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UNIVERSIDADE PÚNGUÈ

Faculdade de Ciências Agrárias e Biológicas

Instrumentos Legais na abordagem sobre a igualdade de gênero e não


descriminação ao nivel internacional e ao nivel nacional

Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas

Abel Zacarias André

Benedito Querebo Zacarias

Domingos Oulisio Lapisone

Helena Eugenio Maibeque

Inácio Pedro Chavier

Rafael José Lapisone

Solange Caetano Pita

Chimoio

Agosto, 2025
Abel Zacarias André

Benedito Querebo Zacarias

Domingos Oulisio Lapisone

Helena Eugenio Maibeque

Inácio Pedro Chavier

Rafael José Lapisone

Solange Caetano Pita

Instrumentos Legais na abordagem sobre a igualdade de gênero e não


descriminação ao nivel internacional e ao nivel nacional

Trabalho Cientifico da disciplina de


Gênero Educação para Inclusão, a ser
entregue na faculdade de Ciências agrárias
e Biológicas, curso de Licenciatura em
Ciências Biológicas, orientado por Mestre:
Jossias Neves

Chimoio

Agosto, 2025
CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO

1.1. Introdução
A construção de uma sociedade justa e equitativa exige a promoção da igualdade
de gênero e a eliminação de todas as formas de discriminação. No âmbito das Ciências
Biológicas, essa temática apresenta relevância por estar intrinsecamente ligada à
compreensão das interações sociais, culturais e políticas que influenciam a saúde, a
educação e o desenvolvimento sustentável. A análise dos instrumentos legais, tanto em
nível internacional quanto nacional, possibilita compreender como os direitos humanos
e a dignidade da pessoa humana são assegurados, impactando diretamente a qualidade
de vida e a inclusão social.

Diversos tratados e convenções internacionais têm desempenhado papel central


na consolidação de políticas de igualdade, como a Convenção sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), adotada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas em 1979 (ONU, 1979), que constitui um marco
jurídico fundamental na proteção dos direitos das mulheres. No contexto africano, a
Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Protocolo de Maputo reforçam a
necessidade de garantir a igualdade de gênero (União Africana, 2003). Em nível
nacional, a Constituição da República de Moçambique de 2004 estabelece, em seu
artigo 36, o princípio da igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios da
vida política, econômica, social e cultural (República de Moçambique, 2004).

O presente trabalho tem como objetivo analisar os principais instrumentos legais


que abordam a igualdade de gênero e a não discriminação, tanto em âmbito
internacional quanto nacional, destacando a sua relevância para a promoção da justiça
social e da equidade. Além disso, busca-se refletir sobre os desafios enfrentados na
implementação efetiva dessas normas, evidenciando sua importância no processo de
formação acadêmica e cidadã no curso de Ciências Biológicas, uma vez que a prática
científica também deve ser guiada por princípios de ética, respeito e inclusão.
1.2. Objectivos

1.2.1. Geral
 Analisar os instrumentos legais que abordam a igualdade de gênero e a não
discriminação, tanto em nível internacional quanto nacional.

1.2.2. Específicos
 Identificar os principais tratados e convenções internacionais que asseguram a
igualdade de gênero e a não discriminação.
 Examinar as disposições legais presentes na legislação nacional que garantem a
igualdade entre homens e mulheres.
 Avaliar os desafios e as oportunidades na implementação efetiva dos
instrumentos legais.

1.3. Metodologia
Para a materialização do trabalho, apropriou-se da pesquisa bibliográfica, que na
expectativa de Gil (2008), este tipo de pesquisa é desenvolvido a partir de material já
elaborado por outros pesquisadores, tais como:

 Livros – obras literárias ou obras de divulgação, dicionários, enciclopédias,


anuários e almanaques;
 Publicações periódicas – artigos científicos de revistas ou jornais científicos,
disponíveis em bibliotecas ou internet.
CAPITULO II: REVISÃO LITERÁRIA

2.1. Conceitos Básicos


2.1.1. Instrumentos Legais

Os instrumentos legais podem ser entendidos como documentos normativos –


como leis, tratados, convenções e regulamentos – que possuem força obrigatória e
visam assegurar direitos fundamentais em nível nacional e internacional. No campo
jurídico, são considerados mecanismos indispensáveis para a garantia da igualdade, da
dignidade humana e da justiça social (Ferrajoli, 2001).

2.1.2. Gênero

O conceito de gênero ultrapassa a dimensão biológica, sendo compreendido


como uma construção social e cultural que define papéis, expectativas e
comportamentos atribuídos a homens, mulheres e outras identidades. Judith Lorber
(1994) afirma que o gênero é uma instituição social que organiza praticamente todas as
esferas da vida social. De forma semelhante, Raewyn Connell (2005) destaca que o
gênero constitui uma estrutura de poder, envolvendo relações de trabalho, autoridade e
dominação, conceito que ficou conhecido como “masculinidade hegemônica”.

2.1.3. Discriminação

A discriminação é definida como qualquer forma de diferenciação, exclusão ou


restrição baseada em características como sexo, raça, religião, origem social, entre
outras, que compromete o exercício dos direitos humanos e liberdades fundamentais em
igualdade de condições. A UNESCO (2022) ressalta que a discriminação pode ser
direta, quando há tratamento desfavorável explícito, ou indireta, quando normas
aparentemente neutras geram efeitos desiguais sobre determinados grupos.

2.2. Instrumentos Legais Internacionais

2.2.1. Igualdade de Gênero e Não Discriminação na Declaração Universal dos


Direitos Humanos (1948)

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), adotada pela


Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, representa um marco
jurídico e político global no reconhecimento da igualdade entre todos os seres humanos
e na rejeição de qualquer forma de discriminação. Embora o termo "gênero" não
apareça expressamente em seu texto (uma vez que a linguagem da época estava mais
centrada na igualdade entre “homens e mulheres”), a DUDH estabeleceu bases
universais que serviram de referência para o posterior desenvolvimento de tratados
específicos sobre igualdade de gênero e não discriminação.

1. Princípio da Igualdade e Não Discriminação

Logo no seu artigo 1º, a DUDH afirma que: “Todos os seres humanos nascem
livres e iguais em dignidade e em direitos” (ONU, 1948). Esse princípio inaugura uma
visão universalista da dignidade humana, afastando qualquer hierarquia entre os
indivíduos com base em sexo, raça, origem ou outra condição social.

O artigo 2º reforça esse princípio ao declarar que: “Todo ser humano tem
capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem
distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política
ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra
condição” (ONU, 1948). Este dispositivo é central para a proteção contra a
discriminação baseada no sexo/gênero, constituindo o fundamento normativo para os
posteriores instrumentos de proteção específicos às mulheres, como a CEDAW (1979).

Assim, a DUDH estabeleceu que a igualdade jurídica e social entre homens e


mulheres é um direito humano universal, não uma concessão estatal.

2. Reconhecimento da Igualdade entre Homens e Mulheres

De forma ainda mais explícita, o preâmbulo da Declaração reconhece a


dignidade inerente a todos os membros da família humana e, em seu artigo 16 (1),
assegura que homens e mulheres, em idade núbil, têm “direito de casar e de constituir
família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião”, gozando de “direitos
iguais quanto ao casamento, durante o casamento e na sua dissolução” (ONU, 1948).

Esse artigo representou um avanço significativo, pois reconhecia formalmente


que a mulher deveria gozar de igualdade plena em relação ao homem na vida familiar,
rompendo com tradições discriminatórias que historicamente subordinavam o papel
feminino no matrimônio e na sociedade.

3. Igualdade no Trabalho e na Vida Social


Outro ponto importante está no artigo 23 (2), que afirma: “Todos têm direito,
sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual” (ONU, 1948). Ainda que a
redação não mencione gênero especificamente, a implicação direta é a de combater a
discriminação salarial contra as mulheres, um dos aspectos mais persistentes das
desigualdades de gênero.

Da mesma forma, o artigo 26, ao tratar do direito à educação, garante que este
deve ser universal e igualitário, o que abre espaço para o combate às práticas que,
historicamente, excluíram as mulheres do acesso à instrução formal.

4. Relevância para a Igualdade de Gênero e Não Discriminação

Embora não tenha sido escrita com uma perspectiva feminista moderna, a
DUDH é considerada a primeira pedra fundamental para o reconhecimento da igualdade
de gênero como um direito humano. Ela fixou o princípio de que nenhuma distinção de
direitos pode ser feita com base no sexo, o que posteriormente fundamentou a criação
de tratados internacionais específicos:

 CEDAW (1979): Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de


Discriminação contra a Mulher.
 Declaração de Beijing (1995): que reforçou os compromissos assumidos em
1948, avançando na perspectiva de gênero.

Portanto, a DUDH é vista como um instrumento normativo fundador, que abriu


caminho para que a igualdade de gênero e a não discriminação se tornassem obrigações
internacionais vinculantes para os Estados.

2.2.2. Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra


a Mulher (CEDAW, 1979)

Após a adoção da DUDH (1948) e da intensificação do movimento internacional


pelos direitos civis e sociais, verificou-se que as mulheres continuavam enfrentando
desigualdades estruturais em praticamente todas as sociedades. Assim, em 1979, a
Assembleia Geral da ONU adotou a CEDAW, considerada a “Carta Internacional dos
Direitos da Mulher” (ONU, 1979).

Ela entrou em vigor em 1981, após ser ratificada por 20 países, e hoje é um dos
tratados de direitos humanos mais amplamente ratificados no mundo.
2. Definição de Discriminação contra a Mulher

O artigo 1º da CEDAW define “discriminação contra a mulher” como: “Toda


distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por efeito ou propósito
prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher,
independentemente de seu estado civil, com base na igualdade entre homens e mulheres,
dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social,
cultural, civil ou em qualquer outro campo” (ONU, 1979).

Essa definição amplia o conceito jurídico de discriminação, incluindo práticas


diretas e indiretas, tanto formais quanto estruturais.

3. Igualdade de Gênero nos Diferentes Âmbitos

A CEDAW estabelece que os Estados signatários devem adotar medidas


apropriadas para assegurar a igualdade de direitos entre homens e mulheres em vários
domínios:

 Vida política e pública (art. 7º): direito de votar, ser eleita e participar em todas
as esferas da vida pública.
 Representação internacional (art. 8º): igualdade de oportunidades de
representar seus Estados em nível internacional.
 Educação (art. 10º): igualdade de acesso em todos os níveis de ensino.
 Trabalho (art. 11º): igualdade de oportunidades, incluindo salários iguais e
proteção contra demissão por gravidez.
 Saúde (art. 12º): acesso igual a serviços de saúde, incluindo planejamento
familiar.
 Direito de família (art. 16º): igualdade de direitos no casamento, divórcio,
propriedade e responsabilidades parentais.

4. Medidas Positivas e Ações Afirmativas

O artigo 4º da Convenção reconhece a legitimidade de ações afirmativas (como


cotas e políticas específicas) para acelerar a igualdade de fato entre homens e mulheres.
Isso foi um avanço, pois muitas vezes a igualdade formal não basta para corrigir
desigualdades históricas.
A CEDAW criou o Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher,
responsável por supervisionar a implementação do tratado. Os Estados que ratificaram a
convenção devem enviar relatórios periódicos sobre os progressos realizados.

2.2.3. Declaração e Plataforma de Ação de Beijing (1995)

A IV Conferência Mundial sobre a Mulher, organizada pelas Nações Unidas em


Beijing, China, 1995, resultou na Declaração e Plataforma de Ação de Beijing,
considerada até hoje o documento internacional mais abrangente para a promoção dos
direitos das mulheres e da igualdade de gênero.

Foi aprovada por 189 Estados e estabeleceu compromissos políticos concretos


para eliminar todas as formas de discriminação contra mulheres e meninas,
consolidando avanços iniciados pela DUDH (1948) e pela CEDAW (1979).

2. Princípios Fundamentais

A Declaração de Beijing reafirma que:

Os direitos das mulheres são direitos humanos universais;

A igualdade de gênero é pré-requisito para a democracia, a justiça social e o


desenvolvimento sustentável;

A eliminação da discriminação contra a mulher é condição essencial para a paz


mundial e o progresso da humanidade (ONU, 1995).

3. Áreas Críticas de Preocupação

A Plataforma de Ação identificou 12 áreas prioritárias onde persistem


desigualdades e discriminações:

 Pobreza-combate à feminização da pobreza.


 Educação e capacitação-acesso universal e igualitário à educação.
 Saúde-garantia de saúde integral, incluindo saúde reprodutiva.
 Violência contra a mulher – eliminação de todas as formas de violência física,
psicológica e sexual.
 Conflitos armados – proteção das mulheres em contextos de guerra.
 Economia – igualdade de oportunidades no emprego e acesso a recursos
econômicos.
 Poder e decisão – maior participação política e representação feminina em
cargos de liderança.
 Mecanismos institucionais – fortalecimento de políticas públicas para igualdade
de gênero.
 Direitos humanos da mulher – garantia da aplicação efetiva dos direitos
humanos sem distinção de sexo.
 Mídia – combate a estereótipos de gênero e promoção de uma imagem
equilibrada da mulher.
 Ambiente – inclusão das mulheres na gestão ambiental e no desenvolvimento
sustentável.
 Meninas – proteção contra casamento precoce, exploração sexual e acesso
desigual à educação.

4. Obrigações dos Estados

Os governos que assinaram o documento se comprometeram a:

 Adotar planos nacionais de ação para igualdade de gênero;


 Integrar a perspectiva de gênero em todas as políticas públicas (gender
mainstreaming);
 Investir em mecanismos de monitoramento e avaliação periódica;
 Cooperar internacionalmente para promover a igualdade substantiva.

2.2.4. Agenda 2030 e o ODS 5: Igualdade de Gênero e Não Discriminação

Em setembro de 2015, na Cúpula das Nações Unidas em Nova Iorque, os 193


Estados-Membros da ONU aprovaram a Agenda 2030 para o Desenvolvimento
Sustentável. Esse documento sucedeu os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
(ODM 2000-2015), reconhecendo que o desenvolvimento sustentável exige um
equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental.

O documento declara:

> “Esta Agenda é um plano de ação para as pessoas, para o planeta e para a
prosperidade. Também busca fortalecer a paz universal com mais liberdade.
Reconhecemos que a erradicação da pobreza, em todas as suas formas e dimensões,
incluindo a pobreza extrema, é o maior desafio global e um requisito indispensável para
o desenvolvimento sustentável.” (ONU, 2015, p. 3).
Dentro desse compromisso global, a igualdade de gênero aparece como eixo
transversal e autônomo, consolidada no ODS 5.

2. Princípio da Igualdade e Não Discriminação na Agenda 2030

Logo no parágrafo 19 da Agenda 2030, a ONU afirma:

> “A realização plena do potencial humano e do desenvolvimento sustentável só


será possível se forem garantidos a igualdade de gênero e o empoderamento de todas as
mulheres e meninas.” (ONU, 2015, p. 8).

Esse princípio amplia a perspectiva da Declaração Universal dos Direitos


Humanos (1948) e da CEDAW (1979), ao reconhecer que a desigualdade de gênero não
é apenas uma violação de direitos, mas também um obstáculo estrutural ao
desenvolvimento global.

3. ODS 5 – Igualdade de Gênero: Metas Principais

O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 é:

> “Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.”


(ONU, 2015, p. 14).

Este ODS estabelece 9 metas e 14 indicadores. As principais são:

Meta 5.1: “Acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres e
meninas em toda parte.”

Meta 5.2: “Eliminar todas as formas de violência contra todas as mulheres e meninas
nas esferas públicas e privadas, incluindo o tráfico e exploração sexual.”

Meta 5.3: “Eliminar todas as práticas nocivas, como o casamento infantil, precoce e
forçado e a mutilação genital feminina.”

Meta 5.4: “Reconhecer e valorizar o trabalho doméstico e de cuidados não


remunerados, por meio da provisão de serviços públicos, infraestrutura e políticas de
proteção social.”

Meta 5.5: “Garantir a plena e efetiva participação das mulheres e a igualdade de


oportunidades para liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida política,
econômica e pública.”
Meta 5.6: “Assegurar o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva e aos direitos
reprodutivos.”

Meta 5.a: “Reformas para dar às mulheres direitos iguais aos recursos econômicos,
acesso à propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, serviços
financeiros, herança e recursos naturais.”

4. Igualdade de Gênero como Eixo Transversal

Embora o ODS 5 trate diretamente da igualdade de gênero, a Agenda 2030


reforça que esse princípio deve ser integrado a todos os 17 objetivos (gender
mainstreaming). Exemplos:

ODS 1 (Pobreza): as mulheres representam a maioria das pessoas em situação de


pobreza extrema.

ODS 3 (Saúde e bem-estar): alta mortalidade materna e falta de acesso a saúde


reprodutiva afetam desproporcionalmente as mulheres.

ODS 4 (Educação): meninas ainda têm menos acesso à educação em muitos países.

ODS 8 (Trabalho decente e crescimento econômico): persistem as desigualdades


salariais de gênero.

ODS 16 (Paz, justiça e instituições eficazes): participação feminina em processos de


paz e governança ainda é limitada.

Assim, a igualdade de gênero é condição necessária para o cumprimento de toda


a Agenda.

2.2.5. Instrumentos Legais Regionais (África)

A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, também conhecida como
Carta de Banjul, foi adotada em 27 de junho de 1981 pela Organização da Unidade
Africana (OUA), atual União Africana (UA). Este documento histórico não apenas
reafirma os princípios universais dos direitos humanos, mas também incorpora valores
civilizatórios africanos, destacando-se pela indissociabilidade entre direitos individuais
e coletivos, bem como pela ênfase nos deveres além dos direitos. A questão da
igualdade de gênero e não discriminação perpassa todo o texto da Carta, embora com
nuances e desafios específicos no contexto africano. Este artigo analisa profundamente
como a Carta aborda essas questões, seus pontos fortes, limitações e desdobramentos
posteriores.

1. Enquadramento Legal e Princípios Gerais de Não Discriminação

A Carta Africana estabelece, desde o seu preâmbulo, um compromisso com a


eliminação de todas as formas de discriminação. Os Estados signatários reconhecem que
a liberdade, a igualdade, a justiça e a dignidade são objetivos essenciais para a
realização das legítimas aspirações dos povos africanos .

 Artigo 2º: A Proibição Expressa da Discriminação

O Artigo 2º é fundamental para a questão da não discriminação:

"Toda a pessoa tem direito ao gozo dos direitos e liberdades reconhecidos e


garantidos na presente Carta, sem nenhuma distinção, nomeadamente de raça, de etnia,
de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou de qualquer outra opinião,
de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação."

A menção explícita ao "sexo" como categoria protegida é crucial. Isso proíbe


legalmente a discriminação com base no gênero e obriga os Estados a garantirem que
mulheres e homens desfrutem igualmente de todos os direitos nela consagrados.

 Artigo 3º: Igualdade Perante a Lei

O Artigo 3º complementa o anterior ao estabelecer:

"1. Todas as pessoas beneficiam-se de uma total igualdade perante a lei. 2. Todas
as pessoas têm direito a uma igual proteção da lei."

Este artigo vai além da mera não discriminação, impondo uma obrigação
positiva ao Estado de garantir que suas leis e sistemas jurídicos protejam todos os
indivíduos de maneira equitativa, inclusive contra vieses de gênero.

2. Direitos Específicos e suas Implicações para a Igualdade de Gênero

A Carta consagra uma gama de direitos cuja efetivação é essencial para a


autonomia das mulheres e a realização da igualdade substantiva.

 Integridade Física e Moral (Artigo 4º e 5º)


Os artigos 4º e 5º garantem a inviolabilidade da pessoa humana e o direito à
integridade física e moral, proibindo expressamente a tortura e os tratamentos cruéis,
desumanos ou degradantes . Isso tem implicações diretas para o combate à violência
baseada no gênero, como a violência doméstica, a mutilação genital feminina e os
casamentos forçados, ainda prevalentes em muitas partes da África.

 Direitos Políticos e de Participação (Artigo 13º)

O Artigo 13º estabelece o direito de participar livremente na direção dos assuntos


públicos e de acessar funções públicas . Isso é vital para garantir a representação
política das mulheres e sua participação nos processos de decisão, quebrando barreiras
históricas de exclusão.

 Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

A Carta é pioneira ao não separar rigidamente as categorias de direitos. Este aspecto


é crucial para a igualdade de gênero, pois as discriminações contra as mulheres
frequentemente se manifestam nas esferas econômica e social.

 Artigo 15º: Direito ao Trabalho: Garante o direito a condições de trabalho


equitativas e satisfatórias e "salário igual por trabalho igual" . Este é um
instrumento direto para combater a disparidade salarial entre gêneros.
 Artigo 16º: Direito à Saúde: O direito ao mais alto padrão de saúde física e
mental impõe aos Estados o dever de tomar medidas para proteger a saúde de
suas populações, o que inclui saúde sexual e reprodutiva .
 Artigo 17º: Direito à Educação e à Cultura: A educação é um pilar para a
emancipação feminina. Além disso, o inciso 3º do mesmo artigo afirma ser dever
do Estado promover e proteger "a moral e os valores tradicionais reconhecidos
pela comunidade" . Este ponto cria uma tensão complexa, pois valores
tradicionais podem, por vezes, conflitar com a igualdade de gênero, exigindo
uma interpretação equilibrada.

2.2.6. O Protocolo de Maputo (2003): Uma Análise Abrangente do Marco dos


Direitos das Mulheres em África

O Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os


Direitos das Mulheres em África, popularmente conhecido como Protocolo de Maputo,
foi adotado pela União Africana (UA) em 11 de julho de 2003 na cidade de Maputo,
Moçambique. Este protocolo representa um dos instrumentos de direitos humanos mais
progressistas e abrangentes do mundo, concebido especificamente para abordar as
desigualdades e discriminações históricas enfrentadas pelas mulheres e meninas no
continente africano.

A sua criação foi uma resposta à constatação de que os direitos das mulheres
eram frequentemente marginalizados, mesmo no contexto dos direitos humanos
consagrados na Carta Africana de 1981. A necessidade de um instrumento específico e
vinculativo tornou-se imperativa para garantir que os direitos das mulheres fossem
plenamente reconhecidos, protegidos e realizados .

1. O Processo de Elaboração e Ratificação

 Gênese e Drafting

A origem do Protocolo remonta a março de 1995, em Lomé, Togo, onde uma


reunião organizada pela Women in Law and Development in Africa (WiLDAF) exigiu a
criação de um protocolo específico para os direitos das mulheres. A Assembleia da então
Organização da Unidade Africana (OUA) mandatou a Comissão Africana dos Direitos
Humanos e dos Povos (CADHP) a elaborar tal protocolo na sua 31ª Sessão Ordinária,
em junho de 1995, em Adis Abeba .

Um primeiro rascunho, produzido por um grupo de peritos que incluía membros


da CADHP, representantes de ONGs africanas e observadores internacionais, foi
submetido e subsequentemente revisto em várias sessões. Um marco crucial foi a
nomeação de Julienne Ondziel Gnelenga como a primeira Relatora Especial sobre os
Direitos das Mulheres em África em 1998, com o mandato de trabalhar para a adoção
do protocolo .

 Adoção e Entrada em Vigor

Appressão de grupos de direitos das mulheres, liderados por organizações como a


Equality Now, o protocolo foi finalmente adotado na Cimeira da UA em Maputo, a 11
de julho de 2003. De acordo com o seu Artigo 29, o Protocolo entraria em vigor após
ser ratificado por 15 Estados-membros. Este marco foi alcançado a 25 de novembro de
2005, tornando-o juridicamente vinculativo para os países que o ratificaram .

 Estado Atual de Ratificação


Até setembro de 2023 (dados mais recentes disponíveis nos resultados de pesquisa):
49 países assinaram o Protocolo.

 44 países ratificaram-no e depositaram os instrumentos de ratificação junto da


UA .
 Os países que não assinaram nem ratificaram são o Botswana, o Egito e o
Marrocos.
 Os países que assinaram mas ainda não ratificaram incluem o Burundi, a
República Centro-Africana, o Chade, a Eritreia, Madagáscar, o Níger, a Somália
e o Sudão .

TEstado de Ratificação do Protocolo de Maputo (Dados Selecionados com base em )

País Data de Assinatura Data de Ratificação Status (Set/2023)

 África do Sul 18/12/2003 17/12/2004 Ratificado


 Angola 30/06/2008 ? Ratificado
 Cabo Verde 05/12/2003 09/06/2008 Ratificado
 Gana 09/12/2003 13/01/2005 Ratificado
 Moçambique 27/02/2004 14/12/2011 Ratificado
 Nigéria 16/12/2003 16/04/2012 Ratificado
 Quénia 11/02/2004 30/09/2005 Ratificado
 Uganda 18/12/2003 22/07/2010 Ratificado

2. Princípios e Direitos Fundamentais Consagrados no Protocolo

O Protocolo de Maputo é notável pela sua abrangência e detalhe. Ele vai


significativamente além de instrumentos globais como a CEDAW (Convenção sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres), ao abordar
contextos e desafios específicos do continente africano .

 Definições Abrangentes

O Artigo 1º do Protocolo fornece definições cruciais:

Discriminação contra a mulher: Qualquer distinção, exclusão, restrição ou


tratamento diferencial baseado no sexo, cujos objetivos ou efeitos comprometam
o reconhecimento, gozo ou exercício dos direitos humanos e liberdades
fundamentais pelas mulheres .
Práticas Nocivas: Comportamentos, atitudes e/ou práticas que afetam
negativamente os direitos fundamentais de mulheres e meninas, como os direitos
à vida, saúde, dignidade, educação e integridade física (ex: MGF, casamento
infantil) .
Violência contra a mulher: Todos os atos perpetrados contra mulheres que
causem ou possam causar danos físicos, sexuais, psicológicos e económicos,
incluindo a ameaça de tais atos .
 Direitos Civis e Políticos
Artigo 2 (Eliminação da Discriminação): Os Estados devem combater a
discriminação através de medidas legislativas, institucionais e outras, incluindo a
integração de uma perspetiva de género em todas as políticas .
Artigo 8 (Acesso à Justiça) e 9 (Participação Política): Garantem igual
proteção perante a lei e o direito de participar no processo político e de decisão .
 Direitos Económicos, Sociais e Culturais
Artigo 13 (Direitos Económicos e Sociais): Reconhece o direito à segurança
económica, incluindo o controle sobre a sua propriedade e herança.
Artigo 15 (Direito à Segurança Alimentar) e 16 (Direito à Habitação
Adequada): Estabelecem direitos fundamentais para a autonomia das mulheres .
Artigo 17 (Direito a um Contexto Cultural Positivo): Talvez um dos artigos
mais inovadores, obriga os Estados a promover e proteger os valores culturais
positivos, mas também a modificar os padrões sociais e culturais de conduta que
são prejudiciais às mulheres. Isto cria uma base legal para desafiar tradições
nocivas em nome do próprio património cultural africano .
 Direitos sobre a Integridade Física e Autonomia Corporal
Artigo 4 (Direito à Vida, Integridade e Segurança): Proíbe todas as formas de
violência contra as mulheres, incluindo a violência sexual e o tráfico. Ordena aos
Estados que não executem grávidas ou mulheres a amamentar .
Artigo 5 (Eliminação de Práticas Nocivas): Ordena a proibição e eliminação
de todas as formas de Mutilação Genital Feminina (MGF) e de outras práticas
nocivas, através de legislação, sanções e programas de sensibilização .
Artigo 6 (Matrimónio): Estabelece a idade mínima para o casamento em 18
anos e exige o consentimento livre e pleno de ambas as partes. Além disso,
encoraja a monogamia como forma preferencial de matrimónio e protege os
direitos das mulheres em relações polígamas .
 Saúde e Direitos Reprodutivos (Artigo 14)

Este é um dos artigos mais progressistas e, consequentemente, mais controversos


do Protocolo. Ele garante às mulheres o direito de controlar a sua fertilidade e de decidir
se querem ter filhos, quantos e quando. Especificamente, obriga os Estados a:

Proteger os direitos reprodutivos das mulheres, autorizando o aborto médico em


casos de agressão sexual, violação, incesto e quando a continuação da gravidez colocar
em risco a saúde mental ou física da mãe ou a vida da mãe ou do feto .

Fornecer serviços de planeamento familiar adequados, acessíveis e de qualidade.

Estabelecer e reforçar serviços de saúde pré e pós-natal.

 Oposição e Controvérsias

A natureza progressista do Protocolo, particularmente nas áreas de direitos


reprodutivos e práticas culturais, gerou oposição significativa .

 Oposição Religiosa
Oposição Cristã: Liderada pela Igreja Católica, que sob o Papa Bento XVI
descreveu os direitos reprodutivos do Protocolo como uma "tentativa de
trivializar o aborto sub-repticiamente". Em países como o Uganda, conselhos
cristãos poderosos opuseram-se à ratificação com base no Artigo 14 .
Oposição Muçulmana: Em países de maioria muçulmana como o Níger, o
Parlamento rejeitou a ratificação em 2006, com o argumento de que tradições
como o casamento precoce e as restrições ao aborto eram incompatíveis com os
valores predominantes. Grupos de mulheres muçulmanas chegaram a protestar
contra o que chamaram de "protocolos satânicos de Maputo" .

Contudo, é importante notar que a oposição não é unânime dentro destas religiões.
No Djibouti, por exemplo, a ratificação em 2005 foi apoiada por uma conferência que
declarou que a MGF não é apoiada pelo Alcorão e vai contra os preceitos do Islão .

4. Impacto e Implementação: Da Teoria à Prática

O verdadeiro teste de um instrumento de direitos humanos reside na sua


implementação. O Protocolo de Maputo tem sido utilizado de forma poderosa em
litígios estratégicos em todo o continente, levando a mudanças concretas .
 Casos Jurídicos Paradigmáticos com base no Protocolo de Maputo

Caso/País Issue Decisão/Impacto

Quénia (2021) Desafio à proibição da MGF O Tribunal Constitucional manteve


a constitucionalidade da lei de proibição da MGF, alinhando-se com o Artigo 5.
Quénia (2020) Violência sexual pós-eleitoral (2007) O Tribunal Superior
considerou o governo responsável por não investigar a violência de género e
ordenou indemnizações, citando o Protocolo.
Serra Leoa (2019) Proibição de meninas grávidas na escola O Tribunal da
CEDEAO declarou a proibição discriminatória, violando os Artigos 2 e 12. O
governo levantou a proibição em 2020.
Etiópia (2018) Caso de "casar com o estuprador" A Comissão Africana
considerou que a Etiópia violou os direitos da vítima, ordenando uma
indemnização e pressionando pela reforma legal.
Tanzânia (2019) Idade mínima de casamento O Tribunal de Recurso manteve
uma decisão que exige que a idade mínima de casamento seja elevada para 18
anos para ambos os sexos, citando o Artigo 6.
Mali (2011) Código da Família O Tribunal Africano considerou o Mali em
violação do Artigo 6 (idade e consentimento) e 21 (herança) do Protocolo.
 Mecanismos de Prestação de Contas

Os Estados Partes são obrigados a submeter relatórios periódicos a cada dois


anos à Comissão Africana, detalhando as medidas legislativas e outras tomadas para
implementar o Protocolo. A Comissão Africana publicou Diretrizes de Relatórios
Estatais e Comentários Gerais para auxiliar os Estados e fornecer interpretação
autoritativa sobre disposições específicas, como o Artigo 14 (direitos à saúde)

2.2.7. Instrumentos Legais Nacionais

2.2.7.1. Igualdade de Género e Não Discriminação em Moçambique

A Constituição da República de Moçambique consagra, no seu artigo 35.º, o


princípio da igualdade de todos os cidadãos diante da lei, proibindo qualquer forma de
discriminação baseada em motivos de género, origem, condição social, entre outros. O
artigo 36.º especifica a igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres em
todos os domínios político, económico, social e cultural criando a base normativa
fundamental para planes, políticas e legislação que visem concretizar a igualdade
substantiva.

 Políticas Públicas de Género

A operacionalização deste quadro constitucional tem sido construída através de


políticas públicas como a Política de Género e Estratégia de Implementação (2018) e o
Plano Nacional para o Avanço da Mulher (PNAM) 2018–2024, que estruturam e
orientam ações concretas, metas claras e responsabilidades intersetoriais para promover
direitos iguais de forma transversal.

 Legislação Penal (Violência Doméstica)

A Lei n.º 29/2009, de 29 de setembro define e tipifica as formas de violência


doméstica contra a mulher (física, psicológica, sexual, patrimonial, moral), impõe a
natureza pública do crime e estipula medidas protetivas e cooperação entre instituições.
É um instrumento essencial para a prevenção, repressão e proteção jurídicas às vítimas
de violência baseada no género.

 Direitos na Família

A Lei n.º 22/2019, de 11 de dezembro — Lei da Família — reforça os princípios


de igualdade no âmbito conjugal ao estabelecer direitos e deveres iguais entre cônjuges
e dar proteção especial às crianças, contemplando casamento, registo e capacidade
jurídica de todos os membros da família.

 Código Penal

A Lei n.º 24/2019, de 24 de dezembro, que reviu o Código Penal, introduziu


alterações relevantes para o combate à violência sexual, tráfico de pessoas e crimes
relacionados — oferecendo também instrumentos penais para atuar sobre
discriminações violentas de género. Juntamente com a Lei de Violência Doméstica,
consolida um robusto quadro jurídico penal protetivo.

 Legislação Laboral

No domínio laboral, o Código do Trabalho atual (anexo e comentários


disponíveis via trabalhadores e portais jurídicos) estabelece, no artigo 24.º, o direito à
igualdade de oportunidades e de tratamento no emprego, formação, promoção e
condições de trabalho, abrangendo proibição de discriminação por sexo, estado civil,
parentalidade, entre outros. O artigo 30.º proíbe restrições baseadas no sexo, inclusive
nas ofertas de emprego e formação profissional, e permite preferência a candidatos de
género subrepresentado, em certas circunstâncias.

 Estruturas Institucionais de Género

Para garantir a aplicação prática dessas normas, o Estado criou o Ministério do


Género, Criança e Ação Social e instituiu núcleos de género em diversos setores (saúde,
educação, agricultura etc.), além de planos setoriais que integram metas de género —
reforçando a coordenação intersetorial e a responsabilização institucional.

 Serviços Integrados de Atendimento

O Decreto n.º 75/2020 regulou a criação dos Centros de Atendimento Integrado


às Vítimas de Violência, que articulam saúde, justiça, polícia e assistência social para
garantir atendimento multidisciplinar e eficaz às vítimas de violência baseada no
género.

 Dados e Monitoria

As políticas nacionais destacam a importância de dados desagregados por sexo e


indicadores específicos, bem como a monitoria periódica de resultados por meio de
relatórios técnicos e avaliações (p. ex., UN Women). Estes instrumentos são
fundamentais para aferir progresso, ajustar ações e alocar recursos à medida dos
desafios.

 Promoção da Igualdade Substantiva

Mais concretamente, os instrumentos nacionais promovem o acesso das


mulheres a activos produtivos (terra, crédito), formação, emprego, políticas de
conciliação trabalho-família, redução de abandono escolar e combate a casamentos
precoces, bem como sensibilidade socio-cultural através de campanhas comunitárias.
Tais medidas figuram em planos públicos como o PNAM.

2.2.8. Exemplo de um Instrumento Legal na abordagem de Igualdade de Gênero e


não a discriminação

1. A Política de Gênero de Moçambique


A Política de Gênero de Moçambique, aprovada em 2007, visa promover a
igualdade entre homens e mulheres, conforme reconhecido pela Constituição desde
1975. A política é fundamentada em tratados internacionais, como a CEDAW e os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Após uma década de implementação, a
avaliação identificou avanços, como o aumento da representação feminina em posições
de decisão e melhorias no acesso à educação e saúde. No entanto, lacunas persistem,
especialmente na participação das mulheres em níveis locais e na retenção de meninas
na escola.

2. Enquadramento da Política de Gênero

A Política de Gênero é alinhada ao Protocolo da SADC sobre Gênero e


Desenvolvimento. Define visão, missão, princípios e objetivos estratégicos, abordando a
necessidade de recursos financeiros e humanos para sua implementação eficaz.

3. Conceitos Fundamentais

 Igualdade de Gênero: Refere-se à ausência de discriminação com base no sexo,


garantindo direitos e oportunidades iguais para homens e mulheres.
 Equidade de Gênero: Reconhece as diferenças entre indivíduos, promovendo
um tratamento justo que busca reduzir desigualdades.
 Masculinidades: Atributos e comportamentos associados aos homens, definidos
socialmente.
 Transversalidade de Gênero: A ideia de que todas as áreas devem incluir a
perspectiva de gênero para garantir a igualdade.
 Planificação e Orçamentação na Óptica de Gênero (POOG): Integra a
perspectiva de gênero em processos orçamentários e de planejamento.

4. Visão e Missão

 Visão: Uma sociedade onde homens e mulheres tenham direitos e oportunidades


iguais, contribuindo e beneficiando-se dos processos de desenvolvimento.
 Missão: Promover atitudes e práticas que favoreçam a igualdade e equidade de
gênero.

5. Princípios

Os princípios fundamentais da Política de Gênero incluem:


1.Unidade: Promover a unidade na diversidade.

2. Igualdade e Equidade de Gênero: Considerar as contribuições iguais de homens e


mulheres.

3.Transversalidade: Reconhecer os direitos das mulheres como parte dos direitos


humanos.

4. Participação: Envolver todos os grupos na implementação de ações.

5. Justiça Social: Assegurar equidade e prevenir desigualdades.

6. Coerência: Integrar a igualdade de gênero nas políticas governamentais.

7. Compromisso e Responsabilização: Garantir que os atores sejam responsáveis pelos


resultados.

8. Cooperação: Coordenar ações entre diferentes setores.

7. Objetivos da Política de Gênero

7.1. Objetivo Geral

 Orientar as ações para promover a igualdade de gênero e o respeito pelos


direitos humanos.

7.1.1. Objetivos Específicos

 Eliminar práticas nocivas que violam os direitos das mulheres e meninas.


 Garantir representação equitativa em órgãos de decisão.
 Promover igualdade no acesso à educação e recursos produtivos.
 Combater todas as formas de violência de gênero.
 Promover acesso universal à saúde sexual e reprodutiva.

8. Estratégia de Implementação

A implementação da política é organizada em nove eixos estratégicos:

Eixo 1: Legislação

Ações Estratégicas:

 Garantir que os direitos de mulheres e homens não sejam violados.


 Definir mecanismos para sancionar a inobservância da legislação sobre
igualdade de gênero.
 Adotar e implementar legislação para proteger mulheres com deficiência e
idosos.

Eixo 2: Governação

Ações Estratégicas:

 Capacitar mulheres para participação efetiva em processos de decisão.


 Introduzir quotas para aumentar a representatividade feminina nos órgãos de
decisão.
 Promover a capacitação em gênero para todos os governantes.

Eixo 3: Educação e Formação

Ações Estratégicas:

 Assegurar acesso e retenção de meninas em todos os níveis de ensino.


 Revisar currículos escolares para eliminar estereótipos de gênero.
 Promover a formação de meninas em disciplinas STEM e nas TIC.

Eixo 4: Saúde Sexual e Reprodutiva

Ações Estratégicas:

 Implementar políticas que garantam cuidados de saúde de qualidade e


acessíveis.
 Promover a saúde sexual e reprodutiva, garantindo direitos equivalentes para
todos.
 Desenvolver programas para reduzir a mortalidade materna e aumentar o acesso
aos serviços de saúde.

Eixo 5: Recursos Produtivos e Emprego

Ações Estratégicas:

 Promover o acesso das mulheres à terra e recursos produtivos.


 Estabelecer quotas para mulheres em financiamentos e programas de
desenvolvimento.
 Reconhecer e valorizar o trabalho doméstico não remunerado nas estatísticas
econômicas.

Eixo 6: Violência Baseada no Gênero

Ações Estratégicas:

 Cumprir a legislação que proíbe a violência baseada no gênero.


 Garantir serviços de atendimento integrado e assistência para vítimas de
violência.
 Implementar programas de reeducação para agressores e promover novas
masculinidades.

Eixo 7: Mediação de Conflitos e Consolidação da Paz

Ações Estratégicas:

 Incluir mulheres em processos de paz e resolução de conflitos.


 Garantir proteção e assistência a mulheres afetadas por conflitos armados.
 Promover educação em não-violência e prevenção de conflitos.

Eixo 8: Meios de Comunicação e Tecnologias de Informação

Ações Estratégicas:

 Integrar a perspectiva de gênero nas políticas e códigos de conduta dos meios de


comunicação.
 Promover a participação feminina na mídia e aumentar o acesso das mulheres às
TIC.
 Expandir a formação em TIC para mulheres e meninas, especialmente em áreas
rurais.

Eixo 9: Meio Ambiente e Mudanças Climáticas

Ações Estratégicas:

 Promover o empoderamento das mulheres em questões ambientais e


sustentabilidade.
 Garantir a equidade de gênero em estratégias de mitigação e adaptação às
mudanças climáticas.
 Integrar a perspectiva de gênero em políticas ambientais e de recursos naturais.
9. Implementação

Coordenação

A implementação é coordenada pelo Ministério do Gênero, Criança e Ação


Social e envolve atores do governo, sociedade civil e setor privado.

Planificação, Monitoria e Avaliação

As ações são monitoradas através de instrumentos de planejamento do governo,


alinhados à matriz de monitoria do Protocolo da SADC. A avaliação da política será
realizada por meio de estudos e relatórios periódicos.

Financiamento

É necessário assegurar recursos financeiros sustentáveis para a execução da


política. A mobilização de fundos deve incluir contribuições de parceiros nacionais e
internacionais.

Capacitação

Programas de capacitação serão implementados para fortalecer a compreensão


de gênero entre os atores envolvidos na política.

Responsabilidade e Divulgação

Todos os atores são responsáveis pela implementação, e uma ampla divulgação é


essencial para garantir que a política seja conhecida e aplicada.

10. Mecanismos Institucionais

Os Pontos Focais de Gênero (PFG) deverão ter suas atribuições fortalecidas, e o


Conselho Nacional para o Avanço da Mulher terá um papel central na coordenação da
execução da política.
CAPITULO III: CONSIDERAҪÕES FINAIS

3.0. Conclusão

A análise dos instrumentos legais na abordagem sobre a igualdade de gênero e a


não discriminação, tanto ao nível internacional como nacional, evidencia que este é um
tema central para a consolidação dos direitos humanos e para a construção de
sociedades mais justas e inclusivas. No plano internacional, tratados, convenções e
declarações, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e a
Agenda 2030 das Nações Unidas, constituem marcos normativos que orientam os
Estados na promoção da igualdade, estabelecendo padrões mínimos de proteção e de
garantia de direitos. Esses instrumentos não apenas reconhecem a igualdade de gênero
como princípio fundamental, mas também impõem obrigações jurídicas e políticas que
visam eliminar as diversas formas de discriminação.

Ao nível nacional, verifica-se que muitos países, incluindo Moçambique,


incorporaram tais princípios nos seus ordenamentos jurídicos, por meio de
constituições, políticas públicas e legislações específicas que visam assegurar
oportunidades iguais para homens e mulheres, combater práticas discriminatórias e
reforçar a participação feminina em todas as esferas da vida social, política e
econômica. Todavia, a efetivação desses instrumentos enfrenta desafios significativos,
como a resistência cultural, a fraca implementação das políticas e a insuficiência de
mecanismos de monitoria e responsabilização.

Conclui-se, portanto, que embora os instrumentos legais internacionais e


nacionais constituam um arcabouço normativo robusto para a promoção da igualdade de
gênero e da não discriminação, a sua eficácia depende da conjugação entre vontade
política, educação cívica, fortalecimento institucional e transformação cultural. A
consolidação da igualdade de gênero não deve ser vista apenas como uma obrigação
jurídica, mas como um imperativo ético e social indispensável para o desenvolvimento
humano sustentável.

4.0. Referências Bibliográficas

Connell, R. W. (2005). Masculinities (2nd ed.). University of California Press.

Ferrajoli, L. (2001). Direitos e garantias fundamentais. Revista dos Tribunais.

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Adis Abeba: UA.

UNESCO. (2022). Relatório Global da Educação 2022: Inclusão e igualdade. Paris:


UNESCO.

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