0% acharam este documento útil (0 voto)
14 visualizações9 páginas

Variacao Sociolinguistica Do Portugues e

O artigo analisa a variação da língua portuguesa em Angola, influenciada pela coexistência com línguas Bantu. Utilizando bases da sociolinguística laboviana, o estudo descreve fatores que afetam a instabilidade normativa do português, destacando suas particularidades em diversos domínios linguísticos. A pesquisa visa combater preconceitos linguísticos e promover a pluralidade linguística no país, reconhecendo o português como língua oficial e também como língua segunda e estrangeira em muitas comunidades.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
14 visualizações9 páginas

Variacao Sociolinguistica Do Portugues e

O artigo analisa a variação da língua portuguesa em Angola, influenciada pela coexistência com línguas Bantu. Utilizando bases da sociolinguística laboviana, o estudo descreve fatores que afetam a instabilidade normativa do português, destacando suas particularidades em diversos domínios linguísticos. A pesquisa visa combater preconceitos linguísticos e promover a pluralidade linguística no país, reconhecendo o português como língua oficial e também como língua segunda e estrangeira em muitas comunidades.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 9

Versão Online - ISSN: 3005-3633

Vol. 3, N˚1, pp.78-86, 2025


http://www.revista.academicuspro.ao

Variação sociolinguística do português em contexto bi/plurilíngue angolano1

Jacinto Tchambala 2 Recibo: 09.10.2024


Aceito: 01.11.2024
Publicado:24.01.2025

Resumo: Este artigo tratou do fenómeno da variação da língua portuguesa no contexto angolano, forçado pela convivência
anacrónica desta com as demais Línguas Bantu. As bases teórico-metodológicas que fundamentaram o estudo foram os postulados da
linguística variacionista labovianos, apoiados na dinâmica social e linguística, objecto da sociolinguística. O objectivo deste artigo
passou necessariamente por descrever os principais factores influenciadores da instabilidade normativa do português em Angola,
cujas particularidades são notórias nos domínios fonético-fonológico, morfológico, semântico e até pragmático. A relevância do
estudo consiste, essencialmente, em trazer subsídios linguísticos que venham chamar atenção às pessoas para se absterem do
preconceito e do estigma linguístico e do combate à pluralidade linguística no país. Essa visão foi propiciada pelo contexto realístico
do português observável nos seus falantes, na medida em que a língua oficial consagrada pela Constituição da República de Angola
pode também ser tida como língua segunda (LS) e língua estrangeira (LE), sobretudo na maioria das comunidades rurais.
Palavras-chave: Variação linguística; língua portuguesa; língua materna; bilinguismo; plurilinguismo.
.

Variation in Sociolinguistics of Portuguese in Angolan Bi/Plurilingual Context


Abstract: This article dealt with the phenomenon of variation in the Portuguese language in the Angolan context,
forced by its anachronistic coexistence with other Bantu languages. The theoretical and methodological bases that
underpinned the study were the postulates of Labovian variationist linguistics, supported by social and linguistic dynamics,
the object of sociolinguistics. The objective of this article was necessarily to describe the main factors influencing the
normative instability of Portuguese in Angola, whose particularities are notorious in the phonetic-phonological,
morphological, semantic and even pragmatic domains. The relevance of the study consists, essentially, in providing linguistic
subsidies that will draw people's attention to abstaining from prejudice and linguistic stigma and combating linguistic
plurality in the country. This view was facilitated by the realistic context of Portuguese observed in its speakers, insofar as
the official language enshrined in the Constitution of the Republic of Angola can also be considered a second language (LS)
and a foreign language (FL), especially in most rural communities.
Keywords: Linguistic variation; Portuguese language; mother tongue; bilingualism; multilingualism.

Variación en Sociolingüística del Portugués en el Contexto Bilingüe/Plurilingüe


Angoleño
Resumen: Este artículo aborda el fenómeno de variación de la lengua portuguesa en el contexto angoleño, forzada por su
coexistencia anacrónica con otras lenguas bantúes. Las bases teórico-metodológicas que sustentaron el estudio fueron los postulados
de la lingüística variacionista laboviana, apoyados en la dinámica social y lingüística, objeto de la sociolingüística. El objetivo de este
artículo fue necesariamente describir los principales factores que influyen en la inestabilidad normativa del portugués en Angola,
cuyas particularidades son notorias en los dominios fonético-fonológico, morfológico, semántico e incluso pragmático. La relevancia
del estudio consiste, esencialmente, en proporcionar subsidios lingüísticos que llamen la atención de la población para que se
abstenga de los prejuicios y del estigma lingüístico y combatan la pluralidad lingüística en el país. Esta visión fue facilitada por el
contexto realista del portugués observado en sus hablantes, en la medida en que la lengua oficial consagrada en la Constitución de la
República de Angola también puede ser considerada una segunda lengua (LS) y una lengua extranjera (LE), especialmente En la
mayoría de las comunidades rurales.
Palabras-clave: Variación lingüística; lengua portuguesa; lengua materna; bilingüismo; plurilingüismo.

1 DOI: https://dx.doi.org/10.4314/academicus.v3i1.7
2 Instituto Superior Politécnico Ndunduma (ISPN). E-mail: [email protected]
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

Introdução
O presente artigo sobre a Variação Sociolinguística do Português em Contexto
Bi/Plurilíngue Angolano, é uma descrição sucinta sobre os factores variacionistas e mudanças
linguísticas da língua portuguesa, tendo como base a sociologia da linguagem. O fenómeno da
variação linguística, isto é, da língua portuguesa falada e até escrita em Angola, decorre em diversos
ambientes – socioeconómico, político, social, filosófico e dadáctico-pedagógico.
No geral, os interlocutores discursivos precisam sempre de inferir lógica para a construção
de sentenças na abstracção da racionalidade da sua capacidade de discurso e configura-se como um
estudo contextualizado e realístico das novas tendências sintácticas (sujeito-verbo, verbo-nome e
outros) da língua portuguesa, constatadas nos enunciados orais dos falantes, quando se comunicam
em português.
A descrição dos fenómenos de variação linguísticas tratadas neste trabalho pretende
perceber os factores de variação da língua portuguesa que, embora demonstrem estranheza à norma
culta do português, encontram uma explicação científica na sociologia da linguagem e ultrapassam
as ideias simplistas, superficiais e preconceituosas de pessoas despreparadas cientificamente sobre o
assunto.
Dentro do fenómeno variacionista, constataram-se também, além das distorções sintácticas,
fenómeno de estrangulamento linguístico e fonético-fonológico (caotização ortofónica, caotização
ortoépica) que, na visão de Undolo (2014), tem passado por profundas transformações,
apresentando traços lexicais, morfológicos, sintácticos e fonético-fonológicos das Línguas Bantu,
diferenciando-se, a passos largos, do português padrão.
Descrição variacionista do português em contexto bi/plurilíngue
Angola, o nosso país, caracteriza-se, segundo estudos, pela existência de várias línguas e
várias culturas. A língua portuguesa, língua do colonizador imperialista, embora seja a mais falada
nos grandes centros urbanos do país, na administração do estado, nos órgãos de justiça, há a referir,
ainda, a existência de várias Línguas Bantu faladas por uma grande maioria populacional, que
excluem o português na sua prática diária com os outros.
Considerando essa pluralidade linguística, a extensão territorial do país e o contacto de
línguas, torna-se impossível a homogeneidade e/ou homogeneização do português, sobretudo no
modo da realização oral. As línguas, no seu todo, não são semelhantes uma a outra em todo em
qualquer parte do mundo onde as mesmas são faladas. Cada língua apresenta características
particulares, deste modo, as diferenças podem ir ao ponto de tornar-se aleatórias as tentativas de
comunicação. Desse modo, as diferenças podem ser notabilizadas não só na língua falada como
também na língua escrita.
A língua, para Hàgege (2000), apesar dos aspectos gerais que registam os seus falantes, a
língua nunca é falada de maneira igual em todas as regiões.
O autor entende que as línguas se alteram, adaptam-se, empobrecem, enriquecem-se. Da
vida, elas retiram os traços inesperados, os cambiantes, as armadilhas a diversidade [...] retiram o
instituto obstinado de continuidade, uma vez que, ainda que morram, individualmente, elas não
deixam de existir enquanto conjunto, traduzindo em acto a aptidão para a linguagem, essa
propriedade determinativa pela qual uma única espécie animal se tornou diferente de todas.
Uma vez que a sintaxe se interesse pela consolidação das regras gramaticais estabelecidas
pela elite culta da língua, quer do ponto de vista dos mecanismos anatómicos fisiológicos
envolvidos na produção física dos sons da fala, é nossa pretensão, nesta pesquisa, estudar as causas
que incidem na realização do fenómeno de variação do português.
Neste sentido, Costa (2006), entende que a existência da língua portuguesa, em Angola,
79
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

decorre num contexto histórico-cultural com substrato das línguas de origem bantu.
De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Linguísticos (1996), todos os povos têm
direito de exprimir, desenvolver a sua língua, pois ela é um produto social e cultural mutável e
propenso à diversas mudanças. Daí que, cada comunidade linguística tem o direito de criar suas
normas convencionais, estruturas políticas, educativas, de comunicação e de administração pública
próprias.
Mediante o exposto, a marcação das fronteiras entre língua materna do indivíduo e língua
segunda, segundo Costa (2006), é determinada através de dois sistemas de oposições: o primeiro
que se fundamenta na "relação subjectiva" e o segundo sistema que considera "relação objectiva".
A "relação objectiva", “é determinada pela confrontação do indivíduo com as línguas da sua
interacção, nomeadamente: língua materna, língua segunda, ao passo que a "relação objectiva" é
determinada pela situação geográfica, social e política em que surgem as línguas em causa”
(ibidem).
Diante da dicotomia, centra-se na relação subjectiva uma vez que a nossa pesquisa se ocupa
da interacção língua materna/língua segunda num processo de sistema de contacto linguístico que
propicia a variação da língua portuguesa em Angola.
Variação linguística
Neste capítulo, Variação Linguística, propõe-se proceder a uma descrição sucinta e
topicalizada do fenómeno da variação linguística com base nos estudos labovianos, relativamente a
sua famosa obra Padrões Sociolinguísticos.
Neste quadro conceptual, sobre a variação linguística de uma língua natural, no geral, que
serão fundamentais na compreensão do fenómeno variacional da língua e daí abstrair as
particularidades do português falado no país.
Questões preliminares
Começaremos por equacionar as generalidades do fenómeno da variação linguística,
seguidamente, consideraremos as particularidades linguísticas do português falado em Angola,
conforme notabilizadas na parte final do estudo (sintáctico-semânticas pragmáticas).
Esta língua neolatina recebe das línguas nativas estruturas lexicais próprias, que
impulsionam visões linguísticas preconceituosas e estigmáticas da língua em variação e,
consequentemente, dos seus falantes.
A língua portuguesa em variação e mudança, forçada por contacto de línguas e povos
diferentes tem sido caracterizada como deficiente e retrógrada por indivíduos despreparados,
embora, hoje, essa realidade corresponda aos falares da maioria dos angolanos. Para Miguel (2014),
toda e qualquer língua viva é susceptível de mudanças, enquanto novas características vão-se
implantando, outras vão-se reformando. Para ele esta dinâmica origina a transformação da língua e
não se produz de idêntica maneira em todos os territórios onde ela seja actualizada.
A situação linguística de Angola, como acontece com a maioria dos países africanos, é
heterogénea. O autor observa que “a par das línguas africanas, o português, língua europeia,
imposta durante a colonização, com um carácter multifuncional, apresenta maior difusão, não
obstante não ser dominada por muitos angolanos’’ (Idem), que, a nosso ver, a língua portuguesa em
Angola é reflexo da nossa distinção cultural e identitária às quais nos devemos orgulhar que, no
dizer de Costa Andrade (1999), os escritores angolanos “deseuroperizaram a palavra europeia nas
suas obras”.
Sociolinguística variacionista
A Sociolinguística centrada no estudo da língua enquanto entidade pura, uma ciência nova,
80
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

voltada para o estudo da variação e mudança linguística objectiva a identificação, a descrição e a


reflexão sobre fenómenos variacionistas, persuadindo políticos e professores a adoptarem um
comportamento pedagógico e realístico perante a norma não-padrão duma língua.
A variação linguística para Santos (2017), pode ser considerada um fenómeno cultural
motivada por factores intra e extralinguísticos que, ao ser estudada pelo investigador, pode
identificar quais são os contextos que favorecem ou impedem o seu uso de um grupo social. A
variação diacrónica cabe ao estudo da gramática e da linguística históricas; a variação no espaço é
objecto de estudo da geografia linguística e da dialectologia.
Medeiros e Tomasi (2013), entendem que não se pode perder a consciência da adequação
das variedades linguísticas às diversas situações comunicativas, de acordo com os diferentes
contextos dos interlocutores.
Situação variacionista da língua
Estudar os fenómenos linguísticos, sobretudo no que diz respeito aos estudos variacionistas,
cabe aos trabalhos de seu fundador, William Labov, segundo Bagno (2012), iniciados na década de
1960, que trouxeram importante contribuição para o entendimento da língua como um fenómeno
estreitamente vinculado à vida social de falantes de uma comunidade.
Actualmente, os estudos labovianos têm sido contestados porque se parte do princípio de
que uma verdadeira sociologia da linguagem, deveria interessar-se fundamentalmente no estudo da
sociedade, tendo como base as relações interpessoais estabelecidas entre si por meio da linguagem,
visto que a língua é utilizada como arma de violência de uns cidadãos contra os outros.
Variação Diacronotópica
Na história das palavras do léxico de uma língua intervêm dois princípios fundamentais para
a análise: o primeiro, de inspiração histórica, língua portuguesa, designado por linguistas como
diacronia espalhada por diversos territórios pelo seu colonizador, imposta aos falantes autóctones
das ex-colónias, actualmente designadas como CPLP/PALOP adquiriu distintas marcas ao longo
dos tempos e o segundo, conhecido por linguistas como sincronia, isto é, o estudo da língua num
determinado momento. Para Mateus et. al (2003), a singularidade da língua portuguesa começou a
desenhar-se no domínio do léxico o processo de normatização, ou padronização, retira a língua de
sua realidade social, complexa e dinâmica, para transformá-la num objecto externo aos falantes,
numa entidade com “vida própria”, (supostamente) independente dos seres humanos que a falam»,
escrevem, leem e interagem por meio dela.
Segundo Silva (2005), a criação de um padrão de língua muito distante da realidade dos usos
actuais fez surgir, em todas as sociedades ocidentais, uma milenar “tradição da queixa”. Em todos
os territórios e em todos os períodos históricos, sempre aparecem as manifestações daqueles que
lamentam a “ruína” da língua, a “corrupção” do idioma.
Em contraposição à noção de erro e à “tradição da queixa” dela derivada, a ciência
linguística oferece os conceitos de variação e mudança. Enquanto a Gramática Tradicional tenta
definir a “língua” como uma entidade abstrata e homogênea, a Linguística concebe-a como uma
realidade intrinsecamente heterogênea, variável, mutante, em estreito vínculo com a realidade social
e com os usos que dela fazem os seus falantes.
Uma sociedade extremamente dinâmica e multifacetada como Angola só pode apresentar
uma língua igualmente dinâmica e multifacetada. Ao contrário da Gramática Tradicional, que
afirma existir apenas uma forma certa de dizer as coisas, a Linguística demonstra que todas as
formas de expressão verbal têm organização gramatical, seguem regras e têm uma lógica linguística
perfeitamente demonstrável (Bagno, 2003).
Neste sentido, falar em erro na língua, dentro do ambiente pedagógico, é negar o valor das
81
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

teorias científicas e da busca de explicações racionais para os fenómenos que nos cercam. Essa
mudança já está presente até mesmo na língua escrita mais monitorada.
A ciência mostra-nos que qualquer análise que desconsidere um desses pontos de vista o
científico e o do senso-comum – será, fatalmente, incompleta e não permitirá uma reflexão que
permita analisar a realidade linguístico-social nem a elaboração de políticas que auxiliem na
constituição de um ensino verdadeiramente democrático e formador de cidadãos Bagno (2003).
A escola não pode desconsiderar um facto incontornável: os comportamentos sociais não são
ditados pelo conhecimento científico, mas por outra ordem de desprezar totalmente substituindo-os
pelas mudanças.
Querer fazer ciência a todo custo sem levar em conta a dinâmica social, com suas demandas
e seus conflitos, é uma luta fadada ao fracasso. A Sociolinguística ensina-nos que onde tem
variação (linguística) sempre tem avaliação (social).
A nossa sociedade é profundamente hierarquizada e, consequentemente, todos os valores
culturais e simbólicos que nela circulam também estão dispostos em categorias hierárquicas que vão
do “bom” ao “ruim”, do “certo” ao “errado”, do “feio” ao “bonito” etc.
E entre esses valores culturais e simbólicos está a língua, certamente o mais importante
deles. Por mais que os linguistas rejeitem a norma-padrão tradicional, por não corresponder às
realidades de uso da língua, eles não podem desprezar o facto de que, como bem simbólico, existe
uma demanda social por essa “língua certa”, identificada como um instrumento que permite acesso
ao círculo dos poderosos, dos que gozam de prestígio na sociedade.
De acordo Bagno (2007), uma das tarefas do ensino de língua na escola seria, sobretudo,
discutir criticamente os valores sociais atribuídos a cada variante linguística, chamando a atenção
para a carga de discriminação que pesa sobre determinados usos da língua, de modo a conscientizar
o aluno de que sua produção linguística, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação
social, positiva ou negativa.
Metodologicamente, por exemplo, propõe que “ao encontrar formas não padrão na produção
oral e escrita de nossos alunos, oferecer a eles a opção de “traduzir” seus enunciados para a forma
que goza de prestígio, para que eles se conscientizem da existência dessas regras” (Ibidem).
A consciência gera responsabilidade. E é ao usuário da língua, ao falante/escrevente bom
conhecedor das opções oferecidas pelo idioma, que caberá fazer a escolha dele, eleger as opções
dele, mesmo que elas sejam menos aceitáveis por parte dos membros de outras camadas sociais.
Língua e comunidade linguística
A língua é um organismo vivo e dinâmico pertente a uma comunidade linguística. É o meio
através do qual o homem categoriza o mundo, que na reflexão de Adriano (2015), o mesmo pode
ser categorizado linguisticamente de formas diferentes: por grupos socioculturais diferentes e
geograficamente distanciados.
A língua exerce o seu objecto social na comunicação interpessoal dos membros de uma
comunidade linguística, reflectindo as vivências, os hábitos, os costumes e as tradições dessa
comunidade.
Conforme vimos, pode-se depreender que o modo de comunicação oral apresenta, numa
perspectivação mais clarificadora, problemas da correcta expressão fonémica
(ortoépia/ortofonia/prosódia). O português falado pela maioria dos angolanos comporta
características próprias nos planos morfossintáctico, sintáctico-semântico, embora a
pronunciabilidade (fonemicidade>os fonemas, foneticidade>sonoridade) sejam mais notabilizadas
devido à flexibilidade dos segmentos lexicalizados na língua.

82
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

Essas particularidades dão azo a consideração de uma língua deficiente para os indivíduos
rurais, embora hoje essa realidade seja também extensiva a indivíduos bem instruídos e ultrapassa
qualquer pedagogia linguística.
Depreende-se, no entanto, que a situação linguística do português em Angola, como
acontece com a maioria dos países africanos, é heterogénea. O autor observa que a par das línguas
africanas bantu, o português imposto durante o período de colonização, com um carácter
multifuncional, apresenta maior difusão, não obstante não ser dominada por muitos angolanos.
A variedade rural-urbana é rica em frases-feitas, enfáticas porque utiliza expressões como a
gíria, o regionalismo, anacolutos. Medeiros e Tomasi (2013), afirmam que a língua constitui uma
variedade não monitorada de pouco prestígio se compara com a norma-padrão; é espontânea e
descontraída. Seu objectivo é a comunicação clara e eficaz. Sua expressão é subjectiva e afectiva. É
funcional, sobretudo, porque se vale de outros meios de expressão que não as palavras, como,
exemplo, a entoação, na linguagem oral. Tal variante linguística distancia-se da norma gramatical.
Mediante o exposto, o português de Angola, representa, pois, uma das formas da linguagem
rural-urbana, uma vez que é caracterizado por estruturas morfossintácticas, fonéticas e semânticas
das Línguas Bantu.
O Contacto de Línguas
Os primeiros contactos da língua portuguesa com as línguas nativas de Angola deram-se no
período em que os primeiros navegantes portugueses entenderam invadir o país. Assim, em toda a
comunidade de fala decorrente de contactos linguísticos foram frequentes as formas linguísticas em
variação.
A história da variedade do português em Angola tem implicações directas no contacto
linguístico desta com as demais Línguas Bantu com as quais partilha o mesmo espaço. Neste
sentido, Bagno (2012) defende que a variedade linguística é um processo sociocultural que tem
origem na interacção entre a dinâmica social da comunidade de fala e o processamento da língua no
cérebro por parte dos indivíduos em interacção social. O autor apresenta, por sua vez, três forças
inerentes mais importantes na mudança linguística: (1) a economia linguística; (2) a
gramaticalização; (3) a analogia.
Analogicamente, essas situações têm a ver com as diferentes formas de concordância.
Enquanto os falantes letrados tendem a fazer a concordância de forma mais monitoradas, os menos
instruídos tendem a suprimir os morfemas redundantes, conforme veremos nos capítulos
subsequentes.
Ferraz (2007), entende que quando uma população falante de uma língua A se vê
constrangida a falar uma língua B diferente, na fase adulta, o contacto dessas duas línguas provoca
mudanças principalmente na língua B.
A norma-padrão é, inicialmente, também uma língua materna, adoptada por um grupo de
pessoas prestigiadas, transformada para língua paterna e posteriormente estratificada para padrão
(do latim patronu-). No entender de Bagno (2012), na sua Gramática Pedagógica do Português
Brasileiro, da raiz pater- semanticamente ‘pai’, procedem os termos patrão e patrono.
Actualmente, levantam-se discussões acerca da padronização linguística, sobretudo nos
países Plurilíngue como Angola. Na sua visão, Bagno (2012), atesta que a língua padrão é a língua
da Lei, sempre associada à figura do pai. É essencialmente escrita, ortografada e normalizada,
conferindo-lhe estatutariamente formas de prestígio. Os artifícios fundamentais que levam à eleição
da língua paterna como elemento da padronização, é sem dúvida alguma, a presença da escrita,
tomada sempre na sua vertente canónica, literária.
O termo norma culta, identificado sempre com a linguagem escrita mais formal, mais
83
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

monitorada, de preferência com pretensões literária, tem a ver com uma linguagem certa, oficial,
normalizada, a língua do rei, pai da nação, símbolo do Estado.
Sobre as inconsistências do uso do português padrão num país multilíngue e multicultural,
como Angola, devemos, inequivocamente, concluir que se trata de uma deficiente formulação
científica que tende a apresentar as linguagens determinadas pelas supostas interferências das
Línguas Bantu no português, em oposição aos falantes da variante do português, língua segunda.
De acordo com Sousa (2020) apud Câmara Junior (1978), o sistema flexional nominal de
número do português é definido por um mecanismo simples baseado no contraste entre a forma
singular, sem uma marca de distinção; e uma forma plural, que tem sua marca representada pelo
morfema /-s/.
Concepção sobre outros aspectos variacionistas do português em Angola
Após análises sobre os fenómenos de varação e mudança linguísticas, constatou-se outros
fenómenos em quase todos os planos do uso do português que passamos a apresentar alguns
exemplos:
1. Diferenças fonéticas (no modo de produzir e pronunciar os sons da língua): alguns
angolanos dizem, por exemplo, eu [*seio] nadar, quando se refere ao verbo saber, a
norma culta do português estabelece eu [sâ]i;
2. Diferenças sintácticas (no modo de organização de frases, de orações e de partes que as
compõem): alguns angolanos dizem: estou mbora a te fala; a norma culta consagra:
“estou a falar consigo”;
3. Diferenças lexicais (palavras que existem no léxico angolano e não existem na norma
culta, e vice-versa): o angolano chama de “lengenu” aquele indivíduo que foge por uma
situação qualquer, que a norma culta chama de esgueirar;
4. Diferenças semânticas (no significado das palavras): “cuecas” em Portugal são os “fios
dental”, “biquíni”, “sunga”, “tanga” das angolanas.
Conclusão
Das análises feitas, foram identificadas no plano sintáctico, como áreas mais afectadas, as
inconformidades linguísticas de concordância, nomeadamente (verbo-nome, determinante-nome),
além das relações de género e número em relação às estruturas de concordância previstos pela
norma culta.
Assim, afirmar que o português que se fala neste país é português europeu são apenas
incompreensões da falácia, dos enganos de quem impende um olhar simplista e superficial sobre o
fenómeno da variação da língua portuguesa no contexto angolano.
Os processos linguísticos mais notáveis no português de Angola são: a afixação, a
conversão, a composição, a amálgama ou cruzamento, a truncação, embora, em todos os processos
morfológicos, a derivação encerre a maior parte desses processos de formação.
As inadequações sintácticas também decorrem do processo da coabitação do português com
as Línguas Bantu. Isto significa que as lexemas das Línguas Bantu estarão cada vez mais presentes
no léxico português em uso no país.
Vale ressaltar que a Língua Portuguesa não só recebeu um número considerável de
estruturas morfológicas das Línguas Bantu como também transferiu, para essas línguas, algumas
estruturas, por meio de contacto interlínguas.

84
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

Referências bibliográficas
Adriano, P. S. (2015). A Crise Normativa do Português em Angola-clitização e Regência
verbal: que atitude normativa para o professor e o revisor. (1ª Edição). Mayamba Editora.
Andrade, F. C. (1999). Poeta Angolano em Luta. União dos escritores angolanos.
Bango, M. (2007). Preconceito Linguístico: o que é como se Faz. (49ª Edição). Editora:
Layota
Bagno, M. (2012). Gramática Pedagógica do Português Brasileiro. Parábola Editorial.
Bagno, M. (2003) A Língua de Eulália: Novela Sociolinguística. Editora Contexto.
Augusto, M. A. (2016). Morfologia Contrastiva entre o Português e Kimbundu: Obstáculos
e suas Causas na Escrita e Ensino da Língua Portuguesa entre os Kimbundu de Angola. (Tese de
doutoramento em Língua Portuguesa pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
Bechara, E. (1975). Moderna gramática portuguesa - cursos de 1º e 2º graus. Companhia
Editora Nacional.
Cortesão, A. A. (1907). Nova Gramática Portuguesa. Acomodada Aos Programas Oficiais
Para Uso Das Escous Normais e dos Institutos de Ensino Literário. (7ª Edição). França Amado
Editor.
Da Costa, A. F. (2006). Rupturas Estruturais do Português e Línguas Bantu: Para uma
Análise Diferencial.
David, R. (2014). Colonizadose Colonizadores. (1ª edição). Grecima.
Declaração Universal dos Direitos Linguísticos. (1996).
Ferraz, M. J. (2007). Ensino da Língua Materna. Editorial Nzila.
Galisson, R. & Coste, D. (1983). Dicionário de Didáctica das Línguas. Livraria Almedina.
Hegège, C. (2000). Não à Morte das Línguas. Instituto Piaget. Editions Odile Jacob.
Labov, W. (2008). Padrões sociolinguísticos. Parábola Editorial.
Marques, M. E. R. (1995). Sociolinguística. Universidade Aberta.
Mateus, H. M. Et al, (2003). Gramática da Lingua Portuguesa. (7ª Edição). Editorial
Caminho.
Medeiros, J. B. & Tomasi, C. (2015). Português Forense. Atlas.
Miguel, A. (2013). Sobre a Referência Indeterminada de Sujeito e Agente da Passiva em
Português europeu. 1ª Edição, Mayamba Editora.
Miguel, M. H. (2014). Dinâmica da Pronominalização no Português de Luanda. (1ª edição).
Mayamba Editora.
Mingas, A. A. (2000). Interferência do Kimbundu no Português Falado em Lwanda. Campo
das Letras – Editores.
Rio-Torto, G.; Rodrigues, A. S; Pereira, I; Pereira, R; Ribeiro, S. (2013). Gramática
Derivacional de Português. Imprensa Online.
Santos, A. M. (2017). Sociolinguística e a Teoria da Variação e Mudança Linguística.
Revista SOCIODIALET, Vol. 7, No. 20, pp. 36-53, ISSN: 2178-1486. Disponível
em:https://periodicosonline.uems.br/index.php/sociodialeto/article/view/7786
Sousa, C. M. P. (2020), Estudo comparativo da concordância nominal variável entre o PB

85
Versão Online - ISSN: 3005-3633
Vol. 3, N˚1, pp.79-86, 2025
http://www.revista.academicuspro.ao

contemporâneo e o Português dos séculos XVIII e XVII. Dissertação de Mestrado Apresentada à


Banca Examinadora da Universidade de Ciências Sociais e Humanas do Ouro Preto.
Undolo, M. (2016). A Norma do Português em Angola: Subsídios para o seu Estudo. ESP-
Bengo.

86

Você também pode gostar