“ Ode  Triunfal ”,  de Álvaro de Campos   (Heterónimo de F. Pessoa) Análise do poema Rafael Albergaria, nº 16 Raul Ferreira, nº 17 Escola Básica 2,3/S de Vale de Cambra  Português 12º D (2009/2010)
Título e Conteúdo do Poema.
O ideal de A. Campos neste poema =  “sentir tudo de todas as maneiras” ;  Sentir tudo numa  “histeria de sensações” ,  Sentir tudo e identificar-se com tudo, mesmo com as coisas mais aberrantes [ “Ah!, poder exprimir me todo como um motor se exprime! / Ser completo como uma máquina!/(...) / Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, / Rasgar-me todo, abrir-me completamente, (...)/ A todos os perfumes de óleos e calores e carvões...) , vv.26-31] Todo o prazer do poeta está em revelar-se como um “monte confuso de forças”, um  “eu”  universo   donde jorra a volúpia sensual de ser tudo, uma espécie de “prostituição febril às máquinas”. Este ideal é o oposto do ideal da estética aristotélica, que punha toda a ênfase na ideia da beleza, no conceito do agradável, no equilíbrio comandado pela inteligência. Na poesia de Campos, em vez da bela harmonia clássica saída da clara inteligência, há a caótica força explosiva saída de um subconsciente em convulsão. A sua poesia revela-se, assim, como um novo processo de descompressão do subconsciente de Pessoa, sempre torturado pela inteligência, pela “dor de pensar”. Espírito do Poeta face ao mundo.
Influência de Pessoa-ortónimo: Ao longo do poema, há um desfilar irónico dos escândalos da época: a desumanização, a hipocrisia, a corrupção, a miséria, a pilhagem, os falhanços da técnica (desastres, naufrágios), a hipócrita harmonia entre marido e mulher, etc. Nesta enumeração pode entrever-se o substrato céptico da inteligência torturada de F. Pessoa;  A evocação nostálgica da infância  (“Na nora do quintal da minha casa... /(...)/Pinheirais onde a minha infância era outra coisa/ Do que eu sou...”); O facto de haver uma tendência para a ficção. Se se reparar bem, o entusiasmo da civilização industrial assume, em Campos, aspectos de um certo masoquismo sádico  (“Atirem-me para dentro  das fornalhas!” , que se orienta mais para a criação de sensações novas e violentas ( Sensacionismo ), do que para a exaltação das máquinas.  F. Pessoa subordinava tudo à criação literária.
Percepção do real pelo sujeito poético. O modo como o sujeito poético percepciona o real, baseia-se num excesso de sensações:  “(...) excesso / De expressão de todas as minhas sensações” Visuais:   forma – “Ó rodas, ó engrenagens (...)”; luminosidade – “À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas (...)”; movimento – “Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes”. Auditivas:   “(...) r-r-r-r-r-r eterno!”, “De vos ouvir demasiadamente de perto”; “Rugindo, rangendo (...)”,  v. 24; Olfactivas:   “A todos os perfumes de óleos e calores e carvões”. Gustativas:   “Tenho os lábios secos (...)” ; Tácteis :   “Fazendo-me um excesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma.”
Linguagem e Estilo Tendência contínua de humanizar as máquinas:  “Grandes trópicos humanos de ferro, fogo e forças”; “E há Platão e Virgílio dentro das máquinas”; “exprimir-me como um motor se exprime” , etc; O uso da ironia, para exprimir a face negativa da civilização industrial. Eis algumas frases com um  expressivo  sentido irónico: —  “ escrocs exageradamente bem vestidos” : além da ironia, está aqui presente a  antítese  entre a compostura exterior (vestuário) dos  escrocs  e as suas intenções: —  “ Chefes de família vagamente felizes” : o advérbio “vagamente” projecta sobre a felicidade dos chefes de família a sombra do cansaço (fartos de viver); —  “ Banalidade interessante.../ Das burguesinhas.../ Que andam na rua com um fim qualquer” : de assinalar são a palavra “burguesinhas” e a expressão “com um fim qualquer”, já que mostram a existência de uma  antítese  entre o aspecto exterior das burguesinhas (diminutivo irónico) e as suas obscuras intenções; —  “ A maravilhosa beleza das corrupções políticas, / Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos” : a adjectivação antitética assume aqui a forma de  oxímoro .
Outras  antíteses  presentes no poema são: —  “ tudo o que passa e nunca passa” : exprime a concentração do passado no presente, ou a continuidade dos acontecimentos do dia-a-dia.; —  “ O ruído cruel e delicioso da civilização de hoje” : antítese que reflecte os sentimentos contraditórios do poeta em relação à civilização industrial. Existe a presença de  metáforas  e  imagens  expressivas, tais como: “ Arde-me a cabeça de vos querer cantar”;  “ Grandes trópicos humanos de ferro, fogo e força”  “ Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável”  “ Nos cafés, oásis de inutilidade ruidosas”  “ Quilhas de chapa de ferro sorrindo” Através destas imagens e metáforas, o sujeito poético mostra a forma como vibra com as coisas da civilização industrial (com a fúria do movimento das máquinas, com a excessiva quantidade de carvão).  Além disso, dá também uma imagem muito negativa dos cafés, com ruídos inúteis; apresentando, ainda, a imagem dos navios ancorados:  “quilhas de chapa de ferro sorrindo”.
Ruptura com a lírica tradicional portuguesa. Ruptura a nível formal:  Irregularidade estrófica, métrica e rítmica;  Uso excessivo da coordenação;  Catadupa de figuras de estilo (onomatopeias ousadas, apóstrofes e enumerações exageradas), discurso caótico... Ruptura a nível do conteúdo:  O uso de palavras completamente prosaicas (comuns ou vulgares);  O canto excessivo da civilização industrial; a ousadia de tocar em alguns aspectos negativos da sociedade, etc.
À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica  Tenho febre e escrevo.  Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,  Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.  Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!  Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!  Em fúria fora e dentro de mim,  Por todos os meus nervos dissecados fora,  Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!  Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,  De vos ouvir demasiadamente de perto,  E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso  De expressão de todas as minhas sensações,  Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! (…) A maravilhosa beleza das corrupções políticas,  Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,  Agressões políticas nas ruas,  E de vez em quando o cometa dum regicídio  Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus  Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana! (…)
Bibliografia. http://ciberjornal.files.wordpress.com/2009/01/ficha-analise-poema-ode-triunfal-alvaro-de-campos.pdf http://poesiaseprosas.no.sapo.pt/alvaro_de_campos/poetas_alvarodecampos_odetriunfal01.htm

Ode Triunfal de Álvaro de Campos

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    “ Ode Triunfal ”, de Álvaro de Campos (Heterónimo de F. Pessoa) Análise do poema Rafael Albergaria, nº 16 Raul Ferreira, nº 17 Escola Básica 2,3/S de Vale de Cambra Português 12º D (2009/2010)
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    O ideal deA. Campos neste poema = “sentir tudo de todas as maneiras” ; Sentir tudo numa “histeria de sensações” , Sentir tudo e identificar-se com tudo, mesmo com as coisas mais aberrantes [ “Ah!, poder exprimir me todo como um motor se exprime! / Ser completo como uma máquina!/(...) / Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, / Rasgar-me todo, abrir-me completamente, (...)/ A todos os perfumes de óleos e calores e carvões...) , vv.26-31] Todo o prazer do poeta está em revelar-se como um “monte confuso de forças”, um “eu” universo donde jorra a volúpia sensual de ser tudo, uma espécie de “prostituição febril às máquinas”. Este ideal é o oposto do ideal da estética aristotélica, que punha toda a ênfase na ideia da beleza, no conceito do agradável, no equilíbrio comandado pela inteligência. Na poesia de Campos, em vez da bela harmonia clássica saída da clara inteligência, há a caótica força explosiva saída de um subconsciente em convulsão. A sua poesia revela-se, assim, como um novo processo de descompressão do subconsciente de Pessoa, sempre torturado pela inteligência, pela “dor de pensar”. Espírito do Poeta face ao mundo.
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    Influência de Pessoa-ortónimo:Ao longo do poema, há um desfilar irónico dos escândalos da época: a desumanização, a hipocrisia, a corrupção, a miséria, a pilhagem, os falhanços da técnica (desastres, naufrágios), a hipócrita harmonia entre marido e mulher, etc. Nesta enumeração pode entrever-se o substrato céptico da inteligência torturada de F. Pessoa; A evocação nostálgica da infância (“Na nora do quintal da minha casa... /(...)/Pinheirais onde a minha infância era outra coisa/ Do que eu sou...”); O facto de haver uma tendência para a ficção. Se se reparar bem, o entusiasmo da civilização industrial assume, em Campos, aspectos de um certo masoquismo sádico (“Atirem-me para dentro das fornalhas!” , que se orienta mais para a criação de sensações novas e violentas ( Sensacionismo ), do que para a exaltação das máquinas. F. Pessoa subordinava tudo à criação literária.
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    Percepção do realpelo sujeito poético. O modo como o sujeito poético percepciona o real, baseia-se num excesso de sensações: “(...) excesso / De expressão de todas as minhas sensações” Visuais: forma – “Ó rodas, ó engrenagens (...)”; luminosidade – “À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas (...)”; movimento – “Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes”. Auditivas: “(...) r-r-r-r-r-r eterno!”, “De vos ouvir demasiadamente de perto”; “Rugindo, rangendo (...)”, v. 24; Olfactivas: “A todos os perfumes de óleos e calores e carvões”. Gustativas: “Tenho os lábios secos (...)” ; Tácteis : “Fazendo-me um excesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma.”
  • 6.
    Linguagem e EstiloTendência contínua de humanizar as máquinas: “Grandes trópicos humanos de ferro, fogo e forças”; “E há Platão e Virgílio dentro das máquinas”; “exprimir-me como um motor se exprime” , etc; O uso da ironia, para exprimir a face negativa da civilização industrial. Eis algumas frases com um expressivo sentido irónico: — “ escrocs exageradamente bem vestidos” : além da ironia, está aqui presente a antítese entre a compostura exterior (vestuário) dos escrocs e as suas intenções: — “ Chefes de família vagamente felizes” : o advérbio “vagamente” projecta sobre a felicidade dos chefes de família a sombra do cansaço (fartos de viver); — “ Banalidade interessante.../ Das burguesinhas.../ Que andam na rua com um fim qualquer” : de assinalar são a palavra “burguesinhas” e a expressão “com um fim qualquer”, já que mostram a existência de uma antítese entre o aspecto exterior das burguesinhas (diminutivo irónico) e as suas obscuras intenções; — “ A maravilhosa beleza das corrupções políticas, / Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos” : a adjectivação antitética assume aqui a forma de oxímoro .
  • 7.
    Outras antíteses presentes no poema são: — “ tudo o que passa e nunca passa” : exprime a concentração do passado no presente, ou a continuidade dos acontecimentos do dia-a-dia.; — “ O ruído cruel e delicioso da civilização de hoje” : antítese que reflecte os sentimentos contraditórios do poeta em relação à civilização industrial. Existe a presença de metáforas e imagens expressivas, tais como: “ Arde-me a cabeça de vos querer cantar”; “ Grandes trópicos humanos de ferro, fogo e força” “ Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável” “ Nos cafés, oásis de inutilidade ruidosas” “ Quilhas de chapa de ferro sorrindo” Através destas imagens e metáforas, o sujeito poético mostra a forma como vibra com as coisas da civilização industrial (com a fúria do movimento das máquinas, com a excessiva quantidade de carvão). Além disso, dá também uma imagem muito negativa dos cafés, com ruídos inúteis; apresentando, ainda, a imagem dos navios ancorados: “quilhas de chapa de ferro sorrindo”.
  • 8.
    Ruptura com alírica tradicional portuguesa. Ruptura a nível formal: Irregularidade estrófica, métrica e rítmica; Uso excessivo da coordenação; Catadupa de figuras de estilo (onomatopeias ousadas, apóstrofes e enumerações exageradas), discurso caótico... Ruptura a nível do conteúdo: O uso de palavras completamente prosaicas (comuns ou vulgares); O canto excessivo da civilização industrial; a ousadia de tocar em alguns aspectos negativos da sociedade, etc.
  • 9.
    À dolorosa luzdas grandes lâmpadas eléctricas da fábrica Tenho febre e escrevo. Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos. Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno! Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria! Em fúria fora e dentro de mim, Por todos os meus nervos dissecados fora, Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto! Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, De vos ouvir demasiadamente de perto, E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso De expressão de todas as minhas sensações, Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! (…) A maravilhosa beleza das corrupções políticas, Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos, Agressões políticas nas ruas, E de vez em quando o cometa dum regicídio Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana! (…)
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