ficaria melhor com Dawson ao meu lado na cama.
Quando eu, enfim, consigo ter vontade de fazer qualquer outra coisa que
não seja me deliciar com o momento, pego meu celular e assisto a mais
alguns vídeos de linguagem de sinais e pratico um pouco. Aí, quando já está
tarde o suficiente para não dar a impressão de que fiquei de preguiça a
manhã toda esperando para mandar uma mensagem para ele (porque
fiquei), envio.

Tem planos para hoje?

DAWSON
Só ficar deitado lendo romances deliciosamente obscenos.

Ai, meu Deus, isso parece chato pra cacete. Deixa eu tentar
de novo…

Eu tenho inúmeros planos incríveis e excitantes para hoje, por


quê?

Solto uma gargalhada com a sequência de mensagens, sentindo um


calorzinho no peito.

Inúmeros planos incríveis e excitantes? Merda, eu ia te


perguntar se você não queria sair comigo e depois fazer um
sexo suado e maravilhoso, mas parece que você já está bem
ocupado.

DAWSON

Sexo suado e maravilhoso? Acho que posso adiar alguns


compromissos.

Eu imaginava que seriam as palavras mágicas mesmo ;) Te


pego meio-dia?

DAWSON

Ok. Até logo.

Eu me levanto da cama e entro no banho, ignorando completamente, a


qualquer custo, minha ereção. Se Dawson estará na minha cama hoje,
melhor esperar. Na minha cama, dentro de mim, me possuindo…
Gemo diante das imagens que se formam na minha mente. Imagens com
as quais me tornei tão familiarizado ao reproduzi-las ao longo dos anos, que
agora são mais do que um apanhado carnal e uma sinfonia de sons quentes
e úmidos.
Tomo banho correndo e me visto depressa antes de deixar meu pau super
ansioso me convencer a bater uma antes do meu encontro.
Quando acabo de me vestir, encontro outra mensagem de Dawson
esperando por mim.
DAWSON

Eu te dei acesso ao meu calendário online, pode colocar


nosso encontro lá?

Vou colocar.

Localizo o calendário dele e escrevo Parque Matheson Hammock –


kiteboarding e jantar depois. Eu me pergunto como deve ser viver com um
medo tão profundo de acordar na manhã seguinte e não fazer ideia do que
fez no dia anterior. Como foi acontecer isso com ele? Simplesmente ter um
ano de sua vida totalmente apagado? Sinto meu coração doer por ele.
Não demora muito para chegar à sua casa. Ele está esperando do lado de
fora quando chego, e corre para o carro assim que estaciono. Seu sorriso é
largo e ele está vestindo uma sunga rosa sexy que me diz que aquele
homem de quem me lembro não está tão perdido quanto ele pensa.
Ele se senta no banco do passageiro e, imediatamente, começa a digitar
uma mensagem que vibra no meu celular segundos depois.
DAWSON

O que é kiteboarding?

– Não tenho certeza. Vi no site do parque, e dizia que a água de lá é


ótima para iniciantes porque é muito calma. Acha legal tentar?
Dawson parece desconfiado, mas animado. Dá para ver em seu rosto o
homem que ele era e o que é agora em guerra. O Dawson que conheci não
tinha medo de nada, foi o que ele mesmo me disse. Este Dawson tem
muitos medos. É compreensível, mas não o faz feliz. Não é quem ele
realmente é em seu interior, quem ele quer ser.
Finalmente, ele concorda com a cabeça, ajeitando os ombros como se
estivesse se preparando para a batalha. Estendo a mão e entrelaço nossos
dedos, então, saio para a estrada em direção ao parque.
A chuva parou há mais de uma hora, e o sol está brilhando quando
chegamos.
Saímos do carro e eu pego uma toalha no porta-malas. Faço uma menção
em direção à praia e Dawson me segue. Leva alguns minutos para encontrar
um lugar bom e, quando encontramos, estendo a toalha e puxo Dawson para
se sentar ao meu lado. Ele franze a testa, confuso, quando me deito de
costas e mostro o espaço vazio ao meu lado. Nuvens brancas fofinhas
flutuam preguiçosamente pelo céu.
Cutuco o ombro de Dawson e aponto para uma das nuvens. Então, faço o
sinal que significa cachorro, que aprendi ontem durante as muitas horas que
fiquei assistindo a vídeos de linguagem de sinal.
Dawson sorri largamente e concorda. Depois, ele aponta para uma nuvem
e faz um sinal que não vi na minha pesquisa. Olho para ele em dúvida, e ele
solta uma gargalhada rouca. Ele faz o gesto novamente e segura sua virilha.
Volto a olhar para a nuvem e, agora, vejo perfeitamente o que ele estava
insinuando. Rio alto de um jeito que pensei já ter esquecido como fazer.
Dawson entrelaça os dedos nos meus e meu peito se enche de calor. Ele
se vira de lado e volta minha cabeça para olhar para seu rosto, que está a
poucos centímetros de distância, iluminado por um sorriso. A cor verde
como o mar dos seus olhos está ainda mais vibrante do que minha memória
permitia. Sua língua rosada umedece seus lábios e meu corpo ferve. Suas
pálpebras se fecham quando ele inclina a cabeça, me oferecendo seus lábios
tão docemente, e eu os aceito.
Ele geme contra a minha boca conforme nossos lábios se movimentam
em sintonia, saboreando um ao outro.
Quando eu me afasto, Dawson procura meus lábios, fazendo um som de
descontentamento com a perda do contato. Roço meu nariz no dele e volto a
olhar para o céu, para podermos procurar juntos por mais formas nas
nuvens.
Depois de encontrarmos um zoológico inteiro de animais, e pelo menos
mais três pênis, guardamos a toalha e alugamos dois kiteboards.
Quando pisamos nas pranchas, Dawson fica nervoso, mas, depois de
alguns minutos pairando tranquilamente sobre a água, ele começa a relaxar,
e eu ouço sua risada contente. Eu rio junto e aproveitamos o lindo dia.
Por fim, seguimos para o restaurante no outro lado do parque. Posso
sentir o olhar de Dawson em mim enquanto caminhamos, me observando e
sorrindo.
– O que foi? – acabo perguntando com uma risada quando estamos perto
do restaurante.
Ele morde o lábio inferior e sorri novamente, então, digita uma
mensagem e me envia.
Só é muito estranho. Há menos de uma semana, eu estava
assistindo a uma fofoca sobre a banda na TV, e agora estou
aqui com você. É surreal.

Leio a mensagem e meu coração pesa. Ele mencionou que eu era seu
crush famoso. Será que é assim que ele me vê agora? Apenas um cara
famoso para trepar nas férias e poder contar aos amigos? Será que, agora,
para ele, eu sempre serei apenas o Lando, baixista do Queda Vertiginosa?

Por que você parece tão triste? – envia.

– Não é nada – minto, balançando a cabeça e forçando um sorriso.


Dawson põe a mão na minha, mas não parece satisfeito. Depois de alguns
segundos e um olhar determinado, ele se aproxima e me abraça. Meu corpo
aquece com o gesto. Quando foi a última vez que recebi um abraço?
Caralho, é muito triste que eu não consiga me lembrar? Ele mantém um
braço em mim enquanto digita outra mensagem e eu descanso o queixo em
sua cabeça enquanto leio.

Na hora, foi tão estranho… eu tive essa vontade louca de te


mandar uma mensagem para ver se você estava bem e te
confortar. Pensei que estivesse chegando ao fundo do poço,
me tornando um perseguidor esquisito ou algo assim.

Meu coração se agita e eu o abraço mais forte, beijando o topo de sua


cabeça, e beijo cada uma de suas covinhas.
– Vamos entrar, estou faminto – proponho, e ele assente fervorosamente,
fazendo um “C” com a mão, e a coloca em frente ao peito. – Com fome? –
suponho, ele sorri e concorda.

Quando você aprendeu esses sinais? – questiona Dawson


assim que nos sentamos e fazemos nosso pedido.

– Nas últimas noites, e um pouco hoje de manhã.


Ele fica boquiaberto e me encara por vários segundos.
Por quê? – pergunta quando se recompõe.

– Imaginei que facilitaria a comunicação. Ainda não sei muita coisa, mas
vou continuar aprendendo – garanto-lhe.
Dawson se levanta depressa, sua cadeira faz um barulho alto quando
arranha o chão e quase cai. Por um segundo assustador, acho que ele vai
embora. Em vez disso, ele dá a volta na mesa e segura meu rosto com
ambas as mãos. Ele cola seus lábios aos meus, forte o bastante para quase
me derrubar. Sua boca está quente e exigente quando sua língua entra na
minha, me saboreando e me deixando quase louco de tesão.
– Obrigado – sussurra ele antes de dar mais um selinho no canto da
minha boca e voltar para o seu lado da mesa.
Com um sorriso malicioso, abro o calendário de Dawson no meu celular
e adiciono um novo evento para a noite.
O telefone de Dawson vibra com a notificação do novo registro. Ele lê o
registro que diz “Na casa de Lando trepando até ele não conseguir mais
enxergar direito” e joga a cabeça para trás com uma gargalhada rouca.

É melhor você estar planejando comer rápido depois dessa


provocação – responde por mensagem.

Enquanto comemos, trocamos mensagens sobre coisas banais e Dawson


me mostra mais alguns sinais, a maioria obscenos. Quando a conta chega,
ele arregala os olhos ao perceber que deixo uma gorjeta de 100%.
– Minha mãe foi garçonete – explico timidamente. – Tenho mais dinheiro
do que jamais vou precisar, posso muito bem usá-lo para deixar a vida de
outras pessoas mais feliz onde eu conseguir.

Você não é o que eu esperava.

– E o que você esperava? – pergunto antes de pegar sua mão e caminhar


até o carro enquanto ele digita uma resposta com a outra, essas habilidades
dos Millennials são bem-vindas de vez em quando.
Não sei. Acho que pensei você seria uma estrela do rock
como as outras. Você é tão… fofo.

Solto uma risada e percebo um lampejo de tristeza passar pelos olhos de


Dawson.
– Jude faz mais o tipo estrela do rock. O resto de nós somos só… quem
sempre fomos, apenas temos muito mais dinheiro e estresse – explico. –
Preciso perguntar… “fofo” é uma coisa boa ou você preferia ter esbarrado
em Jude?
Em vez de digitar uma resposta, Dawson se aproxima, me imprensando
contra o carro e me beija com intensidade. Este beijo é potente, ele agarra
meus cabelos e pressiona sua ereção contra a minha por cima da calça
jeans. Eu dou o melhor que consigo, metendo minha língua em sua boca e
enfiando minhas mãos na parte de trás de sua calça para agarrar suas
nádegas firmes. Meus polegares encontram outro conjunto de covinhas
sensuais logo acima de sua bunda, e eu sorrio contra seus lábios.
O pré-gozo derrama dentro da cueca enquanto ele se esfrega em mim,
deixando meu pau latejante e meu saco doendo para se aliviar.
– Podemos, por favor, ir para casa? – imploro contra sua boca. Não tem
como ele saber o que eu disse, mas parece que entendeu o recado quando
me solta e dá um tapa na minha bunda para me mandar para o banco do
motorista.
Quando entramos na casa de praia, cerca de dez minutos depois, Dawson
não perde tempo e arranca minha camisa, lambendo do meu pescoço até
meu mamilo. Seus dentes arranham minha pele sensível e eu estremeço,
gemendo. Ele se atrapalha com a minha calça, abaixando-a assim que
consegue abrir o zíper. Tiro a calça com os pés e Dawson passeia com o
olhar pelo meu corpo praticamente nu. Ele lambe os lábios e olha para
baixo, vendo um evidente ponto molhado na minha cueca vermelha, e um
claro contorno da cabeça do meu pau. Ele geme baixinho e cai de joelhos
sonoramente. Eu me retraio diante do quanto deve ter doído, mas ele não
parece se incomodar ao roçar no volume da minha cueca, respirando
profundamente, como se estivesse tentando memorizar meu cheiro.
Enfio os dedos em seus cabelos, sem tentar apressá-lo, apenas para
apreciar cada ponto de contato que consiga ter com ele. Ele olha para cima
através de seus cílios escuros, e aquele sorrisinho malicioso em seus lábios
me deixa impossivelmente mais duro. Esforço-me para não abaixar minha
cueca e forçar meu pau entre seus lábios deliciosos.
Ele dá beijos obscenos de boca aberta ao longo de todo o meu membro
por cima da porra do tecido, e quando chega ao local melado e úmido, ele
dá linguadas em movimentos completos e gananciosos até que eu esteja
tremendo e implorando.
– Por favor, por favor, por favor – balbucio, agora puxando seus cabelos
e esperando pra caralho que ele sinta pena de mim e me foda logo.
Quando ele enfia os dedos no cós da minha cueca, quase choro de alívio.
Não estou nem aí se ele me fode ou me chupa, só quero que me faça gozar.
Mas, ao invés de acabar com o meu sofrimento, ele se levanta e abaixa a
minha cueca.
Dawson pega a minha mão e me leva nu para o quarto, minhas roupas
são deixadas amontoadas na sala. Ele aponta para a cama e eu subo nela,
me deitando de costas.
– Tira a roupa.
Ele balança a cabeça e eu reclamo impaciente mesmo sabendo que ele
não pode me ouvir. Ele ri diante da minha expressão descontente e sobe na
cama, abrindo minhas pernas para poder ficar entre elas. Seus olhos
passeiam avidamente pelo meu corpo, então, param na minha ereção
orgulhosamente em pé, gotejando o pré-gozo na minha barriga.
Ele afasta ainda mais as minhas pernas e ergue minhas coxas, com a clara
intenção de chegar no meu cu. Contente em ajudá-lo com este objetivo de
qualquer maneira possível, encosto os joelhos no peito.
Dawson emite um som de aprovação quando seu olhar pousa no meu
buraco. Ele corre gentilmente um dedo seco ao redor, e tenho vergonha de
dizer que choramingo impaciente.
Sua língua se junta ao dedo e eu projeto o quadril com a sensação
deliciosa de sua língua quente e molhada me provocando. Ele dá linguadas
longas e lentas até eu sentir a saliva pingando do meu buraco. Então, ele
mete um dedo lá dentro, e eu solto um gemido sufocado.
Como ele não vai ouvir minhas súplicas, puxo seus cabelos com mais
força, incitando-o a se apressar e me foder. Meu pau flexiona e goteja, e
meu saco está pesado e dolorido. O calor se espalha de dentro da boca do
meu estômago. Se ele não meter em mim, vou gozar em seu dedo ao invés
de no seu pau, e isso seria uma tragédia.
Ele acrescenta outro dedo, e eu esperneio, me fodendo descaradamente
em seus dedos e implorando por mais.
Quando ele os tira, eu praticamente choro. Busco por ele, agarrando seus
braços conforme tento trazê-lo mais para perto, desesperado por mais
contato, mais tudo.
Não me dou conta de que meus olhos estão fechados até ele bater no meu
braço. Abro os olhos e encaro Dawson admirado, banhado pela luz do luar e
mais lindo do que nunca. Seus lábios estão inchados e úmidos, seu peito
arfando. Em algum momento, ele tirou a camisa; como fui perder isso? Ele
tem mais tatuagens escondidas sob a roupa. Não tenho condições de ler os
rabiscos em seu peitoral, mas faço uma nota mental para olhar melhor mais
tarde.
Percebo que ele está esperando alguma coisa quando assimilo suas
sobrancelhas erguidas e um sorriso divertido.
– Ah, camisinha e tal, claro – resmungo, me obrigando a levantar. Saio da
cama e remexo na minha mochila até meus dedos pousarem na caixa de
preservativos e no tubo de lubrificante que enfiei ali quando estava
arrumando a mala, com a esperança que permanecia no fundo da minha
mente de que, de alguma maneira, eu encontraria Dawson novamente.
Quando volto, ele está nu e esparramado na cama, se acariciando
lentamente. Subo na cama, dando um tapa para afastar sua mão e coloco a
minha no lugar. Ele joga a cabeça para trás no travesseiro e seus olhos se
fecham enquanto arranco sons roucos desesperados dele com a minha mão.
Uso os dentes para destampar o lubrificante e me dou conta de que não
vou conseguir espremer o tubo sem a outra mão. Relutante, solto o pau de
Dawson e espremo um pouco de lubrificante em meus dedos, depois deixo
o tubo de lado e volto a acariciá-lo. Espalho o lubrificante em volta do meu
cu, ainda úmido pela boca de Dawson, mas não molhado o suficiente para o
pau dele entrar. Uso dois dedos para enfiar o lubrificante lá dentro, e depois
rasgo o pacote de camisinha e visto a ereção de Dawson.
Ele agarra o lençol e me observa com olhos vorazes enquanto monto em
seu quadril e posiciono seu pau no meu buraco lambuzado.
Já faz anos que ninguém me come, mas nem pensar que vou devagar
agora. A picada brusca de sua cabeça grossa me invadindo me faz ofegar e
me prende ao momento. Quero que a dor me lembre de que isto é real. Isto
não é um sonho ou uma fantasia, é Dawson dentro de mim de novo.
Suas mãos agarram meus quadris quando o meto todo dentro de mim
num movimento rápido. Gemo com a gloriosa extensão e saciedade. Giro os
quadris, me luxuriando com a sensação do pau de Dawson chegando bem
profundamente dentro de mim. Minha cabeça cai para trás e um gemido
escapa dos meus lábios. Eu subo e desço de novo com tudo, fazendo
Dawson gemer. Uma pontada de tristeza atinge meu peito quando imagino
o quanto eu seria triste se não pudesse escutar seus sons de prazer.
Pego a mão de Dawson e a coloco na minha garganta antes de subir e
descer devagar o bastante para nos deixar loucos. Minha garganta vibra
contra a palma de sua mão quando gemo profundamente, e Dawson
convulsiona de prazer embaixo de mim.
Ele dobra os joelhos e projeta os quadris, metendo ainda mais fundo. Seu
membro se arrasta pela minha próstata, obrigando o pré-gozo a pingar da
minha ponta.
Dawson aperta a minha garganta um pouco mais quando cavalgo nele
violentamente e murmuro de maneira incoerente.
O calor aumenta mais uma vez dentro de mim, formando gotas de suor
na minha testa. Ele aperta mais ainda, não a ponto de me deixar sem ar, mas
é possível que deixe hematomas. Cacete, quero seus hematomas no meu
pescoço, nos meus quadris, na minha bunda. Coloco a minha mão sobre a
dele e grito com a intensidade do orgasmo que finalmente me atinge. Meus
músculos ficam tensos, e a ansiedade dolorosa finalmente atinge o auge
quando meu canal aperta com força o pau de Dawson, enterrado tão
profundamente. Ele geme junto comigo quando meu gozo espirra em seu
peito.
Desabo em seu peitoral quando a última onda de tremores acaba, e gemo
quando seu pau amolecido sai de dentro de mim.

Dawson

Meus membros estão pesados e meu corpo está todo suado enquanto
estamos deitados emaranhados nos lençóis, o cheiro de sexo paira pesado
no ar. Estou com o rosto no peito de Lando, o tranquilo descer e subir me
embala.
Pisco meus olhos pesados e passo os dedos nos pelos do peito de Lando.
Quando um ronco começa a vibrar no meu rosto, me pergunto, por um
segundo, se é Lando ronronando. Mas, quando olho para seu rosto, vejo
seus lábios se movendo. Está escuro demais para ler o que ele diz, então,
rolo e pego meu celular na mesa de cabeceira e estendo para ele, para que
pegue o dele.

O que está dizendo? – pergunto.

Eu estava cantando. Desculpe, não percebi o que estava


fazendo.

A mesma dor da saudade se instala em meu peito, me deixando


infinitamente invejoso de qualquer um que consiga saber como é o som da
voz de Lando. Eu sei que ele não é o vocalista do Queda Vertiginosa – será
que é porque ele não canta bem ou simplesmente não quer os holofotes?
Será que sua voz é rouca e inexperiente? Ou será o tipo de voz que pode
fazer alguém se apaixonar instantaneamente por ele quando canta?

O que você estava cantando? – pergunto depois da minha


longa pausa de autopiedade.

Estava cantando “Suor de Bala”.

Estremeço quando leio sua mensagem. É uma das minhas músicas


preferidas do QV. É sexy pra caralho, cheia de luxúria nua e crua e desejo
desesperado. Sabendo como Lando é passional na cama, a música faz
sentido. Entretanto, um pensamento louco me ocorre. Talvez seja muito fora
da casinha sequer cogitar, mas uma vez que está no meu cérebro, tenho que
perguntar.

Essa música é sobre mim?

Lando encara a minha mensagem por um bom tempo, mordendo o lábio


inferior, me deixando louco só de imaginar qual vai ser a resposta. Devo
estar enganado. E daí que ele diz que passamos um final de semana
maravilhoso juntos anos atrás? Tenho certeza de que ele esteve com um
milhão de homens perfeitos e provavelmente compôs músicas sobre todos
eles.
Meu coração entra em choque quando ele digita uma mensagem. Meu
telefone vibra na minha mão quando a recebo, e tenho medo de olhar. Não
sei bem se consigo lidar com a resposta para essa pergunta.
Meu dedo treme quando pressiono o ícone da mensagem e o texto abre.

É.

Meu peito pesa. Não tenho certeza se essa é a resposta que eu queria. É
excessivo e injusto pra caralho eu não conseguir me lembrar daquele final
de semana que inspirou essa música.

Tem outras sobre mim?

Tem.

Minha cabeça gira e meu coração afunda.

Quais?

Todas.

Sinto um soluço preso na garganta. Minha mente é uma névoa confusa e


meu corpo assume o controle. Sem pensar, saio da cama e me visto. Posso
sentir o olhar de Lando nas minhas costas o tempo todo, mas não consigo
olhar para ele.
Assim que termino de me vestir, me viro e dou um beijo no rosto de
Lando.
– É melhor eu voltar para casa. Amanhã te mando mensagem.
Faixa 16: Lado B
NADA DE REMOER O PASSADO

Lando

Havia uma nuvem cinza conveniente bloqueando o sol na segunda de


manhã quando acordei. Senti cócegas nas minhas costas e, quando me virei,
vi que Dawson estava acordado, me fazendo carinho.
– Desculpe, te acordei?
– Não – afirmei, e, virando-me para ele, o abracei. Meu coração doeu só
de pensar em me afastar dele agora. Apenas dois dias e ele já era dono de
todo o meu ser.
– Nada de tristeza esta manhã. Diga alguma coisa divertida que faremos
juntos quando nos virmos de novo – motivou Dawson, se aninhando no
meu peito.
– O que você quer fazer?
– Algo louco – disse resolutamente. – Tirolesa? Ou bungee jumping?
– Parece apavorante. – Eu ri.
– Por quê?
– Porque tenho medo de altura, como qualquer pessoa sensata.
Dawson gargalhou e se aninhou ainda mais em mim.
– Eu não tenho – informou ele sem necessidade.
– Então, do que você tem medo?
– De chegar ao fim da minha vida e sentir como se não tivesse
aproveitado o bastante, vivido o bastante. Quero ter uma vida que me faça
tão feliz a ponto de me transbordar. Quero viver aventuras e escrever sobre
elas. Quero me apaixonar tão intensamente a ponto de me assustar. Quero
aproveitar tanto a vida que outras pessoas tenham inveja quando prestarem
atenção a ela.
– Pouquinha coisa, então – brinquei, mesmo que meu coração estivesse
quase explodindo com suas palavras. A pergunta estava na ponta da minha
língua, se ele queria vir na turnê com a banda, conhecer alguns lugares, ter
novas experiências… só que algo me impediu.
– Você vai me levar para pular de bungee jumping quando nos virmos de
novo?
– Com certeza, Covinhas. – Abraço-o mais apertado e deposito um beijo
doce e demorado em seus lábios.
Passamos a manhã na cama, tentando desesperadamente fingir que eu
não pegaria um avião à tarde sem saber quando nos veríamos novamente.
Quando não dava mais para adiar, me vesti e enfiei minhas roupas e todo
o resto de qualquer jeito na mala.
– Como você vai para a casa da sua irmã? – perguntei quando me dei
conta de que não havíamos conversado sobre isso. Estivemos bem ocupados
fingindo que nada existiria depois deste final de semana.
– Parker deixou meu carro no estacionamento do aeroporto na semana
passada quando soube que eu estava voltando para casa.
– Ah, legal – assenti, a realidade fria do término do final de semana
chegava. – Então… acho que é melhor irmos?
– É – Dawson suspirou. – Não acaba aqui, não é?
– De jeito nenhum, Covinhas. – Esfreguei meu nariz no dele e dei um
selinho. – Este é só o começo.
Faixa 17: Lado A
QUERIA QUE FOSSE VOCÊ

Lando

– Porra – grito para mim mesmo quando a porta bate atrás de Dawson. Eu
não deveria ter jogado tudo desse jeito. Foi rápido demais. Ele nem
conseguia se lembrar de mim, e aqui estou eu, basicamente confessando
uma obsessão por ele.
Eu me viro e enfio a cara no travesseiro que tem cheiro de suor e de
Dawson. Meia hora atrás estávamos no paraíso, e agora ele se foi… outra
vez.
Agarro o travesseiro e o jogo contra a parede mais próxima. É mais fácil
punir o travesseiro por cheirar tão perfeitamente do que me punir por ser
um idiota do caralho. A raiva no meu peito não se acalma ao jogar o
travesseiro, então, pego outro e o arremesso com mais força ainda na
parede. Ajuda um pouco, mas não o bastante.
Saio da cama e abro a janela. Uma brisa fria atinge minha pele nua,
esfriando as gotas de suor. O barulho do mar se infiltra na minha névoa de
raiva e me acalma um pouco. Inspiro a maresia e prendo o ar por alguns
segundos antes de soltar. Minhas pálpebras se fecham e imagens dançam
por trás delas. Imagens de Dawson e eu enroscados, beijando, nos tocando,
fazendo um ao outro gozar.
Um formigamento familiar começa no fundo da minha mente. Conheço
essa sensação, mas tenho medo de ter esperança. Respiro fundo mais
algumas vezes, focando nas memórias táteis de Dawson na minha cama.
Palavras flutuam pela minha mente. Palavras como “desejo” e “saudade”.
Palavras tentando desesperadamente capturar os sentimentos agitados
dentro de mim. Quero pegar uma folha de papel e anotá-las, mas tenho
medo de assustá-las.
Meu celular vibra na cama, onde o deixei, e o pego depressa, esperando
que seja Dawson, até perceber que é uma ligação e não uma mensagem de
texto.
É Benji ligando, assim, deslizo para atender.
– Oi – atendo.
– É… oi – responde Benji. – Você está bem?
– Pra caralho, o que manda?
– Acabei de receber uma ligação estranha do Lincoln.
– Ele está bem?
– Para falar a verdade, não tenho certeza. Ele me chamou de Benny e
estava falando a mil por hora. Acho que está tendo um daqueles episódios
quando não dorme.
– Puta que pariu – suspiro profundamente e me jogo na cama com o
celular ainda ao ouvido.
– Estou muito preocupado com ele. Ele disse que Jace está lá.
– Jace? – repito horrorizado. Lincoln não está emocionalmente forte o
bastante para lidar com o dia a dia, muito menos para suportar ter o coração
partido uma segunda vez pelo homem que ele nunca deixou de amar.
– É, não consigo decidir se isso é uma boa notícia ou não. Se eles se
resolverem, talvez Lincoln finalmente procure ajuda. Mas se der errado…
acho que ele não sobrevive.
– Concordo.
– Seria melhor ligar para o Archer? Odeio incomodá-lo, ele merece férias
tanto quanto nós.
– Por que não damos alguns dias ao Lincoln e depois eu ligo para ver
como ele está?
– Certo – concorda Benji. – Como vão as suas férias?
Emito um som evasivo do fundo da garganta. Não tenho energia nem
palavras para falar sobre o que está acontecendo com Dawson.
– E as suas? – pergunto para mudar o foco.
– Interessantes. – Benji parece feliz, e meu coração se anima um pouco.
– É mesmo? Você e London reacenderam a antiga flama? – suponho.
Benji emite um som irritado do outro lado da linha:
– Quantas vezes tenho que falar para vocês que London e eu não estamos
juntos? Acho que preciso alugar um outdoor ou algo assim. E não, não
estamos transando casualmente de novo nem nada do tipo.
– É? Quem está te deixando tão interessado? – provoco.
– Ainda ninguém, mas vamos ver como as coisas andam.
– Você está de olho em alguém específico?
– Estou. Só não sei se vou conseguir. Vamos ver – explica.
– Se você está a fim do cara, ele não tem nenhuma chance.
– Ah, obrigado, amor.
– Disponha, docinho – brinco.
Conversamos por mais alguns minutos antes de desligar. Coloco meu
celular na mesa de cabeceira e me levanto para fechar a janela. Meu
coração pesa quando me dou conta de que a janela aberta carregou para fora
o cheiro de sexo que estava no ar. Quero lhe dar espaço mais do que
pressioná-lo. Mas estas férias terminam daqui a alguns dias e tenho medo
de que não tenha uma terceira chance com ele se deixá-lo escapar de novo.

Dawson

Entro na minha casa alugada escura enquanto as lanternas traseiras do


Uber desaparecem ao longe. Meu coração ainda bate acelerado no meu
peito. Todas as suas músicas são sobre mim, e isso não faz sentido nenhum.
Uma coisa é esquecer um casinho de fim de semana, cacete, isso
acontece até com pessoas que não têm problema de perda de memória. Mas
isto é claramente muito mais do que um final de semana de suor embaixo
dos lençóis.
Pego meu notebook e me sento no sofá, abrindo depressa minha página
de letras de músicas preferida que deixei nos meus favoritos. Não me
incomodo em procurar por “Suor de Bala”, esta eu já memorizei, e faz
sentido compor essa por causa de uma transa. Estou mais preocupado com
as outras: “Lágrimas de uma Inspiração”, “Azul Celeste”, “Me Destruo por
Você”, “Covinhas” e mais uma dúzia delas. Minhas mãos tremem conforme
rolo as páginas. Assim como no restaurante no outro dia, tenho a nítida
impressão de que Lando acha que está falando sobre mim, mas eu não
conheço esse homem que ele descreve. Uma música depois da outra, ele se
torna poético sobre alguém cujo único medo era perder a vida, que
experimentaria qualquer coisa, que nunca deixou de fazer um comentário
obsceno ou uma provocação divertida. Porra, eu estou apaixonado por
quem quer que seja este homem…, mas ele não sou eu.
Não tenho certeza de até que horas fiquei acordado, examinando as letras
e tentando encontrar um jeito de conectar o homem das músicas com a
pessoa que sou. Nem olho para o relógio quando finalmente vou para a
cama, me sentindo nu e exposto, querendo pra caralho ter ficado na casa de
Lando em vez de vir para cá ter uma crise existencial.
Será que Lando criou este homem perfeito a partir de lembranças
imperfeitas que tem de mim? Será que ele me colocou num pedestal que
nunca vou alcançar? Ou será que, naquela época, eu era mesmo esta
pessoa?

Minhas pálpebras estão pesadas quando o sol me desperta. Nem acordei


completamente antes de ser invadido pelos sentimentos inquietos da noite
passada. Eu não deveria lembrar se essa era realmente a pessoa que eu
costumava ser? Claro que tenho uma lesão cerebral e a memória parecida
com um queijo suíço. Mas eu não deveria ter me esquecido de mim, não é?
Só tem uma pessoa que saberia disso com certeza.

Estou diferente desde o acidente?

PARKER

Além do óbvio, imagino?

Sim, tipo… eu era mais corajoso? Mais espontâneo e


extrovertido? Eu era mais feliz?

Parker demora séculos para responder. Fico olhando para a palavra “lida”
e para os pontinhos pulando que mostram que ela está digitando pelo que
parece uma eternidade.
PARKER
Uma coisa assim mudaria qualquer um.

Meus pulmões ficam sem ar. Eu sei que esqueci coisas que aconteceram
comigo, mas como fui me esquecer? Algumas lágrimas quentes escorrem
pelo meu rosto, e eu nem ligo de secá-las. Será que essa pessoa ainda está
em algum lugar dentro de mim ou será que ele morreu no acidente? Será
possível eu conseguir ser despreocupado, feliz e corajoso como Lando se
lembra, como Parker diz que eu era?
Antes de poder pensar melhor nisso, envio uma mensagem para Lando.

Desculpe por ter surtado ontem à noite, mas foi… muita coisa
para processar.

LANDO

É… desculpe. Eu não queria mentir para você.

Eu agradeço.

Mordo o lábio inferior enquanto penso na próxima mensagem.

Fiquei acordado até tarde lendo todas as suas músicas.

LANDO

O que você achou? Vendo-as com um novo olhar e tal.

Acho que você está apaixonado por um homem que morreu.

Os pontinhos que mostram que Lando está digitando aparecem e somem


várias vezes enquanto prendo a respiração esperando por sua resposta.
LANDO

Pode ser que você esteja certo. Vamos esquecer aquele cara.
Eu estava falando a verdade quando disse que quero te
conhecer. Esqueça quem foi.
Você consegue fazer isso? Quando você olha para mim, não
vê quem eu era?

LANDO

Quando olho para você, vejo alguém que é sexy pra cacete,
brilhante e corajoso. Tudo isso é verdade, independentemente
de qualquer outra coisa.

Leio suas palavras pelo menos umas dez vezes, tentando formular
alguma resposta. Que loucura! Um casinho de férias era uma coisa, mas isto
está ficando sério rápido demais. Ele me quer há tanto tempo. Como eu
sequer posso fazer jus ao homem que ele idealizou em sua mente? Só vou
desapontá-lo. Porra, eu decepcionaria qualquer um, quanto mais um cara
que vem me idealizando em sua mente há quase uma década.
LANDO

Por favor, não deixe que isso estrague tudo. Estávamos nos
divertindo, não?

Sorrio ao pensar nos últimos dias e no quanto Lando tem sido fofo e
maravilhoso. E o sexo… meu pau se anima antes mesmo que eu possa
deixar minha mente vagar completamente por esse caminho. Ontem foi
sobrenatural o que aconteceu com a gente.

Sim, estávamos nos divertindo

LANDO

Certo, vamos manter assim por enquanto. Estamos de férias,


vamos fazer alguma coisa legal hoje.

Tá. Preciso tomar banho e tal antes.

LANDO

Sem problemas. Passo aí em uma hora?

Até logo.
Lando

Suspiro aliviado quando Dawson concorda em sair de novo hoje. Não sei
como mostrar a ele que entendo que ele não se sinta como o cara no qual
não paro de pensar há anos. Eu sei que aquele cara está lá, mas também
gosto dessa versão de Dawson. Quero todos os seus lados e versões.
Antes de me levantar da cama, meu telefone toca com outra mensagem.
Abro e vejo um novo áudio de Lincoln. Será possível ele ter composto
alguma coisa? Não apenas compor, mas compartilhar em vez de jogar fora
ou esconder?
Clico na setinha para tocar a música e afundo no sofá para escutar as
palavras assustadoramente lindas que, de alguma maneira, são a perfeita
combinação de desespero e esperança. É uma música sobre o
relacionamento que uma pessoa pode ter com a obscuridade que tem dentro
dela. Quando termina, estou enxugando lágrimas e mandando mensagem
para Archer.

Já ouviu a nova música do Linc?

ARCHER

Ouvi, e nem sei o que dizer… é tudo o que me fez dar uma
chance para vocês lá no início.

Ouvi a música mais uma vez, sentindo um peso sair do meu peito. Pode
ser apenas outra composição isolada de Lincoln antes de passar mais uns
cinco anos sem colocar a caneta no papel outra vez, mas escolho enxergar
isso como um novo começo. As coisas podem ser diferentes depois dessa
pausa. As coisas podem ser como sempre deveriam ter sido. E parte de
como elas deveriam ter sido inclui convencer Dawson a vir para Nova
Iorque comigo no final dessas férias.
Faixa 18: Lado A
CASTELOS DE AREIA

Dawson

Um banho quente demorado acalma um pouco meu nervosismo. Lando


estava certo; estávamos nos divertindo e não tem motivo nenhum para que
eu estrague tudo surtando. Quantas chances na vida terei de trepar com
alguém como a porra do Lando Meyers? Eu iria me culpar para sempre se
estragasse tudo antes de a diversão terminar. Ele é mesmo um fofo… e sexy
pra caralho.
Deixo minha mente vagar de volta ao nosso encontro de ontem, e ao sexo
à noite. Eu não conseguiria sonhar com um dia melhor nem se tentasse. Me
pergunto o que ele planejou para nós dois hoje.
Depois de sair do banho e me enxugar, resolvo enviar uma mensagem a
Parker já que tenho certeza de que ela está morrendo de preocupação depois
da última mensagem que enviei.
Não me surpreende ver uma mensagem da minha irmã já me esperando.
PARKER

Como vão as suas férias?

Boas.

Eu rio ao enviar uma resposta monossilábica que certamente vai irritá-la


demais.
PARKER

Para de sacanagem. Eu comprei estas férias para você; o


mínimo que pode fazer é me dar detalhes picantes.

Ah, estão bem picantes ;)

PARKER

Estou feliz por você, mas… que nojo!

kkk

PARKER

Mas, sério, está se divertindo? Você me deixou preocupada


depois da última mensagem.

Sim, estou ótimo. Tenho saído com este cara e estou me


divertindo muito.

PARKER

Era ISSO que eu esperava.

Eu te amo, mas você está envolvida demais na minha vida


sexual.

PARKER

Eu também te amo, e só quero que seja feliz.

Obrigado, P. Tenho que me arrumar, logo ele chega para me


buscar.

PARKER

Divirta-se e se cuida. Só mais alguns dias e nos vemos.

Alguns dias… meu coração pesa. É claro que eu sabia que voltaria para
casa no fim da semana, mas não pensei muito sobre isso. Passamos um final
de semana juntos que nem consigo lembrar e, agora, teremos apenas uma
semana? Será que é só isso que Lando e eu estamos destinados a ter?
Alguns dias furtivos a cada nove anos?
Meu celular vibra de novo e vejo uma mensagem dele:
LANDO

Toc, toc

Sorrio e me dou conta de que ainda estou nu. Por mais que a ideia de
estar nu perto de Lando não seja nem um pouco ruim, eu gostaria de saber o
que ele planejou para me cortejar hoje antes de chegarmos novamente à
parte em que estaremos pelados.

Peraí, estou pelado. Saio em dez minutos.

LANDO

Nada contra nudez.

Eu rio da sua resposta, quase exatamente o que pensei alguns segundos


antes. Querendo provocar, enrolo a toalha na cintura bem lá embaixo e tiro
uma foto para enviar a ele.
LANDO

Sacanagem

;)

Jogo meu telefone na cama, me visto depressa e saio para receber Lando.
Assim que abro a porta, Lando me puxa, me abraçando, e me beija com
ardor.
– Pensei em ficarmos curtindo aqui um pouquinho e pedir alguma coisa
para comer… – sugere quando me solta, e eu concordo com a cabeça. –
Quer ficar aqui ou ir para a minha casa? – Aponto para ele e apalpo meu
bolso para me certificar de que estou com o celular e a chave, então,
saímos.
Lando

De volta à casa na praia, nos sentamos no balanço no quintal e ficamos


observando as ondas, aproveitando a brisa e o sol, e nossas companhias.
– Deve ter sido legal crescer na Flórida. Aposto que passava todos os
finais de semana na praia.

Quase todos. Parker e eu costumávamos fazer campeonatos


de castelos de areia.

– Nunca construí um castelo de areia – admito.

O quê? Isso é uma tragédia de proporções épicas. Vamos


consertar isso agora mesmo.

Solto uma gargalhada por causa de sua indignação, mas ele já está se
levantando, então, faço o mesmo. Ele vai em direção a um pequeno celeiro
perto da casa de praia e sai de lá com um baldinho vermelho e um sorriso
triunfante.
– Vamos mesmo fazer castelos de areia? – pergunto cheio de esperança.
Dawson assente enfaticamente e pega a minha mão. Eu o deixo me
arrastar pelo curto caminho até a água. Meu peito está leve, uma sensação
que não me lembrava de ter desde a última vez em que estive com Dawson.
Não sei o que é, mas ele tem um jeito de fazer a vida parecer muito mais
despreocupada.
Ele se abaixa e enche o balde com água, então, acena para mim,
apontando um local seco para trabalharmos na nossa obra de arte. Dawson
derrama a água na areia seca e se senta ao lado do local molhado. Eu me
ajoelho ao seu lado e ele mostra como construir uma base sólida e moldar
pilares para deixar nosso castelo épico.
Ele é bem melhor em moldar cuidadosamente a areia do que eu. Dawson
ri quando eu derrubo acidentalmente uma das torres ao tentar alisá-la.
– Você acha isso engraçado? – indago brincando, e Dawson assente, sem
se incomodar em esconder sua risada destreinada. Lindo, jogando a cabeça
para trás e rindo profundamente sem se importar com nada.
Encho uma mão com areia molhada e arremesso nele como se fosse uma
bola de neve. Pega bem no peito dele, que para de rir e olha para mim. Uma
bola de areia vingativa me atinge bem na cara, e eu me levanto para revidar,
sem me importar em evitar pisar bem no nosso castelo. Dawson solta um
gritinho e ri quando corro atrás dele e o jogo no meu ombro. Ele dá
soquinhos nas minhas costas enquanto eu corro em direção ao mar e entro
só o suficiente para o jogar com segurança fazendo a água espirrar.
Dawson irrompe na superfície e me molha. Seguro-o pela cintura e o
abraço, beijando-o, nossos lábios estão salgados e quentes por causa do mar
e do sol. Agarro o tecido ensopado de sua camisa quando o trago mais para
mim, minha língua escava sua boca, memorizando outra vez a topografia de
cada centímetro dele. Ele envolve minha cintura com suas pernas e eu nos
conduzo para fora da água, de volta à areia.
Deito Dawson no chão e cubro seu corpo com o meu, beijando-o e
tocando-o despreocupadamente como um homem que tem todo o tempo do
mundo. Não sei se tenho mesmo, mas preciso acreditar que conseguirei
ficar com ele desta vez.
– Você está feliz? – pergunto, recuando para analisar seu rosto, sujo de
areia e com gotas d’água enfeitando sua pele. Ele assente e sorri para mim,
agarrando a minha camisa encharcada. – Não quis dizer nesse momento,
embora fique contente em saber. Quero dizer… você está feliz com sua
vida?
Dawson franze a testa diante da minha pergunta, e eu me dou conta de
que deve ter sido injusto fazer essa pergunta, uma vez que nossos telefones
ficaram na varanda, então a comunicação é limitada. Imagino que ele
conseguiria responder verbalmente, porém, não parece gostar de fazer isso.
Ele dá um jeito de responder mesmo assim, levantando a mão e
gesticulando “mais ou menos”, depois dá de ombros.
Volto a beijá-lo, chupo seu lábio inferior e me deleito com o gemido que
ressoa do fundo do seu peito. Então, me levanto e o puxo junto.
Dawson pega o baldinho vermelho de onde o deixamos, perto do nosso
castelo destruído, e caminhamos pela areia de volta à casa, levando metade
da praia junto grudada em nossos pés.
Avisto um chuveiro na lateral da casa e o aponto para Dawson, que
assente e me segue até lá, já tirando a camisa no caminho. Faço o mesmo,
tirando minhas roupas molhadas pelo caminho, e as jogo na calçada ao lado
do chuveiro.
Assisto com interesse quando Dawson se curva e abaixa sua boxer para
tirá-la com os pés. Não resisto a apalpar sua bunda linda e redonda, o que
me rende um olhar de repreensão nada convincente.
Ele abre o registro do chuveiro e nos coloca debaixo do jato. Dou um
grito por causa da água fria se derramando sobre mim e a risada de Dawson
vibra no meu peito quando ele puxa minha cabeça para me beijar.
Nossos lábios se movem juntos e nem a água gelada impede nossos paus
de ficarem duros, pressionados entre nossos corpos. Deixo meus dedos
escorregarem pela pele molhada de Dawson, sentindo os arrepios
irromperem sob meu toque.
Ele esfrega os quadris nos meus, e eu gemo dentro da sua boca. Seu pau
quente e latejante roça no meu, derramando pré-gozo conforme seu membro
duro cutuca o meu. Cravo os dedos na bunda de Dawson para puxá-lo mais
para mim, obrigando-o a estocar com mais força contra o meu pau. Nossos
gemidos e grunhidos ecoam para fora das paredes finas do chuveiro.
Já faz tanto tempo que tive a chance de saborear Dawson e, de repente,
esperar mais parece uma tortura. Preciso ter o pau dele na minha boca, seu
gozo pingando da minha língua. Preciso disso como preciso de oxigênio.
Com bastante dificuldade, desgrudo nossos lábios e caio de joelhos. Ele
lamenta baixinho e agarra meus cabelos, empurrando os quadris
subconscientemente em minha direção enquanto enfio o nariz na junção da
sua coxa. Seus pelos grossos fazem cócegas e eu espero de verdade que a
minha barba fique com o cheiro do seu saco suado depois de terminar aqui.
Seguro a base do seu pau e sinto o sangue pulsando em sua ereção dura
como aço. Uma gota de pré-gozo puro escorre de sua fenda, e eu corro
minha língua para pegá-la. O gosto salgado e forte explode na minha
língua. Lambo a cabeça, bombeando devagar para extrair mais pré-gozo
dele. Dawson oscila e agarra meus cabelos para se equilibrar.
Abocanho sua cabeça grossa e o engulo até o fundo da garganta. O peso
do seu pau na minha língua faz meu saco doer quando a minha ereção
explode. Coloco a mão entre as minhas pernas e puxo meu pau enquanto
mexo a cabeça, levando Dawson cada vez mais fundo, deixando a saliva
escorrer pela minha barba, e minha cabeça dói pelo modo como ele puxa
meus cabelos.
Relaxo a garganta e o engulo mais um pouco, gemendo de prazer
enquanto Dawson fode minha garganta.
– Isso, isso, ai, meu Deus – Dawson grunhe baixo quando seu pau fica
mais grosso dentro da minha boca, me deixando sem ar conforme ele se
enterra por inteiro, roçando na minha cara e chegando ao orgasmo. Minha
mão se move furiosamente na minha ereção, me levando ao limite.
Ele dá estocadas mais rápidas dentro da minha boca e, então, explode
com um grito alto de prazer, pulsando na minha língua e se derramando no
fundo da minha garganta. Só preciso de mais uma bombeada no meu pau
para o meu orgasmo explodir nas pernas e nos pés de Dawson.
Com a água do chuveiro ainda caindo sobre nós, meu gozo é lavado de
sua pele quase que imediatamente enquanto apoio a testa em seu quadril e
tento recuperar o fôlego. Ele retira a mão carinhosamente dos meus cabelos,
acalmando meu couro que queima.
Levanto o olhar para Dawson e ele sorri de maneira tola e satisfeita,
depois, usa as duas mãos para esfregar seu peito.
– Feliz? – adivinho, sabendo que vi este sinal ontem quando estava
estudando. Ele assente e afunda encostado na parede instável do chuveiro. –
Vem, vamos encontrar toalhas e, quem sabe, um almoço?
Ele concorda, fechando o registro do chuveiro e me levando todo
molhado para dentro de casa.
Faixa 19: Lado A
FALE DE UMA VEZ

Dawson

Depois de nos secarmos após nosso banho divertido, Lando me empresta


algumas roupas enquanto as minhas estão na máquina de lavar para tirar o
sal. Ele sugere pedir uma pizza e eu assinto, concordando. Estou muito feliz
por passar a tarde enroscado em Lando ao invés de sair e dividi-lo com o
mundo.
– Você gosta de pizza de quê?

Não me julgue, mas pizza de abacaxi é a minha preferida –


envio a mensagem e aguardo um “lugar de abacaxi não é na
pizza”.

– Casa comigo? – pergunta, sua expressão é tão séria que quase acredito
por um segundo que não é brincadeira, então, ele ri e o nó no meu estômago
se desfaz. Meu peito dói de anseio. Como será a risada dele? Como será sua
voz? Será rouca quando ele acorda pela manhã? E quando está louco de
prazer, implorando para gozar, como ele soa?
Depois de pedir a pizza, Lando abre os braços com uma expressão cheia
de esperança, e eu não hesito em me aconchegar nele suspirando de
satisfação. Deito a cabeça em seu peito e curto o leve subir e descer de sua
respiração. Este deve ser o momento mais surreal da minha vida, ficar
deitado nos braços de um deus do rock depois de construir castelos de areia
e receber um boquete épico. Isso não parece a minha vida, mas, de uma
maneira estranha, parece. De certa forma, isso parece mais certo do que
qualquer outra coisa nos últimos nove anos.
Meu telefone vibra na minha mão, e vejo uma mensagem de Lando. Eu
devo ter viajado mesmo para não perceber que ele estava digitando.

Em que você está pensando?

Estou pensando no quanto isso é estranho. E no quanto


parece certo. Desde o acidente, tudo pareceu um pouco
esquisito, como aquela sensação que a gente tem quando
chega num cômodo e esquece o que foi fazer ali. Imaginava
que fosse pela perda repentina da audição e da memória.
Acho que era porque eu sentia sua falta e nem sabia disso.

Você acredita em destino? Em almas gêmeas?

Quer saber Lando na próxima mensagem, e meu coração descarrilha


diante da insinuação. Nunca acreditei muito em destino, pelo menos, não
que eu me lembre. E, depois do acidente, teria sido difícil sentir que isso
estava destinado a acontecer. E se estivesse, quem ou o que toma essas
decisões?

Não sei. Acredito em se apaixonar e se esforçar todos os dias


para mostrar àquela pessoa o que ela significa para você.
Acredito em se apaixonar por alguém antes mesmo de
entender por que a pessoa é a certa para você. Acredito em
fazer da sua vida o que você acha que ela deve ser –
respondo.

Sempre agradeci por ter aproveitado a oportunidade de


passar aquele final de semana com você nove anos atrás. Só
penso nisso desde então. Mas sinto que, se nós não
tivéssemos vivido aquele final de semana, você não teria
sofrido o acidente.

Posso sentir a tensão e a culpa emanando de sua confissão. Ele sente


como se o acidente, de alguma forma, fosse culpa dele.
Aquele acidente não foi culpa de ninguém. Bem, foi culpa do
caminhoneiro bêbado, mas definitivamente não foi culpa sua.
E fico contente por você ter as lembranças daquele final de
semana, assim, pelo menos alguma coisa boa veio dele.

Eu quero mais do que lembranças; quero um futuro.

Responde Lando, e sua resposta me enche de calor. Isto está indo rápido
demais, mas fico contente em saber que, de alguma maneira, estamos na
mesma página. Independentemente do que eu disse antes, isto não é um
casinho.

Eu também – concordo.

Quando a pizza chega, comemos e assistimos a um filme juntos. É um


dos melhores dias de toda a minha vida.

Lando

Meu coração dói diante da visão de Dawson dormindo profundamente na


minha cama. Os lençóis estão enrolados em suas pernas, mal cobrindo as
partes mais interessantes. O sol da manhã lambe sua pele exatamente como
fiz ontem à noite, saboreando-o. Suas pálpebras se agitam durante o sonho
que o seguiu pela manhã, e um leve sorriso ergue o canto de seus lábios. Ele
é absolutamente perfeito.
Minha vontade é de deixá-lo dormindo tranquilamente, mas não consigo
resistir ao impulso de roubar pelo menos um beijo. Quantos beijos vou ter
desta vez? Será que tem alguma maneira de ficar com ele? Essas questões
são dolorosas demais para considerar no casulo quentinho da manhã. Tudo
o que quero é provar um pedacinho da pele de Dawson, aquecida pelo sol.
Encosto meus lábios no meio de seu peitoral, bem no centro de uma faixa
iluminada pelo sol, e gemo com o doce gosto salgado de suor e luxúria de
Dawson.
– Hmmm – murmura ele sonolento, virando de lado e se enrolando em
minha direção.
Corro os dedos delicadamente pelo arco das costas de Dawson e observo
os arrepios explodirem pela sua pele. Eu poderia passar a manhã toda
saboreando-o, lambendo-o da cabeça aos pés, tocando cada centímetro dele.
Mas, se conseguir me levantar da cama e preparar o café da manhã para ele,
posso ter um argumento melhor para ser um namorado em vez de apenas
um casinho de férias.
Ele se mexe só um pouquinho quando me arrasto para fora da cama.
Fecho a porta em silêncio antes de me dar conta de que estou agindo como
se ele pudesse me escutar, e rio de mim mesmo.
Ligo a cafeteira, pego os itens de que preciso na geladeira, e começo a
preparar as rabanadas.
Assobio enquanto bato os ovos e acrescento o leite e a baunilha à
mistura. Agradeço por ter feito um estoque quando fui ao mercado no
primeiro dia. Não seria tão impressionante dar apenas uma tigela de cereais
a Dawson em nosso primeiro café da manhã juntos… bem, o primeiro que
ele vai conseguir se lembrar, de qualquer maneira.
Ouço passos hesitantes atrás de mim quando viro a primeira rabanada na
frigideira. Sorrio quando um par de braços envolve minha cintura e Dawson
encosta os lábios nas minhas costas.
Eu me viro e seguro seu rosto com ambas as mãos, inclinando a cabeça
para dar um beijo em sua boca.
– Bom dia – digo ao soltá-lo. Meu olhar desce e eu percebo as tatuagens
que não tive a chance de ver melhor antes.
Delineio as duas citações no peito de Dawson. “Tudo bem; então, eu vou
para o inferno.” e “Qualquer coisa pela qual valha a pena morrer certamente
vale a pena viver.”
– Tirou de algum livro, imagino? – pergunto, e ele assente. – Me conta
enquanto tomamos café? – Ele assente novamente, e eu volto à rabanada
para que não queime.
Quando nos sentamos juntos, Dawson está com o celular na mão.

Não tem muita história por trás dessas tatuagens. São


algumas das minhas citações preferidas. A que fala sobre o
inferno é de Huck Finn, e era exatamente o tipo de coisa
leviana que eu sempre adorei quando algum religioso cheio
de preconceitos me ameaçava com o inferno por eu ser gay.
E a outra, é de Ardil 22; só pareceu uma boa filosofia.
Leio a explicação e desejo ter estado lá. Consigo imaginar nós dois juntos
agarradinhos no sofá enquanto Dawson me contaria sobre as tatuagens que
ele pensava em fazer, talvez até tentando me convencer a fazer uma juntos.
Meu peito dói, imaginando como a vida deveria ter sido.
– Se muda comigo para Nova Iorque? – descarrego sem conseguir me
deter. Dawson pisca surpreso, com uma garfada de rabanada a caminho de
sua boca. – Merda, não queria pedir desse jeito. Eu ia esperar um pouco e
talvez planejar um jeito de tornar uma sugestão bastante interessante. Sei
que parece loucura, mal nos conhecemos.

Parece completamente insano. Eu sei que ontem à noite


conversamos sobre isto ser mais do que um caso, mas é
rápido demais – escreve Dawson.

– Eu sei – suspiro. – Vamos pausar o assunto por um instante e


conversamos sobre isso mais tarde.
Dawson parece cético ao digitar sua resposta.

O que eu faria em NY?

Meu coração dá um salto. Não é um não.


– Explorar a cidade, conhecer pessoas novas, escrever coisas incríveis.
Você pode viver a vida que me disse que queria.

A pessoa que queria essas coisas está morta.

– Parte dele ainda está aí dentro. Eu vi – insisto. – Eu sei que é rápido,


mas acho que poderíamos ter algo muito bom juntos.
Dawson balança a cabeça, sua expressão é uma mistura de nervosismo e
ansiedade.

Posso pensar sobre?

– Pode – concordo depressa. – Pense nisso o tempo que precisar.


Dawson assente e volta a devorar seu café da manhã. Pelo menos, não foi
uma recusa categórica, garanto a mim mesmo.

O que você quer fazer hoje? – ele envia uma mensagem


depois que terminamos de comer.

– Eu estava pensando em experimentar aquela churrasqueira enorme no


quintal. Poderíamos assar umas carnes, sei lá. E, quem sabe, explorar por aí,
encontrar uma aventura? – sugiro, e Dawson concorda. – Certo, vou
precisar ir ao mercado bem rapidinho comprar uns bifes e tal, depois
podemos deixar essas coisas aqui e ir procurar alguma coisa para fazer.

Dawson

Fico mexendo no meu celular, com os pés no painel, enquanto espero


Lando. Quando chegamos ao mercado, resolvo esperar no carro, para ter
alguns minutos sozinho para processar o que ele sugeriu hoje de manhã.
Deixo minha mente vagar por alguns minutos pensando em como seria se
eu considerasse seu convite para ir morar com ele em Nova Iorque.
Será que eu conseguiria fazer isso? Eu não saberia andar pela cidade.
Não conheço ninguém por lá. Não é como se eu tivesse muito do que abrir
mão aqui além do conforto. Por que, então, essa ideia me apavora tanto?
Levanto o olhar, pretendendo procurar impacientemente por Lando,
quando percebo uma quantidade de pessoas se aglomerando do lado de fora
do carro. Pessoas com câmeras. Não precisa ser um gênio para descobrir
que Lando obviamente foi encontrado pela imprensa.
Eu me afundo no banco do carona, esperando que não me notem. Será
que eles sabem que ele alugou este carro? Ou será que receberam um aviso
de que ele estava neste supermercado?
Pressiono o ícone da mensagem de texto e digito uma mensagem rápida
para Lando.

Acho que os paparazzi te encontraram.

LANDO
Porra!

É… eles estão espalhados perto do carro.

LANDO

Duas vezes porra. Tem como você trazer o carro mais para
perto do mercado para eu só entrar nele?

Seu pedido me deixa com medo. Minhas mãos tremem conforme me


imagino colocando-as na marcha e fazendo o carro se movimentar. Os
músculos da minha perna se contorcem diante da ideia de pisar no
acelerador. Meu coração martela forte no meu tórax.

Desculpe, não consigo.

Demora muito tempo entre Lando ler a mensagem e o curto OK que ele
responde. É oficial, ele me odeia. Claro que odeia; era mesmo só uma
questão de tempo.
Quanto mais pessoas aparecem e cercam o carro, mais eu aproximo as
pernas do meu peito, segurando o celular com força na mão. Fecho os olhos
e tento fingir que estou deitado na toalha na praia com Lando encontrando
desenhos nas nuvens. Quando o carro balança um pouco, abro os olhos num
rompante, viro a cabeça e vejo Lando parecendo incomodado e irritado ao
se sentar no banco do motorista. Ele me lança um leve sorriso, apenas um
pouquinho do lábio curvado, antes de ligar o carro e sair com ele devagar,
obrigando todas as pessoas paradas em frente a ele a saírem do caminho.

Lando

Não acredito que me encontraram. Nem sei direito o que eles queriam,
além de perguntarem onde Lincoln está e se a banda acabou. Deixo minha
missão no mercado para trás quando recebo a mensagem de Dawson,
abandonando o carrinho no meio de um corredor como um idiota. Chegar
ao carro é como tentar enfrentar uma legião de zumbis, pessoas por todos os
lados gritando para mim, disparando fotos. E, quando finalmente entro,
Dawson parece apavorado.
Meu maxilar trava e cerro os dentes. Eu não me importo nadinha com
essa importunação, mas assustar Dawson é meu limite. Para sua sorte, eles
saíram da frente quando eu coloquei o carro em movimento, porque não
estou me sentindo tão generoso a ponto de me importar se atropelo o pé de
alguém que não se mexe.
Ninguém nos segue para fora do estacionamento, o que significa que
provavelmente já sabem onde estou hospedado. Puta que pariu.
Em vez de voltar para a minha casa alugada, vou em direção à de
Dawson. Queria de verdade que ele pudesse me escutar, para eu poder
perguntar se ele está bem sem tirar os olhos da estrada. Foco em chegar lá o
mais rápido possível, onde poderei abraçá-lo e ter certeza de que ele está
bem.
Chegamos à sua casa e, assim que estaciono o carro, me viro para ele. Ele
ainda está em posição fetal, com as mãos trêmulas. Estendo a minha e
coloco sobre a dele. Demora alguns segundos antes de ele olhar para mim.
– Você está bem? – pergunto.
Dawson assente brevemente e digita alguma coisa em seu celular. Eu
coloco a mão no bolso para pegar o meu. Não o encontro, juro que o havia
colocado ali. Verifico o outro bolso, também não o encontro.
– Merda, acho que deixei meu celular cair quando aqueles babacas me
assediaram – grunho e deixo a mão cair no encosto de cabeça. Será que dá
para este dia ficar mais irritante?
Dawson desafivela o cinto de segurança, sua porta range e ele sai do
carro. Eu faço o mesmo, seguindo-o para dentro da casa. Ele encontra um
bloquinho de papel na cozinha e escreve algo.

Podemos fazer isso como os incas até você conseguir um telefone


novo.

Sugere, e eu concordo.

Sinto muito por não conseguir dirigir o carro.

– Não, ei, está tudo bem – asseguro-lhe, aproximando-me, e o abraço. –


Eu nem deveria ter te pedido para fazer isso. Eu só meio que entrei em
pânico.
Ele deita sua cabeça no meu peito por um segundo antes de me escrever
novamente.

Você não me odeia?

Levanto seu queixo e lhe lanço um olhar sério.


– Eu nunca conseguiria te odiar, Covinhas. – Deposito um beijo em seus
lábios macios, depois em cada covinha para provar o que digo. Quando o
solto, suspiro irritado ao me lembrar da imprensa. – Eu vou ter que ir para
outro lugar, agora que eles sabem que estou aqui.
Dawson arregala os olhos e fica tenso nos meus braços.

Vai voltar para Nova Iorque? – escreve, parecendo em pânico.

– De jeito nenhum – grunho, abraçando-o com mais força.


Ele morde o lábio inferior enquanto pensa no que quer que esteja prestes
a escrever. Finalmente, ele faz a anotação e vira o bloco para que eu leia.

Minha casa?

Meu coração dá um salto e eu sorrio.


– Tem certeza? É Natal e tal… não quero ser abusado.
Ele assente enfaticamente e aponta com a caneta para a mensagem.
– Tudo bem, eu adoraria – concordo. Por mais que eu queira deixar tudo
como está e ajudar Dawson a arrumar as malas, uma coisa ainda me
incomoda. – Você estava nervoso por causa dos paparazzi rodeando o carro
ou porque não consegue dirigir de jeito nenhum?
Dawson morde o lábio inferior e evita meu olhar. Com o dedo em seu
queixo, levanto sua cabeça, erguendo minhas sobrancelhas para questioná-
lo. Não quero forçar nada, mas se Dawson está lutando contra algo, quero
saber.
Ele suspira e escreve alguma coisa, depois, me passa o papel.

Desde o acidente, tenho ataques de pânico quando tento dirigir. Não


é nada de mais, fico bem sem dirigir. Além disso, se eu me mudar para
Nova Iorque, não vou precisar dirigir mesmo.

Meu coração dá um salto diante da menção da possibilidade de se mudar,


e eu desconfio de que ele jogou essa para me distrair do assunto em
questão.
– Se você está tendo ataques de pânico, talvez deva procurar ajuda.

Vou pensar sobre isso.

Sorrio e lhe dou um beijo na boca. Entendo porque passar pelo que ele
passou bagunçaria a cabeça de qualquer um. Tudo o que quero é que ele
possa viver a vida plenamente, do jeito que ele queria.
– Pronto para fazer as malas e meter o pé daqui?
Ele assente e pousa a caneta, então, vamos arrumar as coisas.
Faixa 20: Lado A
É BEIJO GREGO, NÃO UM BICHO DE SETE
CABEÇAS

Lando

Dawson insere “ir para casa e levar Lando” no calendário, depois, ajudo-o a
arrumar as malas. Passamos na minha casa para ver se eu conseguiria pegar
minhas coisas. Como desconfiava, o lugar está lotado de paparazzi e de
pessoas que não merecem o título de jornalistas. Por sorte, não deixei meu
violão nem nada importante dentro da casa. Meu notebook teria que ser
abandonado por ora, mas não estou preocupado com ele. Vou pedir a Archer
que mande alguém.
Cutuco o ombro de Dawson para perguntar se posso usar seu celular para
ligar para Archer. Ele me entrega o aparelho e eu uso o Bluetooth do carro
alugado para fazer a ligação.
– Alô? – atende Archer.
– Oi, é o Lando.
– Lando, como vai? – pergunta Archer, parecendo mais feliz do que
jamais o vi.
– Você parece feliz. Está indo tudo bem com Bennett? – pergunto, me
vendo sorrir.
– Você é uma puta fofoqueira – repreende Archer de boa.
– Todos temos nossos vícios, o meu é enfiar meu nariz na vida dos meus
amigos. Pelo menos, não é me cortar nem me drogar – destaco.
– É, já tivemos mais do que suficiente destas coisas para esta vida –
concorda secamente. – Está precisando de alguma coisa ou é só uma ligação
de cortesia?
– A imprensa me encontrou – conto. – Eu não estava na casa na praia na
hora e não posso voltar lá agora.
– Merda. Você vai voltar para Nova Iorque ou quer que eu providencie
outro lugar?
– Na verdade – olho rapidamente para Dawson, que está olhando pela
janela – tenho um lugar para ir, estou indo de carro até lá. Fica a cerca de
duas horas, mas duvido que os fofoqueiros de plantão me encontrem.
– É? E onde seria isso? – quer saber Archer. – Por favor, me diga que
você é esperto o bastante para não ir para a casa de algum casinho de férias.
– Não é assim, é… – Olho mais uma vez para Dawson e meu coração se
enche de tanto amor que quase não consigo respirar. – Eu o encontrei, Arch.
– Encontrou quem?
– Ele… O cara que deixei anos atrás.
– Puta merda – Archer soa tanto impressionado quanto aliviado com o
meu anúncio. – Estou muito feliz por você, e não só porque ele é a sua
inspiração.
Solto uma gargalhada.
– É, já estou sentindo as palavras surgindo. Mas não é por isso que estou
interessado nele, isso é só um bônus.
– Com certeza – concorda Archer. – Por que não me manda o endereço
dele por mensagem assim que puder? Vou mandar alguém pegar suas coisas
e levá-las até você.
– Pode deixar, patrão – concordo. – Ah, e eu perdi meu celular. Consegue
mandar um para mim logo pela manhã?
– Deixa comigo. Dirija com cuidado e me diga se eu puder te ajudar em
mais alguma coisa.
– Claro. E continue com o quê, ou quem, te fez parecer tão feliz quando
atendeu o telefone.
Archer responde apenas com uma risadinha antes de desligar.
Com o endereço de Dawson no meu GPS, a viagem é silenciosa. Penso
em como deve ser chato ser surdo numa viagem longa de carro. Não dá para
jogar conversa fora nem ouvir música. Acho que dá para assistir a um filme
se tiver o aparelho adequado. Faço uma anotação mental para sempre me
certificar de ter meu tablet abastecido com filmes para Dawson sempre que
tivermos que fazer uma viagem longa no futuro.
Quando chegamos aonde Dawson mora, pego suas malas e ele me mostra
seu apartamento no terceiro andar do edifício. É espaçoso e iluminado, com
grandes janelas de frente para onde o sol nasce.
– É muito bom aqui.
Dawson sinaliza “Obrigado”.
– De nada – sinalizo, e Dawson sorri.

Não me importo de morar aqui, mas fica um pouco solitário às


vezes. Queria muito dois gatos, mas fico preocupado de que possa me
esquecer de alimentá-los ou algo assim – escreve Dawson no
bloquinho que trouxe da casa na praia.

Leio a mensagem e meu coração dói.


– Você costuma se esquecer de coisas assim? Achei que tinha esquecido
apenas memórias antigas.

No início, eu me esquecia muito das coisas do dia a dia. Isso não


acontece mais. Mas ainda me preocupo.

Então, me toco que ele está tão preso ao passado como eu tenho estado,
apenas de um jeito diferente. Ele não consegue superar o que aconteceu, e
não se deixa seguir em frente.
– Que nomes você daria aos gatos? – pergunto.

Scout e Atticus.

Eu rio com a resposta.


– Deveria ter adivinhado que seria algo assim.

Nerd na área – brinca.

– Gosto disso – afirmo. – Eu gosto de você.


Dawson se aproxima e levanta o rosto para o meu, e eu dou um selinho
nele.
– Nós deveríamos ter uma aventura hoje, mas acho que nossa primeira
missão tem que ser decorar seu apartamento para o Natal, já que só faltam
dois dias.
Dawson assente e olha em volta, como se estivesse vendo seu
apartamento pela primeira vez.

É, acho que me esqueci de decorar este ano. O Natal meio que


apareceu do nada para mim.

– Tudo bem, ainda dá tempo. Você tem enfeites guardados ou precisamos


comprar?

Teve uma inundação no porão do prédio alguns meses atrás, então,


tudo o que eu tinha lá embaixo já era. Vamos ter que comprar tudo
novo. Podemos comprar uma árvore artificial, acho um desperdício
comprar uma árvore de verdade agora. Além disso, tenho certeza de
que quaisquer que tenham sobrado nos terrenos devem estar bem
feias.

– É – concordo. – Vai ser divertido, vamos.


Dawson insere nossa aventura em seu calendário e o endereço da melhor
loja no GPS, e saímos.

Dawson

Perto do Natal, alguns itens são escassos, mas conseguimos uma pequena
árvore artificial que pode ficar na minha mesinha de centro, luzes de Natal e
algumas outras decorações. Acontece que Lando tem um fraco por imagens
idiotas de Papai Noel, então, pegamos algumas. Lando também insiste em
pegar uma lata grande com diferentes tipos de pipoca e ingredientes para
assar um negócio chamado barras mágicas de biscoitos.
– Minha mãe fazia isso todos os Natais, e costumava mandar para mim
na estrada – explica.

Onde estão seus pais este ano? Por que não vai passar o Natal com
eles?

– Eles estão na Europa. Foi o meu presente antes de saber que a nossa
turnê seria cancelada. Vou ligar para eles amanhã para ver como estão. Eu
tinha planejado visitá-los daqui a seis meses quando nossa turnê terminaria,
mas, agora, devo fazer uma viagem para lá mais cedo.

Você é próximo dos seus pais? – pergunto.

– Sim, eles são ótimos. Sempre me apoiaram, não apenas com a banda,
mas praticamente em tudo. São os melhores.

Deve ser legal – escrevo melancolicamente.


Minha mãe nunca foi muito maternal. Mas, ao menos, tenho minha
irmã.

– Também fico contente que você tenha a sua irmã. – Ele me dá um beijo
na cabeça e, feliz, eu me encosto nele. – Agora, vamos levar esses enfeites
para casa e deixar seu apartamento alegre.
Concordo e o sigo para o caixa.
Passamos o resto da tarde decorando e assando os biscoitos que Lando
queria, depois, nos aconchegamos no sofá para assistir a alguns filmes de
Natal.
– Este é o meu melhor Natal em anos – declara Lando.

Por quê? – escrevo.

– Quase sempre estamos na estrada. Não me importo de fazer turnês, mas


fica um pouco solitário. É de se pensar que cinco homens aglomerados num
ônibus seria tudo menos solitário, mas tem sido difícil nos últimos anos.
Não somos os melhores amigos que costumávamos ser.

Sinto muito, deve ser bem difícil.

– Sim – concorda. – Desculpe, a última coisa de que você precisa é ouvir


eu me lamentando.

Não me importo – garanto-lhe. – Aliás, você tem razão; essas barras


de biscoito são incríveis.

Eu me pergunto como seria se eu fosse para Nova Iorque com Lando. O


que eu faria sozinho quando ele estivesse em turnê? Sei que eles saem
bastante em turnê e, às vezes, por quase um ano direto. Eu ficaria
simplesmente sentado sozinho no apartamento dele, esperando-o voltar? Ou
ele acha que a banda vai acabar e é por isso que me convidou a morar com
ele?

Se fosse morar com você, o que eu ficaria fazendo enquanto você


está em turnê? – pergunto.

Vejo Lando respirar fundo… suspirando? Seu olhar está mais triste do
que eu esperava quando fiz a pergunta.
– Nem sei se haverá mais turnês. Mas, se conseguirmos continuar com a
banda, você poderia vir nas turnês, se quisesse. Seria legal, e aposto que
encontraria um monte de inspiração para escrever.
Considero a sugestão. Seria bem legal viajar com ele, mas não vou criar
esperanças sobre a parte da escrita.

Eu ainda preciso pensar sobre isso – aviso.

Consigo enxergar isto dando certo, mas ainda sinto que é rápido demais.
Somos loucos por sequer levar essa ideia em consideração, não somos?
– Pense o quanto precisar – garante-me ele.
Assinto e pego sua mão, saindo do sofá para levá-lo ao meu quarto.
Minha cama já viu várias noites em que me masturbei imaginando Lando
ali, agora, está na hora de tornar realidade.
Tiro a camisa e me aproximo de Lando, que me observa com curiosidade.
Faço um “O” com o polegar e o indicador e faço como se lambesse.
Lando arregala os olhos e sorri excitado. Aponto para a cama e ele se
atrapalha para se despir depressa, depois, sobe na cama de bruços.
Seu entusiasmo deixa meu pau duro pra caralho, louco para estar metido
entre suas nádegas redondas. Mas tem uma coisa que quero fazer primeiro.
Ele, na minha cama, é tão maravilhoso quanto imaginei que seria, deitado
e iluminado pela luz do luar. Sua pele é tão macia e convidativa. Eu me
junto a ele na cama, ajoelhando no meio de suas pernas abertas. Coloco as
mãos em suas coxas e aliso seus pelos grossos, fazendo Lando estremecer
de prazer, arrepiando suas costas e bunda. Umedeço os lábios e me ajeito,
engolindo um gemido quando minha cueca roça no meu pau.
Cravo os dedos em suas nádegas durinhas, massageando e abrindo-as
para ver seu lindo ânus. Lando está com o rosto enfiado em seus braços, e
eu queria poder ver o que ele sente. Eu não linguo ninguém desde que perdi
a audição, e só agora me dei conta de que será difícil saber se ele está
gostando do que estou fazendo, se não consigo ouvi-lo para avaliar sua
reação.
Suspiro, frustrado, e cutuco Lando no ombro. Ele vira a cabeça e olha
para mim com uma expressão encantadora. Parece que, até agora, está
gostando; isso é bom.
Penso em escrever para ele, mas isso parece brochante neste momento.
– Pode fazer um sinal com as mãos se não gostar do que estou fazendo?
Lando franze a testa como se as minhas palavras não fizessem sentido
para ele.
– Eu gosto de ser lambido.
– Sim, mas se quiser que eu faça mais rápido ou mais devagar…
Lando entrelaça os dedos nos meus cabelos e me puxa para um beijo.
– Você está pensando demais.
Concordo e respiro fundo. Sei que ele está certo. Sempre adorei lamber
cu; não vou deixar minhas inseguranças estragarem isto para nenhum de
nós dois.
Volto para o meio das pernas dele. Dando beijinhos na parte de trás de
suas coxas enquanto aperto e massageio sua bunda, sorrio quando ele
começa a se contorcer. Este é um sinal que consigo interpretar sem
problema nenhum.
Vou subindo pela sua coxa, lambendo e mordiscando. Quando meus
dentes encontram sua polpa, Lando dá um solavanco, levantando o rosto,
vira-se para mim com o olhar risonho.
– Cócegas – diz ele, e eu rio. Beijo o local e continuo subindo.
Todo o corpo de Lando vibra quando passo a língua em seu saco e
períneo, ainda com os dedos cravados em sua bunda. Subo a língua,
saboreando o gosto almiscarado, até chegar à pele áspera e pregueada do
seu ânus.
Arrasto a língua pela sua entrada, dando lambidas como se fosse um
sorvete de casquinha derretendo. Seu buraco vibra contra minha língua,
empurrando os quadris para trás, exigindo mais. Aparentemente, eu estava
apenas procurando problemas antes. Descobrir se ele está gostando não é
exatamente um bicho de sete cabeças.
Alterno as lambidas, mantendo-o imaginando se a próxima será longa e
lenta ou uma provocada rápida apenas com a ponta. E quando enfio um
dedo dentro dele, seu corpo retesa, e ele agarra os lençóis. Seu ânus segura
apertado meu dedo, quentinho, fazendo meu pau latejar entre as minhas
pernas. Acrescento mais um dedo e deixo minha língua se movimentar
junto com eles. Lando se esfrega em meus dedos. Desço até encontrar sua
próstata e a cutuco. O corpo inteiro de Lando estremece e seus músculos
contraem. Cutuco mais uma vez, lambendo intensamente ao mesmo tempo.
Seu canal comprime ao redor dos meus dedos e, aí, ele espasma, e ondas
lentas apertam meus dedos enquanto ele se desmancha.
Quando as ondas terminam, me afasto e abaixo a cueca até as minhas
coxas num movimento desesperado, meu saco está pesado e dolorido, e, do
meu pau, o pré-gozo goteja.
Só preciso de duas bombeadas fortes até estar decorando as costas e a
bunda de Lando com jatos de porra densa; meu peito pesa com a
intensidade.
Quando acabo, tiro a cueca por completo e a uso para limpar o esperma
das costas de Lando. Depois, desabo ao lado dele.
Lando enfia as mãos delicadamente em meus cabelos enquanto seu peito
sobe e desce sob meu rosto. É igual a alguns dias atrás na casa na praia,
igual a um milhão de sonhos que tive ao longo dos anos. Mas, talvez, não
fossem sonhos. Talvez, no fim das contas, fossem lembranças.
Ele para com o cafuné, abro os olhos para ver o que interrompeu o
momento gostoso. Inclino a cabeça para trás para ver seu rosto, o brilho dos
postes de luz lá fora ilumina-o o bastante para enxergar facilmente seu
semblante e ler seus lábios.
– Pode me mostrar como dizer Feliz Natal?
Sorrio e me sento, os lençóis caem, me deixando exposto. Lando me
devora com os olhos cheios de desejo, e uma leve vibração de prazer me
invade. Sorrindo, cutuco seu queixo para que ele olhe para as minhas mãos,
e o mostro como é o sinal para Feliz Natal. Ele tenta e eu aceno com a
cabeça em aprovação, fazendo o sinal de “muito bom”.
– Você demorou muito para aprender a língua de sinais? – pergunta.
Pego meu bloquinho da mesa de cabeceira e me encosto em seu peito
novamente antes de escrever a resposta.

Muito tempo. Mensagens de texto ainda são uma bênção na minha


vida.
Sim, mensagem de texto é conveniente. Mas preciso aprender,
mesmo que demore.

Escreve Lando ao lado da minha resposta. O “por você” não dito fica
retido em meu coração, e eu o guardo como se fosse um tesouro. Nada
disso faz sentido para mim, mas quero muito que seja real. Quero ser a
pessoa por quem Lando está desesperadamente apaixonado em suas
músicas.
Faixa 21: Lado A
QUEM EU QUERO SER

Lando

A sensação do corpo quente de Dawson aconchegado ao meu, o som alto de


pássaros cantando do lado de fora da janela, e a brisa fria soprando com o
canto dos pássaros me fazem acordar com um sorriso no rosto. Quanto
tempo faz que as coisas não pareciam tão certas? Não ligo para o que
Dawson diz, algumas coisas estão destinadas a acontecer.
Lábios quentes encostam atrás do meu ombro, e eu balanço a bunda em
sua ereção matinal, recebendo-a entre minhas nádegas.
– Hmm – Dawson emite um som feliz do fundo da garganta, que ressoa
nas minhas costas e faz seus lábios vibrarem na minha pele. Suas mãos
percorrem preguiçosamente meu peito e barriga, até que eu pego uma e a
coloco no meu pescoço, para deixá-lo sentir os ruídos que está extraindo de
mim.
– Eu amo você – sussurro, sabendo que estou a salvo de Dawson ouvir
isso cedo demais.
Ele segura meu quadril e me vira de costas. Seus cabelos cacheados estão
despenteados, e um sorriso se abre no canto de seus lindos lábios rosados,
fazendo suas covinhas começarem a aparecer.
– O que você disse? – pergunta.
– Eu falei bom dia – minto, e o puxo para um beijo.
Nossos lábios se movimentam juntos sem pressa. Sua ereção quente e
grossa bate na minha, e eu gemo em sua boca, mas não faço nada para
acelerar as coisas. Dawson crava os dedos na minha bunda, apertando e
massageando, enquanto acaricio suas costas. Sua língua se enrosca na
minha, quente e molhada, preenchendo a minha boca e me deixando sem ar.
Tiro uma mão das suas costas e prendo em seus cachos bagunçados,
puxando seu rosto para mais perto, para aprofundar o beijo. Dawson prende
uma das pernas no meu quadril e roça o pau com mais vontade no meu. Sua
ereção dura como aço é absolutamente perfeita quando ele fode o pau dele
no meu. Nós gememos na boca um do outro, nosso beijo tranquilo logo se
transforma em desesperado, com o suor pingando de nossos corpos
enquanto nos esfregamos um no outro.
A coxa de Dawson aperta a minha cintura, todo o seu corpo fica mais
tenso. Minhas bolas estão rígidas e doloridas, querendo alívio, meu pau
lateja enquanto o pré-gozo escorre da minha abertura, melando os dois. Ele
grunhe, chupando mais a minha língua e cravando os dedos na minha
lombar a ponto de deixar hematoma. Seu gozo quente explode na minha
barriga e respinga no meu pau. Coloco a mão entre nós dois e seguro meu
pau, me masturbando com força, usando seu gozo como lubrificante, até um
gemido baixo escapar dos meus lábios e meu pau lançar devagar uma porra
densa.
– Bom dia – Dawson ofega com um sorriso feliz.
Nós nos beijamos mais um pouco, voltando aos beijos preguiçosos com
que começamos, sem ligar para o esperma espalhado sobre nós dois e os
lençóis.
– Acho que precisamos de um banho – rio um pouco depois, quando nos
separamos e finalmente saímos da cama.
Dawson concorda e me segura para que eu o siga.
Seu box é grande o bastante para nós dois, e o reservatório de água
quente dura apenas o suficiente para um boquete e o banho, o que foi
terrivelmente conveniente.
Depois da chuveirada, meu celular novo chega. Nem quero saber o
quanto Archer gastou do meu dinheiro para ser entregue na véspera de
Natal. Não é como se fosse me falir, e eu prefiro não pensar na quantidade
obscena de dinheiro que as pessoas cobram por coisas que sabem que você
pode bancar.
– Se importa se eu ligar rapidinho para os meus pais? – consulto Dawson.
Ele acena para que eu o faça.
– Orlando! Como você está, meu querido? – pergunta minha mãe.
– Estou bem, mãe. E a Europa?
– Estamos nos divertindo muito. Embora eu esteja morrendo só de pensar
em você passar o Natal sozinho. Vi que sua turnê foi cancelada. Está tudo
bem?
– Vamos esperar para ver – admito. Meus pais apoiam nossa banda desde
o início. Cacete, eles nos deixavam ensaiar na garagem quando não éramos
ninguém além de um bando de garotos querendo apenas fazer barulho para
abafar nossos dramas adolescentes. – Mas não vou passar o Natal sozinho.
– Não? Com quem você está? Archer? Benji?
– Não, os dois estão resolvendo seus próprios problemas na nossa pausa.
Estou com… hmm… bem, você se lembra de nove anos atrás quando contei
sobre um cara que conheci e fiquei muito triste por ele nunca ter ligado
depois de passarmos um final de semana juntos?
– Claro, aquele garoto não devia ter a mínima sensibilidade.
Eu rio e acaricio minha barba.
– É com ele que estou – admito. – A coisa de não ligar não foi culpa dele.
Ele sofreu um acidente depois que nos conhecemos.
– Ai, não. Ele está bem? – pergunta ela, entrando no modo mamãe ursa.
– Ele está bem. Na verdade, ele está ótimo – digo, observando Dawson se
movimentar pela cozinha, fazendo o café da manhã.
– Conheço esse tom de voz. Você está apaixonado por ele.
– É, estou. Só que ele ainda não. Parece que vou ter que suar a camisa.
– A jornada do amor verdadeiro nunca é fácil, querido – lembra-me
minha mãe, e meu coração perde um compasso. Eu sei que é uma citação
comum, mas quais são as chances?
– Acho que você tem razão – concordo.
– Posso falar com ele? Adoraria desejá-lo um feliz Natal.
– Ele ficou surdo.
– Ai, caramba, acho que é melhor aprender a linguagem de sinais se meu
futuro genro é surdo – declara ela, e minha garganta queima com uma
gratidão que nunca serei capaz de expressar.
– Vou te mandar uns links com os vídeos de onde tenho aprendido. Eu te
amo, mãe.
– Eu também te amo, meu querido. Você tem que trazê-lo para nos
conhecer depois que voltarmos de viagem.
– Levo, sim. Prometo.
Depois que ela chama meu pai na ligação, conversamos por alguns
minutos. Ele me conta sobre os lugares históricos que visitaram e todos os
locais em que foram até agora. Então, desejo aos dois um feliz Natal e me
despeço com a promessa de ir visitá-los em breve.
Dawson aparece com um prato de ovos e um sorriso.
– Meus pais desejaram feliz Natal, e mal podem esperar para te conhecer.
Ele fica boquiaberto e arregala os olhos.

Eles querem me conhecer? – escreve num pedaço de papel que


estava no balcão.

– Querem, de verdade.

Por quê?

– Porque eu gosto de você… muito.


Dawson sorri e morde o lábio inferior.

Eu também gosto muito de você.

– Parece que estamos na escola – rio.

Você gosta de mim? Marque sim ou não – Dawson escreve com um


sorriso brincalhão e eu rio.

Dawson

Posso te fazer uma pergunta estranha?

Envio uma mensagem de texto para Lando enquanto estamos deitados no


sofá assistindo a um filme do Rudolph.
– Claro.

O que de tão louco eu fiz quando você me conheceu naquela


época?
– O que quer dizer com isso?

Não sei. Algo espontâneo, escandaloso, divertido…

– Você disse que queria pular de bungee jumping.

Bungee jumping?! Parece assustador. Por que eu queria fazer


isso?

– Você disse que tinha medo de não experimentar tudo o que a vida tinha
a oferecer – diz Lando com um sorriso melancólico. Ele ainda está
apaixonado por essa pessoa e, de certa forma, acho que eu também. Quero
voltar a ser aquele homem.

Certo… vamos.

– Hã? – Lando arregala os olhos quando lê.

Vamos pular de bungee jumping.

– Covinhas, é véspera de Natal, não acho que conseguiremos fazer isso


hoje – destaca ele. – Além disso, você não precisa provar nada. Não
precisamos pular de bungee jumping só porque você acha que isso vai me
fazer gostar mais de você, nem nenhuma loucura dessas.

E se isso ME fizer gostar mais de mim?

Lando dá um sorriso triste e pega a minha mão.


– Se você realmente quer fazer isso, então vamos. Mas vamos ter que
esperar até depois dos feriados.
Concordo e mordo o lábio. Será que conseguirei manter minha coragem
até a próxima semana? Eu quero. Quero ser a pessoa que costumava ser:
destemido, irresponsável… feliz, vivo.
– Enquanto isso, por que não te ajudo a embrulhar os presentes que você
comprou para a sua irmã, e podemos assistir a mais filmes de Natal?
Você é obcecado com filmes de Natal – acuso com um
sorriso.

– Vergonha nenhuma – ele sorri.


Faixa 22: Lado A
ALEGRIA DE NATAL

Dawson

Perdi a noção de quantos dias seguidos acordei nos braços de Lando. Três?
Parece mais. Parece que eu o conheço e sou apaixonado por ele por metade
da minha vida. Como pode ser assim com um homem que eu mal conheço?
E seria mesmo loucura demais cogitar ir morar com ele em Nova Iorque?
Só consigo pensar no que Parker diria se ela soubesse que eu estou
considerando ir morar com um cara que mal conheço. Claro que ela queria
que eu transasse, mas não acho que ela quis dizer que eu deveria me mudar
para outro estado com alguém.
O ritmo delicado do peito de Lando subindo e descendo a cada respiração
contra as minhas costas é suave, seu calor me envolve como se fosse um
cobertor.
Meu olhar se desloca até a janela, pela grama verde e a luz do sol para
além da minha cama. Era legal quando nevava no Natal na época em que eu
frequentava a faculdade no centro-oeste. Eu conseguia me ver morando em
algum lugar com as estações definidas outra vez. Tem uma coisinha lá no
fundo que me diz que talvez eu tenha até planejado me mudar para algum
lugar mais para o norte antes do meu acidente. A menos que eu fosse uma
pessoa completamente diferente durante o último ano da faculdade, não
consigo imaginar que meu plano de vida, quando entrei num avião para
voltar para cá depois da formatura, fosse arrumar um emprego de garçom e
definhar nesse fim de mundo que é a Flórida.
Só que me mudar para Nova Iorque é totalmente diferente de me mudar
para Nova Iorque com um cara com quem estou saindo. É cedo demais dar
um passo como morar juntos. Mas, por algum motivo, não parece errado
imaginar isso. Claro que seria um desastre anunciado colocar em prática
esta ideia louca. Por outro lado, não consigo me obrigar a dizer “não” à
proposta.
Os lábios quentes de Lando se movimentam na parte de trás do meu
ombro como se ele estivesse falando alguma coisa. Eu me pergunto se ele
está cantando de novo ou se esqueceu que eu não posso ouvi-lo dando bom
dia. Meu coração pesa um pouco por um segundo. Tenho certeza de que
levaria algum tempo para se acostumar se nunca namorou uma pessoa surda
antes, mas quero desesperadamente que ele me enxergue, e não a pessoa de
quem ele pensa que se lembra.
Eu me viro e o encaro com um sorriso.
– Você disse alguma coisa? – pergunto, e imagino como minha voz
pouco usada soa aos seus ouvidos.
Lando balança a cabeça e afasta meu cabelo da testa com um sorriso
fofo. Então, recua um pouco e faz o sinal de “Feliz Natal” exatamente como
eu lhe ensinei. Uma risada retumba do meu peito, passando pelos meus
lábios. Eu me sinto um idiota completo por causa dos meus pensamentos há
poucos segundos. Lando pode ainda estar um pouco apaixonado pela versão
de mim que talvez nunca mais exista. Mas acho que ele também está se
apaixonando por esta versão.
– Feliz Natal – sinalizo.
– Minha mãe tem uma tradição de fazer rabanadas cobertas com açúcar
para o café da manhã de Natal. Com fome?
Assinto. Rabanada é uma boa, mas não estou pronto para deixá-lo sair da
cama ainda. Eu me aconchego, encostando o nariz na base do seu pescoço e
inalo seu cheiro.
– Uns minutinhos – murmuro e pressiono meus lábios em sua pele
quentinha. Seus braços me envolvem com força e, se eu fechar meus olhos,
posso sentir a resposta certa para a pergunta sobre Nova Iorque, mesmo que
eu não esteja pronto para respondê-la ainda.


Corro pela cozinha, preparando o jantar e rezando para que Parker não
fique toda estranha com Lando. Ela nunca foi muito audiófila e não
acompanha as fofocas das celebridades, então, tem uma grande
possibilidade de que ela não o reconheça imediatamente. Só que eu trazer
um suposto casinho de férias para o meu apartamento vai parecer
extremamente estranho para ela. Eu não a culpo; toda essa situação é
estranha pra cacete.
Meu celular vibra no bolso, eu o pego e vejo uma mensagem de texto de
Parker que diz simplesmente “estou aqui”.
Sorrio e coloco o aparelho de volta no bolso antes de checar o assado no
forno mais uma vez e, depois, vou receber minha irmã.
Lando está sentado no sofá e olha para mim quando passo por ele.
– Minha irmã – sinalizo, e quase posso ver as engrenagens virando em
sua cabeça enquanto ele tenta se lembrar o que esse sinal quer dizer. Não
tenho dúvidas de que ele vai pegar seu celular para procurar assim que eu
sumir do seu campo de visão.
Abro a porta e minha irmã me cumprimenta com um sorriso.
– Feliz Natal – sinaliza ela pouco antes de eu abraçá-la.
– Não surta, mas temos um convidado para o jantar – digo a ela quando
chego para o lado dando espaço para ela entrar.
Parker arregala os olhos quando entra no meu apartamento e vê Lando
sentado no sofá com um gorro de Papai Noel e um suéter brega de Natal.
Não consigo evitar um sorriso quando ele dá uma mordida num biscoito
enquanto assiste feliz a “Uma História de Natal”.
– Quem é? – sinaliza Parker, olhando desconfiada para Lando.
Reviro os olhos. Eu sabia que Parker não reconheceria o baixista da
melhor banda de todos os tempos.
– Lando – respondo simplesmente.
Parker balança a cabeça como se dissesse “isso não responde à pergunta”.
– Ah – Lando percebe a presença de Parker e se levanta do sofá,
limpando os farelos de biscoito das mãos em sua calça. – Você deve ser a
Parker, muito prazer.
– Sou eu. E você, quem é? – Posso ver a tensão em seu maxilar ao
perguntar.
– Sou o Lando, é… Dawson e eu somos… – Ele olha para mim pedindo
ajuda e eu abafo uma risada. Estou interessado em ver como ele termina a
frase sozinho. – Nós estamos saindo há pouco tempo. Não sou da Flórida,
então, ele ficou com pena de mim e me convidou para passar o Natal com
vocês.
– Entendi – manifesta Parker, depois, ela se vira para mim com um
sorriso. – Podemos conversar a sós?
– Ele não sabe muito da linguagem de sinais. Conversamos praticamente
em particular desse jeito – asseguro.
– Mas que merda é essa? Por que não me contou que estava saindo com
alguém?
– É recente.
– É claramente sério o suficiente para que o convide para o Natal –
contesta.
Suspiro e olho para Lando, tentando decidir o quanto quero contar à
minha irmã.
– Eu já o conhecia, só não me lembro.
– O quê? Quando?
– No fim de semana do meu acidente.
Parker fica boquiaberta e eu só consigo presumir que ela está inquieta
quanto à revelação. Ela direciona um olhar acusador para Lando.
– Você estava com ele naquele fim de semana? Sabe o que aconteceu?
– Nós tínhamos acabado de nos conhecer, passamos o final de semana
juntos, e depois voltei para Nova Iorque. Nunca soube por que ele não me
ligou.
Parker amolece um pouco e volta para mim.
– Como você está lidando com tudo isso? Você está bem?
– Fiquei assustado no início, mas agora estou bem. Eu gosto dele, por
favor, seja legal.
Ela olha mais uma vez para Lando.
– Vou tentar – admite.
– Obrigado.
– Ah, ei, esse eu sei – diz Lando orgulhoso, e eu sorrio e faço o sinal
universal do boquete. Lando cora na hora. Parker me dá um tapa no braço e
eu rio, me sentindo mais leve e mais eu mesmo do que jamais me senti em
nove anos.

Lando
Vendo Dawson com a irmã fica fácil perceber como são próximos. Eu me
pergunto como ela vai se sentir se ele resolver ir morar comigo.
Ela me olha com desconfiança do outro lado da mesa enquanto
comemos, avaliando cada movimento meu com o olhar.
– Você me parece muito familiar – diz ela, inclinando a cabeça e
espremendo os olhos.
Quase deixo o vinho sair pelo nariz. Olho para Dawson para descobrir se
ela está só me zoando ou se realmente não sabe quem eu sou, e ele está
ocupado tentando não rir.
– Você já deve ter me visto – falo vagamente, e ela franze a testa.
– Onde? Você disse que não mora por aqui. Você não estudou com
Dawson, estudou?
– Não.
Dawson pega seu celular e começa a tocar na tela. Suponho que ele esteja
me mandando uma mensagem, mas, em vez disso, ele o estende para a
irmã. Ela começa a piscar para o que ele está mostrando e, então, ela
arregala os olhos.
– Você é da banda que ele gosta? Queda Vertiginosa?
– Sim. Toco baixo e componho a maioria das músicas – admito, me
contorcendo na cadeira enquanto meu rosto ferve.
– Ai meu Deus, faz muito mais sentido agora. Eu sempre me perguntei
por que Dawson tinha uma estranha obsessão com uma banda já que ele é
surdo. Não fazia sentido nenhum antes, mas agora… – Ela olha de um para
o outro. – Você não se lembra de conhecê-lo? – apura com Dawson, e ele
balança a cabeça negativamente.
– Tudo bem; ele não tem que se lembrar de mim naquela época para que
isso signifique algo.
A expressão séria de Parker se transforma em sentimental e ela sinaliza
algo para Dawson. Ele assente e adota a mesma expressão.
– Quais são suas intenções com o meu irmão? Presumo que você não vai
ficar muito tempo na Flórida. Onde você mora? Los Angeles? Você deve
fazer muitas turnês, não é? – Parker dispara perguntas para mim
aceleradamente até que Dawson coloca a mão na boca da irmã.
– Eu gosto muito do seu irmão, e estamos entendendo o que tudo isso
significa para nós dois a longo prazo. Eu moro em Nova Iorque e faço
muitas turnês. Fui sincero com Dawson quando falei que as coisas podem
ser complicadas entre nós, mas estou mais do que disposto a me esforçar
para fazer dar certo.
Parker parece impressionada com a minha resposta e se volta novamente
para o irmão, sinalizando algo depressa. Não consigo entender a maior
parte, mas juro que a palavra “amor” apareceu. Um rubor aparece no rosto
de Dawson e ele sorri, suas covinhas se mostram plenamente e, então, ele
encolhe levemente os ombros para a irmã, o que parece mais com timidez
do que com incerteza.
– Não o magoe; ele já passou por coisa demais – diz ela com um último
olhar severo.
– Prometo que não vou.
Faixa 23: Lado A
VAMOS DANÇAR

Lando

Espero, tenso, enquanto o telefone chama. Archer não costuma deixar o


telefone tocar tanto antes de atender. Quando alguém finalmente atende,
não é quem eu esperava.
– Alô? – diz uma voz grossa, sonolenta e rouca do outro lado.
– Jude? Por que você atendeu o celular do Archer?
– Ai, merda – diz Jude. Ouço um farfalhar bastante desesperado do outro
lado, e duas vozes masculinas diferentes perguntam quem está ligando.
– É para o Archer. É o Lando. – O sussurro de Jude é abafado como se
ele estivesse tentando cobrir o telefone para que eu não ouvisse.
– Alô? – atende Archer depois de vários segundos, sua voz está tão rouca
quanto a de Jude. Ele limpa a garganta e ouço mais barulho. – Lando, está
tudo bem?
– Tudo certo – respondo, tentando manter minha voz inabalada. – Você
estava… é… você estava dormindo com o Jude?
Archer limpa a garganta outra vez, mas não responde. Interessante.
– Está aproveitando suas férias?
– Sim, foi meio que por isso que liguei. Queria ver se você entrou em
contato com Lincoln e se tinha alguma ideia sobre um cronograma ou… –
As palavras “se a banda vai voltar” pairam não ditas no ar.
– Ainda indefinido. Por quê? Está ansioso para voltar a Nova Iorque?
Olho para Dawson, esparramado no sofá, mexendo em seu celular.
Depois da nossa conversa há alguns dias, tenho pensado em como faríamos
isso dar certo se ele fosse para Nova Iorque. Eu adoraria que ele viesse nas
turnês conosco, mas não quero fazer disso a vida dele. Cacete, isso não
deveria ser a vida de todos nós. Talvez tenha sido onde erramos. Nós nos
atiramos na lama.
– As coisas podem ter mudado para mim, Arch.
– Que coisas?
– Minhas prioridades.
– Tem a ver com o seu homem – supõe ele.
– Tem. – Dawson inclina a cabeça e sorri para mim como se estivesse
feliz apenas por saber que estamos no mesmo ambiente. O sentimento é
mútuo. – Não posso me ausentar igual a antes. Se a banda continuar unida,
as coisas têm que mudar.
– Acho que podemos considerar isso, Lando – concorda.
– Que bom. – Solto um suspiro de alívio. – Não vou me intrometer no
que está acontecendo entre você e Jude, mas só me diz se ele está melhor.
– Jude está bem melhor. Bennett o está ajudando – confirma Archer.
– Fico contente em saber. Falo com você depois, Arch.
– Está bem, e estou ansioso para conhecer seu “muso”.
– Vamos ver – rio e desligamos.
Eu me sento ao lado de Dawson e ele digita uma mensagem para mim.

Quando você tem que voltar a Nova Iorque?

– Ainda não tem nada definido. Provavelmente, pelo menos não até o
final de janeiro. – Será que vai ser tempo o bastante para Dawson decidir se
quer ir morar comigo? Se não for, será que conseguirei me afastar de novo,
mesmo com a promessa de vê-lo novamente em breve? Não. É um enfático
e fácil “não” para essa questão.
A pergunta paira entre nós dois por alguns minutos, e eu me pergunto se
ele está pensando no mesmo que eu. Ele tem cerca de um mês para
descobrir se está disposto a se afastar da sua vida aqui para ficar comigo.
Será que é justo da minha parte sequer propor isso a ele? Mesmo que não
seja justo, não posso voltar atrás.
Terei que ir trabalhar daqui a pouco :(

– Seria estranho se, em vez de simplesmente te levar no trabalho, eu


ficasse lá?
Espantado, Dawson pisca durante vários segundos antes de balançar a
cabeça negativamente. Fico intrigado, incerto se ele quis dizer que “não,
não é estranho” ou “não, não venha comigo”.
– Fica comigo – diz ele num tom de voz rouco.
– Legal. Eu não vou te incomodar. Pensei em levar um bloquinho e ver se
consigo compor alguma coisa.
Dawson concorda e calça os sapatos. Eu tiro meu bloquinho da mochila,
calço os sapatos, e o sigo até a porta.
O bar é um barzinho de cidade pequena: não tem muita coisa para ver do
lado de fora e, do lado de dentro, não é muito melhor. Dawson morde o
lábio e lança um olhar de soslaio para mim. Coloco a mão em seu ombro e
dou um apertão tranquilizador. Depois, aponto para uma mesa no canto e
ele assente. Não sei ao certo que tipos de palavras podem surgir aqui, mas
não custa tentar.

Dawson

Enquanto executo minha rotina noturna de estocagem e limpeza, estou


plenamente ciente da presença de Lando no bar. Não que ele esteja fazendo
alguma coisa para atrair minha atenção, além de existir. Mas existir é mais
do que o suficiente para me distrair. Olho para ele e o vejo girando a caneta
entre os lábios. Não tenho como saber se o suspiro que esta cena provoca é
audível ou não. Mas ninguém por perto reagiu, então, imagino que esteja
tudo bem. Ele levanta o olhar e me lança um doce sorriso que me deixa sem
fôlego.
Obrigo-me a desviar o olhar dele e me esforço para focar em servir
bebidas e fazer meu trabalho. Só que, sempre que olho, ele parece feliz e
isso me faz querer tanto beijá-lo quanto gritar.
Este bar não sou eu. Este emprego não é o que eu deveria estar fazendo
da vida. Lando diz que suas palavras estão perdidas, mas, pelo menos, ele
vai em busca delas. Eu só faço me esconder num bar sujo e sentir pena de
mim mesmo.
Sinto a corrente de ar da porta ao se abrir e me viro para dar a quem quer
que seja um sorriso acolhedor. Eu me retraio quando vejo Greg, um dos
clientes regulares que parece não aceitar um “não” como resposta.
Greg se aproxima e se senta em uma banqueta em frente ao balcão.
– Oi, lindo – cumprimenta ele, e eu enxergo a fala arrastada em seus
lábios. Ele já chegou bêbado hoje.
Pego meu bloquinho, escrevo “não posso te servir, você já está bêbado”
numa escrita irregular e jogo no balcão na frente dele.
– Ah, fala sério, gato. Só tomei uma cerveja em casa – mente.
Balanço a cabeça e faço um gesto de como se o enxotasse. Seu sorriso
insinuante se transforma em careta. Eu o enfrento, relutante em recuar e
deixá-lo pensar que não há problema nenhum em seu comportamento.
Finalmente, a careta some e ele volta a sorrir.
– O que acha de concordar com um encontro? Aí, eu vou embora.
Reviro os olhos e balanço a cabeça. Greg tenta pegar na minha mão, que
eu puxo depressa, cruzando os braços.
Greg abre a boca para protestar novamente, mas, antes que ele possa
dizer qualquer coisa, Lando está parado atrás dele, com a mão em seu
ombro e uma carranca no rosto normalmente sorridente. Minha frequência
cardíaca aumenta quando Lando gira Greg.
– Ele disse não – expõe Lando. Não consigo ver a resposta de Greg, já
que ele está de costas para mim, mas a afirmação seguinte de Lando me faz
estremecer. – O namorado dele.
O formato da palavra “namorado” nos lábios de Lando é como um
orgasmo para a minha alma. Eu sou o namorado dele? Ou será que ele só
disse isso para se livrar do babaca do Greg? É meio patético o quanto eu
quero que seja a primeira opção.
Greg balança a cabeça e se livra das mãos de Lando. Ele olha para mim
mais uma vez antes de ir em direção à porta.
– Sinto muito por isso – manifesta Lando, acariciando a barba de maneira
nervosa. – Não quis agir como um homem das cavernas.
Coloco meu bloquinho no balcão e dou a volta, olhando para cima,
oferecendo meus lábios para que Lando beije.
Não tenho certeza se Lando vai se lembrar de tudo o que lhe ensinei
antes, mas sinalizo devagar:
– É verdade?
Ele demora um pouco para responder.
– Que você é meu namorado? – indaga. Assinto, mordendo o lábio
inferior. – Você quer ser? – Assinto mais uma vez. – Então, é verdade.
Solto um suspiro de alívio e acho até que uma risadinha escapa da minha
garganta. Lanço meus braços pelos ombros de Lando e o beijo com mais
intensidade desta vez.
O resto da noite passa rápido, e Lando até me ajuda a limpar o chão e a
colocar as cadeiras para cima depois de fechar.
Bocejo quando destranco a porta do meu apartamento, Lando vem logo
atrás de mim. Tiramos nossos sapatos com os pés e eu penso em ir direto
para a cama, mas ele me puxa em direção ao sofá em vez disso.
Tiro meu celular do bolso e escrevo uma mensagem.

Conseguiu escrever alguma coisa hoje?

Os olhos de Lando se iluminam quando ele lê o texto e assente


animadamente.
– Escrevi uma música nova.

Que maravilha! Queria poder ouvir.

Parte meu coração saber que nunca vou conseguir escutar as músicas que
ele compõe.
– Eu também, Covinhas. – Ele me dá um beijo na bochecha e enterra o
nariz em meus cabelos, me abraçando por alguns minutos.
No momento em que eu começo a adormecer em seu ombro no sofá,
Lando se levanta e me leva junto com ele. Ele me puxa contra seu peito e
sua respiração sopra em meus cabelos. Quando começa a balançar ao som
de uma música que não consigo ouvir, inclino a cabeça para olhar para ele.
Não estou com meu celular e, sobretudo, não quero me afastar dele para
pegá-lo, então, me contento com a minha voz raramente usada.
– O que você está fazendo?
Ele sorri para mim, pegando minhas mãos, e as coloca em volta do seu
pescoço, depois coloca os braços em volta da minha cintura.
– Dançando – responde.
Faço uma careta.
– Não posso ouvir a música – reclamo.
– Não tem problema, não tem ninguém aqui para ver se você está fora do
ritmo.
Meu coração aperta e qualquer parte dele que ainda não havia sido
entregue a Lando agora pertence a ele.
Faixa 24: Lado A
MINHA VIDA NÃO TE PERTENCE

Lando

Assobio enquanto faço café para Dawson, imaginando como será se ele
concordar em vir para Nova Iorque comigo. Posso me levantar cedo e fazer
café para ele todas as manhãs, se isso o fizer feliz. Acho que eu faria
praticamente qualquer coisa por Dawson.
Mandei a letra que escrevi ontem à noite para o Archer, ele ficou radiante
por eu finalmente ter voltado a compor. Foi um verdadeiro alívio me sentar
no bar e ver as palavras fluindo da minha caneta. Eu estava certo de que
elas haviam desaparecido para sempre. Archer tinha razão: Dawson é o meu
“muso”, sempre foi. De alguma forma, ele desbloqueia as palavras.
Meu celular vibra na bancada e eu me pergunto se Dawson está me
mandando mensagens da cama.
BENJI

Hmm, cara… você viu isso?

Tem um link no final da mensagem e eu solto um grunhido. Que merda


será que os tabloides estão viralizando hoje?
Clico no link e meu sangue congela assim que leio a manchete. Esqueça
“Alameda Cherry”. Conheça Dawson Hayes, o Homem que Inspirou o
Resto da Longa Lista de Músicas do Queda Vertiginosa.
Não pode ser. Como será que eles descobriram sobre Dawson? Mesmo se
tivermos sido vistos juntos, as únicas pessoas que sabem que ele inspirou
tantas músicas são a banda e o próprio Dawson, e nenhum deles foi
correndo para os sanguessugas com essa informação.
Eu me estabilizo e desço a página até a matéria, escuto minha pulsação
em meus ouvidos a cada palavra que leio. Tudo sobre Dawson está ali:
especulações sobre como e quando nos encontramos, seu acidente… Clico
para continuar a leitura, e cerro o maxilar com tanta força que quase quebro
um dente. Tem uma imagem com um print de nossas mensagens de texto.
DAWSON

Essa música é sobre mim?

É.

DAWSON

Tem outras sobre mim?

Tem.

DAWSON

Quais?

Todas.

– Porra – rosno, segurando forte meu telefone lutando contra o impulso


de atirá-lo na parede. – Porra, porra, porra.
Dawson sai cambaleante do quarto com um sorriso de felicidade,
totalmente alheio ao meu rompante, até que me vê com os punhos fechados
e o rosto vermelho de raiva.
– O que houve? – sinaliza ele e, por um segundo, a alegria em entender o
sinal sobrepõe-se à minha raiva.
– Eu sinto muito, de verdade – digo impotente, afundando na cadeira
onde estava sentado antes do meu rompante.
As sobrancelhas de Dawson se juntam de preocupação.
– O que houve? – pergunta novamente.
Quase não quero lhe mostrar. Quero nos manter numa bolha aonde o
mundo lá fora e toda aquela merda não conseguem chegar.
– Lembra quando perdi meu celular? – questiono, e ele assente com uma
expressão desconfiada. – Acho que alguém encontrou. – Deslizo o telefone
em sua direção para que ele veja a matéria.
Meu estômago revira enquanto ele lê, franzindo cada vez mais a testa.
Quando o estende de volta para mim, sua mão está tremendo.
Em vez de pegar o celular, seguro seu pulso e o puxo para mim.
– Sinto muito – digo, ele assente distraidamente, estampando um sorriso
falso. – Covinhas, você não faz ideia…
– Está tudo bem – sussurra ele, e eu posso ouvir a mentira em sua voz.

Dawson

É surreal ler sobre a própria vida numa matéria de revista. Estava tudo lá,
até as manchetes dos jornais sobre meu acidente de carro. É como se todo
mundo achasse que tem o direito de falar sobre mim e a minha vida. É
como se eu não fosse uma pessoa de verdade. E, se eles têm essas
mensagens que Lando e eu trocamos, devem ter todas elas. E leram as
coisas doces e sexys que escrevemos um ao outro naquela semana antes de
ele perder o celular. Viram os momentos de medo e insegurança escritos
naqueles textos. Viram a minha vida e a mostraram ao mundo.
Namorar alguém famoso é assim?
Quero enviar uma mensagem a Lando dizendo que preciso de um pouco
de espaço para pensar, mas tenho medo de fazer isso. E se alguém também
ler essa em algum momento? E se lerem tudo o que enviamos um ao outro?
Eles já se sentem com direito à minha vida. Onde isso vai acabar?
Pego um pedaço de papel na bancada, amassando-o com a força da
minha mão.

Preciso de um tempo sozinho.

Escrevo e entrego para Lando antes de ir para o meu quarto, fechando a


porta ao entrar.
Me enfio embaixo do lençol e coloco a coberta por cima da cabeça, me
escondendo do mundo. Aqui, ninguém pode me ver e especular sobre mim.
Se eu ficar com Lando, se for morar com ele em Nova Iorque, pode ser
que seja sempre assim. O mundo inteiro vai se sentir no direito de saber
sobre a minha vida. Será que consigo viver desse jeito?
Pego meu celular e leio a matéria mais uma vez. Meu estômago se agita
diante dos detalhes. Alguém passou bastante tempo vasculhando fundo na
minha vida. Eu me sinto um animal de zoológico, onde todo mundo encosta
o nariz no vidro e aponta para mim.
O único ponto positivo é que não tem nada na matéria sobre o final de
semana que passamos juntos nove anos atrás. Tem apenas especulações
sobre como nos conhecemos. Se tivesse detalhes sobre o final de semana do
qual ainda não consigo me lembrar, eu reagiria como um louco. Se eu não
posso saber sobre aquele final de semana, eles também não podem.
Segundos depois que coloco o telefone na cama ao meu lado, ele vibra.
Quase não olho a mensagem, com medo de que seja Lando pedindo
palavras tranquilizadoras. Meu estômago dói ao pensar nele sentado na
cozinha, se perguntando se vamos ficar bem. Neste momento, não tenho
essas palavras tranquilizadoras para lhe dar. Não sei se consigo lidar com a
minha vida sendo assim.
Quando, enfim, verifico meu celular, é uma mensagem de Parker.
PARKER

Viu a matéria? Você está bem?

Claro, estou bem pra caralho.

PARKER

Devagar com o sarcasmo; estou tentando ser legal.

Desculpe. Isso é uma merda, P. Ninguém tem direito a todos


esses detalhes da minha vida.

PARKER

Eu sei. É bem injusto.

Sim.
PARKER

Eu não sabia que todas as músicas dele eram sobre você.


Isso é… ele gosta muito de você.

Eu me retraio com a mensagem. Sei que ela não está tentando me fazer
sentir pior, mas foi o que aconteceu.

É… tenho que ir. Falo com você depois.

PARKER

Mande mensagem se precisar de mim.

Fico escondido no meu quarto por mais uma hora mais ou menos antes
de me aventurar de novo. Encontro Lando sentado no sofá, assistindo
televisão, parecendo tão infeliz quanto eu imaginei.
– Covinhas, me desculpe. Eu deveria ter sido mais cuidadoso com o meu
celular. Nunca pensei…
Eu me sento ao lado dele e coloco a mão sobre sua boca para que ele pare
de falar. Balanço a cabeça e encosto a testa em seu ombro.
Ficamos sentados desse jeito por alguns minutos enquanto organizo meus
pensamentos. Então, pego um bloco de papel na mesinha de centro e
escrevo para ele.

Não é culpa sua. Mas não tenho certeza se consigo lidar com esta
vida. Preciso de um tempo para processar tudo.

– Você está terminando comigo? – pergunta Lando ao ler.

Não, estou avaliando tudo. Preciso pensar em algumas coisas antes


de poder decidir sobre Nova Iorque ou qualquer outra coisa.

Lando assente, com o semblante triste e os ombros caídos. Queria que


fosse mais fácil. Se ele fosse simplesmente um homem lindo e fofo que não
é famoso, seria muito mais simples.
Lando

Algumas horas depois de descobrir sobre a matéria, deixo Dawson no


trabalho. Desta vez, não peço para ficar, independentemente do quanto eu
queira. Ele precisa de tempo para avaliar as coisas.
– Porra. – Soco o volante e deito a cabeça no encosto com os olhos
fechados depois de ver Dawson desaparecer dentro do bar.
Que merda vou fazer para convencê-lo a ignorar estas besteiras de
celebridade e ir morar comigo? É engraçado, a maioria dos caras com quem
saí nestes nove anos teria ido à loucura por ter uma matéria sobre eles.
Dawson não está interessado nesta parte da minha vida e é isso que sempre
fez dele diferente, especial e o certo para mim.
Que caralhos eu faço agora?
Volto para o apartamento de Dawson para esperar o tempo até ter que
buscá-lo no trabalho. Neste intervalo, procuro algum lugar em que possa
levá-lo para pular de bungee jumping e escrevo uma música para ele,
porque quando se trata de Dawson, as palavras são sempre fáceis de captar.
Contudo, não acho que seja apenas Dawson que torne as palavras mais
fáceis. Tudo parece diferente aqui, longe do peso da banda. Está tudo
desmoronando, mas, curiosamente, isso parece ter acabado com a pressão.
Quando fico sem papel, me levanto para procurar um bloco novo. Já vi
Dawson pegá-los de todos os lugares. Começo pela cozinha, abrindo a
gaveta de tranqueiras perto da geladeira.
Tem um bloco bem em cima, que eu pego e faço uma nota mental para
comprar um novo para colocar no lugar antes de ir buscar Dawson mais
tarde.
Debaixo do bloco, algo chama a minha atenção. É uma pilha de folhas
impressas, algumas com imagens de dentro do ouvido dele e outras com
trechos destacados. Eu sei que não deveria bisbilhotar, mas, quando a frase
“cirurgia experimental” chama a minha atenção, não consigo evitar de
pegar os papéis e ler todos eles.
Depois que termino, enfio tudo de volta na gaveta e tento não pensar
nisso. A esta altura, nem sei se Dawson ficará comigo para que eu me
preocupe por tanto tempo, muito menos que estes papéis sejam da minha
conta.
Depois de terminar de escrever e me dar conta de que ainda tenho uma
hora até precisar buscar Dawson, afundo no sofá e pego meu celular. Nem
tenho certeza para quem devo ligar para me animar. Acabo ligando para
Linc, um dia depois do Natal, e ainda me sinto meio babaca com a
conversa. Ele parecia tão feliz e tudo o que consegui fazer foi alertá-lo
sobre o quão dura pode ser a queda se as coisas derem errado com seu
homem. Eu poderia ligar para o Benji, mas prefiro não entrar em contato
para reclamar com ele. Me vejo digitando o número de Archer antes de
sequer decidir fazê-lo.
– Alô? – atende uma voz rouca que definitivamente não é a de Archer.
– Hmm… alô? – respondo. – Archer está por aí?
– Está, espera um pouco – diz o homem, e depois ouço mais abafado –
Archie, um de seus meninos está no telefone.
– Já te disse para parar de chamá-los assim, Ben. Eles são meus clientes,
não meus meninos, e eles já têm quase trinta anos.
– Eles são meninos – repete Ben. Suponho que Ben seja Bennett, o que
deixa esse cenário estranhamente interessante. Archer estava na cama com
Jude no outro dia de manhã e, agora, está soando estranhamente amigável
com seu ex. Aposto que tem uma história muito boa se desenrolando no
apartamento de Archer.
– Alô? – diz Archer.
– Oi, Archie – brinco.
– Jesus, por favor, não me chame assim – resmunga ele, e eu rio.
– Ah, só o Ben pode te chamar de Archie?
– Vai vendo… posso começar a te chamar de Orlando – ameaça ele, e eu
estremeço.
– Trégua – concordo depressa, e, desta vez, Archer gargalha do outro
lado da linha.
– A propósito, coloquei aquela matéria na mão dos advogados. Vamos
descobrir quem roubou seu celular e pegá-lo de jeito – assegura-me ele sem
mais delongas.
– Obrigado. Só queria que tivesse um jeito de colocar aquele gênio de
volta na lâmpada. Dawson ficou bem abalado.
– É, nem todo mundo consegue lidar com o escrutínio da mídia e a
invasão de privacidade que vem com o trabalho.
– Não posso perdê-lo por causa disso, Arch. O que eu faço? – indago,
desesperado por alguma resposta mágica que faça isso tudo desaparecer.
– Não sei se tem alguma coisa que você possa fazer. Essa situação é uma
merda, mas as coisas são como são. Você não pode prometer a ele que isso
não acontecerá mais. Ele tem esse passado trágico que faz os sanguessugas
da mídia gozarem nas calças.
– Eu não posso perdê-lo – repito, escutando a derrota na minha própria
voz. – Você já está nisso há um tempo; é possível ter amor e sucesso neste
ramo?
Archer suspira e meu coração pesa um pouco.
– Quero que a resposta seja positiva, tanto para o seu bem quanto para o
meu próprio. Mas, com toda franqueza, não tenho certeza.
– Não tem nada que eu possa fazer? Só ficar sentado e esperar que
Dawson me dê um pé na bunda por causa da falta de privacidade?
– Diga a ele como se sente; seja sincero com ele sobre tudo. E depois lhe
dê um tempo para processar e decidir se vale a pena lidar com toda essa
merda para ficar com você ou não. Mas, enquanto isso, certifique-se de que
ele veja que você vale a pena.
– Se ele não estiver disposto a assumir a bagagem que vem com namorar
uma estrela do rock, eu simplesmente terei que não ser mais uma estrela do
rock. Porque ele vale a pena – admito resolutamente para Archer.
– Você carregou o peso da banda em seus ombros por anos. Manteve
Lincoln e Jude de pé quando eles estavam conformados em se deixarem
cair no abismo. Se você não consegue mais fazer isso, vou entender. Todos
entenderemos.
– Obrigado, cara. Não quero que chegue a isso, só estou colocando todas
as minhas cartas na mesa para você.
– Eu agradeço. No final, tudo vai acontecer exatamente como deve.
– É – concordo. – Obrigado pela conversa. Vou te deixar voltar para o
Ben – brinco mais uma vez para deixar o clima mais leve, depois desligo
antes que ele me diga alguma merda de volta.
Não quero sair da banda – se ainda tiver uma banda depois dessa pausa –,
mas Dawson vem em primeiro lugar. Sempre.
Faixa 25: Lado A
VOE OU CAIA

Lando

Depois de conversar com Archie ao telefone, vou buscar Dawson no bar. O


bar parece calmo, tem apenas um carro no estacionamento quando paro lá.
Quando Dawson sai do bar logo depois, ele ainda parece tenso, reservado,
claramente processando até agora o que aconteceu mais cedo.
As palavras de Archer ressoam em minha mente. Diga a ele como se
sente; seja sincero com ele sobre tudo. Sei que ele se referia a toda essa
merda da mídia, mas talvez eu deva justamente externar tudo para Dawson.
Ele abre a porta e se senta no banco do carona com um sorriso forçado.
– Oi – sinalizo, e seu sorriso suaviza um pouco.
– Oi – sinaliza ele.
A volta para o apartamento dele é rápida a esta hora da noite. Quando
entramos, sinto um desconforto entre nós dois ao qual não estou
acostumado.
– Podemos conversar? – pergunto, trocando o peso do corpo de pé e
acariciando a barba.
Dawson concorda com a cabeça, pega um bloquinho e uma caneta na
bancada e vai para o sofá. Eu me junto a ele, resistindo ao impulso de puxá-
lo para os meus braços e fazê-lo me prometer que tudo vai ficar bem.
Estendo a mão para o bloco, erguendo as sobrancelhas, e ele me entrega.
Por algum motivo, isso parece demais para dizer em voz alta. Talvez
escrever seja mais fácil.

Pensei muito enquanto você estava no trabalho e quero ser honesto


com você quanto ao que acho de tudo. Entendo por que aquela
matéria te assustou e, por mais que eu queira te prometer que nada
assim voltará a acontecer, não posso. O que eu vou te prometer é que
nada significa mais para mim do que você. Se para ter você na minha
vida for preciso sair da banda, eu saio. Se eu tiver que me mudar para
cá em vez de te levar para Nova Iorque, farei isso também. Sei que é
cedo, e talvez isso seja um exagero, mas é como eu me sinto.

Dawson lê minhas palavras, aparentemente mais de uma vez, e fica


quieto e imóvel por tanto tempo que eu começo a me preocupar que tenha
me excedido.
Por fim, ele pousa o bloco e levanta o olhar para mim com uma pontada
de medo em seus olhos.
– Vamos para a cama – sinaliza ele, apontando para o quarto, para o caso
de eu não ter entendido.
Eu o sigo com um nó na garganta. Presumo que eu não ter sido banido
para o sofá seja um bom sinal, só que ainda não sei como ele se sente sobre
o que aconteceu hoje ou sobre o que eu lhe disse.
Dentro do quarto, Dawson se vira para mim e puxa delicadamente a
minha camisa até eu levantar os braços para que ele a tire. Suas mãos
brincam lentamente em meu peito e em minha barriga, depois, ele chega ao
botão da minha calça e a tira também.
Meu pau está duro e levanta o tecido da minha boxer quando Dawson
fica de joelhos e olha para mim com uma expressão tão doce que quase faz
minhas pernas fraquejarem.
Passo os dedos pelos seus cachos enquanto ele aquece minha pele com
beijos. Ele segura minha ereção com uma mão com pressão suficiente para
eu gemer de frustração, e me lança um sorriso malicioso que me diz que
sabe exatamente o que está fazendo comigo.
Agarro seus cabelos com força e sua respiração faz cócegas no meu
baixo-ventre quando ri por causa da minha impaciência. Mas ele fica com
pena de mim e enfia os dedos no cós da minha boxer, puxando-a até meus
tornozelos.
Suas mãos voltam para a minha bunda enquanto ele dá um selinho na
ponta do meu pau. A gota do pré-gozo que se forma ali fica grudada em
seus lábios quando ele se afasta, e eu gemo diante da visão, meu saco incha
e formiga. Dawson lambe os lábios e faz um barulho no fundo da garganta
que é como uma carícia.
Ele entreabre os lábios e eu espero com ansiedade enquanto ele os arrasta
pela cabeça do meu pau, me deixando molhado com sua saliva.
Quando ele finalmente me coloca na boca, quase gozo na hora, depois de
toda aquela provocação. Ele fecha os lábios e enche a boca de ar, me
tomando profundamente e tirando repetidamente até eu implorar, trêmulo.
Ele crava os dedos na minha bunda, me puxando, me encorajando a foder
sua boca. Eu gemo, deixando minha cabeça cair para trás enquanto seguro a
dele no lugar, prendendo seus cabelos, e empurro em sua garganta.
Um ronco profundo ecoa do meu peito, e eu queria pra caralho que
Dawson pudesse escutar o que ele faz comigo. Com mais uma estocada,
meu saco comprime e meu pau pulsa contra sua língua enquanto ele engole
minha porra.
Ele me chupa até não ter mais o que sair de mim e lambe os lábios como
se meu gozo fosse a melhor guloseima que ele já experimentou. Caralho,
ele é sexy.
Dawson se levanta e me puxa para sua cama. Deitando-se, ele tira sua
calça e sua camisa e joga tudo de lado.
Quando se vira para apagar a luz, eu o impeço, procurando mais
respostas em seu rosto.
– Nós vamos ficar bem? – pergunto, contente por, desta vez, ele não
poder ouvir o desespero na minha voz.
– Vamos dar um jeito – garante-me ele antes de dar um beijo leve na
minha boca e apagar a luz.

Dawson

Uma mão forte empurra meu ombro, me arrancando do meu sono


gostoso. Abro os olhos e vejo Lando parado na minha frente com um
sorriso.
– Acorda, Covinhas.
Grunho em resposta e esfrego os olhos. Depois, levanto a cabeça para
olhar o relógio ao lado da minha cama e faço uma careta.
– Cedo demais – sinalizo em protesto.
– Desculpe, ainda não sei esse. Mas você tem que se levantar para
chegarmos lá a tempo da nossa reserva.
Levanto uma sobrancelha para Lando e ele sorri. Em vez de responder,
ele simplesmente me tira da cama e começa a jogar roupas da minha
cômoda para mim. Eu me visto, reclamando o tempo todo. Quando vou
para a cozinha, ele me abraça pela cintura e me direciona para a porta.
– Vamos parar para tomar café no caminho, mas precisamos sair logo.
Mostro o dedo do meio para ele e calço meus sapatos.
– Para onde estamos indo? – resmungo enquanto ele me leva para o
carro. Viro a cabeça para vê-lo responder.
– É surpresa e, sim, está no seu calendário, mas, por favor, não olhe.
Suspiro, mas não tento olhar meu calendário. Se ele diz que está lá,
acredito. E sua última surpresa foi uma torta. Quão ruim essa pode ser?
Quarenta e cinco minutos depois, paramos num estacionamento de
cascalho, e eu olho em volta procurando alguma dica de onde estamos. Não
vi nenhuma placa na entrada.
– Onde estamos? – sinalizo e, quando Lando não entende, falo em voz
alta.
– Você disse que queria pular de bungee jumping – responde ele com um
sorriso.
Meu estômago revira e minhas mãos começam a suar.
– Eu falei mesmo. – Me pergunto se a minha voz sai tão insegura quanto
me sinto. Na teoria, bungee jumping parece legal e um ótimo jeito de
mandar meus medos irem se foder, mas agora que estamos aqui…
– Se você mudou de ideia, tudo bem. Não precisamos fazer isso.
Meu coração se debate em meu peito quando respiro depressa. Será que
eu consigo? Será que eu quero? Se não conseguir, será que ainda serei o
homem que Lando quer? Ou será que isto apenas comprova o covarde que
me tornei?
– Covinhas, presta atenção – Lando segura meu rosto com as duas mãos.
– Fazer isso ou não, não tem a ver com mais nada. Você disse que queria,
então, eu dei um jeito. Eu te a…adoro independentemente de você querer
pular de uma ponte comigo ou não.
Solto uma gargalhada diante de sua frase e me rendo ao seu toque
reconfortante. Me pergunto por que ele gaguejou na palavra “adoro”. No
jantar de Natal, Parker havia me dito “este garoto te ama”. Não sei se
acreditei nela, mesmo querendo desesperadamente que fosse verdade. É
cedo demais e uma loucura, mas quero que seja verdade, mais do que
qualquer coisa.
– Vamos lá – digo resolutamente, me afastando do carro e ajeitando os
ombros.
Lando sorri e pega a minha mão, entrelaçando nossos dedos. Ele se
inclina para frente e deposita em meus lábios um beijo que tem gosto de
esperança e possibilidades. Não tenho certeza se ele me ama ou não, mas é
totalmente possível que eu esteja me apaixonando por ele.
De mãos dadas, caminhamos até a pequena construção, para dar entrada e
assinar milhares de termos de responsabilidade.
Logo, voltamos para o lado de fora, desta vez parando em uma pequena
plataforma com arneses nos unindo e nos prendendo à ponte. Meu
estômago revira violentamente, e posso sentir Lando tremendo levemente
encostado a mim, porém, o enorme sorriso em seu rosto me diz que ele não
está reconsiderando. Minha pulsação acelera freneticamente quando nos
aproximamos da beirada com os braços em volta um do outro e os olhares
fixos.
– Pronto? – pergunta Lando e eu assinto, colando nossos lábios e
puxando-o comigo para a beirada.
O ar corre ao nosso redor enquanto disparamos em direção ao chão lá
embaixo, já não tenho mais estômago e meus pulmões esvaziam. Nunca
senti nada parecido na vida: excitante e apavorante ao mesmo tempo.
Porém, não muito diferente de como Lando me faz sentir.
Quando o elástico repuxa e nós quicamos de volta, sinto o peito de Lando
vibrar contra o meu, e a alegria em seu rosto me diz que ele está rindo e,
então, me dou conta de que também estou. Rindo da adrenalina, de alívio
por sobreviver mesmo que o perigo não tenha sido tão real, rindo da
sensação inacreditável de voltar a viver.

Lando

Quando voltamos ao apartamento de Dawson à tarde, é evidente que algo


mudou entre nós. Dawson parece mais animado do que jamais o vi desde
que nos reencontramos e eu estou começando a me permitir ter esperança
de que as coisas vão se ajeitar.
– Com fome? – sinaliza.
– Faminto – respondo sorrindo. Posso não ser nenhum pouco fluente,
mas estou aprendendo mais a cada dia.
Dawson tira uns bifes da geladeira e os coloca no forno. Quando abre a
gaveta de tranqueiras para pegar o timer especial que ele tem – que pisca ao
invés de tocar – lembro-me de ter olhado aqueles papéis ontem. Meu
estômago comprime de culpa, mas minha mente não consegue ignorar as
perguntas.
– Eu não queria bisbilhotar e tal, mas encontrei alguns papéis nessa
gaveta ontem e fiquei me perguntando sobre eles – despejo quando ele se
vira.
Dawson inclina a cabeça e franze a testa. Vou até a gaveta que ele acabou
de abrir e tiro os papéis que encontrei ontem. Dawson arregala os olhos
quando os ergo.

Eles são bem autoexplicativos, não são? – diz por


mensagem.

– Não tenho certeza. – Eu me sento na banqueta da bancada e olho


novamente os papéis. – Este é um procedimento experimental que poderia
te devolver a audição? – pergunto.
Dawson hesita antes de morder o lábio inferior e assentir.

Meu plano de saúde não cobre, já que é experimental. Mas


eu também não tinha certeza se quero fazer isso. É uma
cirurgia cerebral; é assustador pra caralho. Eu prefiro ser
surdo a sair com o cérebro mais lesionado ainda se algo der
errado.

Arregalo os olhos, compreendendo quando leio sua explicação. Pensar no


que poderia dar errado com uma cirurgia cerebral faz minhas mãos suarem
e meu coração bater descompassado. Isso me faz querer pegar Dawson e
protegê-lo de qualquer coisa que possa machucá-lo de novo.
– Entendo. É muito arriscado. Mas se for algo que você queira fazer e
dinheiro seja a única questão, eu pago.
Não é barato. É tipo uns $100 mil, pelo menos – argumenta
Dawson.

– Covinhas, eu torro cem mil num monte de coisas inúteis. Ficaria feliz
em pagar dez vezes isso se você quiser fazer. Pense; a oferta está de pé.
Ele assente novamente e sinaliza “obrigado”.
– De nada – sinalizo e sorrio.
Durante o jantar, resolvo deixar o assunto cirurgia de lado e mudamos
para temas mais casuais. Expus que pagaria se ele algum dia quiser levar
isso adiante, mas, no fim, a decisão é dele.
– Tem algo planejado para a véspera de Ano Novo? Parker vai vir para cá
de novo? – pergunto.
Dawson nega com a cabeça e digita uma resposta.

Acho que não. Não estava planejando nada para esse dia.
Mas, geralmente, tem fogos de artifício à meia-noite que
podemos ver do telhado daqui. Se você quiser, podemos ter
uma noite tranquila e subir para ver os fogos.

– Parece ótimo.
Dawson está com um sorriso tímido no rosto enquanto escreve sua
próxima mensagem.

Você acredita que podemos planejar mais loucuras como o


bungee jumping?

– Com certeza – concordo. – Podemos fazer o que você quiser: pular de


um avião, nadar com tubarões, saltar de um helicóptero e descer uma
montanha de gelo numa prancha.
Dawson arregala os olhos e eu rio.

Acho que é melhor começar só com uma tirolesa ou algo


assim.

– O que você quiser, Covinhas – concordo, puxando-o para mim e


beijando-o com fome e exigência.
Farei o que for para continuar com Dawson: pularia de um prédio ou um
avião. Eu iria com ele para qualquer lugar.
Faixa 26: Lado A
DIGA QUE SE LEMBRA

Dawson

Às vezes, pode parecer que trabalhar num bar é viver um castigo imposto
por um deus grego. Limpei o mesmo ponto no balcão pelo menos umas
vinte vezes em três horas, e sempre volta a sujar. Ao menos, tenho as
lembranças de ontem com Lando para manter minha mente ocupada. Tenho
orgulho de mim mesmo por não fugir do bungee jumping e não quero recair
no conforto de ficar escondido. Quero me arriscar mais, ir atrás da mesma
sensação de quando estávamos pendurados acima do chão com nada além
de um elástico nos impedindo de cair.
Com o ponto limpo – de novo – largo o pano e sondo os clientes para ver
se alguém parece precisar de alguma coisa. Agora, tem uma pessoa
diferente sentada no canto, então, verifico se o papel e a caneta estão no
meu bolso e vou recepcionar o homem.
Ele demora a levantar o olhar quando me aproximo, por isso, levo um
segundo para escrever meu usual “Bem-vindo ao Rodney’s, como posso te
servir?”. E tiro o olhar do papel para colocá-lo na frente do homem. Nisso,
vejo um rosto conhecido sorrindo para mim.
Meu estômago aperta e meu sangue congela. Eric Hansen, meu arqui-
inimigo da faculdade. Fazíamos as mesmas aulas, sempre competindo pelas
melhores notas ou elogios pela nossa escrita. Claro que eu esbarraria nele
de novo enquanto trabalhasse num bar.
Tento ser discreto ao avaliá-lo: um bom terno, corte de cabelo caro,
sorriso branco perolado. Alguém se deu bem.
– Puta merda, Dawson Hayes? Como você está? – diz ele com um sorriso
largo.
Cerro o maxilar e forço um sorriso para combinar com o dele. Aponto
para meu ouvido e balanço a cabeça negativamente. Seu sorriso fraqueja.
– Você está surdo? – indaga, evidentemente surpreso, pelo jeito que suas
sobrancelhas desaparecem na raiz dos seus cabelos.
Assinto e viro uma folha nova de papel.

Sim, tive um acidente logo depois da formatura. O que você vai


querer? – Passo o papel para ele, que o lê com os olhos arregalados.

– Você lê lábios? – quer saber e eu assinto. – Sinto muito. Só estou


surpreso por te ver aqui. Não fazia ideia de que você morava na Flórida.
Você ainda escreve?
Gesticulo um “mais ou menos” e posiciono a caneta no papel para lhe dar
a dica de que ainda estou esperando para anotar seu pedido.
– Você sempre foi um escritor do caralho. Não tão bom quanto eu,
logicamente – declara ele com um sorriso presunçoso. – Você não vai
acreditar. Fui a um encontro com uma mulher tem umas semanas, e
acontece que ela é autora de romances. Você sabe… desse tipo que escreve
meia dúzia de livros por ano com completas baboseiras. Quando falei para
ela que eu tinha me formado em literatura, ela começou a me perguntar por
que eu não havia escrito nenhum livro, e eu falei que a literatura de verdade
leva tempo.
Agarro a caneta com força e faço o possível para resistir ao impulso de
enfiá-la no olho dele. Minha memória não lhe fazia justiça. Pelo menos,
essa mulher conseguia colocar palavras no papel. Foda-se se são boas ou
não, mas o gênero não faz diferença. Claramente, ela é uma escritora mais
ambiciosa do que Eric ou eu. A esta altura, eu ficaria feliz em conseguir
colocar palavras no papel em qualquer merda de gênero. Pelo menos,
algumas coisas nunca mudam; Eric é um cuzão tão arrogante quanto eu
lembrava.
– Pode me trazer uma cerveja? – pede, finalmente, e eu suspiro aliviado e
assinto.
Sem dúvida nenhuma Eric é um babaca arrogante, mas vê-lo traz à tona o
peso intenso de fracassar. Minha vida nunca deveria ter sido assim. Talvez
eu devesse ter entrado naquele avião quando Lando propôs…
Travo enquanto sirvo a cerveja de Eric. Quando Lando propôs. Ele me
chamou para ir com ele para Nova Iorque. Eu me lembro.

Lando

A porta dos fundos do bar se abre e Dawson sai voando, como um


morcego saindo do inferno, dois minutos depois do final do seu turno.
Sorrio e me inclino para abrir a porta do carona para ele. Quando ele se
senta, sinto uma energia palpável saindo dele. Ele se vira para mim com um
sorriso, seus olhos brilham à luz do luar.
– Eu me lembro – diz ele. Eu paro de repente, meu coração dispara e uma
alegria cautelosa brota na boca do meu estômago.
– Lembra? – repito, contente por ele não poder ouvir minha voz
falhando. Ele assente animado e pega o celular. Ele deve ter digitado
previamente uma mensagem para mim porque só aperta o “enviar” e uma
mensagem longa aparece no meu celular.

Não me lembro de tudo, mas me lembro do último dia. Você


me pediu para ir para Nova Iorque com você e eu quis tanto
dizer que sim. Quase concordei, e queria ter concordado. Eu
deveria estar com você, não definhando aqui. Desta vez, vou
tomar a decisão correta, se não for tarde demais…

Minha garganta seca enquanto leio a mensagem e a alegria cautelosa se


transforma num jardim pleno de êxtase.
– Nunca é tarde demais. Por favor, vamos para Nova Iorque? Diga que
você vai.
– Vou.
Agarro Dawson e o arrasto pelo painel até o meu colo, os dois rindo.
Seus lábios encontram os meus e ele tem gosto de esperança e felicidade
quando sua língua desliza pela minha, quente e cheia de entusiasmo. Seu
gemido vibra dentro da minha boca quando agarro sua bunda e o puxo mais
para perto.
Caralho, esperava tanto conseguir convencê-lo a vir comigo para Nova
Iorque. Mas, depois daquela merda do vazamento das nossas mensagens,
uma grande parte de mim achava que o destino iria foder comigo pela
segunda vez.
A bunda dele toca a buzina e me assusta, me fazendo rir. Dawson inclina
a cabeça para mim.
– Você apertou a buzina com a bunda – explico.
– Isso é um eufemismo? – pergunta e eu gargalho.
– É, vamos voltar para o seu apartamento para eu poder te mostrar.

Dawson

Todo o tempo que passei nos últimos dois dias me perguntando se


conseguiria viver com a mídia na minha cola e nunca me fiz a pergunta
mais importante: eu consigo viver sem o Lando? Porque essa é a verdadeira
escolha aqui: lidar com a mídia ou desistir de Lando para sempre. Sei que
ele disse que desistiria da banda se eu pedisse, que viria morar aqui comigo.
Mas nada disso o faria feliz e, sinceramente, também não me faria feliz.
Eu me deixei hibernar aqui por nove anos, está na hora de acordar. Está
na hora de arriscar.
Nossos lábios se movimentam juntos com fome e desespero enquanto
Lando me leva para o quarto.
Ele resmunga alguma coisa contra meus lábios e eu recuo, para ele poder
repetir.
– É pra valer? Você vai morar comigo? – Seus olhos estão cheios de
esperança e insegurança, o que me faz querer beijá-lo até que ele acredite
que vamos fazer dar certo desta vez.
– É pra valer – garanto-lhe, tomando seus lábios novamente. – Nós
somos pra valer – murmuro em sua boca, e seu corpo estremece contra o
meu, como se ele estivesse tão cheio de felicidade que fosse explodir. E
acho que talvez eu também esteja.
As lembranças da última vez que tinha visto Lando não são
particularmente agradáveis, mas, mesmo assim, seguro-as com força em
meu coração como se fossem pedras preciosas. Eu me lembro dele. Lembro
como foi vê-lo ir embora e saber que eu estava fazendo a escolha errada.
Não farei a escolha errada outra vez em relação a Lando. Para onde ele for,
eu vou.
Para variar, despimos um ao outro devagar, nossos lábios se
movimentando numa dança doce que fala de algo muito mais profundo que
nenhum dos dois parece pronto para colocar em palavras.
Lando alcança a mesa de cabeceira para pegar os preservativos e o
lubrificante, depois fica de lado, de costas para mim. Ele olha para mim por
sobre o ombro com um sorriso sedutor que faz meu sangue ferver.
– Assim? – pergunta, e eu concordo.
Espremo o lubrificante em meus dedos e jogo o tubo de lado. Deslizo
meus dedos lambuzados na abertura de Lando e passo os lábios pelo seu
ombro e nuca, salpicando-o de beijos: beijinhos rápidos e uma doce e lenta
exploração. Lando está com os lábios entreabertos e as vibrações que sinto
com suas costas pressionadas ao meu peito me dizem que ele está fazendo
barulhinhos deliciosos.
Meto dois dedos dentro dele, que vira a cabeça para que nossas bocas se
encontrem. Movo a minha mão livre para o seu peito para poder sentir seu
coração batendo acelerado quando meus dedos encostam em sua próstata.
Sua cabeça cai para trás em meu ombro e eu abocanho o ponto de pulso em
seu pescoço.
Com sua cabeça para trás, posso ler a súplica “por favor” saindo de seus
lábios repetidamente. Seu corpo treme quando meto meus dedos mais
profundamente, não apenas abrindo-o, mas provocando-o, dando-lhe prazer.
Seu peito arfa ofegante, seu semblante está cheio de prazer agonizante. Meu
pau flexiona contra sua bunda e, com a minha mão livre, coloco a
camisinha, tiro os dedos e encosto a cabeça da minha ereção à sua abertura
quente.
Lando agarra meu quadril, me puxando e me incitando a acelerar. Eu rio
baixo e dou outro beijo em seu ombro. Cacete, estou tão apaixonado por
este homem.
Meto com uma estocada suave. Lando trava, seu canal me prende como
uma prensa. Ele vira a cabeça e meus lábios encontram os dele. O beijo fica
desajeitado quando Lando relaxa o bastante para que eu volte a me mexer
dentro dele. Ainda assim, nossos lábios permanecem grudados, nossas
pernas enroladas enquanto meto nele, enterrando bem fundo.
Não tenho certeza se são horas ou minutos de uma linda tortura enquanto
nos movimentamos juntos, banhados pela luz do luar e doloridos, à beira de
tanto prazer, mas sem querer terminar o momento e nos afastar.
A respiração de Lando falha e um rubor intenso se espalha pela sua pele
desde o pescoço até seus pés. Seu corpo tensiona e estremece, seus olhos
fechados se agitam pouco antes de seus músculos internos apertados se
fecharem em volta do meu pau numa onda lenta. Gotas grossas de esperma
respingam na sua barriga e no meu edredom. Cravo os dedos em seus
quadris enquanto ele me dá um orgasmo, extraindo meu prazer lá do fundo
e me deixando tonto quando meu saco comprime e eu bombeio minha porra
dentro dele.
Faixa 27: Lado B
A ESCOLHA ERRADA

Dawson

A agitação do aeroporto não invadiu nossa bolha quando nos vimos presos
num momento interminável de desespero. Parecia que o tempo tinha sido
dividido em dois, criando um nítido “antes e depois”. Será que sempre
usaríamos este final de semana como um marco em nossas vidas?
Lando estava com as mãos firmes em meus braços, como se tivesse medo
de que, assim que deixasse de me tocar, tudo terminaria. Ele estava certo:
nós dois sabíamos que os segundos estavam se esgotando.
– Você tem o meu número salvo no seu telefone? – verificou mais uma
vez, e eu lhe ofereci um sorriso triste.
– Sim, tenho. Vou te ligar hoje à noite, aí, você terá o meu, e vou saber
que você está são e salvo em Nova Iorque. Isso não é um adeus, certo? Você
prometeu que não era um adeus.
– Não é um adeus – assentiu ele, me abraçando pela cintura e me
puxando para si. Sua barba pinicou meu queixo e meu rosto quando seus
lábios encontraram os meus. Eu não queria perder nenhum segundo deste
momento. Não tinha certeza se estávamos simplesmente sendo envolvidos
pelos hormônios e pelo romance do final de semana ou se tínhamos um
futuro de verdade. Seja como for, queria nunca esquecer o jeito que Lando
me fez sentir.
– Isso é uma merda – falei rindo quando desgrudamos nossos lábios.
– É mesmo – concordou. Anunciaram o embarque do voo dele no alto-
falante e nós ficamos tensos. – Vem comigo – disparou.
– Hã?
– Vem para Nova Iorque. Não tem nada que te prenda na Flórida, não é?
Você pode procurar emprego em Nova Iorque, pode escrever, e podemos
ver onde isso vai dar.
Meu coração gritava “sim, sim, sim”. Era uma loucura, impulsivo, e eu
queria demais responder sim.
– Eu… não posso – respondi, as palavras pareceram erradas quando as
pronunciei. – Talvez em seis meses ou em um ano quando nos conhecermos
melhor? – Não sabia por que falei isso. Eu não tinha medo de nada, e essa
proposta nada mais era do que uma aventura excitante. O que eu tinha a
perder? Mas eu não consegui mudar minha resposta.
Coloquei minha mão no peito de Lando e senti seu coração batendo
freneticamente.
– Covinhas, eu…
– Shh – cobri sua boca com a minha mão. – Isso não é um adeus – repeti.
Ele assentiu, mesmo seus olhos não tendo mais tanta certeza disso. Ele
encostou os lábios delicadamente na palma da minha mão, que ainda cobria
sua boca, e eu sorri.
– Faça uma boa viagem. Nós nos veremos de novo antes mesmo de
termos a chance de sentirmos saudades – blefei.
– Obrigado pelo melhor final de semana da minha vida. Até logo.
Conforme ele se afastava, meu coração não parava de exigir que eu
corresse atrás dele, mas meu cérebro me manteve firme no lugar,
observando ele desaparecer na multidão.
Faixa 28: Lado A
O MELHOR ANO ATÉ AGORA

Lando

Ficar sentado no sofá com os pés de Dawson no meu colo e a televisão


ligada ao fundo, enquanto ele me ajuda a compor uma música nova, é
melhor do que qualquer outra véspera de Ano Novo que já tive. No ano
passado, tive que lidar com o mau humor de Lincoln, Jude pegando um
garoto de programa e Benji fingindo desesperadamente que foi isso o que
ele imaginou quando sonhou em ser uma estrela do rock.
Dawson deu um puxão de leve na minha barba para chamar minha
atenção, então me dei conta de que o estive encarando em vez de prestar
atenção às frases que ele tentava riscar na minha música.
Ele bate a caneta no papel de novo e, desta vez, olho para ver o que ele
escreveu ao lado da linha que eu tinha escrito. Ele tem razão, as palavras
dele ficam muito melhor.
Assinto e pego a caneta dele para riscar minha frase original. Depois,
cantarolo o que tínhamos até agora para sentir como a letra vai fluir. Pego
Dawson observando melancolicamente e dou um beijo em sua têmpora.
Prometi que não iria pressionar nada em relação à cirurgia. Seja o que ele
decidir, eu não me importo. Eu o amo exatamente como ele é e, se ele
quiser fazer a cirurgia, vou amá-lo da mesma forma.
Quando termino de cantarolar, escrevo mais algumas frases e Dawson
continua a riscar e substituir palavras. Eu rio, mas ele tem razão. Ele tem
mesmo o dom da palavra, mais ainda do que eu.
– Você deveria voltar a escrever – incentivo. Dawson dá de ombros e se
concentra no trabalho que está fazendo. Talvez a mudança de cenário
quando ele for morar comigo desperte alguma coisa nele. Ele tem palavras
para compartilhar com o mundo. E isso é algo sobre o qual vou pressionar e
me intrometer com prazer.
Quando terminamos a música, Dawson escreve um título na parte de
cima: O Melhor Ano Até Agora.
– Gostei – sinalizo e o beijo.
Quando ele se afasta, bate no pulso para indicar a hora e aponta para
cima.
Olho o relógio e é quase meia-noite, então, assinto. Pegamos alguns
cobertores e travesseiros e subimos para o terraço.
Ficamos sentados no terraço do condomínio de Dawson, dividindo um
cobertor sobre os nossos ombros. Comparado aos invernos de Nova Iorque,
isto é maravilhoso, mas Dawson treme levemente ao meu lado.
Olho o relógio no meu pulso e Dawson bate na minha mão para que eu
lhe mostre a hora. Ele sorri largamente e inclina a cabeça para trás, olhando
para o céu com expectativa.
Eu me aconchego a ele e enterro o nariz na lateral do seu pescoço,
roçando para que seu cheiro me preencha.
Ele pega seu celular do chão ao seu lado e digita alguma coisa. Alguns
segundos depois, meu celular vibra e eu sorrio.

Isso é bom. A véspera de Ano Novo é minha data preferida –


diz a mensagem.

Por quê?

Parece um quadro em branco. É uma nova oportunidade de


começar de novo e fazer do próximo ano o melhor de todos.

Concordo com um movimento de cabeça e dou um beijo em seu rosto.


Este será o melhor ano, agora que tenho Dawson de volta à minha vida. Ele
vai para Nova Iorque e vamos construir a vida que nos pertence.
Toco seu ombro para que ele olhe para mim, e minha mão treme
enquanto a ergo fazendo o sinal recentemente aprendido. Surpreso, Dawson
arregala os olhos e coloca uma mão sobre o peito, como se precisasse
conter as batidas do seu coração. Então, ele retribui o gesto e eu rio de
alívio.
Agarro Dawson e o abraço. Ele estende a mão e bate em meus lábios com
o indicador, com um pedido em seu olhar.
– Eu amo você – digo para ele em voz alta desta vez, seus olhos se fixam
em meus lábios como se ele quisesse memorizar o formato deles quando lhe
entreguei meu coração.
– Eu amo você – diz ele com sua voz linda e rouca.
Ele roça os lábios nos meus e meu coração dispara, seu gosto na minha
língua é como uma droga. Enrosco meus dedos em seus cachos
despenteados, e ele geme na minha boca até a explosão brilhante de um
fogo de artifício atrair nossa atenção de volta para o céu.
– Feliz Ano Novo – sinalizo do jeito que ele me mostrou. Dawson ri e
sinaliza a mesma coisa.
Ele sobe no meu colo e eu sorrio enquanto o observo digitar em seu
calendário “Lando disse que me ama” no dia primeiro de janeiro.

Dawson

Aconchegados debaixo das cobertas, de manhã cedo no primeiro dia do


ano, leio o registro que inseri ontem à noite. Lando me ama. Pode ter sido
irresponsável e rápido demais, mas não estou nem aí. Quero pular do
penhasco e ver se conseguimos voar.
Infelizmente, pular de um penhasco é bem menos intimidante do que
contar à minha irmã que vou me mudar para Nova Iorque… em breve. Eu
deveria perguntar a Lando quando exatamente nós vamos. Preciso encerrar
meu contrato de aluguel, arrumar as minhas coisas, pedir demissão do meu
emprego… merda, provavelmente encontrar um novo.
As mãos de Lando estão na minha cintura, me virando antes que eu possa
protestar.
– O que houve? – pergunta quando olho para ele.
– A mudança.
– Está pensando em desistir? – indaga ele e, embora não consiga ouvi-lo,
tenho certeza de que há medo em sua voz, talvez até tremor.
– Não. – Balanço a cabeça depressa e dou um beijo nele. – Muita coisa
para fazer – digo para me explicar.
– Eu vou te ajudar. Faremos uma lista quando nos levantarmos.
– Preciso contar à Parker.
– Merda, é mesmo – concorda. – Quer convidá-la para jantar e contamos
juntos?
Concordo e o abraço.

Enxugo minhas mãos suadas na calça jeans e abro a porta para receber
Parker.
– Feliz Ano Novo – sinaliza ela antes de me abraçar.
Dou um tapinha em suas costas e aproveito a sensação por um momento.
Quando me mudar, com que frequência poderei ver minha irmã? Talvez
possamos fazer chamadas de vídeo semanais?
Quando me solta, Parker cumprimenta Lando com um sorriso forçado.
Bem, o que vou contar a ela durante o jantar com certeza não vai fazê-la
gostar mais dele.
Ofereço uma bebida e, então, nós três nos sentamos na sala. Baseado na
linguagem corporal tensa de Lando e Parker, suponho que paira um silêncio
constrangedor no ar. Ei, ser surdo tem um lado bom: não há nada parecido
com silêncios constrangedores. Mas estes devaneios terão que esperar.
Neste exato momento, preciso me vestir de adulto e contar à minha irmã
que vou me mudar para cerca de dois mil quilômetros de distância. E, além
disso, provavelmente vou viajar com frequência nas turnês com o Lando,
então, quem sabe onde estarei metade do tempo?
Lando começa a contar a Parker sobre o bungee jumping e ela arregala os
olhos, seu olhar se volta para mim com surpresa.
– Você pulou de uma ponte?
Lanço um sorriso de nervoso e assinto. Tenho certeza de que ela tem uma
opinião sobre este tipo de atividade. Em vez de um sermão, ela se levanta e
me dá outro abraço.
– Estou orgulhosa de você – diz ela, e eu fico incrédulo.
– Está? Pensei que ficaria chateada.
– Como vou ficar chateada com você voltando a viver? Amo cada versão
sua, mas meio que senti falta do meu irmão cabeça-dura e impulsivo.
Olho para Lando buscando uma orientação em como responder, mas seu
semblante é um vazio. Ah, foi demais para ele acompanhar essa conversa
em sinais.
– Vou me mudar para Nova Iorque – deixo escapar. Dá para deixar
escapar alguma coisa em linguagem de sinais? Mas foi o que pareceu.
Parker recua como se eu tivesse esbofeteado ela.
– Você vai o quê? – questiona ela e eu estremeço.
– Você está gritando?
Ela fecha os olhos e esfrega a testa, e eu espero que ela se acalme. Olho
mais uma vez para Lando, que está olhando entre minha irmã e eu como se
não conseguisse decidir se deve ou não se envolver. Balanço levemente a
cabeça para ele e lhe ofereço um sorriso tranquilizador.
Quando Parker volta a abrir os olhos, eles mostram mais uma tristeza
conformada do que raiva ou surpresa.
– Vai mesmo se mudar? Você mal conhece este cara.
– Não posso explicar, mas parece o certo. O que eu tenho a perder? Um
emprego de merda? Uma merda de apartamento? Se as coisas derem
errado, eu volto. Mas não enxergo isso acabando. Ele é o cara certo; posso
sentir.
Ela revira os olhos e balança a cabeça, depois respira fundo.
– Não sei em que momento você subitamente se tornou um romântico
incurável. Mas não vejo como te convencer a não fazer isso. Só saiba que
estou aqui sempre que precisar voltar para casa. E vou bater nele, por via
das dúvidas, se ele te machucar.
– Obrigado, mana.
Ela acena em resposta.
– Já contou para a mamãe? – pergunta ela depois de um minuto.
– Vou mandar mensagem para ela hoje à noite. Duvido que ela dê muita
importância. Não é como se passássemos muito tempo juntos.
– Verdade.
Depois de mais um abraço, Parker diz a Lando a mesma coisa que me
disse sobre bater nele e ele garante a ela que não fará nada que mereça isso.
Acesso a lista de tarefas que fiz no meu celular e risco “contar a Parker”.
Agora, só tenho que pedir demissão, encerrar o contrato de aluguel e
empacotar minhas coisas.
Lando me disse que não precisamos estar em Nova Iorque até o final de
fevereiro, já que é quando eles terão que estar prontos para assinar ou não
um novo contrato. Mas, agora que eu decidi me mudar, estou ansioso para
dar este passo, seguir em frente e começar uma nova aventura.
Algumas horas depois que Parker foi embora, Lando e eu nos deitamos
agarradinhos no sofá. Lando dá um tapinha no meu ombro e eu inclino a
cabeça para ver o que ele quer falar.
– Quero fazer uma tatuagem.
Considero pegar meu celular da mesa para digitar a pergunta, mas decido
que não quero me incomodar.
– O que você quer fazer?
– Quero que você escolha alguma coisa para mim. Uma de suas citações
favoritas.
Arregalo os olhos. Lando quer tatuar uma das minhas citações favoritas?
– Parece um grande comprometimento. E se você odiar a citação e nós
terminarmos?
– Eu não vou odiar e nós não vamos terminar.
– Tudo bem, vou pensar. Escolher uma citação para o meu próprio corpo
é uma coisa, escolher para outra pessoa é completamente diferente.
Lando assente com firmeza e puxa minha cabeça para seu peito,
encerrando efetivamente a conversa.
Faixa 29: Lado A
SONHANDO EM NOVA IORQUE

Dawson

Duas semanas depois de contar a Parker que iria me mudar, estávamos


desembarcando de um avião no aeroporto JFK, na cidade de Nova Iorque.
Foi deprimentemente indolor me demitir e encerrar meu contrato de
aluguel. A não ser por Parker, foi fácil demais pegar minhas coisas e deixar
o lugar que chamei de lar durante praticamente a minha vida inteira.
Lando pega na minha mão e eu entrelaço nossos dedos.
– Pronto? – sinaliza Lando depois de pegarmos nossas malas da esteira
de bagagens. Ele me convenceu a empacotar e despachar a maioria das
minhas coisas, então, só tive que trazer uma malinha de roupas para os
próximos dias até o resto das minhas coisas chegarem.
– Pronto – concordo.
Até onde me lembro, nunca estive em Nova Iorque. Pelo que fiquei
sabendo durante o último mês, tenho certeza de que houve um tempo em
que eu teria ficado bem animado em experienciar tudo o que Nova Iorque
tem a oferecer. Neste momento, só o que sinto é um pouco de náusea. As
palavras “Nova Iorque” no meu calendário não capturaram de forma
alguma a realidade do quanto isso é significativo. Mas, quando Lando
aperta minha mão, sei que estou pronto para esse novo capítulo.
Quando saímos do aeroporto, espero ter que acenar para um táxi ou
talvez chamar um Uber. Em vez disso, nós nos deparamos com alguém que
Lando parece conhecer, que nos conduz a um SUV preto com insulfilm bem
escuro nos vidros.
– Este é o meu motorista, Remy – diz Lando para mim, e Remy me
estende sua mão. O homem me surpreende ao sinalizar “olá” depois de
apertar minha mão.
– Muito prazer – sinalizo, e Remy cora.
– Desculpe, só aprendi um ou dois sinais antes de vir buscá-los. Mas vou
aprender mais, prometo.
Ele aprendeu linguagem de sinais por minha causa?
Lando coloca um braço em meus ombros e me dá um beijo no alto da
cabeça. Depois, me leva para dentro do carro.
A cidade passa num borrão de pessoas e edifícios pelo vidro escuro.
Lando e Remy parecem conversar, mas eu não me incomodo em tentar
acompanhar. Pelo contrário, me contento em deitar a cabeça no ombro de
Lando e observar a cidade passando.
E me pergunto como seria se tivesse vindo da primeira vez em que Lando
me convidou. Será que teria dado certo naquela época ou éramos jovens e
imaturos demais para fazer dar certo?
O carro para em frente a um prédio alto e brilhante, Lando dá outro
apertão na minha mão.
– Lar doce lar.
Pisco para o prédio quando saímos do carro. É… intimidante. Um
porteiro abre a porta para o saguão opulento do prédio e eu começo a pensar
que posso estar me metendo em alguma encrenca aqui.
As portas do elevador se abrem dentro da cobertura de Lando, e eu me
engasgo. Não tenho certeza do que tinha imaginado, mas… puta merda.
Dava para colocar três do meu apartamento dentro deste lugar.
– Uau – murmuro. Posso sentir Lando atrás de mim enquanto observo as
janelas de parede inteira, o mobiliário caro, dispositivos chamativos.
Quando eu finalmente me viro para ele com os olhos arregalados, ele me
oferece um sorriso tímido e acaricia a barba.
– Sei que é muito frio e impessoal. Podemos decorar juntos, do jeito que
você quiser.
Eu sabia que Lando era rico, mas era algo abstrato antes, como o
tamanho do sol: você sabe que é gigantesco, mas nunca pensa sobre isso
porque não é relevante para a sua vida. Agora que está aqui na minha cara,
não sei o que fazer.
Já faz semanas desde que olhei para Lando e o vi como uma estrela do
rock. Mas, aqui na casa dele, com a evidência de sua riqueza e fama por
todo o canto, fica difícil não pensar sobre isso.
– Ei. – Lando para na minha frente, me encarando. – Essas coisas não me
definem. A pessoa com quem você conviveu neste último mês, este sou eu.
Por favor, não deixe que isto mude a maneira como você me vê.
Identifico um medo real nos olhos de Lando, e isso me tira da minha
análise atordoada do seu apartamento.

Só fiquei surpreso. Está tudo bem – digito para tranquilizá-lo


assim que me recupero.

Ele me mostra o lugar e basta eu entrar no banheiro para eu me


acostumar. Tem uma banheira de hidromassagem enorme e um chuveiro
com seis duchas. Seu quarto – nosso quarto – também me deixa babando
com uma cama king-size macia o bastante para me afundar nela e lençóis
que devem ter aproximadamente um bilhão de fios. São macios demais,
parecem manteiga na minha pele quando subo nela para experimentar.
Lando sobe na cama ao meu lado e sorri.
– Gostou?
Assinto e inclino a cabeça pedindo um beijo, que ele me dá prontamente.
Não sei o que eu fiz de certo em uma vida passada para agora estar me
pegando com uma estrela do rock numa cama que deve custar cerca de dez
mil dólares, mas só quero agradecer e aproveitar.

Lando

Quando voltamos para a sala depois de ele me mostrar o apartamento,


avisto meu baixo no suporte ao lado do sofá. Meus dedos coçam para tocar
outra vez. Acho que nunca fiquei um mês sem tocar desde que aprendi.
– Vem aqui – eu me sento e mostro meu colo. Dawson se senta sem
hesitar. Eu o ajeito para que tenha bastante espaço para o meu baixo, depois
o pego do suporte. Dawson inclina a cabeça com curiosidade. Posiciono
uma das suas mãos no baixo e coloco a outra no meu pescoço, então,
começo a tocar. Sei que não é a mesma coisa do que ser capaz de escutar as
músicas que escrevi para ele, mas quero que ele seja capaz de sentir a
música e saber que é para ele.
Dawson observa meus lábios atentamente enquanto canto a música nova
que compus para ele chamada “Destinados”.
Ao longo dos anos, compus muitas músicas para ele, mas, de todas, esta é
a minha preferida. As outras eram feitas de sonhos, esta é pura esperança.
Dawson sorri ao mesmo tempo em que algumas lágrimas escapam e
escorrem pelo seu rosto. Continuo dedilhando, mas paro de cantar para
beijar suas lágrimas.
Quando termino, Dawson sinaliza algo que ainda não aprendi. Ele ri
diante da minha expressão confusa e se compadece de mim.
– É linda – diz ele, fazendo o sinal novamente para que eu tente
memorizá-lo.
– Você é lindo e perfeito, e eu te amo. – Coloco meu baixo de lado e
beijo Dawson até ficarmos sem ar.
– Tatuagem – murmura Dawson contra meus lábios quando consigo abrir
o botão de sua calça.
– Porra – murmuro. Ele tem razão, se começarmos agora, iremos nos
atrasar para o meu compromisso. Depois que mencionei para Dawson que
queria fazer uma tatuagem, levei o assunto ao Benji numa conversa por
mensagens de texto para pedir uma recomendação de profissional. Ele me
disse que traria seu novo melhor amigo tatuador de Seattle. Falei que era
loucura e sua resposta foi: Para que ser um milionário se não pode gastar
dinheiro trazendo especialistas para cada coisinha que se quer?
Dawson sai do meu colo e geme quando coloca a mão dentro da calça
para ajeitar sua ereção. Depois, ele tira o celular do bolso e me envia uma
mensagem.

Vamos, Benji trouxe o cara para fazer sua tatuagem. Não


podemos fazer desfeita. Embora, se mudar de ideia quanto à
citação, eu vou entender.

– Não mudei de ideia coisa nenhuma, Covinhas. Só me distraí com os


nossos corpos ficarem tão bem juntos.
Nós moramos juntos agora; temos o resto das nossas vidas
para ficarmos enroladinhos um no outro.

– Nós moramos mesmo juntos – concordo, o calor transbordando nas


minhas veias.
Benji mora a apenas uma quadra de distância, então, assim que nos
recompomos, Dawson e eu caminhamos para o prédio de Benji.
Cumprimento o porteiro de Benji, e Dawson olha novamente com
surpresa pelo saguão do prédio. Ele vai se acostumar a ver o que o dinheiro
pode comprar, o que o resto de nós tem.
Assim como no meu prédio, o elevador abre dentro da cobertura de
Benji. O som de música e de risadas nos saúdam quando as portas revelam
o local. Benji é nosso tecladista, mas ele toca praticamente qualquer
instrumento que for colocado na frente dele, e parece que neste exato
momento ele está curtindo a cítara que comprou há alguns anos.
De nós quatro, acho que Benji é o único que realmente aproveita o que
todo esse dinheiro possibilita. Não que ele não tenha controle, mas ele é…
feliz, como o resto de nós não tem sido.
Fiquei surpreso quando conversei com Benji e ele me contou que já
estava voltando para a cidade. Não sei dizer se isso significa que ele não
conseguiu se resolver com quem quer que estivesse de olho. Considerando
que ele nunca me contou quem era, nem consigo imaginar.
– Lando, chega aí. Preciso de vocal – grita Benji, e eu rio.
Dawson olha em volta com os olhos arregalados. Comparado ao meu
apartamento, a casa de Benji parece um mundo completamente diferente.
Ele adora colecionar coisas: máscaras tribais, livros, instrumentos, arte,
esculturas… seu apartamento parece a junção de um museu com a casa dos
sonhos de um acumulador. Presumo que não me surpreenda que ele goste
de colecionar pessoas também. Em todos os lugares aonde vamos, ele
sempre encontra pessoas que tem que conhecer: chefs, maquiadores,
tatuadores. Ele adora se gabar sobre conhecer os melhores em todos os
negócios e ter cada um deles na discagem rápida para quando chegar o
momento. E é por isso que não fiquei totalmente surpreso por ele insistir em
deslocar de outro estado um tatuador para fazer uma tatuagem simples em
mim, em vez de apenas indicar quem, nesta cidade, faria um bom trabalho.
Coloco a mão no ombro de Dawson e o conduzo pelo corredor, seguindo
o som da música e das vozes até o estúdio de Benji. Dou uma espiada lá
dentro e vejo Benji no chão com sua cítara, como esperado, e um homem
tatuado encostado na parede, observando Benji tocar com alegria em seus
olhos. Mal reconheço o homem do show secreto que fizemos em Las Vegas
no ano passado. Benji havia visto o homem e seus amigos em meio ao
público e adorou suas tatuagens. Então, ele mandou um dos seguranças
trazê-los ao camarim depois do show.
– E aí – cumprimenta o homem quando nos vê na porta. – Lando, certo?
– Sim. Desculpe, esqueci completamente seu nome.
– Royal. – Ele estende a mão.
– E este é Dawson – apresento-o aos dois.
– Finalmente você vai parar de se lamentar por causa deste cara – brinca
Benji, e Dawson me olha de lado com um sorriso travesso.
– Eu não ficava me lamentando – digo para Dawson.
– Claro – sinaliza ele, o sarcasmo estampado em sua expressão.
Benji pousa o instrumento e se levanta, alisando a calça.
– Olha o que Royal fez para mim hoje de manhã, antes de vocês
chegarem – mostra Benji, levantando a camisa, depois se vira para que eu
veja uma tatuagem enorme cobrindo suas costas. Parece um campo cheio de
flores silvestres.
– Uau, está incrível. Fico feliz que você tenha feito um trabalho de
verdade, porque eu estava me sentindo bem idiota por te fazer cruzar o país
só para tatuar uma citação em mim.
– Mesmo que fosse só a citação, eu não reclamaria. Só de Benji ter me
trazido aqui junto com meus parceiros num voo particular para passar o
final de semana… Foda demais. Devo ter feito a oração certa para ter me
aproximado do Benji, dou graças por isso.
– Você é talentoso pra caralho, não precisa de oração – garante-lhe Benji.
– Benji me deixou arrumar minhas coisas na sala, então, por que não vem
comigo para escolher uma fonte e começar essa tatuagem?
Royal me mostra um site para escolher uma fonte, em seguida, imprime a
frase em um papel de transferência.
– Você é virgem, certo? – pergunta ele quando dou um pulo com o
esguicho de um pouco de antisséptico com cheiro de menta no meu
antebraço.
– Ah…
– Virgem de tatuagem – esclarece Royal com um sorriso malicioso. Benji
solta uma gargalhada de onde está, no sofá ao lado de Dawson.
– Sim, primeira tatuagem – concordo.
– Não se preocupe; você está em boas mãos.
Ele aplica a citação na minha pele, pressionando o papel para obter um
contorno sólido fixado e, quando levanta o papel, inclino a cabeça para
admirá-la.
Sejam as almas feitas do que forem, a dele e a minha são iguais.
– Essa frase é de algum lugar? – pergunta Royal.
– O Morro dos Ventos Uivantes. Dawson escolheu – explico, acenando
para ele.
Royal olha para Dawson e sorri.
– Diz para ele não foder com tudo – sinaliza Dawson para mim e dá uma
piscadinha. Fico emocionado ao perceber que entendi a frase inteira
enquanto a repassava para Royal.
– Farei o meu melhor – brinca Royal. – Como tatuador, sou obrigado a te
avisar sobre o perigo de fazer uma tatuagem para alguém que está
namorando. É de conhecimento geral que tatuagens de casal são
amaldiçoadas.
– Não estou preocupado com isso – falo, e abaixo a cabeça para que
Dawson não possa ler meus lábios. – Eu vou me casar com ele assim que eu
tiver certeza de que o pedido não vai fazê-lo surtar.
Royal gargalha.
– Parabéns, cara. Neste caso, vamos te marcar para o seu homem.
A tatuagem é rápida e, quando termina, eu me deleito com uma sensação
de retidão, tendo, em meu corpo, palavras que Dawson ama. Talvez, algum
dia, eu tenha uma citação original dele na minha pele.
Agradeço a Royal e lhe dou uma gorjeta generosa, mesmo tendo certeza
de que Benji já lhe pagou uma quantia obscena.
– Devemos ir para a boate mais tarde; me diga se quiser nos encontrar lá
– propõe Benji, me dando um tapinha no ombro. – Tenho que oferecer uma
diversão ao meu novo melhor amigo e a seus homens enquanto eles estão
aqui, para que voltem muitas vezes para alimentar meu vício em tatuagem.
– Logo, logo você vai ficar sem espaço na pele – alerto Benji. Royal se
engasga, colocando uma mão sobre o coração.
– Isso é uma blasfêmia – declara Royal dramaticamente.
– Dá para ver por que Benji se apegou a você tão rápido – rio.
– O que você acha? – pergunto a Dawson. Boates não parecem ser a praia
dele, mas não quero presumir nada.
Dawson dá de ombros.
– Decidimos mais tarde? – sinaliza ele e eu concordo com um
movimento de cabeça.
– Eu te ligo se decidirmos sair mais tarde. Mas, agora, Dawson e eu
temos uns negócios inacabados no meu apartamento.
Benji e Royal assobiam para nós dois quando arrasto Dawson para fora
com um sorriso.
Faixa 30: Lado A
JÁ ERA HORA

Dawson

Através da janela gigantesca, com uma xícara de café em minhas mãos,


observo a cidade passando lá embaixo. Será que alguma dessas pessoas
sabe o quanto a vida é frágil? Talvez seja melhor não saberem. Eu estava
melhor antes, quando achava que era invencível. Queria ainda ser a pessoa
destemida de quem Lando se lembra quando olha para mim, por isso, a cada
dia dou um passo na direção para voltar a ser aquela pessoa. Ao longo das
últimas duas semanas, desde que me mudei para Nova Iorque, estou me
lembrando de algumas coisas que estavam totalmente esquecidas. Agora,
lembro como eu era naquela época, e sinto falta daquele eu. Sinto falta da
sensação de ousadia de nunca temer a morte, apenas temer não viver o
bastante. Quero aquilo de volta mais do que tudo. Talvez eu chegue lá
algum dia, talvez não. Só o que posso fazer agora é continuar seguindo em
frente.
Com uma sensação estranha de infantilidade, assopro no vidro frio e,
com o dedo, desenho um coraçãozinho na janela que embacei. Sorrio por
um segundo antes de limpar.
Será que consigo ser corajoso novamente? Será que isso ainda existe
dentro de mim? Eu pulei de bungee jumping e me mudei para um estado
diferente por puro capricho. O que posso fazer hoje para continuar me
impulsionando a seguir em frente?
Acho que poderia começar indo a algum lugar sozinho enquanto Lando
se encontra com o empresário da banda. Talvez possa até mesmo não inserir
no meu calendário. A ideia me dá uma pontada de nervosismo, me
deixando ainda mais determinado a pelo menos tentar. Vou apenas dar uma
caminhada até o final da rua e comprar um café. Talvez me sente e fique
observando as pessoas por um tempo.
Assinto com determinação, pouso minha xícara de café, agora frio, e vou
para o quarto me vestir. Sorrindo, visto uma das minhas camisetas da banda
Queda Vertiginosa e tiro uma selfie rápida para mandar para Lando.
Calço os sapatos e pego na bancada a chave que Lando me deu depois
que me mudei. Esta é a primeira vez que saio da cobertura sozinho, então é
a primeira vez que preciso dela. Respiro fundo antes de entrar no elevador.
Não é nada demais; é uma caminhada até a esquina. Então por que parece
que vou pular de um avião?
Houve um tempo em que pular de um avião parecia divertido. Não é de
se espantar que eu fosse capaz de escrever histórias envolventes naquela
época, eu era capaz de imaginar um mundo cheio de possibilidades e
emoções.
Entro no elevador e me encosto no fundo enquanto ele desce para o
saguão do prédio. Não existe nada inerentemente assustador em sair
sozinho. Fui independente durante anos na Flórida. Mas tem algo de
simbólico nesta ação, como se sair do prédio e colocar os pés nas ruas de
Nova Iorque completamente sozinho significasse que posso fazer qualquer
coisa. É o primeiro pequeno passo para ter minha vida de volta. Sei que
falei para Lando que a pessoa que eu costumava ser morreu naquele
acidente de carro, mas eu não acho que isso seja verdade. Lando viu que
aquela pessoa ainda habita em mim, quero que ele esteja certo.
O porteiro acena amigavelmente quando passo, atento às grandes portas
da frente. Empurro para passar por elas e sou imediatamente atingido no
rosto pelo ar frio. Seria fácil voltar lá para cima e guardar todo esse
renascimento simbólico para a primavera. Lando já disse que não se
importa se eu trabalho ou não. Eu poderia ficar sentado naquela cobertura e
escrever algum blog de merda que ninguém leria e dizer a mim mesmo que
isso conta como seguir em frente.
É perturbador pra caralho ver tanta atividade – carros, ônibus, pessoas,
pássaros – e não ser capaz de ouvir nada disso. É de se pensar que, depois
de todo esse tempo, eu estaria acostumado, mas é um nível completamente
novo de estranheza estar em algum lugar como Nova Iorque e não ser capaz
de ouvir um único som.
Determinado a levar minha aventura patética até o fim, viro em direção à
cafeteria mais próxima e caminho com passos perseverantes.
O aroma do café e das guloseimas me atraem quando me aproximo.
Praticamente posso me imaginar descendo até aqui com meu notebook e
escrevendo em uma dessas cadeiras desproporcionais que vejo pela vitrine.
Entro e desfruto do calor que me envolve. Eu me aproximo do balcão e
tiro o bloquinho do meu bolso traseiro para poder escrever o que quero.
– Como posso te servir? – pergunta o barista. Ele é um rapaz bonito e
jovem. Quase posso imaginar que ele sou eu se tivesse vindo para Nova
Iorque com Lando anos atrás. Ele parece tão cheio de otimismo e animação.
Sorrio para ele e escrevo meu pedido, passando-lhe o bloquinho.
– Você é surdo? – sinaliza ele.
– Sim.
– Meu irmão também. Quer algo além do café? Folhado? Sanduíche?
– Um sanduíche cai bem. Ovo e salsicha. Obrigado.
– Sem problemas.
Pago, pego um número que o barista me dá e vou procurar uma mesa
vaga. Quando me sento, sinto o impulso de pegar meu celular e dar uma
olhada nas redes sociais ou mandar mensagem para alguém, por pura força
do hábito. Em vez disso, observo as pessoas que circulam na cafeteria.
Antigamente, uma das minhas maneiras preferidas de encontrar
inspiração para uma história era ir a algum lugar e ouvir as conversas,
depois inventar histórias sobre o que elas significavam ou sobre quem as
pessoas eram. Não posso ouvir, mas ainda posso bisbilhotar. Observo a
mulher na mesa ao lado conversando com sua amiga que está de costas para
mim. Só consigo ver um lado da conversa, mas é meio que melhor assim.
Ela está contando à amiga uma história sobre como acidentalmente
terminou numa seita logo depois da faculdade.
Mas que merda! Como se termina acidentalmente numa seita? – me
pergunto. E, simples assim, uma história começa a fluir na minha mente.
O barista traz o meu pedido, e eu sinalizo “obrigado” antes de sair. Tinha
a intenção de ficar um tempinho, mas com as palavras fervilhando na minha
mente pela primeira vez desde que posso me lembrar, preciso ir para casa
ver se consigo escrever.
Lando

Não sei por que estou nervoso quando chego ao apartamento de Archer.
Ele tem sido meu amigo mais próximo por quase dez anos e só quer
conversar sobre o que penso em relação à banda. Archer mencionou que se
encontrou com Linc ontem, estou interessado em saber como foi.
Com Dawson ao meu lado, estou disposto a manter a banda. Mas vai
custar bem mais do que mera força de vontade. As coisas terão que mudar.
O elevador se abre e Archer já está abrindo a porta do seu apartamento;
sem dúvidas o porteiro o avisou.
– Archie! – provoco.
– Orlando! – grita de volta. Meu sorriso se transforma em afronta. – Você
começou.
– Trégua?
– Fico de boa, se você ficar.
Vejo uma leveza nele que nunca vi antes e isso me dá esperança para o
futuro da banda.
Entro no apartamento de Archer e me surpreendo em não encontrar mais
ninguém ali. Não que eu esperasse encontrar algum outro membro da
banda.
– Como Jude está indo? – pergunto no tom mais casual que consigo.
Archer estreita o olhar para mim e balança a cabeça. Eu deveria ter
imaginado que ele veria bem além.
– Você terá que esperar para satisfazer seu desejo de fofoca, porque eu te
convidei para conversar sobre a banda, não sobre a minha vida amorosa.
– Então você admite que está dormindo com Jude? – Arregalo os olhos
com uma alegria descontrolada. Essa é a fofoca do ano.
O rosto de Archer ferve e suas bochechas se contorcem.
– Não falei isso.
– Praticamente falou – argumento, só para irritá-lo.
– Por que não me conta sobre seu rapazinho? – Archer tenta mudar de
assunto. E, maldito seja, a formulação estranha da pergunta funciona.
– Meu rapazinho? Vai com calma no vocabulário, vovô. Imagino que
esteja se referindo a Dawson? – Solto uma risada. – Ele está se adaptando à
cidade e as coisas estão indo bem entre nós dois. Não é perfeito, mas chega
bem perto.
– Fico feliz de saber – afirma Archer enquanto o sigo até a cozinha, o
cheiro de café fresco nos atrai. – E se a banda continuar?
– Ele pode vir em algumas turnês.
Archer estende uma caneca de café, oferecendo. Aceito e me sento em
uma das banquetas que ladeiam a ilha da cozinha.
– Tem escrito alguma coisa?
– Algumas músicas – revelo, mas uma irritação familiar me atinge. – E
quanto a Lincoln? Imagino que ele tenha escrito apenas uma música e eu
terei que cuidar das outras dez. Depois, claro, a música que ele compôs
enquanto estava confinado em sua casa do lago isolada ganhará um
Grammy, enquanto as músicas que eu for escravizado a criar nas próximas
semanas serão meramente passáveis. – O sorriso de Archer alarga
irritantemente enquanto desabafo. – O quê? – exclamo.
– Já era hora. Eu estava começando a me perguntar se você nunca iria se
impor. Planeja compartilhar esses sentimentos com Lincoln?
Isso me murcha um pouco.
– Não planejei nada. É só a mesma merda, apenas um dia diferente. O
que eu gritar com ele resolveria?
– Pode te fazer se sentir melhor, no mínimo – destaca. – E pode abrir os
olhos de Lincoln, na melhor das hipóteses.
– Ele não está frágil demais e cheio de merda para eu gritar com ele?
Deus que perdoe alguém de fazer alguma coisa que não seja tratar os
sentimentos de Lincoln como a porcelana chinesa da vovó.
Archer ri, uma risada retumbante do fundo do seu peito como se fosse a
coisa mais engraçada que ele já ouviu na vida.
– Onde este Lando esteve nos últimos dez anos? Talvez se você tivesse
essa chama o tempo todo, Lincoln e Jude teriam medo de sair tanto dos
trilhos. – Archer balança a cabeça, ainda rindo. – Acho que já mimamos
Lincoln o suficiente. Ele está numa estrada difícil, mas de recuperação. Ele
consegue lidar com você lhe dizendo que ele precisa carregar o próprio
fardo.
– Certo, vou fazer isso, então – decido.
– Bom. Agora, me conte sobre Dawson.

Quando saio do elevador, fico surpreso com o som de uma digitação


furiosa. Vou em busca de onde vem, sorrindo diante da ideia de Dawson
voltar a escrever depois de tanto tempo.
Eu o encontro no sofá da sala com o notebook apoiado nos joelhos e o
olhar focado conforme seus dedos deslizam pelas teclas. Preferindo não
interromper seu fluxo, vou para a cozinha e começo a preparar o almoço. O
tec-tec das teclas continua enquanto junto alguns legumes para assar no
forno e desfio um pouco de frango assado para os sanduíches.
Quando o almoço fica pronto, me pergunto se devo interromper Dawson
ou não. Felizmente, ele chega na cozinha antes de eu ter que decidir. Ele
para de repente, surpreso, e sorri.
– Eu não quis atrapalhar seu fluxo – explico, abrindo os braços para ele.
Ele vem ao meu encontro e me beija audivelmente. – Como está sendo seu
dia? – pergunto, ansioso para ouvir sobre sua escrita e o que está fazendo
seus olhos brilharem.
Ele leva a mão ao bolso, mas não pega o celular. Ele parece confuso, mas
finalmente me responde em voz alta, ao invés de deixar meus braços.
– Ótimo. Fui dar uma volta, comprar um café, e comecei a escrever.
– Isso é ótimo, Covinhas. Estou feliz por você. – Dou um beijo em sua
testa e o abraço mais apertado.
O forno apita, então eu o solto e tiro os legumes. Quando volto, ele está
com o celular na mão.

Como foi sua reunião com o empresário?

– Boa. Ele quer que eu fale para Lincoln como tenho me sentido sobre o
lance da composição das músicas.

E você vai?

– É, acho que vou.

Bom.

– Quer me contar o que você está escrevendo? – pergunto cheio de


esperança. Ele hesita por um segundo e eu me pergunto se ele vai ser um
escritor misterioso que não deixa ninguém ler o manuscrito que ele passará
os próximos vinte anos escrevendo.

É meio que uma comédia sombria sobre um assassino em


série que acidentalmente começa uma seita.

– Parece incrível. Mal posso esperar para ler.


Dawson pousa o celular e contorna a bancada para voltar aos meus
braços. Enterro o nariz em seus cabelos e fecho os olhos, deliciando-me na
certeza de mantê-lo perto, exatamente onde ele pertence.
Faixa 31: Lado A
DIZ DE UMA VEZ

Dawson

É o terceiro dia seguido que saio de casa para dar uma volta, explorar a
cidade. É o terceiro dia seguido que escrevo e sinto como se o universo
estivesse correto. Com um sorriso no rosto e com alegria, vou para a
cafeteria pensando num muffin de amoras.
Do nada, uma mulher com uma câmera aparece e se põe no meu
caminho. Ela mete a câmera na minha cara e eu faço uma careta. Sempre
achei que as celebridades fossem meio imbecis em relação aos paparazzi,
mas isso é ridículo. Seus lábios se movem, mas não me incomodo em tentar
descobrir o que ela está falando. Empurro a câmera e olho furiosamente
para ela, apontando para o meu ouvido e balançando a cabeça para ela
entender. Eles devem saber que sou surdo, foram eles que espalharam todos
os detalhes sobre a minha vida há algumas semanas.
Ela continua falando, e eu a empurro para passar. Tenho certeza de que à
tarde sairá uma história sobre o namorado de Lando ser um babacão. Ah,
muito bem. Uau, isso é um pouco libertador. Quem se importa com o que
escrevem sobre mim? Meu sorriso se alarga diante desta constatação, e eu
entro bem feliz na cafeteria.
Hugo, o barista que sabe linguagem de sinais, acena para mim.
– Bom dia, me vê um café grande e um muffin de amoras, por favor? –
sinalizo quando chego ao balcão.
– Claro. Como está seu dia até agora?
– Ótimo, apesar da câmera que meteram na minha cara lá fora.
– Uma câmera? Por quê? – pergunta intrigado.
– Acho que para descobrir algum podre do meu namorado, Lando.
Ele arregala os olhos.
– Não percebi que você namorava o Lando. Ele é bem legal, sempre dá
boas gorjetas. Fico feliz em saber que ele finalmente está feliz. Ele sempre
pareceu solitário.
Meu coração se parte e infla ao mesmo tempo diante da declaração.
Odeio que Lando tenha ficado solitário por tanto tempo, mas o fato de que
eu sou o único que ele quer, me faz me sentir especial.
Depois de pedir o café com o muffin, fico observando as pessoas por um
tempo, depois caminho um pouco mais ao longe na rua para conhecer um
brechó que estava querendo dar uma olhada. Na volta para casa, olho para o
meu reflexo na lateral de um edifício e, por um segundo, não me reconheço.
Mal consigo me lembrar de quando sorri tão largamente ou me senti tão
feliz assim. Pela primeira vez, sinto como se estivesse exatamente onde
deveria.

Lando

Meu coração dói enquanto assisto à entrevista de Lincoln. Ele tem um


sorriso falso estampado no rosto enquanto fala sobre uma dor profunda da
qual eu não fazia ideia. Era evidente que Lincoln estava com dificuldades,
mas ao assisti-lo explicar seu diagnóstico, me dou conta de que não dava
muita atenção à sua luta.
Meu estômago contorce de culpa enquanto relembro os últimos dez anos
e a minha certeza de que Lincoln estava apenas sendo dramático, querendo
atenção, se recusando a simplesmente ficar bom logo. Não era simples
assim, e eu deveria saber disso. Claro que ele teria ficado melhor se fosse
uma opção.
– Por que eu não sabia que ele estava sofrendo tanto? – questiono.
Dawson aperta a minha mão de maneira tranquilizadora, e descansa a
cabeça no meu ombro. Mas ele não tenta responder a questão impossível
que levantei.
Então o repórter pergunta sobre Jace, e o semblante de Lincoln muda.
Não está mais rígido e forçado; seu sorriso é brilhante e cheio de luz.
– Acho que vamos conseguir – devaneio, acariciando as costas da mão de
Dawson. – Mas preciso dizer a ele como me sinto, não?
Dawson concorda e acaricia meu ombro, me tranquilizando.

Duas semanas depois da entrevista de Lincoln ir ao ar, estou no corredor,


encarando a porta pela qual passei centenas de vezes ao longo dos anos.
Ainda me lembro de como era ter dezoito anos e encarar esta mesma porta,
sabendo que minha vida mudaria completamente ao passar por ela. Quase
posso nos ver, jovens e cheios de esperança para o futuro, aguardando
animadamente sermos chamados para dentro desta sala para assinarmos o
contrato do nosso primeiro álbum.
O som de passos atrás de mim chama a minha atenção, e eu avisto
Lincoln chegando pelo corredor contente como não via há uma década.
– Oi – cumprimento.
– E aí? – Ele me surpreende ao me abraçar apertado, dando tapinhas nas
minhas costas e se mantendo assim por alguns segundos antes de me soltar.
– Achei que eu seria o primeiro a chegar.
– É, cheguei um pouco mais cedo porque esperava te encontrar antes da
reunião. Podemos conversar um pouco?
– Claro. Venha. – Lincoln alcança a maçaneta e eu percebo um corte
cicatrizando em seu braço e vários rabiscos que parecem feitos com
marcador. O corte aparenta ter pelo menos um mês, e eu me permito a
esperança de que tenha sido a última vez que ele tenha usado uma lâmina
em si mesmo por tristeza ou dor.
A sala é exatamente como me lembro: uma mesa de reunião ocupando a
maior parte do espaço, uma janela grande e, imponente ao fundo, álbuns de
platina cobrindo as paredes.
Lincoln se senta em uma das cadeiras em volta da mesa e eu pego outra
em frente a ele. Respirando fundo, fico imóvel até finalmente dizer a
Lincoln como tenho me sentido.
– Sinto como se precisássemos esclarecer as coisas, tem uma coisa que
eu deveria ter te falado há muito tempo. Se vamos continuar com a banda,
preciso que você escute. Acho que todos nós precisamos admitir as dores
que causamos uns nos outros ao longo dos anos se tivermos qualquer
esperança de cura.
– Eu não poderia concordar mais – afirma Lincoln, seu rosto está um
pouco pálido enquanto ele se prepara para as minhas palavras.
– Nós dois fizemos uma promessa um para o outro. Deveríamos, ambos,
compor as músicas para a banda e, em dez anos, você escreveu apenas duas.
– Lincoln abre a boca para dizer alguma coisa, mas estendo a mão para
detê-lo. Eu preciso colocar tudo para fora antes que o deixe se desculpar ou
justificar seus atos. – Sei que você passou por muita coisa. Eu não entendia
bem o quanto até recentemente, mas o fato é que comecei a ficar
profundamente magoado com você – admito, e sua expressão desmonta. –
Desculpe ser direto, mas preciso que você saiba disso. Você não deveria ter
colocado isso tudo sobre meus ombros; não foi justo comigo. Se vamos
assinar outro contrato, preciso que você me dê um motivo para acreditar que
não será igual.
Tomo fôlego e coloco minhas mãos trêmulas no colo antes de acenar para
que Lincoln vá em frente e responda.
– Sinto muito pela pressão que coloquei em você por não fazer a minha
parte. Eu poderia inventar desculpas, mas não vou fazer isso. Você está
completamente certo ao dizer que fiz uma promessa e não cumpri. Você não
tem motivos para acreditar em mim, mas posso lhe garantir que as coisas
serão diferentes daqui em diante. Já compus oito músicas novas e estou
trabalhando em mais algumas enquanto decidimos o futuro da banda. Não
posso prometer que nunca mais vou foder com tudo, mas se acontecer,
quero que você me repreenda depressa. Na verdade, você tem permissão
para ligar para Jace e dizer para ele me dar uma bronca se eu não cumprir
minha parte das responsabilidades desta vez.
A tensão se dissipa dos meus ombros e, pela primeira vez em anos, sinto
como se pudesse respirar com facilidade.
– Vou fazer isso. Tenho certeza de que Jace pode impor castigos muito
piores para você do que eu.
Lincoln ri, concordando.
A porta se abre e nós dois nos viramos para ver Jude entrar na sala
parecendo arrependido e mais saudável como não via em anos. Lincoln
aponta a cadeira ao seu lado.
– Entra, Jude. Estamos lavando a roupa suja, tenho certeza de que ambos
podemos pensar em algumas palavras bem escolhidas para você. – Lincoln
dá uma piscadinha para suavizar as palavras. Temos um longo caminho a
percorrer para curar todas as feridas, mas este é o primeiro passo para a
banda e para a nossa amizade.

Dawson me recebe na porta com um beijo e um sorriso doce quando


chego em casa.
– Como foi? – sinaliza.
– Surpreendentemente bem. Nós todos tivemos uma ótima conversa,
falamos abertamente sobre as coisas que atrapalharam a nossa música e
nossa amizade. Acho que podemos consertar os estragos. Sem dúvidas,
estamos todos prontos para seguir em frente, juntos, para variar.
– Vocês vão assinar o novo contrato amanhã? – quer confirmar.
– Vai depender de como serão as negociações, mas estou esperançoso.
Ele sorri novamente e me deixa puxá-lo para outro beijo demorado.
Quando o solto de novo, ele me arrasta para a cozinha e coloca um prato de
carne com batatas na minha frente.
– Obrigado – sinalizo.
– Disponha.
Depois do jantar, ficamos juntos no sofá.
Acaricio os pés frios de Dawson, que descansam no meu colo. O som
rápido das teclas me faz sorrir. Dou uma olhada e me perco observando seu
rosto por alguns minutos. Amo observar cada expressão que brinca em sua
face enquanto ele escreve, como se ele fosse o personagem, tendo
conversas, sentindo as emoções. Às vezes, ele fecha os olhos por alguns
minutos, e a única pista de que continua trabalhando é a digitação
ininterrupta no teclado.
Ele abre os olhos e me vê observando pela primeira vez.
– O que foi? – indaga. Amo o fato de ele falar mais comigo. As
mensagens de texto são convenientes, mas sinto falta da sua voz. A dúvida
se ele quer tentar a cirurgia experimental ainda está na mesa. Não faz
diferença para mim se ele decidir ir em frente ou não; só o que quero é que
Dawson tenha toda a felicidade do mundo. Quero que ele viva sua vida ao
máximo para que todos que virem fiquem com inveja, exatamente como ele
sempre sonhou.
– Eu amo você – declaro. Ele sorri e um leve rubor surge em suas
bochechas.
– Eu amo você – responde ele, antes de colocar o computador de lado e
vir para o meu colo. – Está nervoso com a reunião da banda amanhã?
Balanço a cabeça.
– Espero que possamos nos acertar e continuarmos juntos, mas se as
coisas não forem mudar… – balanço a cabeça outra vez. – Vamos ver como
será.
Dawson abaixa a cabeça e me dá um beijo.
– Seja como for, você está preso comigo – garante-me ele, e eu me
ilumino de dentro para fora.
– Isso mesmo – concordo. – Nunca vou te deixar ir embora, Covinhas.
– Por mim, tudo bem. Já te deixei ir uma vez; nunca mais vou cometer
esse erro.
– Vamos para a cama – sugiro com um olhar libidinoso.
Dawson guarda o notebook na capa para manter seguro e me segue para a
cama. Amanhã, conto que agendei uma viagem para a América do Sul, para
uma tirolesa épica, daqui a alguns meses. Também já escolhi uma aliança
para dar a ele quando estivermos lá. Por enquanto, só quero aproveitar este
momento. Enroladinhos, nossos corpos em harmonia, não estou nem aí para
o que Dawson diz; esse é o nosso destino.

FIM
Leia a história completa de Lincoln em Encare a Música (Replay, 1)

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SOBRE A AUTORA

A autora K.M. Neuhold é uma total viciada em romance, uma


sentimental total em todos os sentidos. Ela começou sua jornada como
autora de romance new adult, heterossexual, mas depois de uma leitura
casual de um livro de MM, ela ficou completamente viciada em tudo sobre
homens adoráveis – e às vezes danificados – encontrando seu Felizes para
Sempre juntos. Ela tem uma forte paixão por escrever personagens com
muito coração e alma, e um pouco de humor também. E admite plenamente
que suas tendências de TOC para garantir que todos os personagens
secundários tenham uma história completa provavelmente levarão todos os
livros a terem um spin-off ou série. Quando não está escrevendo, ela é
domadora de leões, astronauta e super-heroína… só brincando, ela
provavelmente está assistindo Netflix e se aconchegando com seu husky
enquanto seu marido incrível traz café para ela.

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CRÉDITOS E COPYRIGHT

TÍTULO ORIGINAL
Play it by Ear
EDITORA DE AQUISIÇÃO E REVISÃO
Carina Derschum
TRADUÇÃO
Stéphanie Rumbelsperger
CAPA
Mariana Oliveira
IMAGEM DE CAPA
Dusko / Adobe Stock
PRODUÇÃO DE EBOOK
Marcela Nogueira
© K.M. Neuhold, 2018
© Galuba Editorial, 2025
Todos os direitos desta edição reservados à Galuba Editorial
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

N485s
Neuhold, K.M.
Sinta a Música [recurso eletrônico] / K.M. Neuhold; tradução de
Stéphanie Rumbelsperger. – Rio de Janeiro: Galuba, 2025. (Série Replay,
livro 2)
250 p.; 0,99 Mb
ISBN978-65-84978-22-5 (e-book)
Tradução de: Play it by Ear
1. Romance contemporâneo LGBT. 2. Romance sensual. 3. Banda de
rock. I. Rumbelsperger, Stéphanie. II. Título.
CDD 813

Isabela Lustosa CRB-7: RJ-007115/O


Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desse livro pode ser usado
ou reproduzido de maneira nenhuma sem permissão escrita, exceto em
casos de citações breves incorporados em artigos de crítica ou resenhas.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, empresas, lugares,
eventos e incidentes são produtos da imaginação da autora ou foram usados
de maneira puramente fictícia. Qualquer semelhança com pessoas reais,
vivas ou mortas, eventos ou locais é mera coincidência.

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