Exame Final Nacional de Filosofia
Prova 714 | Época Especial | Ensino Secundário | 2018
11.º Ano de Escolaridade
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho
Duração da Prova: 120 minutos. | Tolerância: 30 minutos. 9 Páginas
Utilize apenas caneta ou esferográfica de tinta azul ou preta.
Não é permitido o uso de corretor. Risque aquilo que pretende que não seja classificado.
Para cada resposta, identifique o grupo e o item.
Apresente as suas respostas de forma legível.
Apresente apenas uma resposta para cada item.
As cotações dos itens encontram-se no final do enunciado da prova.
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, selecione a opção correta. Escreva, na folha de respostas, o
número do item e a letra que identifica a opção escolhida.
Nos termos da lei em vigor, as provas de avaliação externa são obras protegidas pelo Código do Direito de Autor e dos
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GRUPO I
1. Leia o texto argumentativo seguinte.
De acordo com a lei portuguesa, um peão pode ser multado por atravessar uma via urbana
fora das passadeiras. Isso significa que as pessoas que se deslocam a pé devem procurar
passadeiras para atravessarem a rua. Deste modo, para que os condutores de automóveis
possam circular despreocupadamente a maior velocidade, as pessoas que se deslocam a pé
são obrigadas a fazer trajetos mais longos. Tal desigualdade é injusta e só pode ser corrigida por
uma alteração da lei.
O propósito do texto é concluir que
(A) não se devia multar os peões por atravessarem uma via urbana fora das passadeiras.
(B) os peões são obrigados a fazer trajetos mais longos para utilizarem as passadeiras.
(C) a lei portuguesa em vigor favorece os condutores em detrimento dos peões.
(D) a alteração da lei portuguesa retirará aos condutores as vantagens a que se habituaram.
2. A Lógica dá-nos instrumentos que permitem
(A) saber que proposições são verdadeiras.
(B) distinguir as proposições válidas das proposições inválidas.
(C) distinguir as conclusões a priori das conclusões a posteriori.
(D) saber que proposições se seguem de outras.
3. Atente no diálogo seguinte.
José – Ultimamente, já não se pode estar sossegado num jardim, a descansar ou a ler.
Maria – Porquê, José?
José – Porque agora há sempre alguém por perto a fazer exercício físico.
Maria – Bem, José, quem se incomoda com o exercício físico é contra a prática desportiva. Eu não sabia
que eras contra a prática desportiva.
A Maria, ao considerar que o José é contra a prática desportiva, incorre na falácia
(A) ad hominem.
(B) do falso dilema.
(C) do boneco de palha.
(D) do apelo à ignorância.
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4. Infelizmente, há países que ainda têm pena de morte. Ora, a pena de morte é um ataque à inviolabilidade
da vida humana. Uma vez sacrificado o mais sagrado dos direitos humanos, a sociedade acabará por
aceitar sacrificar todos os direitos, desde a liberdade de expressão até ao direito à educação.
Quem argumenta deste modo
(A) ataca o carácter e a credibilidade de todos aqueles que, racionalmente, defendem a pena de morte.
(B) n
ão justifica que a violação de um direito fundamental acabe por conduzir inevitavelmente à violação
de todos os outros.
(C) a
dmite sem provas que, em nenhuma circunstância, os direitos, sejam eles quais forem, devam ser
restringidos.
(D) supõe que ou não existe nenhum direito ou existe um sistema que inclui todos os tipos de direitos.
5. U
ma pessoa tinha curiosidade de ver o que aconteceria se pressionasse um certo botão no sistema de
comandos de um edifício inteligente. Para isso, pressionou esse botão e descobriu que o facto de o ter
pressionado levou a que as portas do edifício se fechassem.
A pessoa em questão realizou propositadamente a ação de
(A) associar o botão às portas.
(B) fechar as portas do edifício.
(C) pressionar o botão.
(D) ver o que aconteceria.
6. Atente nas afirmações seguintes.
1. Franklin Roosevelt é considerado pelos norte-americanos um dos três mais importantes presidentes
dos EUA.
2. Já adulto, Franklin Roosevelt contraiu poliomielite.
3. Franklin Roosevelt não gostava de ser fotografado em cadeira de rodas.
4. Franklin Roosevelt deveria ter decidido mais cedo a entrada dos EUA na II Guerra Mundial.
Selecione a opção correta.
(A) Apenas a afirmação 4 exprime um juízo de valor.
(B) As afirmações 1 e 4 exprimem juízos de valor.
(C) As afirmações 2 e 3 exprimem juízos de valor.
(D) Apenas a afirmação 3 exprime um juízo de valor.
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7. Considere o caso seguinte.
O Ministério da Qualidade de Vida de um certo país adotou uma política utilitarista. A finalidade dessa
política é
(A) distribuir igualmente os bens primários.
(B) garantir que todos têm o que querem.
(C) aumentar a felicidade ou bem-estar geral.
(D) dar a todos as mesmas oportunidades.
8. Considere a seguinte recomendação moral, decorrente da ética utilitarista.
Se a Dona Maria dispõe de 50 000 euros, deve usá-los para apoiar um programa de vacinação de 5000
crianças de um país pobre, em vez de pagar um curso de teatro em Londres à sua neta, que deseja ser
atriz.
Há quem considere que recomendações como a anterior mostram a implausibilidade do utilitarismo de
Mill, porque
(A) levam a fazer algo que ninguém estaria disposto a fazer.
(B) n
os obrigam a tratar os outros como meros meios, e não como fins em si, contrariando as convicções
morais comuns.
(C) levam a fazer algo cujos resultados somos incapazes de prever.
(D) m
andam não ter em conta os nossos projetos e preferências pessoais, contrariando as convicções
morais comuns.
9. Na descrição seguinte, encontram-se várias características da ciência.
«A ciência é uma das maneiras de compreender o mundo. Os cientistas distinguem-se por terem boas
ideias, mas a observação desempenha também um papel muito importante na ciência. Além disso,
descobrir leis da natureza exige trabalho metódico. A formulação matemática dessas leis contribui para
que sejam feitas previsões rigorosas.»
Identifique a opção que reúne apenas as características da ciência que não são próprias do senso comum.
(A) É uma maneira de compreender o mundo; recorre à observação.
(B) Usa um método; formula matematicamente as leis.
(C) Recorre à observação; usa um método.
(D) Produz ideias; faz previsões.
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10. Leia o texto seguinte.
As teorias são, mais do que os instrumentos laboratoriais, as ferramentas essenciais do
ofício do cientista. Sem o seu constante auxílio, mesmo as observações e medições feitas pelo
cientista dificilmente seriam científicas. Uma ameaça à teoria é, por conseguinte, uma ameaça
à vida científica e, embora o empreendimento científico progrida por meio dessas ameaças,
o cientista individual ignora-as enquanto puder. Em particular, ignora-as se a sua própria
prática anterior já o levou a empenhar-se no uso da teoria ameaçada. Segue-se daí que novas
sugestões teóricas, destrutivas de velhas práticas, raramente ou nunca emergem na ausência
de uma crise que já não pode ser suprimida.
T. Kuhn, A Tensão Essencial, Lisboa, Edições 70, 1989, p. 256 (texto adaptado).
O texto visa sustentar que
(A) o
s cientistas tendem a preservar as teorias e apenas as põem em causa perante a acumulação de
anomalias.
(B) o
s cientistas procuram criticar as teorias e apenas se empenham na sua defesa perante a acumulação
de anomalias.
(C) d
urante a investigação normal, os cientistas procuram observações e medições capazes de
falsificarem as teorias.
(D) d
urante uma crise científica, os cientistas procuram observações e medições capazes de corroborarem
as teorias.
GRUPO II
Neste grupo, para os itens 1.,2. e 3., são apresentados dois percursos:
Percurso A – Lógica aristotélica e Percurso B – Lógica proposicional.
Responda apenas aos três itens de um dos percursos.
Na sua folha de respostas, identifique claramente o percurso selecionado.
PERCURSO A – Lógica aristotélica
1. Considere as proposições seguintes.
a) Não há criança que não goste de andar de baloiço.
b) É falso que todas as pessoas prefiram usar sandálias no verão.
c) Há pessoas que nunca choram em público.
Destas três proposições, apenas uma é afirmativa.
Identifique o sujeito e o predicado dessa proposição.
Sugestão: Comece por escrever as proposições na forma padrão.
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2. Considere o silogismo seguinte.
Não é só porque gostam de flores que os ingleses apreciam jardins; é também porque muitas pessoas que
gostam de flores apreciam jardins.
Explique a invalidade do silogismo apresentado.
3. Considere o argumento seguinte.
Todas as bandas filarmónicas são bandas formadas por músicos amadores.
Logo, as bandas filarmónicas são bandas acarinhadas pelo público.
Introduza uma outra premissa no argumento de modo a obter um silogismo válido da primeira figura.
Indique se a premissa introduzida é a premissa maior ou a premissa menor do silogismo.
PERCURSO B – Lógica proposicional
1. Considere as proposições seguintes.
a) É falso que Joaquim e Gonçalo joguem xadrez nas tardes de sábado.
b) Orwell teria escrito mais ensaios e mais ficção se não se tivesse envolvido na atividade política.
c) A Clara sorri, mas está triste.
Destas três proposições, apenas uma é uma conjunção.
Identifique as proposições simples que a compõem.
Sugestão: Comece por traduzir as proposições para a linguagem proposicional.
2. Considere o argumento seguinte.
Não é só porque Ricardo Pacheco joga em equipas estrangeiras ou ganha muito dinheiro que é um grande
jogador; é também porque, se ganha muito dinheiro, então é um grande jogador.
Teste a validade do argumento apresentado, recorrendo ao método das tabelas de verdade.
3. Considere o argumento seguinte.
A Maria aproveita as férias grandes para trabalhar como nadadora-salvadora ou para trabalhar como
monitora num campo de férias.
Logo, a Maria aproveita as férias para trabalhar como nadadora-salvadora.
Introduza uma nova premissa no argumento, de modo a obter um argumento com uma das formas válidas
estudadas. Identifique essa forma de inferência válida.
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GRUPO III
1. Atente nos textos seguintes.
Tendo refletido sobre aquilo de que duvidava, e que, por consequência, o meu ser não era
inteiramente perfeito, pois via claramente que conhecer é uma maior perfeição do que duvidar,
lembrei-me de procurar de onde me teria vindo o pensamento de alguma coisa de mais perfeito
do que eu; e conheci, com evidência, que se devia a alguma natureza que fosse, efetivamente,
mais perfeita. […] Para conhecer a natureza de Deus, tanto quanto disso a minha [natureza] é
capaz, bastava-me considerar, acerca de todas as coisas de que em mim encontrava alguma
ideia, se era, ou não, perfeição possuí-las.
R. Descartes, Discurso do Método, Lisboa, Edições 70, 2003, pp. 76-77 (texto adaptado).
Ao analisarmos os nossos pensamentos ou ideias, por mais compostas e sublimes que sejam,
sempre descobrimos que elas se resolvem em ideias tão simples como se fossem copiadas
de uma sensação ou sentimento precedente. Mesmo as ideias que, à primeira vista, parecem
afastadas desta origem, descobre-se, após um escrutínio mais minucioso, serem dela derivadas.
A ideia de Deus, enquanto significa um Ser infinitamente inteligente, sábio e bom, provém da
reflexão sobre as operações da nossa própria mente, e eleva sem limite essas qualidades de
bondade e sabedoria.
D. Hume, Investigação sobre o Entendimento Humano, Lisboa, Edições 70, 1985, p. 25 (texto adaptado).
Compare as perspetivas de Descartes e de Hume acerca da origem da ideia de Deus.
Na sua resposta, integre adequadamente a informação dos textos.
2. Considere a questão seguinte, levantada por Hume.
Se se dissesse que experimentámos que o mesmo poder continua unido ao mesmo objeto
e que objetos idênticos são dotados de idênticos poderes, renovaria a minha pergunta: por que
razão, a partir desta experiência, tiramos uma conclusão que ultrapassa os casos passados de
que tivemos experiência?
D. Hume, Tratado da Natureza Humana, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2012, p.127.
Identifique o problema filosófico que é formulado.
3. P
opper considera que a ciência é uma busca incessante da verdade e que as novas teorias científicas são,
geralmente, passos que ainda não tinham sido dados em direção à verdade.
De acordo com Popper, que condições uma nova teoria científica tem de satisfazer para constituir um
passo em direção à verdade?
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GRUPO IV
1. R
awls defendeu que, se fôssemos colocados na posição original para escolhermos o tipo de sociedade em
que iríamos viver, escolheríamos os princípios de justiça por ele indicados.
Terá Rawls razão ao afirmar que essa seria a escolha que todos faríamos? Justifique a sua opinião.
2. Leia o texto seguinte.
Quando, por exemplo, dizemos «Não deves fazer promessas enganadoras», admitimos que a
necessidade desta abstenção não é […] um conselho para evitar qualquer outro mal – como se
disséssemos «Não deves fazer promessas mentirosas para não perderes o crédito quando se
descobrir o teu procedimento» – mas que fazer promessas enganadoras é uma ação que tem de
ser considerada como má em si mesma […].
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 2009, p. 59 (texto adaptado).
Recorrendo às máximas apresentadas no texto, explique a diferença entre imperativo categórico e
imperativo hipotético.
3. T
alvez roubar se justifique em certas circunstâncias. Por exemplo, no caso de um país devastado pela
guerra, uma pessoa em condições de extrema necessidade pode ter de se apropriar de alimentos ou de
agasalhos que não lhe pertencem para ajudar os seus filhos a sobreviverem.
Mostre como o exemplo dado representa um desafio para a moral kantiana.
GRUPO V
Alguns filósofos defendem que a retórica conduz à persuasão pela beleza das palavras e, assim, concluem
que a retórica não contribui para a aquisição de crenças adequadamente justificadas, isto é, justificadas
por boas razões, e não por belas palavras.
Outros filósofos defendem que a retórica, ao tornar explicações, argumentos e discursos mais claros e
agradáveis, facilita quer a compreensão quer a discussão das crenças e das razões que as sustentam e,
assim, concluem que a retórica pode ser útil ao conhecimento.
Poderá a retórica ser útil ao conhecimento?
Na sua resposta, deve
‒ explicitar o problema apresentado;
‒ identificar inequivocamente a perspetiva que defende;
‒ argumentar a favor da perspetiva que defende.
FIM
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COTAÇÕES
Item
Grupo
Cotação (em pontos)
1. a 10.
I
10 × 8 pontos 80
1. 2. 3.
II
8 12 12 32
1. 2. 3.
III
12 8 12 32
1. 2. 3.
IV
16 12 12 40
V Item único
16
TOTAL 200
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